RESUMO: O Estado brasileiro tem como uma de suas características a possibilidade de controle da economia. Essa atuação dá-se de forma indireta por meio das chamadas agências reguladoras, modelo de administração de inspiração norte-americana, com alto grau de especialização técnica. São instituídas sob a forma de autarquias de regime especial, atuando com a maior autonomia frente o poder Executivo e, para isso, dentre outras coisas, os seus dirigentes gozam de instrumentos tendentes a assegurar a imparcialidade em seus atos e decisões. É exatamente sobre essa independência dos presidentes das agências reguladoras o cerne central da discussão no presente artigo.

PALAVRAS-CHAVE: Agências reguladoras. Autonomia. Estabilidade dos dirigentes.

ABSTRACT: The Brazilian state has as one of its features the ability to control the economy. This action takes place indirectly through the regulatory agencies, management model of American inspiration, with a high degree of technical expertise. They has a special regime , acting with greater autonomy and, among other things, its leaders are chosen in a impartial form to be free in its acts and decisions. It is exactly on this independence of the presidents of the regulatory agencies  the heart of the discussion in this article.

KEYWORDS: Regulatory Agencies. Autonomy. Stability of directors.

SUMÁRIO: 1.Introdução; 2.Estabilidade dos dirigentes das agências reguladoras; Conclusões; Referências;

1.INTRODUÇÃO

                  As agências reguladoras surgiram no Brasil em um momento político e econômico predominante nos países na década de 90, baseado em um modelo de administração gerencial influenciado por ideais neoliberalistas1. Esse modelo de administração dos serviços públicos teve os Estados Unidos como  inspirador, donde se imaginava que o Estado não teria condições de atuar de forma eficiente, em comparação ao setor privado, em todas as áreas de cunho público. Dessa forma, a intenção de implantar agências reguladoras era que os entes independentes desempenhassem funções de regulação em atividades exploradas pelo setor privado, atuando de forma técnica, sem influência de opções político-partidárias ou ideológicas.

                As agências reguladoras são entes dotados de personalidade jurídica de direito público, submetem-se ao art. 37, XIX, da Constituição Federal de 1988, possuem criação e extinção dependentes de lei específica. Apenas duas das agências existentes no país na atualidade possuem a previsão de sua existência em sede constitucional, quais sejam: a ANP (Art. 177, III, § 2º, CF/88) e a ANATEL (Art. 21, XI, CF/88). Quanto à sua natureza jurídica, são classificadas como autarquias de regime especial em decorrência das peculiaridades que lhes são atribuídas pelas leis que as instituem;

                No âmbito federal, há ainda outros exemplos de tais entidades: Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVS) , Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), dentre outras.

                Para exercerem as suas atribuições específicas, as agências possuem uma série de características e recebem uma gama de atribuições administrativas próprias do poder executivo. Podem ser lembradas, a ampliação da sua autonomia administrativa, o exercício do poder normativo e uma efetiva independência funcional dos seus presidentes. Finalmente, registre-se que as agências não se restringem às criadas pela União. Aos estados e municípios também se faculta a criação de suas agências, para tratar de temas de seus respectivos interesses.

2. ESTABILIDADE DOS DIRIGENTES DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

             Como dito anteriormente, as leis instituidoras das agências reguladoras definiram-nas como autarquias especiais, dotadas de autonomia administrativa e financeira. Isso significa, basicamente, a presença de dois aspectos: a impossibilidade de revisão, no âmbito administrativo, das decisões tomadas pelos órgãos e  a estabilidade do mandato de seus dirigentes. Além desses dois aspectos, outros podem ser citados como determinantes da especialidade das autarquias denominadas reguladoras, quais sejam: a autonomia da gestão; o estabelecimento de fontes próprias de recursos e a indicação dos seus dirigentes pautada por critérios técnicos, sendo preferível que sua nomeação não seja ato exclusivo do poder Executivo, devendo envolver o Legislativo1.

                 Quando se fala em estabilidade dos dirigentes destas agências, dois pontos devem ser elencados como de maior importância: a previsão de mandatos fixos e a escolha, dos mesmos, pautada em critérios que devem ser norteados pela tecnicalidade e não pela decisão político-partidária.

