1. Introdução:

O artigo 225 da Constituição Federal delimita, de forma ampla, as obrigações do Estado e da coletividade no que diz respeito à defesa e preservação do meio ambiente, para as gerações presentes e também futuras.

Atento às determinações constitucionais, o Estado vem aperfeiçoando os mecanismos de fomento, fiscalização e controle ambientais.

Entre os diversos institutos jurídicos criados nos últimos anos, para fazer cumprir a Constituição, encontra-se a Medida Provisória 2.166-67/2001, que promoveu reformas no Código Florestal – Lei nº. 4.771/1965, acrescentado e alterando dispositivos.

A criação do instituto da servidão florestal é uma das inovações trazidas pela citada medida provisória, que acrescentou ao Código Florestal o artigo 44-A, com a seguinte redação:

Art. 44-A. O proprietário rural poderá instituir servidão florestal, mediante a qual voluntariamente renuncia, em caráter permanente ou temporário, a direitos de supressão ou exploração da vegetação nativa, localizada fora da reserva legal e da área com vegetação de preservação permanente.

Trata-se de um instituto que permite ao proprietário de um imóvel rural, destinar parte deste para reserva legal de imóvel rural de terceiro. Entretanto, a servidão florestal somente poderá ser utilizada em casos de imóveis localizados na mesma micro-bacia hidrográfica e pertença ao mesmo ecossistema, como dispõe o Código Florestal no artigo 44, inciso.

O novo instituto pode trazer benefícios às políticas econômicas e ambientais do Brasil, possibilitando aos particulares, como adiante descrito, a criação de um novo mercado, ligado à conservação de recursos naturais, com reflexos econômicos importantes para determinadas regiões, onde os recursos ambientais podem ser melhor gerenciados, destinando-se áreas de baixa aptidão para explorações agropecuárias para a preservação ambiental.

2. A questão da natureza jurídica da servidão florestal.

No que diz respeito à natureza jurídica da servidão florestal, a discussão que se faz é no sentido de que, em nosso ordenamento jurídico, existem institutos distintos de servidões. Por um lado temos as servidões civis, de direito privado. Por outro temos as servidões administrativas, de direito público. Discute-se assim, a qual dos institutos se afina a servidão florestal.

Conforme ensinamento de Hely Lopez Meireles, a distinção entre esses institutos está em que a servidão civil caracteriza-se por um direito real, de um prédio particular sobre o outro, instituído com finalidade de serventia privada. Já a servidão administrativa, para o ilustre doutrinador, caracteriza-se pela imposição de um ônus real, pelo poder público, sobre propriedade particular, cuja finalidade destina-se a serventia pública.

A análise da redação do artigo 44-A do Código Florestal, introduzido pela Medida Provisória 2.166-67/2001, possibilita concluir tratar-se de servidão cuja natureza mais se afina com a servidão civil. A instituição da servidão, segundo a previsão legal, deve ser realizada por iniciativa do proprietário do imóvel rural. Além disso, diz o dispositivo legal que a renúncia, pelo proprietário, a direitos de supressão ou exploração da vegetação nativa, nas áreas de instituição de servidão, deve ser voluntária, não sendo, portanto, imposição do poder público.

Assim sendo, resta claro que a servidão florestal é um instituto afinado com os preceitos das servidões civis de direito privado.

3. Exigência de averbação no ofício de registro de imóveis competente.

O § 2º do artigo 44-A dispõe sobre a necessidade de averbação da servidão florestal à margem da matrícula do imóvel, após anuência do órgão ambiental estadual competente.

Conclui-se, pela disposição legal, que a servidão florestal somente estará constituída após a devida averbação na matrícula do imóvel, do instrumento jurídico que a instituiu.

O proprietário do imóvel rural poderá utilizar-se de escritura pública, contrato ou testamento, como instrumento para instituição da servidão florestal.

