Sabe-se que, em seu aspecto material, o crime pode ser definido como uma lesão a um bem jurídico relevante à esfera penal, ou seja, todo fato lesivo que agride o Ordenamento jurídico e que proporciona o efeito imediato sob forma de sanção. Entretanto, a idéia do crime é complexa e passa por muitas tentativas de conceituação, desde conceitos clássicos, neo-clássicos até chegarmos ao conceito analítico de crime que o define como um fato típico, antijurídico e culpável. Ainda que se ressalve parte da doutrina que exclui a culpabilidade, do conceito de crime, posicionando-a com mero pressuposto da pena, a maior parte da doutrina sustenta que o crime é mesmo definido como fato típico, antijurídico e culpável. Desta forma, com cada um destes elementos sofrendo seus respectivos desdobramentos, chega-se até a idéia de que o fato típico é composto pela conduta, resultado, nexo causal e tipicidade. No primeiro termo desta composição (a conduta) estaria situada a omissão, relevante para o que se pretende abordar agora.

Fala maior parte da doutrina que não existe nexo causal entre a omissão e o resultado, ou seja, não existiria liame entre a conduta omissiva e o resultado causado por esta conduta. Neste sentido Bitencourt (BITENCOURT: 2004) pontua: “ Na doutrina predomina o entendimento de que na omissão não existe causalidade, considerada sob o aspecto naturalístico, pois do nada não pode vir nada”. Além de Bitencourt, Luiz Regis Prado (PRADO: 2002) acompanha o pensamento: “ Como já exposto, não há relação de causalidade alguma na omissão (ex nihilo nihil fit). O simples fato de estar o sujeito em atitude passiva deixa claro a impossibilidade de originar-se qualquer processo gerador de um resultado”. Entretanto mesmo dentro desta corrente há algumas exceções que entendem que se como nexo normativo não há causalidade alguma na omissão, o mesmo não se pode alegar nas hipóteses de crimes omissivos impróprios (comissivos por omissão) onde há a obrigação de agir para evitar um resultado concreto. Haveria nesses casos portanto, um liame entre o resultado e a não-ação do agente em virtude principalmente da sua função garantidora. Tal liame, parte da doutrina aponta como um “nexo de não-impedimento” e não propriamente um nexo causal.

Por outro lado, parte da doutrina concebe o nexo causal entre a omissão e o resultado, como pondera Aníbal Bruno, (BRUNO: 2003) “ a omissão é causal em relação ao resultado quando, se o omitente tivesse praticado a ação omitida, o resultado não teria ocorrido, isto é, quando não se possa conceber como realizada a ação omitida sem que desde logo desapareça o resultado”,

Admitindo a dificuldade do tema, surge entretanto, uma barreira a ser vencida pelo grupo dos que negam o nexo causal da omissão e o resultado. O pensamento é simples e a construção do argumento segue a lógica, pois se o crime é (fato típico , antijurídico e culpável) e o fato típico por sua vez é (conduta, resultado, nexo causal e tipicidade), chega-se à conclusão de que com a supressão do nexo causal não há mais o fato típico, que por sua vez inviabilizaria a própria existência do crime. Ou seja, não existiria o crime advindo de qualquer conduta negativa. Desta forma, como explicar a existência dos crimes omissivos impróprios de que trata o art. 13, parágrafo 2º do CP? Se é verdade que não existe o nexo causal entre a omissão e o resultado é também verdade que deve-se dar uma nova designação ao termo “crimes missivos”, pois não também haveria crime algum com a inexistência do fato típico. Destarte, não é provada a existência ou inexistência do nexo causal entre a omissão e resultado, porém penso ser mais prudente admiti-la para viabilizar a idéia dos crimes omissivos.

Negar a existência do nexo causal entre a omissão e resultado apenas baseando-se na idéia de que do nada, nada pode vir, parece-me um argumento insuficiente e que esbarra na dificuldade de descaracterizar a própria existência dos crimes omissivos, incontestes quanto à sua existência.

Bibliografia:

BITENCOURT, Cezar Roberto – Tratado de Direito Penal : Volume 1 – 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

BRUNO, Aníbal - Direito Penal Parte Geral: Tomo 1, 5ª edição, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2003

PRADO, Luiz Regis – Curso de Direito Penal Brasileiro, Parte Geral Volume 1, 3ª edição –São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais ,2002

 

Como citar o texto:

VASCONCELLOS, Milton Silva de..O nexo causal entre omissão e resultado. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 183. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/1338/o-nexo-causal-entre-omissao-resultado. Acesso em 19 jun. 2006.

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