? INTRODUÇÃO

 

Há crescente necessidade de os municípios brasileiros fazerem uso de todos os meios autorizativos previstos em lei com intuito de se preservar a ordem urbanística prevista nos Planos Diretores. Em casos extremos, o ente federativo municipal pode até agir de acordo com a desapropriação sancionatória, hipótese em que é demandado o particular que não fizer uso da propriedade, tendo em vista o interesse social. Nos dizeres de respeitada doutrina: “ocorre interesse social quando o Estado esteja diante dos chamados interesses sociais, isto é, daqueles diretamente atinentes às camadas mais pobres da população e à massa do povo em geral, concernentes à melhoria das condições de vida, à mais equitativa distribuição da riqueza, à atenuação das desigualdades em sociedade” .

Somada a esta grande necessidade do município de gerir o espaço urbano e eventualmente aplicar sanções ao particular, não pode ficar despercebido o novo enfoque constitucional dado à propriedade particular.

Nesse sentido, o enfoque puramente civilístico da propriedade privada, com a normatização constitucional do princípio da função social, sofreu profundas transformações. Tal tendência incluiu-se na configuração do novo Código Civil, ao acolher expressamente a função social da propriedade , o que consagra, na verdade, a concretização do princípio da Socialidade, reflexo mesmo da publicização do Direito Civil. Hodiernamente, a melhor doutrina entende que a função social é elemento essencial à propriedade. Tal entendimento atesta o grau de importância e de correlação máxima entre ambos os conceitos: não há propriedade sem atendimento à função social. Ao tratamento civil do direito de propriedade, hoje em vigor, aplicam-se direcionamentos de direito público voltados à caracterização da função social, motivo pelo qual, empolgado com a CF/88, JOSÉ AFONSO DA SILVA afirmou que "o Código Civil não disciplina a propriedade, mas tão-somente as relações civis a ela referentes” .

? INSTITUTOS DE LIMITAÇÃO AO DIREITO DE PROPRIEDADE:

O intuito deste trabalho é analisar os tradicionais meios de intervenção do Estado na propriedade privada, sempre com o enfoque voltado para a municipalidade. Logo, serão abordadas as relações de sujeição do particular frente ao Poder Público legitimado à obtenção do interesse coletivo. Com o fundamento na Supremacia do Interesse Público, e o estrito amparo em previsão legal, é que ocorrem todas as intervenções públicas na esfera dos direitos individuais alheios. A sempre atual doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello se faz presente, na medida em que defende a estrita atuação da Administração em comprometimento com a imposição legal: “O princípio da legalidade contrapõe-se, portanto, e visceralmente, a quaisquer tendências de exacerbação personalista dos governantes. Opõe-se a todas as formas de poder autoritário, desde o absolutista, contra o qual irrompeu, até as manifestações caudilhescas ou messiânicas típicas dos países subdesenvolvidos. O princípio da legalidade é o antídoto natural do poder monocrático ou oligárquico, pois tem como raiz a idéia de soberania popular, de exaltação da cidadania”.

Os fundamentos são divididos em dois: político e jurídico. O fundamento político da Intervenção do Estado na propriedade privada é a proteção dos interesses da comunidade contra qualquer conduta anti-social praticada pelo particular, enquanto o jurídico é qualquer disposição existente na CF/88 ou na legislação infraconstitucional em tal sentido.

Logo serão analisadas as figuras da limitação administrativa, servidão, tombamento, ocupação temporária, parcelamento/edificação/utilização compulsória, requisição de bens e por derradeiro a desapropriação. Seguindo a orientação didática de Marçal Justen Filho , serão arroladas as figuras mais próximas entre si para posteriormente serem comentadas as limitações mais peculiares.

• LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA

A Limitação Administrativa é uma das facetas do Poder de Polícia da Administração Pública. Conforme definição de Marçal Justen Filho, a “Limitação Administrativa à propriedade consiste numa alteração do regime jurídico privatístico da propriedade, produzida por ato administrativo unilateral de cunho geral, impondo restrição das faculdades de usar e fruir de bem imóvel, aplicável a todos os bens de uma mesma espécie, que usualmente não gera direito de indenização ao particular” .

