RESUMO

Com a vigência da Constituição Federal de 1988, a relação extramatrimonial passou a ser reconhecida legalmente como entidade familiar denominada união estável. A Lei nº. 8.971/94 e a Lei nº. 9.278/96, bem como, o Código Civil de 2002, contribuíram para regulamentar os direitos não previstos pela Constituição Federal - como, por exemplo, o direito a alimentos, direito sucessório, entre outros - e definir a união estável como a união de duas pessoas de sexos diferentes, sem vinculo matrimonial, de caráter notório e estável com o intuito de constituir família.  Este trabalho tem o objetivo de discorrer sobre a entidade familiar denominada como união estável, bem como, o direito que os companheiros têm do advento desta união.

Palavras-chave: união estável – entidade familiar – alimento – reconhecimento – direito sucessório  

 

ABSTRACT

 

With the term of the 1988 Federal Constitution, the extramarital relationship became legally recognized as a family called stable. Law no. 8.971/94 and Law no. 9.278/96, as well as the Civil Code of 2002, helped to regulate the rights not covered by the Constitution - such as the right to food, right to inheritance, among others - and define marriage as the stable union of two people of different sexes, no marriage bond, notorious character and stable in order to raise a family. This paper aims to discuss the family entity known as stable as well as the right to have the companions of the advent of this union.

 INTRODUÇÃO O presente trabalho dispõe sobre o novo conceito de família, relação extrapatrimonial, onde casais convivem como legalmente casados, porém, não ligados ao matrimônio. A união estável sempre existiu, contudo, somente nos últimos anos é que foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro. Com a nova redação do artigo 226, §3º da Constituição Federal, houve um grande avanço legislativo ao reconhecer a união estável como uma entidade familiar e, desta forma, ampliou o conceito de família. Não foi somente a Carta Magna que reconhece a união estável como entidade familiar, mas também, diversas Leis Complementares e Princípios Constitucionais, como por exemplo, a Lei Federal n° 8.971/1994 e, posteriormente, a Lei n° 9.278/1996, que proporcionam os direitos e deveres aos companheiros em relação ao patrimônio, alimentos e sucessões. Com o aparecimento das leis que reconheceram a união estável, surgiram com elas novos problemas de interpretação, entretanto, esclarecidas pelos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil. Assim, o presente trabalho visa analisar os efeitos patrimoniais decorrentes da dissolução da “união estável” e compreendê-los, tentando elucidar algumas das inúmeras e discutíveis questões pertinentes ao assunto. Portanto, será demonstrado de forma clara e simples o significado desta nova entidade familiar, denominada de união estável, e seus efeitos patrimoniais, conforme as disposições da Constituição Federal, do Código Civil, das jurisprudências atuais, entre outros diplomas.

MATERIAIS E MÉTODOS A presente pesquisa trata-se de uma pesquisa qualitativa, utilizando a técnica bibliográfica, com uso de periódicos, artigos científicos e obras específicas da área do Direito.

