OIT

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) é uma agência multilateral especializada ligada à Organização das Nações Unidas (ONU) em busca da promoção de melhorias nas condições de trabalho no mundo. Estabelece obrigações para os Estados Membros que ratificam suas convenções internacionais do trabalho. Esses instrumentos internacionais visam a proteção do trabalho humano. Dentre as inúmeras convenções internacionais do trabalho adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho, merece realce a norma internacional que aborda o instituto das férias anuais remuneradas: a Convenção nº 132 da OIT. Através do Decreto n. 3.197, de 06 de outubro de 1999,esse texto convencional foi devidamente incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, adquirindo o status de lei ordinária.

As modificações trazidas pela Convenção 132 da OIT

A Convenção nº 132 da OIT diz respeito ao instituto das férias anuais remuneradas, a fim de garantir o valor qualidade de vida do ser humano inserido na cadeia produtiva.Com a aprovação do Decreto n. 3.197, de 05 de outubro de 1999, tornou-se imprescindível o cumprimento dessa norma internacional devidamente inserida no ordenamento jurídico pátrio.Possui a Convenção n. 132 da OIT dois objetivos básicos: proteger a saúde do trabalhador e permitir-lhe recuperar a energia física e psicológica que tinha investido no trabalho durante o ano;e, forma de retribuir o aumento de produtividade, dando mais tempo de ócio aos trabalhadores.O texto convencional em questão é composto de 23 (vinte e três) artigos.Logo em seu início, estabelece que a norma internacional é aplicável a todas as pessoas, excetuando-se os marítimos (artigo 02). O artigo 02, item 02, da Convenção n. 132 da OIT, possibilita a exclusão de determinadas categorias profissionais, desde que a aplicação dessa norma internacional cause problemas particulares de execução ou de natureza constitucional ou legislativa de certa importância. O Brasil não optou pela exclusão de qualquer categoria. A parte final do artigo 1º do Decreto de Promulgação n. 3.197, de 05 de outubro de 1999, nesse contexto, determina que a norma deverá ser executada e cumprida como nela se contém.O artigo 03, item 03, do texto convencional, prescreve que a duração das férias não deverá, em caso algum, ser inferior a três semanas de trabalho por ano de serviço. A norma celetista, em seu artigo 130, dispõe período superior (30 dias corridos, quando o empregado não houver faltado ao serviço mais de cinco vezes e 24 dias corridos, quando o obreiro houver tido de seis a quatorze faltas). Os incisos III e IV, do artigo 130, da CLT, em contrapartida, prevêem a duração das férias inferior a três semanas quando o empregado não comparecer ao trabalho no período igual ou superior a quinze vezes injustificadamente. A aplicação desses últimos dispositivos citados está prejudicada, uma vez que o texto convencional determina o período mínimo de três semanas em qualquer hipótese, não estando vedado o gozo das férias em certo lapso temporal superior ao previsto na norma internacional.Consta no artigo 04, item 01, no artigo 05, itens 01 e 02, e no artigo 11, da Convenção n. 132 da OIT, que toda pessoa terá direito a férias proporcionais, desde que adquirido um período mínimo de serviço, no curso de um ano determinado, independentemente do motivo da rescisão contratual. A duração mínima de tal período de serviço não poderá ultrapassar a seis meses, cabendo a autoridade competente ou o órgão apropriado de cada país determiná-la. Observa-se que, no ordenamento jurídico interno, os dispositivos acerca do direito à proporcionalidade estão em desconformidade com a norma internacional. Segundo o artigo 147 da CLT, o empregado terá direito a férias proporcionais, nos primeiros 12 meses de contrato, somente quando for despedido sem justa causa ou cujo contrato de trabalho se extinguir em prazo determinado.

