A globalização é um processo que vem se desenvolvendo ao longo dos séculos, provocando a queda das barreiras comerciais e o estreitamente das relações internacionais entre os países, e, com isso, possibilitando o crescimento e a competitividade entre empresas de diversos países; e trazendo, conseqüentemente, avanços tecnológicos e culturais. E, com a evolução dos meios de comunicação e transporte, o comércio internacional desenvolveu-se concomitantemente, sendo necessário, entre outras razões, a criação de normas que pudessem traçar e organizar as relações comerciais entre os Estados.

Assim, criou-se o GATT (Acordo Geral de Comércio e Tarifas), em 1947, este que posteriormente, em 1994, deu lugar à consolidação de uma Organização Mundial do Comércio – OMC. Esta organização tem como principal objetivo organizar, facilitar, e proteger o comércio entre países. E, no sentido de proteger os mercados, foram criadas medidas de proteção, que são aplicadas na ocorrência de prática desleal de comércio (Medidas Antidumping), para compensar subsídios concedidos, direta ou indiretamente, no país exportador (Medidas Compensatórias), e para organizar o mercado em função do aumento significativo de importações, que possam causar danos materiais a determinado setor do país importador (Medidas Salvaguarda).

Desde a acessão da República Popular da China à Organização Mundial do Comércio – OMC, em 10 de dezembro de 2001, a exportação dos produtos advindos deste país cresceram vertiginosamente. Por ser um país com estrutura altamente produtiva e oferta de mão – de – obra em quantidade e preço inigualável, a China é um país altamente competitivo e ameaçador aos outros países.

E, tendo em vista tal fato, foi instituído no termo de Acessão desse país na OMC um mecanismo de salvaguarda transitória, para produtos chineses que sejam importados por qualquer membro desta Organização, que causem ou ameacem causar desvio importante no comércio para o mercado importador. Assim, tal artifício comercial de proteção possibilita à indústria doméstica de um determinado país membro da OMC, que sentir-se prejudicada ou ameaçada pelo aumento significativo das importações de determinados produtos chineses, a utilizar de tal medida para proteger seu mercado.

No Brasil tal mecanismo foi regulamentado através do Decreto nº 5.556 de 5 de outubro de 2005, que estipulou as condições e formas de aplicação de medidas salvaguardas para evitar a desorganização do mercado brasileiro e o desvio de comércio em função do aumento vertiginoso da importação de produtos chineses.

De acordo com tal regulamento a medida de salvaguarda poderá ser aplicada nos casos em que as importações de produtos chineses estejam aumentando em quantidades e em condições tais que causem ou ameacem a desorganização do mercado para os produtos nacionais de produtos similares ou diretamente concorrentes aos importados.

Portanto, o objetivo da aplicação deste tipo de medida é aumentar, temporariamente, a proteção à indústria doméstica (conjunto de produtores de bens similares ou diretamente concorrentes ao produto importado) que esteja sofrendo ou sendo ameaçada de prejuízo grave decorrente do aumento, em quantidade, das importações, em termos absolutos ou em relação à produção nacional, com o intuito de que durante o período de sua vigência de tal medida a indústria doméstica se ajuste, aumentando a sua competitividade.

Segundo o Decreto acima mencionado, podem requerer a aplicação de medida de salvaguarda contra importação de determinado produto chinês: órgãos e entidades do Governo Federal, empresas ou associações representativas de empresas que produzam o bem objeto da solicitação.

Este pedido deve ser formulado por escrito, instruído com os indícios de desorganização de mercado, e dirigido à SECEX - Secretaria de Comércio Exterior do MDIC, através do DECOM (Departamento de Defesa Comercial); órgão que conduzirá a investigação para confirmar se a aplicação de tal medida é cabível, bem como, com base no resultado da referida investigação elaborará parecer que avalie a existência ou ameaça de desorganização de mercado. Com base no parecer da SECEX, competirá à CAMEX – Câmara de Comércio Exterior decidir e aplicar a medida de salvaguarda solicitada.

Para determinar se há ou não existência de desorganização do mercado decorrente do aumento de importações da China, a Secex, deverá sempre considerar fatores objetivos, tais como: a) Volume e a taxa de crescimento das importações do produto; b) a parcela do mercado interno das importações crescentes; c) o impacto sobre a indústria doméstica, evidenciado pelas alterações de fatores econômicos, tais como: produção, capacidade utilizada, estoques, vendas, participação no mercado, preços (queda ou sua não elevação, que poderia ter ocorrido na ausência de importações), lucros e perdas, rendimento de capital investido, fluxo de caixa; e d) outros fatores que, embora não relacionados com a evolução das importações possam, estar afetando a situação da indústria doméstica em causa.

Existem dois tipos de salvaguarda, a provisória e a definitiva. Ambas são permitidas pelo referido Decreto. A provisória somente será aplicada se comprovado que qualquer demora na aplicação da medida poderá causar dano de difícil reparação, bem como após uma determinação preliminar de que as importações causam ou ameaçam uma desorganização de mercado. Este tipo de salvaguarda tem o prazo de duração de até duzentos dias, e, ao transformá-la em caráter definitivo, o prazo de aplicação da provisória será computado para efeito de vigência total da mesma.

Já a duração da medida de salvaguarda definitiva se limitará ao período necessário para impedir ou reparar a desorganização de mercado para os produtos nacionais de produtos similares ou diretamente concorrentes que sofram ou estejam ameaçados de dano material.

O Decreto ora em comento também concede a oportunidade de se requerer medida de salvaguarda quando da ocorrência de “desvio de comércio”, que se caracteriza quando uma medida aplicada por um terceiro país membro da OMC a determinado produto importado da China, para impedir ou remediar uma desorganização do mercado daquele país, cause ou ameace aumento das exportações da China destinadas ao Brasil. Neste caso, a medida de salvaguarda perderá sua eficácia trinta dias após o término de vigência da medida que deu causa ao desvio de comércio.

E, para determinação da existência de desvio de comércio, a autoridade investigadora, no caso a SECEX, irá monitorar as importações e deverá considerar como evidencia razoável, entre outros, os seguintes fatores:

a) Aumento real ou iminente da participação das importações de produtos chineses no mercado brasileiro; b) A natureza ou extensão de ação adotada ou proposta pela China ou terceiros países; c) o aumento real ou iminente do volume das importações da China devido à medida adotada ou proposta pela China ou terceiros países membros da OMC; d) Condições da oferta e da demanda no mercado brasileiro para o produto em questão; e, e) O volume das exportações da China destinadas ao membro ou membros da OMC que aplicam uma medida de salvaguarda provisória ou definitiva.

A aplicação de medida salvaguarda se caracteriza com a: I) imposição de adicional à TEC, sob a forma de alíquota ad valorem, de alíquota específica ou da combinação de ambas; II) restrição quantitativa; ou III) a Combinação de ambos incisos. Por fim, com base no acima explicitado, conclui-se que com o advento do Decreto acima destacado as empresas nacionais têm a possibilidade de proteger o mercado em que atuam contra as importações de produtos chineses que venham a gerar problemas para sua sobrevivência junto ao mercado consumidor brasileiro.

 

Como citar o texto:

MASSARIOLI, Renata de Alvarenga; MEYER, Roberto Hering..Proteção comercial contra os produtos chineses. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 188. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-internacional/1403/protecao-comercial-contra-os-produtos-chineses. Acesso em 23 jul. 2006.

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