               O trâmite pelo qual se dará a investidura dos cargos de diretoria dos entes reguladores está previsto nos artigos 5º e 6º da Lei nº 9.986/2000. Desta forma, compete ao Presidente da República escolher os nomes que exercerão o cargo. Como requisitos primordiais, os indicados (presidente, diretor-geral ou diretor-presidente e demais membros do conselho diretor ou da diretoria) deverão ser brasileiros, possuir reputação ilibada, ter formação universitária e deter elevado conceito no campo de especialidade dos cargos para os quais serão nomeados. Depois desta primeira escolha, por força do artigo 52, III, f, da Constituição Federal, serão sabatinados pelo Senado Federal e, se aprovados tomarão posse no cargo, passando a contar com a estabilidade de seus mandatos. Percebe-se que o ato de nomeação destes dirigentes é composto, ou seja, o aval é dado por dois entes que compõem a administração direta, Executivo e Legislativo. Este, também, é um ponto que reforça a autonomia e independência dos dirigentes escolhidos, determinando que estes dirigentes possam exercer seus cargos de forma imparcial, sem nenhum tipo de pressão do ente instituidor no que diz respeito aos atos e decisões tomados,  levando-se em conta o poder regulador desenvolvido por estas agências.

            Importante ressaltar que, uma vez nomeado, o dirigente exerce um cargo por tempo determinado e só pode ser exonerado ou destituído nas hipóteses previstas em lei. É o que se infere da lei 9986/2000: “art. 9º: Os Conselheiros e os Diretores somente perderão o mandato em caso de renúncia, de condenação judicial transitada em julgado ou de processo administrativo disciplinar. Parágrafo único: A lei de criação da Agência poderá prever outras condições para a perda do mandato".

          Percebe-se que a lei determina mandato fixo, porém não vitalício. Preenchidas as condições presentes no artigo nono, o dirigente perderá o mandato. Impende dizer que se trata de uma situação exemplificativa. A lei que instituiu a agência reguladora poderá prever outras formas de perda do mandato.

          Deve-se levar em conta, ainda, a previsão expressa no artigo 8 da lei 9986/2000 que prevê a chamada quarentena, de conteúdo moralizador, ao proibir o ex-dirigente de exercer atividade ou prestar qualquer serviço no setor regulado pela respectiva agência, por um período de quatro meses, contados da exoneração ou do término de seu mandato. Período no qual o ex-dirigente continua recebendo a sua remuneração compensatória equivalente ao cargo de direção exercido2.

             Não se pode negar, que a despeito desta proteção dada aos dirigentes das agências, muitas são as vozes que criticam essa opção política feita pelo legislador no momento da criação da entidade. Celso Antônio Bandeira de Mello3, crítico feroz deste modelo, aduz que "a garantia dos mandatos dos dirigentes destas entidades só opera dentro do período governamental em que foram nomeados; encerrado tal período governamental, independentemente do tempo restante para conclusão deles, o novo Governo poderá sempre expelir livremente os que os vinham exercendo". Diz ainda: "Questão importante é a de saber-se se a garantia dos mandatos por todo o prazo previsto pode ou não estender-se além de um mesmo período governamental. Parece-nos evidentíssimo que não. Isto seria o mesmo que engessar a liberdade administrativa do futuro Governo. Ora, é da essência da República a temporariedade dos mandatos, para que o povo, se o desejar, possa eleger novos governantes com orientações políticas e administrativas diversas do Governo precedente. Fora possível a um dado governante outorgar mandatos a pessoas de sua confiança, garantindo-os por um período que ultrapassasse a duração de seu próprio mandato, estaria estendendo sua influência para além da época que lhe correspondia (o primeiro mandato de alguns dirigentes da ANATEL é de sete anos) e obstando a que o novo Presidente imprimisse, com a escolha de novos dirigentes, a orientação política e administrativa que foi sufragada nas urnas. Em última instância, seria uma fraude contra o próprio povo”.

                  Importante determinar que essa atuação técnica e imparcial deve dizer respeito a todos os níveis de relação possíveis que estes dirigentes possam ter: político, jurisdicional, com aqueles que usam os serviços e bens públicos e que se beneficiam da regulação realizada pelas agências reguladoras.

3.CONCLUSÃO

                 Vislumbradas as duas vertentes, a crítica a ser feita não diz respeito ao tipo de escolha dos dirigentes ou ao tipo de mandato exercido. O mau uso feito pelos governantes na nomeação dos dirigentes, a não utilização de critérios técnicos e sim de cunho político, desvirtuam o importante papel que as agências tem na sociedade brasileira, atuando como ente regulador de setores específicos da atividade econômica tão determinantes para o desenvolvimento de uma nação.

4.REFERÊNCIAS

           1 .Alexandrino,Marcelo; Paulo,Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. -21. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo; Método, 2013.

           2. Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. – 23. ed. – São Paulo: Atlas, 2010.

            3. Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, Malheiros., 14ª ed., 2002, p. 153-154

 

 

           

 

                                            

 

 

Elaborado em novembro/2013

 

Como citar o texto:

SOUZA JÚNIOR, José Maria Moraes de..Estabilidade dos dirigentes das agências reguladoras. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1118. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-administrativo/2856/estabilidade-dirigentes-agencias-reguladoras. Acesso em 11 nov. 2013.

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