Estamos aqui cuidando da limitação à propriedade tipicamente por meio de ato administrativo, isto é, stricto sensu. Em sentido amplo, limitação administrativa seria qualquer influência do Poder Público (Legislativo e Executivo) na esfera privada, abarcando todos os institutos de ingerência do Poder Público frente ao Particular, com o fundamento do Bem Comum. Não é este o propósito. Admitindo isso, alargaríamos demasiadamente o tema. Devemos nos ater à análise administrativa do fenômeno da restrição da propriedade privada. Assim, a limitação administrativa é uma restrição pessoal e gratuita, impondo obrigação negativa, o que pode ocasionar também a adoção pelo particular de medidas positivas. É produzido um ato administrativo genérico com intuito de atender ao interesse público, em que se altera o regime jurídico da propriedade. Ressalte-se o cunho geral deste ato administrativo, impondo sacrifícios socialmente aceitáveis, ou seja, que não afetam o núcleo dos direitos fundamentais de propriedade e de liberdade, o que logicamente, não ensejaria indenização. Logo, este regime é aplicável a todos os bens de uma mesma espécie. Exemplo usual de limitação administrativa é a estipulação pelo Poder Público Municipal de altura máxima de prédios em determinada região urbana e metragem mínima de recuo para construções de imóveis . A limitação, conforme já dito, não gera em regra dever de indenização. Todavia, havendo desnaturação excessiva do direto do particular, ou seja, a limitação imponha sacrifícios demasiados, a jurisprudência já assentou entendimento de que caberia verba indenizatória paga pelo Poder Público .

De tudo exposto, a limitação administrativa é uma imposição “ao particular do exercício de um dever (não mera faculdade), que consiste em regular, restringir ou limitar administrativamente, de modo legal e legítimo, o exercício dos direitos fundamentais de propriedade e de liberdade, de maneira a obter, mais positiva do que negativamente, uma ordem pública capaz de viabilizar a coexistência dos direitos em sua totalidade, sem render ensejo à indenização, por não impor dano injusto. Trata-se de um conceito deliberadamente posto a serviço de uma grande causa: a emergência do primado lógico e empírico dos direitos fundamentais” .

• SERVIDÃO ADMINISTRATIVA

A Servidão Administrativa institui um direito real de natureza pública, impondo ao proprietário do imóvel a obrigatoriedade de suportar um ônus parcial sobre o imóvel de sua propriedade, afetando assim, a exclusividade deste direito. Há disputa doutrinária em torno da forma de imposição da servidão, alguns admitindo apenas ato administrativo singular, outros admitindo também a imposição por lei. Adotaremos a corrente que especifica a servidão fundamentada em ato administrativo , visto que a imposição de servidão por lei constitui verdadeira limitação administrativa, dada sua generalidade. É justamente esta a grande diferenciação entre servidão e limitação administrativa. A primeira baseia-se na especificidade de determinado imóvel, enquanto a limitação administrativa remete a uma generalidade de imóveis.

Portanto, servidão administrativa é quando o particular mantém a propriedade do imóvel, porém é obrigado a suportar um ônus público, pois a servidão não transfere o domínio, nem a posse, mas apenas o limita o direito de uso e fruição do bem.

Com a definição de Marçal Justen Filho, “a servidão administrativa consiste no regime jurídico específico, imposto por ato administrativo unilateral de cunho singular, quanto ao uso e fruição de determinado bem imóvel e que acarreta dever de suportar e de não fazer, podendo gerar direito de indenização.” Temos como exemplo prático da instituição da servidão administrativa a passagem sob residências, de fiação elétrica e implantação de placas de ruas na parede externa de prédios. Logo, a servidão, em regra, não gera direito de indenização, até porque o dever de suportar e de não fazer, podem não atingir de forma incisiva o direito de propriedade como um todo. Assim, o dever de non facere (não fazer) e ou um pati (suportar) não ocasiona, prima facie, direito de indenização. No entanto, dependendo do caso, se o particular se sujeita a praticamente perda das faculdades de uso e fruição do bem em favor da coletividade, a regra é a indenização.

