Para que o processo tenha a tramitação justa e adequada é indispensável a observância dos princípios processuais dispostos na Constituição da República brasileira. Os princípios podem ser compreendidos como normas que orientam a aplicação das regras e preenchem a lacunas das mesmas quando não apresentam a solução para os casos concretos. Diante disso cabe citar alguns princípios do processo civil e a aplicação dessas normas nos casos de prova emprestada.

O princípio da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da isonomia, da razoável duração do processo, dentre outros, são considerados princípios que visam garantir a solução dos conflitos de interesses de forma justa e a efetividade do processo.

O princípio do devido processo legal dispõe que ninguém pode perder a liberdade e os bens sem que sejam respeitados o direito de defesa e a tramitação justa do processo, por exemplo, no processo de execução, o executado deve ser citado para caso queira, apresentar defesa e para embargar a execução, antes que perca os seus bens levados a leilão, alienados, adjudicados, etc.

O mesmo ocorre em relação ao princípio do contraditório, por vezes entendido apenas como a garantia de defesa do réu, na verdade também visa proporcionar a ciência de todos os atos do processo para as partes envolvidas, por exemplo, a produção de provas no processo deve observar a possibilidade de manifestação das partes, por isso se afirma que o contraditório também é exercido pelo autor. Diante disso, Didier Jr., (2008, p.66) afirma que “[...] Democracia no processo recebe o nome de contraditório. Democracia é participação; e a participação no processo se opera pela efetivação da garantia do contraditório”.

O princípio da isonomia também objetiva a composição justa do processo, de modo que as partes tenham a possibilidade de se manifestar de forma igual nos atos do processo na medida de suas desigualdades, assim como a observância de tratamento diferenciado durante a tramitação do processo, por isso o art.1.211-A do CPC dispõe sobre a prioridade dos procedimentos judiciais em que figure como parte ou interessado pessoa com idade superior a 60 (sessenta) anos ou portadora de doença grave.

É necessário que a tutela jurisdicional se manifeste em tempo hábil, para que a lesão ou ameaça a lesão de direito seja solucionada da forma mais breve possível, sem que isso prejudique o contraditório e a ampla defesa das partes conforme estabelece o princípio da razoável duração do processo disposto art. 5º, LXXVIII da CRFB/88.

Ademais, os princípios processuais constitucionais servem de base para a formação do processo civil brasileiro, pois vários dispositivos estão fundamentados na CRFB/88, entre eles destaca-se o art. 2º do CPC que trata da inércia da jurisdição e que pode ser relacionado com o art. 5º, XXXV da CRFB/88 ao dispor que a todos é garantido o direito de ação (lato sensu).

Sem dúvida, a principal fonte dos princípios processuais constitucionais é o art. 5º da CRFB/88 e servem como diretrizes a serem observadas pelo magistrado e procuradores das partes para que haja a efetividade do processo justo e équo.

Mas impende destacar que a prova é o instrumento pelo qual o juiz pode alcançar a verdade real dos fatos expostos na petição inicial e assim proferir uma decisão de mérito para a ação. A prova também está relacionada ao princípio do contraditório e da ampla defesa disposto no art. 5º, LV da CRFB/88, tal princípio visa dar ciência ao réu de que ação foi ajuizada em seu desfavor, assim como permitir que as partes tenham conhecimento de todos os atos praticados no decorrer da tramitação do processo.

Segundo o entendimento de Marcelo Rodrigues (2010, p. 223) a prova pode ser analisada sob dois prismas conceituais, no aspecto objetivo consiste nos “[...] elementos que permitem o juiz chegar ao conhecimento da verdade” e no aspecto subjetivo é considerada  como “[...] a própria convicção do juiz perante as provas produzidas no processo”.

Assim, a prova emprestada é a possibilidade da parte - seja autor ou réu - utilizar em um processo a prova produzida em processo anterior. Nesse caso, a regra é que há a violação do princípio do contraditório nos casos de prova emprestada, exceto se a mesma está sendo utilizada contra a parte que participou da sua produção no processo anterior ou, se não participou, vier a concordar com a sua utilização. Tal entendimento pode ser observado nas seguintes ementas de decisões:

PROVA EMPRESTADA. Admite-se a prova emprestada desde que originariamente colhida, sob o crivo do contraditório, em processo que figure as mesmas partes Precedente do Superior Tribunal de Justiça - A pretensão recursal tem motivação fundada antes em razões econômicas, o que não se pode admitir em detrimento da garantia constitucional do devido processo legal. Recurso desprovido. (TJSP 187001020128260000/AGR, 9ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Piva Rodrigues, P. 12.05.2012).

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - Contrato de financiamento de veículo - Alegação de fraude -Prova emprestada - Depoimento testemunhai em ação de reparação de danos onde o réu não figurou como parte - Ausência de requisitos para o aproveitamento da prova emprestada -Ausência de elementos configuradores da responsabilidade civil do réu - Danos não configurados - Recurso desprovido. (TJSP 45008320108260156/APL, 7ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Milton Carvalho, P. 17.11.2011).

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. Prova emprestada submetida ao crivo do contraditório em processo com as mesmas partes. Observância às garantias constitucionais da ampla defesa e do devido processo legal. Sua admissibilidade. Recurso a que se nega seguimento. (TJRJ  255033820118190000, 2ª Câmara Cível, Rel Des. Carlos Eduardo Passos, J. 01.06.2011).

O STJ também utiliza tais fundamentos para julgar os casos de prova emprestada no processo penal como se observa nos excertos de algumas decisões:

 

“[...] admite-se a utilização de prova emprestada no processo penal, desde que sobre ela seja possibilitado o amplo exercício do contraditório[...]” (STJ, AgRg no Ag 1081379 / RS – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, P. 15.03.2010).

 

“[...] A prova emprestada de outra ação penal somente pode ser valorada se ambas as partes tiveram integral ciênciae a possibilidade do exercício do contraditório. (STJ, RHC 20.372/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, P 11.06.2007).

Portanto, a validade da prova é condicionada à observância do princípio do contraditório e da ampla defesa, pois não se deve permitir a prova emprestada em face de quem não participou do processo anterior, exceto se figurou como parte e lhe foi garantido o contraditório e a ampla defesa ou, se não foi parte, mas houver concordância da sua utilização a fim de que o processo não seja instrumento de violação do direito fundamental à defesa.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2011.

_______. Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2011.

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. V1. Bahia: Jus Podivm, 2008.

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil. 5ª ed. São Paulo: 2010.

 

 

Elaborado em agosto/2012

 

Como citar o texto:

SANTANA, Anina Di Fernando..Os princípios processuais e a utilização de prova emprestada. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1119. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-processual-civil/2886/os-principios-processuais-utilizacao-prova-emprestada. Acesso em 16 nov. 2013.

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