Sumário: I. Introdução. II. A importância dos princípios consumeristas. 1. Dos princípios gerais de direito. 2. Dos princípios consumeristas. III. Um breve histórico sobre a legislação e as decisões judiciais referentes aos juros até hoje. IV. Aspectos jurídico-legais atinentes à revisão contratual dos juros conforme o Código Consumerista. V. Considerações finais. Referência Bibliográfica.

Resumo:

                  Este artigo tratará da revisão judicial dos juros aplicados em contratos de empréstimo, financiamento e refinanciamento, ou quaisquer modalidades que envolvam juros, firmados entre quaisquer instituições financeiras e clientes-consumidores, tendo em vista que, definitivamente, pela ADIN n. 2.591, qualquer relação negocial-jurídica entre estes é uma relação de consumo. Assim, estão superadas quaisquer tentativas dos bancos e financeiras de se desvencilharem de cumprir o que determina o Código de Defesa do Consumidor, norma de ordem pública.

                  Será analisada a questão da aplicação dos juros advindos de empréstimos e financiamentos fornecidos por bancos e financeiras antes da decisão da ADIN n. 2.591, a qual modificou os parâmetros que os juízes devem utilizar no caso de terem de decidir sobre pedido de revisão contratual ligado a cobrança de juros abusivos e contrários aos princípios consumeristas.

                  Para o desenvolvimento deste artigo servirão de base o Código de Defesa do Consumidor e a ADIN 2.591, além de outras legislações pertinentes e alguns julgados prolatados por tribunais, demonstrando-se as possibilidades viáveis da revisão pelo Poder Judiciário, que deverá analisar os princípios consumeristas para a decisão do litígio.

Palavras-chave: juros; revisão; consumidor; instituições financeiras.

I. INTRODUÇÃO

Preliminarmente, deve-se asseverar que está superada a discussão da aplicação ou não do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de empréstimo, financiamento ou refinanciamento em virtude da decisão da ADIN n. 2591, na qual ficou determinado que nas relações jurídicas firmadas entre consumidor e instituição financeira é aplicável a Lei n. 8.078/90. Entretanto, a Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça já previa que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

Em virtude da previsão da Lei nº 4.595/64 (artigo 17 c/c artigo 18, §1º) são instituições financeiras e autorizadas pelo Banco Central do Brasil: os Estabelecimentos Bancários Oficiais e Privados (lato sensu: Bancos Comerciais, Bancos de Investimento, Bancos de Desenvolvimento e Bancos Múltiplos com Carteira Comercial); as Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento (‘Financeiras’); as Caixas Econômicas; as Cooperativas de Crédito e Cooperativas que possuem Seção de Crédito.

Também as Leis 4.380/64 (artigo 8º) e 9.514/97 (artigo 1º), e a Resolução nº 1.980/93 (artigos 1º e 2º), do Conselho Monetário Nacional, entendem como instituições financeiras os Bancos Múltiplos com Carteira de Crédito Imobiliário as Sociedades de Crédito Imobiliário; as Associações de Poupança e Empréstimo; as Companhias de Habitação; as Fundações Habitacionais; os Institutos de Previdência, exclusivamente com relação à Seção de Crédito Imobiliário; as Companhias Hipotecárias; as Carteiras Hipotecárias dos Clubes Militares; os Montepios Estaduais e Municipais, exclusivamente com relação à Seção de Crédito Imobiliário; as Entidades e Fundações de Previdência Privada, exclusivamente com relação à Seção de Crédito Imobiliário.

                  É interessante notar que o Código de Defesa do Consumidor exerce uma função essencial na sociedade, tendo em vista que os abusos perpetrados, mesmo estando em vigor desde 1990, por fornecedores de produtos e serviços a seus clientes, são constantes. Dessa maneira, a aplicação da Lei Consumerista nas relações de consumo até o julgamento da ADIN n. 2.591 sempre foi criticada pelas instituições financeiras, vez que, do ponto de vista econômico, não lhes era favorável.

