Não! Sou do tempo em que a lei proibia a doação de recurso de pessoa física para candidatos. Sou do tempo em que a lei preconizava reunissem-se os partidos, após o pleito, através de seus representantes, e prestassem contas entre si, tornando, essas contas, problema interna corporis do comitê interpartidário que se criava.

No dia da prestação recíproca das contas compareciam representantes de todos (eu disse todos) os partidos e se questionavam reciprocamente: “Quero ver suas contas“, dizia um; “Pois eu também quero ver as suas”, dizia o outro. Ao final, ninguém via as contas de ninguém e todos se davam recíproca quitação através de uma ata por todos assinada.

Outro ponto a destacar é a separação que não está sendo feita, na mídia ou na Câmara, sobre as formas de contas. Existem as contas de campanha valendo para valores arrecadados e gastos durante o período eleitoral. Existem outras contas, as contas partidárias, que refletem a atuação do partido para fazer seu proselitismo, ajudar na atuação de seus parlamentares, divulgar seu ideário, instruir seus agentes. Essas contas também devem ser prestadas nos respectivos níveis de atuação partidária, para a Justiça Eleitoral. São contas que não dizem respeito à disputa eleitoral propriamente dita.

Atualmente é nessas contas que reside o problema, e não nas contas eleitorais. Se o partido arrecada dinheiro para distribuir entre seus deputados através de mesadas ou outras formas de distribuição, aí temos contas que nada tem a ver com campanhas e com financiamento público delas. Se o presidente do PL aluga uma casa e a mobília com dinheiro do partido, isso nada tem a ver com campanhas e seu financiamento.

Aliás, em breve parêntesis é preciso dizer que o dinheiro a financiar o proselitismo político dos partidos, fora das campanhas eleitorais vem, principalmente, do fundo partidário. É, pois, dinheiro público cujas contas devem ser devidamente prestadas. E, entidades cujo valor de suporte vem, em mais de 50% de dinheiro público, podem sofrer (e seus dirigentes), ação de improbidade administrativa, nos termos do art. 1º. e parágrafos da LIA ( lei de improbidade administrativa ). E, até onde a vista alcança, comprar móveis residenciais, manter residência de representação e comprar esteira para ginástica (?) parece caracterizar desvio de finalidade no uso de dinheiro público.

Continuemos. O dinheiro que se diz arrecadado por todo o país, especialmente naquela empresa de publicidade com ligações fortes junto ao PT, não é dinheiro de campanha. É dinheiro suspeito, sim, de origem duvidosa, que é entregue ilicitamente aos partidos, sem comprovação de origem, e cuja destinação acaba demonstrando laivos de corrupção. Não apresenta movimentação contábil, registros contábeis. Tudo muito ilegal, muito fraudulento, tudo “por debaixo do pano” como na música de Ney Matogrosso.

Afirme-se mais, pela experiência que se tem e teve: neste último pleito, como as doações para campanha tinham limites (2 % da receita bruta para pessoas jurídicas e 10 % do rendimento bruto para pessoas físicas) os doadores preferiram fazer doações diretamente para os partidos que as repassavam para os candidatos, ludibriando limites das campanhas eleitorais, essas sim, que podem vir a ser afetadas pelo financiamento público de campanha.

O TSE e a Receita Federal fizeram convênio para atribuir um número de CNPJ para cada candidato neste último pleito. Cruzamento de doações e declarações dos candidatos foram feitos através da Receita Federal. Ficou-se sabendo, com transparência e com aferição de registros contábeis quem deu, para quem e quanto deu. O sistema de declaração de contas de campanha pode ser aperfeiçoado? Claro que sim! Inclusive e principalmente com sanções que impeçam a posse de candidatos com contas mal prestadas. Ah! As sanções. Ninguém quer saber delas e aí está o ponto a atingir nas contas mal prestadas. Entenda-se por ninguém, os políticos de todo o gênero.

Como sempre, os principais interessados, os políticos, não querem solucionar verdadeiramente os problemas de financiamento das atividades partidárias. Querem atingir as campanhas eleitorais tirando dinheiro do contribuinte para seu financiamento. Quase um bilhão de reais será colocado à disposição dos desmandos das campanhas. Dinheiro que poderia ser aplicado na saúde, na educação e na segurança.

Com isso, pergunta-se, cessariam as doações? Claro que não! Em verdade, o que passaria a acontecer seria voltarem, as doações, a ser feitas “por debaixo do pano”. Com mais força e mais capacidade de corromper. Com maiores compromissos e nenhuma transparência. Com dinheiro público. Com ofensa ao público. E com a satisfação dos políticos e seus arrecadadores.

.

 

Como citar o texto:

ROLLO, Alberto..O financiamento público de campanha inibe a corrupção?. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 135. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-eleitoral/694/o-financiamento-publico-campanha-inibe-corrupcao. Acesso em 19 jul. 2005.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.