Sugestões práticas e objetivas que podem fazer toda a diferença na solução do complexo problema que se tornou o Exame da OAB.

Em outras oportunidades, já me manifestei sobre o Exame de Ordem apresentando críticas construtivas com o fito de promover o aperfeiçoamento desse exame. Vi recentemente algumas dessas idéias serem experimentadas na realização do exame, como a unificação das datas de sua realização, embora não em todo o País, mas em grande parte. Recentemente, vi o comentário de que em São Paulo, os candidatos aprovados na 1ª fase e reprovados na segunda, não teriam que se submeter novamente à 1ª fase do exame, idéia que expus e defendi publicamente muito antes dessa inovação no exame paulista.

Entretanto, acredito que há muito ainda a se fazer para buscar a excelência do exame de ordem, notadamente, visando ao seu real objetivo, que compreendo não deva ser como o de um concurso público, que é o de selecionar os melhores, mas de aferir o conhecimento e aptidão mínima para o exercício da profissão.

Naturalmente, que, como advogado privado e militante, sinto o inconveniente crescente do aumento considerável da concorrência profissional, em parte, ao certo, pelo aumento também considerável de inscritos nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, porém, tenho claro em minha percepção que o Exame de Ordem não deve servir para atenuar esse drama do aumento da concorrência, para isso, outras medidas teriam que ser tomadas e até ousarei expor algumas idéias a esse respeito, oportunamente, em outro artigo.

Logo, se o Exame de Ordem não deve ter o propósito de dificultar o crescimento da concorrência entre os profissionais da advocacia, ou seja, de servir como sensor de preservação da reserva de mercado, é fundamental que seja elaborado, nitidamente, com o espeque de atender a esse principal objetivo – aferir o conhecimento e aptidão mínimos para o exercício da profissão de advogado, resguardando a sociedade de profissionais despreparados que coloquem em risco seus direitos.

Nem sempre esse objetivo tem sido bem observado no bojo de muitas provas realizadas pelo Brasil afora. Aliás, muito se tem utilizado o Exame de Ordem como termômetro para medir a qualidade dos cursos jurídicos. Todavia, ao se afastar de seu objetivo, compromete a qualidade da aferição, produz inúmeras injustiças com os candidatos e desloca o foco da avaliação.

Quanto a utilizar-se o Exame de Ordem como termômetro da qualidade dos cursos jurídicos, não há em si, um erro. É mesmo inevitável que isso aconteça, até mesmo pela mídia, pois o assunto é de grande interesse da imprensa, e serve como indicador de qualidade para colaborar na escolha das faculdades; ainda mais, hoje, que o vestibular não representa mais um fator de restrição de acesso às faculdades, notadamente, as particulares.

O que preocupa, todavia, é que embalado pelo brilho dos holofotes, desloque-se o foco do exame de ordem para servir unicamente como sensor de qualidade dos cursos jurídicos, o que acaba por alterar a sua formatação, comprometer a sua essência e desvirtuar o seu real propósito. Mais uma vez, destaco esse importante alerta.

Tenho observado que muitas questões são anuladas por deficiência na sua elaboração, e várias outras que igualmente deveriam ser, mas por falha no julgamento dos recursos não são atendidas.

Outro problema que observo é que as faculdades são avaliadas pelo resultado no Exame de Ordem, porém elas não são chamadas a discutir as diretrizes do Exame de Ordem, não são nem mesmo informadas de quais os parâmetros são fundamentais na avaliação. Essa ausência de diálogo, no mínimo, facilita que os erros de formação que possam estar ocorrendo no ambiente acadêmico sejam repetidos, porque sem o diagnóstico, não é possível notar em que momento ou de que forma está equivocado o processo de ensino-aprendizagem do Direito.

Tudo bem, você deve estar dizendo que até aqui só critiquei e não apresentei nenhuma idéia para o aperfeiçoamento. Isto é verdade, mas esclareço que as idéias não pareceriam positivas se antes não apresentasse quais os problemas que pretendo combater com as sugestões a apresentar.

Vamos às idéias.

1. O Exame de Ordem deve ser nacional, não apenas uma data nacional, mas toda a primeira fase deveria ser elaborada pelo Conselho Federal da OAB, enquanto a segunda fase deveria ser elaborada pela seccional, observando, naturalmente, as particularidades regionais, pois se trata de prova prática, onde os temas fundamentais e a Organização Judiciária do Estado sofrem mutações, se comparados a outras unidades da Federação.

As dificuldades que vejo para que essa idéia seja implantada está na perda de receita das seccionais. Porém, essa equação pode ser estudada e resolvida entre o Conselho Federal e as Seccionais, com alguma margem na negociação.

O ganho que se teria com a nacionalização da primeira fase está, fundamentalmente, na padronização do exame, na profissionalização deste, eis que o valor das taxas recolhidas pelos candidatos, para elaboração de uma única prova em todo o País, ao invés de dezenas de provas, permitiria recurso suficiente para que a constituição de uma ampla e excelente comissão de advogados-professores de Direito, devidamente remunerados, com no mínimo três responsáveis pela elaboração da prova em cada área, ao invés de apenas um, como é, hoje, evitando muitos erros na elaboração. Assim, como outra comissão muito qualificada para julgar os recursos do Exame de Ordem sobre as questões da primeira fase, dando mais garantia de qualidade, justiça e transparência nas decisões.