A servidão, a fim de ter validade, deve respeitar o devido processo administrativo. Este se dá quando, por ocasião do decreto de utilidade pública é instituído o interesse da Administração em se pautar pela Servidão de determinado bem particular. Caso o proprietário não obste o interesse público, há a constituição do regime da Servidão Administrativa. No entanto, se o particular se opuser, deverá se submeter a um processo administrativo e até judicial, com a imposição, findo estes, de indenização, caso houver, e instituição judicial da Servidão, caso não tenha ocorrido vício do ato administrativo singular.

• TOMBAMENTO

Na conceituação de José Cretella Júnior: “É restrição parcial ao direito de propriedade, realizada pelo Estado com a finalidade de conservar objetos móveis e imóveis, considerados de interesse histórico, artístico, arqueológico, etnográfico ou bibliográfico relevante. Restrição parcial do direito de propriedade, localiza-se no início de uma escala de limitações em que a desapropriação ocupa o ponto extremo”. O tombamento atribui ao bem a característica de se tornar imutável, e pode ser muitas vezes inalienável.

O fundamento constitucional de preservação dos imóveis de interesse histórico artístico e cultural submete o particular a usar, fruir e dispor do bem, desde que sob o comprometimento de preservá-lo. Todos os entes do pacto federativo têm competência para reconhecer o tombamento de determinado bem, respeitado o procedimento administrativo e eventual indenização ao proprietário.

Há uma sucessão de atos administrativos, desde a manifestação do órgão técnico acerca da relevância histórica e cultural do bem, até a inscrição definitiva no Livro do Tombo , transcrevendo-se posteriormente no Registro de Imóveis. Há imposição ao particular de ações positivas em relação ao bem tombado, sejam elas a necessidade de preservação e/ou a comunicação à autoridade competente, se ocorrer determinada avaria ou dano sofrido pela coisa. Quanto às abstenções do particular, podemos dizer que este está impossibilitado de destruir, demolir ou até pintar o bem, sem anuência da Administração Pública. Por derradeiro, há o dever de suportar a fiscalização dos órgãos técnicos, e cabe ao particular disponibilizar o acesso da vigilância sem se opor, sob pena de uso da força policial.

• OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA

“Ocupação temporária é a forma de limitação do Estado à propriedade privada que se caracteriza pela utilização transitória, gratuita ou remunerada, de imóvel de propriedade particular, para fins de interesse público.” A doutrina costuma apontar os seguintes requisitos quando adotado o regime jurídico da ocupação temporária: realização de obras pública; necessidade de terrenos vizinhos; inexistência de edificação no terreno ocupado; obrigatoriedade de indenização e necessidade de se efetuar caução prévia pelo Poder Público. Neste sentido, a ocupação se aproxima da servidão administrativa por ingerir na exclusividade da propriedade, todavia a primeira tem caráter transitório, enquanto a última tem caráter perpétuo. A ocupação temporária, de acordo com a Constituição da República, pode se instituir por ato administrativo quando há “iminente perigo público” e “assegurada indenização ulterior”.

• REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA

Para Celso Antônio Bandeira de Mello, requisição administrativa “é o ato pelo qual o Estado, em proveito de um interesse público, constitui alguém, de modo unilateral e auto-executório, na obrigação de prestar-lhe um serviço ou ceder-lhe transitoriamente o uso de uma coisa in natura obrigando-se a indenizar os prejuízos que tal medida efetivamente acarretar ao obrigado”.

Diógenes Gasparini, por exemplo, leciona o instituto como “a utilização, quase sempre transitória e auto-executória, pela Administração Pública, de bens particulares, mediante determinação da autoridade competente, com ou sem indenização posterior em razão ou não de perigo público”.