1. ORIGEM HISTÓRICA DA UNIÃO ESTÁVEL Há muito tempo existe a entidade familiar denominada de “união estável”, que é aquela relação entre homem e mulher não unidos pelo matrimônio, entretanto, esta nunca foi reconhecida pelo Estado, que admitia somente a relação matrimonial. Na vigência do Código Civil de 1916, era vedada qualquer entidade familiar que não fosse da família legítima, assim, não era reconhecido qualquer direito das famílias extramatrimoniais. Nesse entendimento, menciona Euclides de Oliveira (2008, p 150) que “enquanto vigorou o Código Civil de 1916, não não se reconheciam direitos à família constituída fora dos padrões oficiais do casamento civil ou religioso com efeitos civis.” No Diploma Civil havia uma censura ao concubinato. Esclarece-se que o concubinato era considerado uma relação extramatrimonial e com o passar dos tempos, se tornou análogo ao casamento, contudo, sem a formalização que este prevê. Ademais, o concubinato poderia ser puro ou impuro antes da promulgação da Constituição Federal de 1988. Determinado puro quando a relação entre o homem e a mulher não havia impedimentos para o casamento, com o propósito de constituir uma família, diferente do impuro, qual a relação entre o homem e a mulher era adulterina. Desta forma, com a vigência da Constituição Federal de 1988 surgiu o amparo legal para essas relações extramatrimoniais, sendo protegida pela redação do artigo 226, §3º da Carta Magna a união estável como entidade familiar e não considerado mais como concubinato puro. Assim, o concubinato impuro passou a ser considerado somente como concubinato nos termos do artigo 1727 do Código Civil de 2002. As relações extramatrimoniais surgiram no âmbito jurídico, conforme menciona Dias (2001, p 03), pela própria jurisprudência e aceitas pela sociedade, sob o nome de concubinato, que pela Constituição Federal é chamada de união estável atualmente. Observa-se que ao longo dos anos surgiram novas formas do instituto casamento, não somente aquele formal. Entre estas formas está à união estável, considerada como entidade familiar. Antes do advento da Constituição Federal de 1988, não era admitido qualquer outro vínculo se não as relações entre homens e mulheres no casamento. Foi na Constituição Federal de 1988 que houve o reconhecimento jurídico e a proteção especial do Estado nas relações fora do casamento, dando um novo conceito a família. (Dias, 2001, p. 01) Não só a Constituição Federal de 1988 que regulamentou a união estável, as Leis Federais nº. 8.971/1994 e 9.278/1996 e o Código Civil também regulamentaram esta nova entidade familiar. Estas Leis vieram regulamentar os direitos dos companheiros em relação a alimentos, sucessão, usufruto, meação de bens, o direito real de habitação, bem como, estabeleceram os requisitos fundamentais para que a união estável pudesse ser equiparada a entidade familiar, entre eles: a convivência duradoura, pública, contínua e com o objetivo de constituir família, entre outros.

2. DA UNIÃO ESTÁVEL 2.1. CONCEITO Complementa que a Constituição Federal de 1988 é que foi reconhecida como entidade familiar a união estável, aquela de:

“convivência pública, continua e duradoura de um homem como uma mulher, vivendo ou não sobre o mesmo teto, sem vinculo matrimonial, estabelecida com o objetivo de constituir família, desde que tenha condições de ser convertida em casamento, por não haver impedimento legal para sua convolação (...)”

Neste mesmo entendimento, Rodrigues (2006, p. 259) nos ensina que a união estável pode ser caracterizada como a união de homem e mulher fora do matrimonio, de caráter estável. Contudo, mesmo com as definições doutrinárias, o Código Civil em seu artigo 1.723 trouxe o conceito desta entidade familiar da seguinte maneira:

“Art. 1.723/CC. É reconhecida como entidade familiar à união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

Portanto, podemos definir esta entidade familiar como a união de duas pessoas de sexos diferentes, sem vinculo matrimonial, de caráter notório e estável com o intuito de constituir família.

2.2 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA UNIÃO ESTÁVEL Com o reconhecimento da união estável, duvidas surgiram se qualquer relação entre homem e mulher poderia caracterizar como entidade familiar prevista na Constituição Federal e no Código Civil. Deve-se deixar claro que será reconhecida a união estável quando há a vontade entre as partes de viverem como se casados legalmente fossem, é o que diz o artigo 1.723 do Código Civil, parte final. Para essa relação, conforme menciona Diniz (p. 360 a 369), há de ser observado alguns elementos caracterizados, tais como:

“Diversidade de sexos; ausência de matrimonio civil valido e de impedimento matrimonial entre os conviventes; notoriedade de afeições recíprocas; honorabilidade; fidelidade ou lealdade; coabitação, e segundo alguns doutrinadores, a colaboração da mulher no sustento do lar”.

Contribui para a caracterização da união estável Venosa (2001, p. 48 a 51), dispondo que os elementos constitutivos consistem:

“na estabilidade como característica de ser duradoura, na continuidade da relação, na diversidade de sexos, na publicidade, no objetivo de constituir família, e na habitação comum”.

Portanto, não é qualquer relação entre homens e mulheres que configurará a união estável. Além dos elementos caracterizadores expostos, atribui-se relevante valor jurídico o afeto para a constituição de uma família.

3. EFEITOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL Até a pouco tempo atrás a relação entre homem e mulher não havia consequências no âmbito jurídico, entretanto, quando estas relações se dissolviam as partes procuravam na Justiça os efeitos patrimoniais. Desta forma, como não havia o reconhecimento da união estável como entidade familiar e dependendo do caso concreto, era aplicado o Direito Comercial ou a relação laboral. Entretanto, com o reconhecimento desta unidade familiar pela Constituição Federal de 1988, a Lei nº. 8.971/94 regularizou o direito a alimentos, direito sucessório assegurando o direito a meação. Contudo, foi a Lei nº. 9.278/96 que trouxe a definição de “união estável” como convivência duradoura, pública e contínua, estabelecida com o objetivo de constituir família; não se estabeleceu prazo mínimo para o reconhecimento da união e fixou a Vara de Família para solucionar os litígios decorrentes da dissolução da união estável. Os artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil de 2002 contribuem para a interpretação desta nova entidade familiar. Prevê o artigo 1.725 do mesmo códex o regime de comunhão parcial de bens, ou seja, é feita a partilha de todo o patrimônio adquirido pelos companheiros na constância da união. Portanto, os bens adquiridos durante a união serão partilhados na mesma proporção, independentemente da efetiva contribuição para a aquisição, salvo se optarem em pactuar por contrato outra forma, nos moldes da legislação.

3.1. ALIMENTOS Foi a Lei nº. 8.971/94 que trouxe o dever e o direito da prestação alimentícia entre os companheiros que vivem em união estável, entretanto, foi revogado pelos artigos 2º e 7º da Lei nº. 9.278/96, concedendo o direito e o dever de assistência moral e material. Vejamos:

Art. 2°. São direitos e deveres iguais dos conviventes: I – respeito e consideração mútuos; II – assistência moral e material recíproco; III – guarda, sustento e educação dos filhos comuns.

Art. 7°. Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos.

Porém, os artigos 1.694 a 1.710 do Código Civil de 2002 que regulamentou o direito aos alimentos. Desta forma, de acordo com o artigo 1.694 do mesmo Codex, terá direito a alimentos aquele que demonstrar a necessidade. Segundo entendimento de Dias (2007, p. 467), a obrigação alimentar é em decorrência ao dever de assistência, guarda e sustento entre os companheiros, nos termos do artigo 1.724 do Diploma Civil.   Contudo, conforme o disposto na legislação, para a concessão das prestações alimentícias é necessário demonstrar a real necessidade de quem pede e os recursos da pessoa obrigada, sem comprometer seu próprio sustento. De acordo com Dias (2007, p. 178) tanto o cônjuge como o companheiro que necessitar tem direito de pedir alimentos uns aos outros. Complemente ainda que aquele que pleiteia alimentos valer-se-á da ação de alimentos. Ainda, havendo a mudança na situação financeira daquele que supre ou recebe a prestação alimentícia, poderá o interessado reclamar em juízo conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo, conforme prevê o artigo 1.699 do Código Civil de 2002.     Dispõe o artigo 1.708 do mesmo Diploma que a obrigação alimentar do devedor cessa no caso de nova união estável, casamento ou concubinato por parte do credor. Portanto, observa-se que é o Código Civil que regulamenta o direito a prestação alimentícia decorrente da união estável, analisando a necessidade de quem os pede e daquele que fornece, perdurando enquanto necessitar ou até quando for constituída nova união estável, casamento, ou concubinato, conforme previsão legal.

3.2. BEM DE FAMÍLIA Reconhecida a união estável como entidade familiar e amparada pela legislação, tem os companheiros a possibilidade de instituir o bem de família como medida de amparo e proteção da família. Assim prevê o artigo 1.711 do Código Civil, possibilitando mediante escritura publica ou testamento instituir o bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, sendo o bem impenhorável como medida de proteção a família.  Conforme entendimento de Dias (2007, p. 521), o direito à moradia é assegurado pela Constituição Federal:

“O estado assegura especial proteção à família (CF 226). O direito à moradia é reconhecido como um direito social (CF 6°.) e a casa, o asilo inviolável do individuo (CF 5°, XI). O direito à moradia é considerado um dos direitos da personalidade inerente à pessoa humana, quer como pressuposto do direito à integridade física, quer como elemento da integridade moral do indivíduo. A moradia é tutela como objeto de direito, tratando-se de um direito subjetivo, representando um poder da vontade e que implica no dever jurídico de respeito daquele mesmo poder por parte dos outros.”