2. Uma segunda sugestão que tenho é quanto à escolha dos advogados-professores que integram a comissão que elabora e julga os recursos do exame de ordem. Hoje, não há conhecimento se existe critério objetivo para a escolha desses profissionais, embora a imensa maioria seja qualificada e competente, há falhas no processo e certa deficiência nessa seleção. Acredito que seria muito melhor se houvesse uma parametrização nessa escolha, definindo requisitos mínimos, como tempo de experiência na advocacia, tempo de experiência na docência no ensino superior, titulação acadêmica, formação em didática do ensino superior, e, por que não, até mesmo, uma prova de qualificação na área pretendida, onde se observaria conhecimento na área específica e técnica na elaboração de questões? Porque preparar questões é muito mais difícil do que se imagina, e o domínio da área do conhecimento não é, por si só, garantia de qualidade na elaboração de questões. Esse cuidado daria maior credibilidade a todo o processo, e certamente, reduziria o número de erros na elaboração das questões.

3. Uma terceira sugestão está em se aproximar das instituições de ensino superior, não apenas para informar-lhes os critérios e os pontos fundamentais que serão observados em cada disciplina, mas, fundamentalmente, para discutir quais devem ser esses pontos fundamentais, ou seja, essa interação garantiria mais qualidade e precisão ao Exame de Ordem e maior identificação das instituições dos pontos fundamentais, dos pontos vulneráveis para aperfeiçoarem seus cursos jurídicos. Afinal, os desejos da OAB e das instituições de ensino são convergentes e não contraditórios, quais sejam, formar profissionais com aptidão para o bom exercício das profissões jurídicas. Assim, se é verdade que o Exame de Ordem não quer, simplesmente, reprovar, mas constatar a aptidão para o exercício da advocacia, muito melhor será se contribuir para que o processo de formação dos bacharéis incorpore as sugestões das lacunas observadas e corrija as deficiências detectadas. Isso só é possível com uma aproximação e integração, desfigurando a idéia que predomina do órgão que fiscaliza e ridiculariza pelos resultados que apresenta, para o órgão que contribui com informações úteis para o aperfeiçoamento.

4. Outra sugestão é que os candidatos aprovados na primeira fase e reprovados na segunda fase, durante o período subseqüente de um ou dois anos, não necessitem submeter-se novamente à primeira fase. Afinal, aprovados na primeira fase, já demonstraram o conhecimento geral suficiente sobre Direito, precisam apenas concentrar-se na fase prática do exame de ordem. A idéia de limitar-se o tempo de validade dessa aprovação está calcada na percepção de que o direito é dinâmico, e o tempo entre a aprovação na primeira e na segunda fase não pode ser longo, sob o risco de se estar permitindo o acesso à profissão de quem distante do seu exercício não se manteve atualizado adequadamente com as mudanças que foram erigidas entre a aprovação na primeira e na segunda fase.

5. Uma quinta sugestão está na elaboração da estatística de aprovação por faculdade. Essa estatística deveria ser encaminhada às faculdades detalhando não apenas os percentuais de aprovação e reprovação em cada fase do exame, mas também, os percentuais de erro e acerto de cada uma das questões das diferentes áreas, entre os alunos da respectiva instituição. Essa estatística serviria como relevante diagnóstico para a instituição avaliar os pontos de fragilidade do seu processo de formação e contribuir para corrigir deficiências.

6. Mais uma sugestão refere-se também às estatísticas, penso não ser justo que o candidato que foi reprovado mais de uma vez em cada fase do exame de ordem seja incluído na estatística de reprovação de cada faculdade. Isso porque se cria um resultado irreal para as instituições de ensino superior. Se o exame é realizado até três vezes ao ano, e as faculdades formam uma ou duas vezes por ano, certamente um dos exames tem muitos candidatos reprovados em exames anteriores, e por vezes, reprovados reiteradas vezes. Desta forma, esse mesmo candidato reprovado duas, três, quatro ou mais vezes, está a cada edição do exame de ordem puxando para baixo o percentual de aprovação daquela faculdade, oferecendo um diagnóstico impreciso à instituição e à sociedade, posto que a idéia é que o resultado do exame de ordem está aferindo a última turma formada pela instituição, mas se forem muitos candidatos da instituição de turmas anteriores, às vezes, muito anteriores, o diagnóstico fica impreciso e comprometido, punindo duas ou diversas vezes a instituição pela deficiência do mesmo candidato.

Dessa forma, parece-me apropriado que a estatística por faculdade só deveria observar os candidatos que estiverem se submetendo ao exame de ordem pela primeira vez; assim, o resultado retratará com maior precisão o desempenho da última turma de formandos.

7. A última sugestão neste singelo texto, é de que a OAB deveria instituir para as faculdades de Direito um prazo para a interposição de recurso contras questões das suas provas, regulando que deveria o recurso ser assinado pelo Coordenador do Curso, visando a um maior controle da qualidade das questões e da justiça na aplicação da prova. O eventual provimento desses recursos nos itens atendidos deveria aproveitar a todos os candidatos do exame de ordem. Essa medida, a um só tempo, conferiria mais qualidade ao exame de ordem, mais transparência a todo o processo, mais justiça nos resultados e representaria importante aproximação das instituições de ensino jurídico.

Naturalmente, muitas outras sugestões poderiam ser acrescentadas para o aperfeiçoamento do exame de ordem; no entanto, acredito que a aplicação das medidas aqui sugeridas já serviria como grande avanço de qualidade e justiça na aplicação do exame de ordem ou ao menos para despertar um debate muito relevante que não deve ficar adormecido, notadamente, em ano de campanha eleitoral para a presidência das seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil.

 

Como citar o texto:

ASDRUBAL JÚNIOR.Exame de ordem: como aperfeiçoá-lo. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 170. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/exame-da-ordem-e-concursos/1126/exame-ordem-como-aperfeicoa-lo. Acesso em 20 mar. 2006.

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