Marçal caracteriza a requisição como uma espécie de ocupação, em que o bem requisitado é consumível por natureza, o que acarretará logicamente em seu desaparecimento. Tal imposição da Administração será sempre onerosa, devendo o particular ser indenizado correspondentemente ao dano. É uma medida de urgência, cabendo à Administração estipular o valor a ser pago ao particular em curto espaço de tempo, sob pena de responsabilização pela demora na liquidação da indenização.

• DESAPROPRIAÇÃO

Nos dizeres de Gasparini: "Com base em nosso ordenamento jurídico no art. 5º, XXIV, 182, III, 184, todos da Constituição Federal de 1988, pode – se conceituar a desapropriação como sendo o procedimento administrativo pelo qual o Estado, compulsoriamente retira e alguém certo bem por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social e adquire originariamente para si ou para outrem mediante prévia e justa indenização paga em dinheiro, salvo os casos que a própria Constituição enumera em que o pagamento é feito com títulos da dívida publica ou da divida agrária.”

Existem casos em que não há indenização, assumindo a desapropriação nítido caráter confiscatório, como a desapropriação de área em que haja cultivo ilegal de plantas, conforme bem explicitado no art. 243, CF. É a chamada de desapropriação confiscatória, por não conferir ao expropriado direito indenizatório. A perda da propriedade nesse caso tem como pressuposto a utilização da propriedade para cultura ilegal de plantas psicotrópicas. Após a expropriação, conforme o procedimento disciplinado na Lei 8.257/91, essas áreas são destinadas ao assentamento de colonos, com vistas ao cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos.

A CF ainda contempla a desapropriação extraordinária, que é realizada quando o bem particular, que está sendo desapropriado, não está cumprindo a sua função social. Nesta, há indenização, mas não será prévia, nem em dinheiro. Cuida-se de desapropriação com caráter sancionatório, verificando-se em duas hipóteses.

A primeira delas é a que consta do art. 182, § 4º, III, da CF, denominada de desapropriação urbanística, analisada em subitem próprio. Essa forma expropriatória é prevista como a que pode ser adotada a título de penalização ao proprietário do solo urbano que não atender a exigência de promover o adequado aproveitamento de sua propriedade ao plano diretor municipal, estando o imóvel subutilizado ou não utilizado. Assim, o Poder Público municipal, mediante lei específica, poderá promover essa desapropriação, observada a gradação imposta no art. 8.º da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), sendo o pagamento da indenização feito mediante títulos da dívida pública, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

A outra hipótese de desapropriação extraordinária, quando a propriedade não esteja cumprindo a sua função social, é prevista nos arts. 184 a 186 da CF, denominada pela doutrina de desapropriação rural. Tem o objetivo de permitir a perda da propriedade de imóveis rurais para fins de reforma agrária. A indenização será paga em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, sendo que as benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. Possui disciplina na Lei 8.629/1993, e ainda na Lei Complementar 76/1993.

Cumpre mencionar, ainda, a nova figura trazida pelos §§4.º e 5.º do art. 1.228, CC/2002, que vem sendo denominada por alguns doutrinadores como desapropriação judicial, na qual há a perda da propriedade diante posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, mediante o pagamento de indenização. Embora não se confunda com usucapião, que não requer contrapartida econômica, essa nova figura também não se identifica por completo com a desapropriação propriamente dita, que tem como expropriante o Poder Público, passando o bem à dominialidade pública (embora posteriormente possa ter destinação diversa). Assim, sua disciplina será dada pelo direito privado, em que pese o seu caráter coletivo, pois se verificará no interesse particular, dos possuidores.

A indenização típica deve ser em dinheiro, prévia e justa, tendo caráter constitucional, salvo as exceções supracitadas. Diz – se justa porque satisfaz o valor do imóvel na data da desapropriação. Seu pagamento é prévio porque ocorre antes da imissão na posse, em dinheiro porque realizado em moeda corrente.