Segundo o entendimento de Diniz (2007, p. 521), a intenção da instituição do bem de família tem por finalidade a preservação do ser humano, visto tratar-se de uma medida que visa a proteção à pessoa do devedor. Ressalta-se que há duas espécies de bem de família: o voluntário que decorre da vontade das partes de instituir o bem; e o legal, que decorre de o devedor residir em um imóvel tornando-o impenhorável. O artigo 1.711 do Código Civil que regulamenta o bem de família na entidade familiar da união estável trata do bem de família voluntario. Para Canezin (2008, p. 243), o bem de família voluntário amparado no art. 1.711, do Código Civil é:

“(...)o que se constitui por atitude voluntária - como o próprio nome sugere - dos proprietários (pessoas previstas no art. 1.711 do Código Civil), num ato de liberalidade permitida pelo Código Civil, no intuito de proteger sua família de oscilações futuras ou de quaisquer outros percalços da vida.”

Além disso, o artigo 1.712 do Diploma Civil estabelece que o bem de família não abranja somente o imóvel instituído como bem de família, mas também os móveis e acessórios neles pertencentes. Nesse sentido, esclarece Dias (2007, p. 521) quanto à impenhorabilidade do bem instituído como bem de família e seus pertences:

“A instituição do bem de família gera a impenhorabilidade de um bem determinado, que se transforma em verdadeiro patrimônio, num sentido protetivo do núcleo familiar. Trata-se de qualidade que se agrega a um bem imóvel e seus móveis, imunizando-os em relação a credores, como forma de proteger a família que nele reside.”

Nos termos dos artigos 1.713 e 1.716 do Código Civil, menciona Canezin (2008, p. 245):

“A doutrina admite que a duração do bem de família é limitada. A instituição prevalecerá por um tempo mais ou menos longo e durará enquanto viver um dos cônjuges, ou, na falta destes, até que os filhos completem a maioridade (art. 1.716).”   Em relação a administração do bem de família, competem a ambos os companheiros sendo eles coadministradores do bem, conforme determina o artigo 1.720 do Código Civil. Desta feita, quanto a extinção do bem de família, é imprescindível a análise dos artigos 1.721 e 1.722 do Código Civil que estabelecem que a dissolução da sociedade conjugal pela morte de um dos cônjuges não extingue o bem de família. Assim, extingue-se o bem de família somente com a morte de ambos os companheiros e a maioridade dos filhos.

3.3. SUCESSÃO O direito sucessório nas relações extramatrimoniais, como eram denominadas as uniões estáveis nas legislações anteriores, não beneficiava nenhum dos companheiros. Como já mencionado, a nova entidade familiar foi reconhecida com o advento da Constituição Federal de 1988, entretanto, não foi conferido nenhum direito sucessório aos companheiros. Foi com a vigência da Lei nº. 8.971/94, artigo 2º, que houve o reconhecimento do direito sucessório nas relações que perdurassem pelo menos 05 (cinco) anos, ou dela tenha prole:

“Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do (a) companheiro (a) nas seguintes condições: I – o (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do “de cujus”, se houver filhos ou comuns; II – o (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do “de cujus”, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes; III - na falta de descendentes e de ascendentes, o (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança.”