4. A Cota de Reserva Florestal – C.R.F.

A Medida Provisória nº. 2.166-67/2001 criou um interessante título, denominado Cota de Reserva Florestal. O artigo 44-B, acrescentado ao Código Florestal pela referida medida provisória, tem a seguinte redação:

Art. 44-B. Fica instituída a Cota de Reserva Florestal - CRF, título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal, de Reserva Particular do Patrimônio Natural ou reserva legal instituída voluntariamente sobre a vegetação que exceder os percentuais estabelecidos no art. 16 deste Código.

Como se percebe, trata-se de título que permitirá ao proprietário explorar economicamente o excedente à área de reserva legal e preservação permanente, exigida no artigo 16 do Código Florestal, de seu imóvel rural, que encontrar-se com vegetação nativa.

A providência permitirá aos proprietários a exploração econômica de seus imóveis rurais, sem necessidade de supressão da vegetação nativa, o que deverá contribuir para a preservação ambiental, sem tolher a expectativa econômica dos proprietários.

5. Limitações ao uso do instituto da servidão florestal.

A servidão florestal poderá ser utilizada para compensar área de reserva legal, em imóveis cuja extensão da reserva existente seja inferior aos limites estabelecidos no artigo 16 do Código Florestal, nos termos do artigo 44 caput e inciso III, com a seguinte redação:

Art. 44. O proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta nativa, natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensão inferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art. 16, ressalvado o disposto nos seus §§ 5o e 6o, deve adotar as seguintes alternativas, isoladas ou conjuntamente:

III - compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento.

Entretanto, pelo disposto no artigo 44-C, também inserido ao Código Florestal pela Medida Provisória 2.166-67/2001, a compensação só será possível em determinadas condições. Assim dispõe o artigo 44-C do Código Florestal:

Art. 44C. O proprietário ou possuidor que, a partir da vigência da Medida Provisória no 1.736-31, de 14 de dezembro de 1998, suprimiu, total ou parcialmente florestas ou demais formas de vegetação nativa, situadas no interior de sua propriedade ou posse, sem as devidas autorizações exigidas por Lei, não pode fazer uso dos benefícios previstos no inciso III do art. 44

            Assim sendo, nos casos em que a supressão de florestas ou outras formas de vegetação nos imóveis rurais, tenha ocorrido sem autorização legal, após a edição da Medida Provisória 1.736/1998, não se poderá utilizar da servidão florestal como compensação, devendo, nesses casos, o proprietário realizar a recomposição da reserva dentro do próprio imóvel onde a supressão ilícita tenha ocorrido.

6. Conclusão:

Trata-se de importante inovação, para possibilitar a compensação de reserva legal em imóveis rurais cujas áreas tenham sido suprimidas para limites inferiores ao estabelecido no Código Florestal, atendidas as condições do artigo 44-C.

Apesar de algumas críticas que são feitas ao instituto, no que diz respeito à previsão de comercialização de títulos referentes à servidão florestal, sem preocupações com a biodiversidade, a questão pode ser vista por outro ângulo: como só poderá ser instituída servidão florestal em imóveis com vegetação nativa, para compensar áreas em imóveis já desmatados, torna-se claro que será utilizado para preservar matas nativas o que, sem sombra de dúvidas, garante maior preservação da biodiversidade que a lenta recuperação das áreas já desmatadas que compensará.

Assim sendo, não há como negar a importância da servidão florestal, para assegurar a exploração econômica com equilíbrio ambiental, compensando erros cometidos no passado e evitando novos desmatamentos.

Referências Bibliográficas:

ANTUNES, Luciana Rodrigues. A averbação da reserva legal e da servidão florestal. Disponível em: . Acesso em: 26/06/2005.

JESUS JUNIOR, Guilhardes de . Da servidão ambiental. Disponível em: . Acesso em: 26/06/2005.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo:Malheiros Editores, 2002.

(Elaborado em 28 de junho de 2005)

 

Como citar o texto:

ANGIEUSKI, Plínio Neves..A Servidão Florestal Instituída pela Medida Provisória nº. 2166-67/2001. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 138. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-ambiental/713/a-servidao-florestal-instituida-pela-medida-provisoria-n-2166-672001. Acesso em 8 ago. 2005.

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