Incidirá ainda a indenização sobre benfeitorias necessárias ainda que estas sejam realizadas após a expropriação com fixação amigável (com acordo administrativo) ou judicial (por avaliação de um juiz).

Em linhas gerais, a desapropriação possui duas fases, enquanto procedimento: a declaratória e a executiva, sendo que esta última pode ser processada tanto pela via administrativa/extrajudicial, como pela via judicial.

A fase declaratória se consubstancia na indicação da necessidade ou utilidade pública, ou do interesse social do bem a ser desapropriado. Há, assim, uma manifestação compulsória de vontade do Poder Público, submetendo determinado bem ao regime de desapropriação.

Os efeitos jurídicos da declaração de utilidade pública e interesse social são três: o direito de as autoridades expropriantes penetrarem no imóvel, mas que não se confunde com a imissão provisória na posse (artigo 7.º do Dec.-lei n. 3.365/1941); a fixação do estado do bem, incluindo as benfeitorias nele existentes, o que gera efeitos no cálculo de indenização e o início da contagem do prazo de caducidade da declaração.

Já na fase executória, serão adotadas medidas necessárias à implementação da desapropriação, visando à aquisição do bem pelo Poder Público. Havendo concordância do proprietário sobre o valor da desapropriação, o procedimento se encerrará na via administrativa/extrajudicial. Entretanto, de regra, há o prolongamento pela fase judicial, através de ação movida pelo Estado em face do proprietário.

Assim, de forma semelhante à servidão administrativa, em caso de dissenso entre o expropriante (Administração Pública) e o expropriado (particular), faz-se necessária provocação do Judiciário para a resolução da contenda.

"O pagamento da indenização será feita por acordo ou na forma imposta na decisão judicial, hipótese em que a ordem cronológica das requisições (precatórios) seguirá àquela endereçada ao poder expropriante.”

Nesta ação, portanto, discutir-se-á a justa indenização. É possível que durante o seu curso o juiz conceda a imissão provisória na posse (art. 15 do Decreto-lei 3.365/1941), quando for o caso.

Interessa, por fim, destacar que pode haver a desapropriação indireta, quando o Poder Público deixa de observar o procedimento legal, administrativo ou judicial, ocupando o bem em caráter definitivo. Caberá ao proprietário, se não o impedir no momento oportuno, deixando que a Administração lhe dê destinação pública, pleitear a indenização por perdas e danos, que corresponderá à justa indenização da desapropriação legal. Há grandes óbices doutrinários acerca da constitucionalidade de tal medida por violar expressamente a cláusula geral do Devido Processo Legal. Todavia, a jurisprudência da Corte Suprema já afirmou que tal prerrogativa da Administração é legítima.

Fazendo um adendo ao processo ao já explicitado é necessário que o respectivo pro¬cesso se desenvolva da forma menos gravosa para o erário e para o expropriado. Não haverá, desnecessariamente, de ser alegada urgência, para efeito de imissão provisória na posse; a oferta terá de ser séria, cuidando o juiz de realizar avalia¬ção preliminar, mesmo sem previsão legal expressa, quando julgar necessário; o andamento processual não poderá ser retardado. Numa economia inflacionária, acontece, abusivamente, que o poder expropriante, obtida imissão liminar na posse, mediante depósito inferior ao preço do bem, e realizada perícia avaliatória, desinte¬ressa-se pelo rápido andamento processual, ciente de que a defasagem da correção monetária oficial acabará por anular o valor final da indenização. Cuida-se, como tantas, de uma visão distorcida do interesse público. Aqui valemos até dos ensinamentos de Di Pietro, já citados, em que a Atividade Administrativa é baseada no binômio LEGALIDADE/AAUTORIDADE. Assim, há previsão legal para a imissão da posse, mas esta deve estar condicionada ao objetivo da administração especificado no decreto expropriatório, caso contrário, tal imissão não teria respaldo legal.