Completa ainda o artigo 3° da Lei o direito de meação de bens dos companheiros quando da colaboração comum: “quando os bens deixados pelo(a) autor(a) da herança resultarem de atividade em que haja colaboração do(a) companheiro, terá o sobrevivente direito à metade dos bens.” Ademais, a Lei nº 9.278/96, que reconheceu como entidade familiar a união estável - como aquela duradoura, pública e continua de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituir família – fixou que os bens adquiridos pelos companheiros são frutos do esforço comum, regulamentando outros direitos já mencionados, mas nada mencionou sobre o direito a herança ou usufruto. Contudo, foi o Código Civil de 2002 que inclui o direito sucessório, estabelecendo o direito a participação do companheiro na herança, conforme rege o artigo 1.790:

“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente a que por lei for atribuída ao filho; II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito a totalidade da herança.” O direito sucessório conferido aos companheiros da união estável ocorrerá diante do rompimento do vínculo em razão do falecimento do outro companheiro, conforme entendimento de Cahali (2007, p. 181): “Embora omissa a legislação, apenas se atribui direito sucessório ao convivente se falecido o outro na constância da união estável”. Entretanto, este entendimento vai ao desencontro do que estabelece o Código Civil, segundo Oliveira (2008, p. 161):

“(...)o companheiro pode levar alguma vantagem no quinhão a receber, mas no geral tem sensíveis desvantagens. Primeiro, porque deixa de ser o terceiro na ordem hereditária, passando a concorrer até mesmo com os colaterais. Segundo, porque o companheiro não é considerado herdeiro necessário, enquanto o cônjuge obteve esse privilégio ao lado dos descendentes e dos ascendentes. Demais disso, foi limitada a participação do companheiro na herança deixada por outro. Sua incidência ocorre apenas sobre os bens adquiridos onerosamente durante a convivência, o que representa uma inadmissível restrição pela vedação de acesso aos demais bens, anda que faltem herdeiros sucessíveis. (...) Sob outro aspecto, apresenta-se vantajoso ao companheiro o direito sucessório, em comparação com o direito reservado ao cônjuge sobrevivente. Dá-se a cumulação, para o primeiro, dos direitos de meação e de herança, pois o art. 1790 do CC refere direito sobre os bens adquiridos onerosamente durante a convivência, sem qualquer ressalva”

Ressalta-se que o companheiro fará parte da concorrência sucessória dentre a quota dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, conforme determina o artigo 1.790, inciso I e II do Código Civil. Segundo Cahali (2007, p. 182) o companheiro sobrevivente irá concorrer primeiramente com os descendentes:   “Será chamado o sobrevivente, na primeira classe de preferência, em concorrência com os descendentes, independentemente do regime patrimonial, e exclusivamente sobre a parcela da herança identificada acima (bens adquiridos onerosamente durante a convivência). Na falta de descendentes, o companheiro concorre com os ascendentes.”

Ademais, na falta dos descendentes concorre o companheiro com os parentes sucessíveis apontados no artigo 1.790, inciso III, do Código Civil. Nesse sentido relata Oliveira (2008, p. 163):

“Concorrência com ascendentes e colaterais, pela disposição do art. 1.790, inciso III, do CC, o companheiro terá direito a um terço da herança se concorrer com outros parentes sucessíveis.”

Porém, na falta de descendentes e parentes sucessíveis o companheiro sobrevivente terá direito a totalidade da herança, assim argui Cahali (2007, p. 182):

“Não havendo parentes sucessíveis, agora sim, o companheiro sobrevivente recebe a integridade da herança (art. 1.790, IV). Porém, mesmo nesta situação poderá haver concorrência na sucessão do falecido. É que a totalidade da herança a que se refere o inciso é aquela prevista no caput, ou seja, limitada aos bens adquiridos onerosamente na constância da união. Assim, sendo maior o patrimônio do falecido, aqueles bens não contemplados no caput serão tidos como herança jacente.”   Contudo, para Oliveira (2008, p. 165) “ainda que falte descendentes e parentes sucessíveis, o companheiro restringe-se aos bens adquiridos onerosamente durante a convivência”, quanto aos bens particulares, estes seriam “arrecadados como herança jacente, a converter-se a herança vacante, com a adjudicação do ente público beneficiário.” Entretanto, poderia haver um favorecimento ao companheiro perante a desvinculação do caput do art. 1.790 com a disposição do inciso IV, o qual atribui ao companheiro direito à totalidade da herança, na falta de parentes sucessíveis. Assim, conclui-se que o companheiro sobrevivente participará da sucessão dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, concorrendo primeiramente com os descentes, na falta destes com os parentes sucessíveis e caso não havendo com quem concorrer terá o companheiro sobrevivente direito à totalidade da herança.