Constata-se, nessa linha, a exclusão do direito à proporcionalidade para o dispensado por justa causa e para os demissionários com menos de doze meses de serviço (vide Súmula n. 261 do TST (9)). Reza o artigo 146, em seu parágrafo único, da CLT, que cessado o contrato de trabalho, após doze meses de serviço, o empregado, desde que não haja sido demitido por justa causa, terá direito à remuneração relativa ao período incompleto de férias, de acordo com o artigo 130, na proporção de 1/12 (um doze avos) por mês de serviço ou fração superior a quatorze dias. Os artigos mencionados apresentam controvérsias. O tratado internacional não retira o direito a férias proporcionais aos empregados que deram justa causa à extinção do contrato de trabalho (artigo 11) e aos trabalhadores que saem, espontaneamente, do emprego. O texto convencional não associou o direito à remuneração das férias à causa de extinção do contrato de trabalho. Com a vigência da Convenção n. 132 da OIT, assim sendo, o contrato de trabalho encerrado, a qualquer título, a partir do sexto mês de serviço, dá ao empregado o direito à proporcionalidade. Antes deste lapso temporal, vale a regra celetista: terá direito às férias proporcionais o empregado despedido sem justa causa e cujo contrato a termo extinguir pelo decurso natural do prazo.O artigo 05, item 04, da Convenção n. 132 da OIT, disciplina que as faltas ao trabalho por motivos independentes da vontade individual do empregado interessado, tais como faltas em decorrência de doenças, de acidente ou de licença para gestante, não poderão ser computadas para efeito de férias anuais remuneradas mínimas. O referido dispositivo está em perfeita sintonia com o previsto no artigo 131, em seu inciso III, da CLT.O artigo 133, em seu inciso II, da CLT, deverá ser analisado no caso concreto. Esse dispositivo determina que não terá direito a férias o empregado que permanecer em gozo de licença, com percepção de salário, por mais de trinta dias. Ocorre que o tempo de desligamento não poderá ser considerado como férias caso a licença seja proveniente de motivo independente da vontade do obreiro.O artigo 05, item 04, da norma internacional, colide com o artigo 133, em seu inciso III, da CLT. Com a vigência da Convenção n. 132 da OIT no Brasil, o empregado que deixar de trabalhar, com percepção do salário, por mais de trinta dias, em virtude de paralisação parcial ou total dos serviços da empresa, terá direito a férias anuais remuneradas. Verifica-se que, nessa hipótese, a falta é proveniente de motivo independente da vontade do trabalhador. O período de afastamento, destarte, não poderá ser computado para efeito de férias Igualmente, há incompatibilidade com o artigo 133, em seu inciso IV, da CLT, que assim determina: "não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo: [...] tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente de trabalho ou de auxílio-doença por mais de seis meses, embora descontínuos".Com efeito, não remanescem dúvidas de que o inciso IV, do artigo 133, da norma celetista, foi derrogado, pois o tempo em que o empregado está sem trabalhar, em razão de acidente de trabalho ou de auxílio-doença, não está relacionado com sua vontade individual. O artigo 06 do texto convencional exclui os feriados oficiais ou costumeiros do cômputo dos dias de férias anuais remuneradas. Através dessa nova redação, por exemplo, o empregado que gozar as férias no mês de outubro, terá direito ao acréscimo de um dia ao término dos trinta dias corridos, diante do feriado de 12 de outubro (Nossa Senhora Aparecida). O artigo 07 da Convenção n. 132 da OIT trata sobre a remuneração das férias. Esse dispositivo não modificou a legislação brasileira. O artigo 142 da CLT prevê o direito à remuneração normal do trabalhador em descanso e o artigo 145 da norma consolidada estabelece que o pagamento dessa remuneração será efetuado até dois dias antes do início do período de descanso. Imprescindível ressaltar que o sistema jurídico pátrio é mais benéfico e estabelece o acréscimo de um terço ao salário normal (artigo 7º, em seu inciso XVII, da Constituição Federal), entre outros direitos.O artigo 08, item 01, do texto convencional, estipula que o fracionamento do período de férias anuais remuneradas poderá ser autorizado pela autoridade competente ou pelo órgão apropriado de cada país. A norma pátria procede nesse sentido nos parágrafos do artigo 134. Salvo estipulação em contrário contida em acordo que vincule o empregador e a pessoa empregada em questão, e desde que a duração do serviço dessa pessoa lhe dê o direito a tal período de férias, uma das frações do período deverá corresponder, pelo menos, a duas semanas de trabalho ininterrupto. Um dos períodos de férias, portanto, deverá ser necessariamente quatorze dias. Nessa exigência, o artigo 134, em seu § 1º, da CLT, foi derrogado, visto que o dispositivo estatui que um dos períodos não poderá ser inferior a dez dias.O artigo 10 da Convenção n. 132 da OIT inovou o Capítulo IV da CLT. O dispositivo indica que a ocasião em que as férias serão gozadas será determinada pelo empregador, após consulta à pessoa empregada interessada em questão ou seus representantes, a menos que seja fixada por regulamento, acordo coletivo, sentença arbitral ou qualquer outra maneira conforme a prática nacional. Para a fixação das férias serão levados em consideração as necessidades do trabalho e as possibilidades de repouso e diversão ao alcance da pessoa empregada. Seguindo esse raciocínio, percebe-se que o artigo 136 da CLT, que previa que a época da concessão das férias deveria atender aos interesses do empregador, foi derrogado. As férias serão concedidas mediante ato do empregador, atualmente, observando-se o estatuído no artigo 10 do texto convencional.Dispõe o artigo 12 da Convenção n. 132 da OIT que todo acordo relativo ao abandono do direito ao período mínimo de férias anuais remuneradas de três semanas por ano de serviço ou referente à renúncia ao gozo das férias mediante indenização ou de qualquer outra forma, será, dependendo das condições nacionais, nulo de pleno direito ou proibido. Esse dispositivo pretende banir a renúncia ao período mínimo de férias anuais remuneradas. Confrontou, conseqüentemente, com o determinado no artigo 143 da CLT. O artigo celetista autoriza a conversão de 1/3 (um terço) do período das férias em abono pecuniário pelo empregado. Caso o obreiro, por exemplo, tenha direito ao período de trinta dias corridos e converta dez dias em abono pecuniário, restar-lhe-ão tão somente vinte dias destinados ao descanso anual remunerado. Esse lapso temporal restante está em contrariedade com o período mínimo aludido no texto convencional. Consoante Marcos Neves Fava, a conversão de dez dias em pecúnia passou a ser proibida, porque implicará em renúncia do gozo de parte do período mínimo das férias, mediante indenização. O artigo 13 da Convenção n. 132 da OIT esclarece que a autoridade competente ou o órgão apropriado de cada país poderá adotar regras particulares em relação aos casos em que uma pessoa empregada exerça, durante suas férias, atividades remuneradas incompatíveis com o objetivo dessas férias. O artigo 138 da CLT continua em vigor, quando estipula que durante as férias, o empregado não poderá prestar serviços a outro empregador, salvo se estiver obrigado a fazê-lo em virtude de contrato de trabalho regularmente mantido com aquele.Os artigos 14 a 23 da Convenção n. 132 da OIT tratam de disposições genéricas sobre a aplicação da norma internacional, sua ratificação e seus efeitos.