• PARCELAMENTO, EDIFICAÇÃO E UTILIZAÇÃO COMPULSÓRIOS

O Plano Diretor Municipal, com amparo constitucional, estabelece bases para uma política urbana, para uma ocupação racional do solo urbano. Traz alguns institutos relacionados à política urbana, ocupação social do solo, tudo para dar uma função social da propriedade, tais como:

a) Parcelamento, utilização ou edificação compulsórios.

b) Áreas não podem ser subutilizadas;

c) Notificação ao proprietário;

- prazo de até 1 ano, a contar da notificação, para apresentar um projeto;

- até 2 anos, a contar da aprovação do projeto, para iniciar as obras;

d) não respeitadas as hipóteses acima, implantará o IPTU progressivo no tempo, que poderão ser aumentadas por 5 anos, até o limite de 15% de alíquota máxima;

e) caso o proprietário não se manifeste, o Poder Público poderá manter a alíquota ou desapropriar.

Na definição precisa da doutrina, temos que tais formas de limitação da propriedade “são atos administrativos unilaterais, de competência municipal, que impõem alteração compulsória na configuração do uso e da fruição de imóvel privado urbano para adequá-lo à sua função social, nos termos de lei municipal específica e de acordo com o plano diretor da cidade”. Logo, o descumprimento pelo particular da ordem estabelecida pelo plano diretor aprovado por lei, após notificação pelo poder público, averbada no registro de imóveis, gera a possível imputação das medidas de desapropriação sancionatória.

É de se notar que a constituição só concebeu o direito de a União fazer uso da Desapropriação Sancionatória em matéria de imóvel rural. Todavia, nada impede o Município de desapropriar imóvel rural desde que não seja pelo descumprimento da função social da propriedade.

? CONCLUSÃO

Finalmente, diante de vários institutos a qual dispõe a Administração pública, ainda que a função social faça parte da estrutura do direito de propriedade, servindo como título jurídico de atribuição plena das faculdades que lhe são inerentes, não se pode sustentar que sua eventual inobservância, subtraia todos os direitos do proprietário inadimplente. Isso seria chancelar exagero que daria margem até para justificar a expropriação sem o pagamento de indenização. É que a Constituição não baniu o direito de propriedade; apenas impôs ao seu exercício, o dever de cumprimento da função social. É neste raciocínio que ensina José Afonso da Silva, quando assevera que "é certo que o princípio da função social não autoriza a suprimir, por via legislativa, a instituição da propriedade.” Deveras, as ingerências do Poder Público frente aos direitos de primeira geração, sejam eles a liberdade e os direitos individuais devem ser “fruídos pelos particulares segundo o princípio da proporcionalidade”. Logo, consoante o “binômio legalidade/autoridade” , a função social da propriedade “não gera efeitos despropositados ou absurdos, mas a adoção das providências estritamente adequadas e necessárias a evitar à infração aos interesses protegidos, respeitada a substância econômica da propriedade privada

OBRAS CITADAS

CRETELLA JÚNIOR, J. (2003). Curso de Direito Administrativo (18 ed.). Rio de Janeiro: Forense.

DI PIETRO, M. S. (2009). Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas.

FAGUNDES, M. S. (1984). O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. São Paulo: Saraiva.

FREITAS, J. (2004). "Poder de Polícia Administrativa e o Primado dos Direitos FUNDAMENTAIS. IN: C. L. JÚNIOR, DIREITO PÚBLICO - ESTUDOS EM HOMENAGEM AO PROFESSOR ADILSON ABREU DALLARI. Belo Horizonte: Del Rey.

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JUSTEN FILHO, M. (2010). Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva.

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Data de elaboração: abril/2010

 

Como citar o texto:

AMARAL, Luis Felipe Knaip do..Os meios clássicos de intervenção estatal na propriedade privada sob o viés do Direito Urbanístico. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 13, nº 720. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-administrativo/2022/os-meios-classicos-intervencao-estatal-propriedade-privada-sob-vies-direito-urbanistico. Acesso em 12 out. 2010.

Importante:

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