3.4. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO O Direito Real de Habitação consiste no direito assegurado ao companheiro sobrevivente à moradia no imóvel destinado à residência da entidade familiar. O Código civil estabelece o direito real de habitação do imóvel à residência da família, não fazendo menção aos companheiros. Nesse sentido, Oliveira (2008, p. 164) contribui no sentido de que:

“Acrescente-se que o Código Civil, ao dispor sobre o direito real de habitação sobre o imóvel de residência do casal, menciona como beneficiário o cônjuge sobrevivente (art. 1.831). Esquece de mencionar o companheiro. Se compreendida a omissão como negativa do direito, então o companheiro que não tivesse direito à meação sobre o imóvel adquirido pelo ex–parceiro, no exemplo acima, tampouco concorrendo na herança com os descendentes ou outros parentes do finado, ficaria sem proteção alguma no campo sucessório.”

Contudo, ressalta-se que o direito real de habitação esta garantido pelo artigo 7º, parágrafo único da Lei nº. 9.278/96: “Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família”. Nesse sentido é o entendimento de Dias (2007, p. 169):

(...) a Lei 9.278/1996 assegura o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família. Como o Código Civil não revogou expressamente esses diplomas legais, é mister reconhecer que não estão derrogadas as prerrogativas previstas na legislação pretérita (LICC 2° §§1° e 2°). Assim, omissa a lei, persiste o direito real de habitação na união estável por força do dispositivo legal não revogado (L. 9.278/1996 7° parágrafo único).

Sendo assim, tendo em vista a omissão do Código Civil em não instituir o direto real de habitação aos companheiros, prevalece o dispositivo legal previsto na Lei 9.278/1996, que assegura o direito aos companheiros.

4. CONCLUSÃO Diante do que foi apresentado, conclui-se que com vigência da Constituição Federal de 1988 houve o reconhecimento da união estável, qual era denominada de relação extramatrimonial, como entidade familiar, sendo regulamentada pelas Leis nº. 8.971/94 e nº. 9.278/96, bem como, com o Código Civil de 2002, que estabeleceram os requisitos fundamentais para que a união estável fosse equiparada a entidade familiar. Assim, pode-se definir a união estável como a união de duas pessoas de sexos diferentes, sem vinculo matrimonial, de caráter notório e estável com o intuito de constituir família. Portanto, não é qualquer relação entre homens e mulheres que configurará a união estável, atribui-se relevante valor jurídico o afeto para a constituição de uma família. Além do reconhecimento desta entidade familiar, houve a regulamentação da partilha em relação aos bens patrimoniais, independe da efetiva contribuição para a aquisição, exceto se optarem em pactuar por contrato outra forma. Logo, o direito a prestação alimentícia foi regulamentada pelo Código Civil, condicionando a necessidade dos que pleiteiam com a possibilidade de quem fornece os alimentos, perdurando enquanto um dos companheiros necessite, e até que não seja constituída nova união, seja matrimonial ou não, quando então cessará o direito à prestação alimentícia. Em relação ao direito sucessório, compreende-se que o companheiro sobrevivente concorrerá primeiramente com os descentes, na falta de descendentes com os parentes sucessíveis dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, e caso não havendo estes terá o companheiro sobrevivente direito à totalidade da herança. Assim, a legislação é mais clara quanto ao tema, proporcionando maiores direitos e deveres aos companheiros em relação ao patrimônio, alimentos e sucessões.

REFERÊNCIAS

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RODRIGUES, S..  Direito Civil, Direito de Família. Saraiva, 2006.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                               VENOSA, S.de S..  Direito Civil, Direito de Família.  Atlas, 2001.

 

 

Elaborado em abril/2013

 

Como citar o texto:

SIQUEIRA, Kheyla Mirelly Nogueira e..Da União Estável. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1129. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-familia-e-sucessoes/2923/da-uniao-estavel. Acesso em 27 dez. 2013.

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