A incompatibilidade das regras estabelecidas pela Convenção 132 da OIT com as da CLT

Quando isso ocorrer, deve-se pôr em prática a “Teoria do Conglobamento”, segundo a qual tem valor a norma mais favorável em seu conjunto, e não topicamente. Nesse contexto, fundamental é o cumprimento da Convenção n.º 132 da OIT na seara interna, mas desde que seja ela aplicada in totum e não "pinçando" normas que atendam favoravelmente o trabalhador numa ou noutra situação específica. E isso porque diante do conflito com os princípios trabalhistas que possa existir, nos casos de lides que envolvam pedidos sobre férias anuais remuneradas, toda esta discussão no âmbito do Judiciário deve levar em consideração para aplicação da Convenção n.0 132/OIT o seguinte: a Convenção n.º 132 da OIT não pode ser aplicada isolada e simplesmente naquilo que for mais benéfica ao trabalhador em relação do que está previsto na CLT (Princípio da norma mais favorável), mas sim, deverá ser aplicada em toda sua extensão pelo acatamento da Teoria do Conglobamento e independente de quem seja o mais beneficiado (empregado ou empregador), o que como visto acaba sendo mais justo para as empresas.

Bibliografia

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(texto elaborado no dia 04/12/05)

 

Como citar o texto:

LINS, Juliane de A. e Silva H..Convenção 132 da OIT. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 215. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-internacional/1695/convencao-132-oit. Acesso em 4 fev. 2007.

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