Um pouco de história - O salutar debate.

Agora que os "reformistas governamentais parecem entender que Previdência Social não se inventa ou desinventa em poucos dias, talvez possa ressurgir a salutar prática do debate. Com longo prazo, mas encontrando soluções de acordo com os interesses das classes trabalhadoras e da sociedade.

Assim, nos balões-de-ensaio que o Governo soltou no período pré-reformático, chegou-se a suscitar a proibição de o aposentado trabalhar. Foi preciso lembrar que na aposentadoria por invalidez - a única que realmente tolhe novo laboro - a condição impeditiva é a invalidez, e não a aposentadoria...

Se querem impedir que os trabalhadores aposentados ocupem espaço dos jovens no mercado de trabalho, basta pagar os seus proventos condignamente!!! Reduziram os limites de contribuição e, consequentemente, dos benefícios pela descaracterização da aposentadoria, acabou a necessidade de rescisão do contrato laboral, fala-se em limite de idade para aposentadoria, com grave esquecimento do restrito mercado de trabalho aos maiores de quarenta e cinco anos; e ainda podem pensar em tamanha inconstitucionalidade!

Varrida tal agressão aos preceitos democráticos, restaram extintos - com alterações desde a Lei 8.213/91 - o abono de permanência em serviço e o pecúlio.

Este pecúlio então finado resistia na Lei 8.213/91, em seu artigo 81, inciso II, devido:

"II - ao segurado aposentado por idade ou tempo de serviço pelo Regime Geral de Previdência Social que voltar a exercer atividade abrangida pelo mesmo, quando dela se afastar;

Com seu cálculo determinado no artigo 82:

"Artigo 82. No caso dos incisos I e II do artigo 81, o pecúlio consistirá em pagamento único de valor correspondente à soma das importâncias relativas às contribuições do segurado, remuneradas de acordo com o índice de remuneração básica dos depósitos de poupança com data de aniversário no dia primeiro.

Pois a extinção de tal pecúlio foi obra das Medidas Provisórias do início de 94, originadas na Medida Provisória 381, de dezembro/93, e culminando com a Lei 8.870, de 15 de abril de 1994. Sempre é bom lembrar que as Medidas Provisórias acabaram com o pecúlio mas não isentaram os aposentados de contribuir. Depois de uma grita geral, os congressistas colocaram a exigida isenção na Lei 8.870, em seu artigo 24.

Examinando tal artigo e, principalmente, o seu parágrafo único, é fácil de entender como foi a berraria. Os próprios trabalhadores aposentados e seus patrões pararam de contribuir por conta própria, sem que as Medidas Provisórias assim dispusessem, mas como alguns aguardaram a lei, o diploma legal deu um jeitinho:

"Artigo 24. O aposentado por idade ou por tempo de serviço pelo Regime Geral da Previdência Social que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida pelo mesmo, fica isento da contribuição a que se refere o artigo 20 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

Parágrafo único. O segurado de que trata o caput deste artigo, que vinha contribuindo até a data da vigência desta Lei, receberá, em pagamento único, o valor correspondente à soma das importâncias relativas às suas contribuições, remuneradas de acordo com o Índice de Remuneração Básica dos Depósitos de Poupança com data de aniversário do primeiro dia, quando do afastamento da atividade que atualmente exerce.

Confiando no esquecimento público, o atual Governo brada pelo fim de isenções em contribuições previdenciárias, tanto para as entidades beneficentes e filantrópicas, quanto para os aposentados que se encontram em serviço.

Sem dúvida, o Seguro Social dos Trabalhadores não pode conceder isenções e o trabalhador que já goza aposentadoria deve estar coberto pelo Seguro para as questões de acidentes do trabalho.

Respeitada a inacumulabilidade de aposentadorias e de aposentadoria e auxílio-doença - fazem as vezes do salário, o seguro não pode cobrir duas vezes -, é preciso resguardar a opção pelo mais vantajoso, além do auxílio-acidente quando houver seqüela de acidente do trabalho.

O artigo 18 da Lei 8.213/91, mesmo com o pecúlio, alínea i, revogado, continua com seu § 2º valendo:

"Artigo 18. (...)

§ 2º. O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social que permanecer em atividade sujeita a este regime, ou a ela retornar, somente tem direito à reabilitação profissional, ao auxílio-acidente e aos pecúlios, não fazendo jus a outras prestações, salvo as decorrentes de sua condição de aposentado, observado o disposto no artigo 122 desta Lei.

E dispõe o artigo:

"Artigo 122. Ao segurado em gozo de aposentadoria especial, por idade ou por tempo de serviço, que voltar a exercer atividade abrangida pelo Regime Geral de Previdência Social, será facultado, em caso de acidente do trabalho que acarrete a invalidez, optar pela transformação da aposentadoria comum em aposentadoria acidentária.

Parágrafo único. No caso de morte, será concedida a pensão acidentária quando mais vantajosa.

Assim, entre todos os partícipes do Seguro não se pode falar em isenção de contribuição.

Mas que o pecúlio retorne ao debate...

UM POUCO DE HISTÓRIA

A antiga Consolidação das Leis da Previdência Social, Decreto 89.312/84, em seu artigo 55, definia o pecúlio "constituído pela soma das importâncias correspondentes às suas próprias contribuições referentes ao novo período de atividades, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de 4% (quatro por cento) ao ano. E em seu parágrafo único mantinha prazo para novo pecúlio em 36 meses.

A Consolidação das Leis da Previdência Social ainda dispunha em seu artigo 56 a norma de sucessão, garantindo que, se o segurado não recebesse o pecúlio em vida, seria devido aos dependentes ou sucessores "independentemente de inventário ou arrolamento.

Porém, para bem conhecermos a história, vale uma espiadela no artigo 57, apontando a vigência da norma a contar de 1º de junho de 1975, e em seu parágrafo único, com as devidas explicações do Ilustre Mestre em Previdência Social, ANNÍBAL FERNANDES, em sua obra "Comentários à Consolidação das Leis da Previdência Social, Editora Atlas, 1986, páginas 102/103:

"Artigo 57. O disposto neste capítulo vigora a contar de 1º de julho de 1975, devendo ser observada com relação às contribuições anteriores a legislação vigente à época.

Parágrafo único. As contribuições relativas ao período em que o segurado esteve em gozo de abono de retorno à atividade e que determinaram acréscimo à aposentadoria restabelecida não integram o pecúlio.

"As regras acima têm vigência a contar de 1º de julho de 1975. É que a partir dessa data o pecúlio passou a ser constituído apenas pelas contribuições descontadas ou pagas pelos próprios segurados, nessa condição. Até então ele era constituído da dupla cota, isto é, daquela referente ao trabalhador e também da verba recolhida pela empresa (Lei nº 6.210, de 04.06.75).

Entendemos ressalvados os direitos dos segurados, com direito ao pecúlio, e que contribuíam antes da vigência da Lei nº 6.210. Para eles, a dupla cota prevalece.

Quanto aos segurados autônomos, que suportam normalmente a dupla cota contributiva (segurado e empresa), o pecúlio é calculado apenas em relação à parte do segurado. Os autônomos podem ser reembolsados da contribuição no tocante à cota empresarial.

O parágrafo único do artigo 57 merece esclarecimento. No sistema da Lei nº 5.890, de 11.06.73, que vigorou nesse aspecto precisamente até 30 de junho de 1975, o aposentado que retornava à atividade tinha suspenso o benefício, que era substituído por um abono, corretamente chamado de abono de aposentado que volta a trabalhar. Em contrapartida, o tempo de trabalho pós-aposentadoria e assim abonado era computado para efeito de um acréscimo da renda mensal da aposentadoria, quando o interessado abandonasse de vez o exercício de atividade abrangida pela previdência urbana. Tal período, posterior à aposentadoria e de retorno à atividade, é que está previsto no parágrafo único do artigo 57, com a referência a não integrar pecúlio, posto que tem efeito jurídico no sentido de acrescer à renda mensal na aposentadoria definitiva.

Com a histórica aula do Professor ANNÍBAL FERNANDES, pode-se conhecer a diversidade de normas e benefícios na área da Previdência Social. Desde o abono substitutivo da aposentadoria, quando o segurado retorna à atividade, com todas as melhorias provenientes das novas contribuições, até o pecúlio de dupla cota.

O SALUTAR DEBATE

Os mesmos tecnocratas que extinguiram o pecúlio através das Medidas Provisórias engoliram a isenção de contribuição previdenciária para os trabalhadores já aposentados, conforme o artigo 24 da Lei 8.870/94, tendo plena certeza que a falta de memória popular rapidamente aprovaria sua retirada.

É justo o fim das isenções, até mesmo pelo caráter securitário do sistema.

E inclusive porque, na atual situação, inexistindo salário-de-contribuição do aposentado, podem surgir dúvidas para que se calcule o benefício acidentário e a aposentadoria ou auxílio-doença mais favorável ...?!!

Porém, com o fim das isenções, é preciso observar que o trabalhador já aposentado - sem poder modificar o benefício que já goza ou acumular mais um - estará contribuindo um tanto a mais. Talvez um pecúlio devolvendo a contribuição quando o segurado retornasse à inatividade resolvesse tal problema...

 

Como citar o texto:

FREUDENTHAL, Sérgio Pardal.Aposentado trabalhando: Contribuição e pecúlio. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-previdenciario/155/aposentado-trabalhando-contribuicao-peculio. Acesso em 28 dez. 1998.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.