                  O consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo. Bem por isso, pela força que os fornecedores de produtos e serviços exercem sobre os consumidores nas mais variadas relações de consumo, o Código Consumerista, no seu art. 6º, inciso VIII, prescreve a inversão do ônus da prova a favor destes, quando considerados hipossuficientes ou se forem verossimilhantes suas alegações.

                  Em muitos casos, quando o cliente abre uma conta corrente ou recebe um cartão de crédito – este sendo enviado, muitas vezes, sem a devida solicitação do consumidor, o que é proibido pelo artigo 39, inciso III da Lei Consumerista – o banco ou financeira não fornecem uma cópia do contrato de adesão ao cliente, e conforme o artigo 46 do referido diploma legal, abaixo transcrito, nos casos em que não dado a conhecer ao cliente o inteiro teor do avençado no contrato, não estará obrigado a cumpri-lo.

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance (grifado).

                  Aqui está um importante dado para a revisão dos juros e das cláusulas contratuais em juízo. Uma vez que o consumidor não tem a possibilidade de conhecer as cláusulas contratuais que regem sua relação negocial-jurídica com a instituição financeira, inclusive sem receber uma via do contrato firmado, não está obrigado a cumpri-lo, lembrando do que prescreve o artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor, podendo o autor-consumidor pleitear em ação judicial a inversão do ônus da prova a seu favor, a fim de que a instituição financeira demandada prove que entregou ou deu a conhecer ao cliente as cláusulas que regem a relação de consumo entre eles existente.

                  Isso se torna fácil, em alguns casos, porque o consumidor nem chega a assinar qualquer contrato quando realiza o empréstimo por telefone ou pela internet. Logo, o consumidor pode requerer em juízo a juntada do contrato pela instituição financeira com a sua assinatura. Caso esta não junte a cópia do contrato, o consumidor, após invertido o ônus da prova a seu favor, não estará obrigado a cumprir com as cláusulas contratuais, inclusive a que trata da taxa de juros, multa, encargos, pelo que determina o artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor. Todavia, com ou sem o contrato – que também pode ser entregue pela instituição financeira sem assinatura das partes, como ocorre pelo envio de cartão de crédito pelo correio – o consumidor tem o direito de revisar suas cláusulas, e conseqüentemente os juros, com base nos princípios e preceitos consumeristas.

                  Outra questão imprescindível a ser analisada é a da clareza do contrato. As cláusulas não podem ser abusivas, tampouco dúbias em desfavor do consumidor e contraditórias.

                  A instituição financeira deve elaborar um contrato claro e em letras adequadamente legíveis, tendo em vista que o contrato é de adesão, o que também é mais um motivo para o magistrado levar em consideração o que nele estiver avençado a favor do consumidor (artigo 54, § 3º do Código de Defesa do Consumidor).

                  Conforme prescreve o artigo 47 da Lei Consumerista, as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Assim, o juiz deve agir, ainda que a parte não o requerer, pois o Código de Defesa do Consumidor é norma de ordem pública.

                  Antes da decisão da ADIN n. 2.591, os tribunais, quando solicitada pela parte consumidora na ação judicial a revisão dos juros impostos pela financeira, entendiam que a taxa de juros a ser aplicada era a de mercado, que é de aproximadamente 12% (doze por cento) ao mês, e não a taxa SELIC (Sistema Especial de Liquidação e Custódia), que em abril do corrente ano foi de 0,94 (noventa e quatro centésimos por cento).[1] Nesse sentido, entendia-se que não se aplicava aos juros, nesses casos, qualquer limite legal.[2]

A taxa SELIC é considerada na movimentação e troca de custódia dos títulos públicos federais; é um mecanismo eletrônico, criado para simplificar o controle diário da custódia, liquidação e operação de títulos da dívida pública. Seu índice, que é definido por circular emitida pelo COPOM (Comitê de Política Monetária do Banco Central), demonstra sua instrumentalidade político-monetária, cuja variação se dá segundo a necessidade do mercado.

                  Graças ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal por meio da ADin n. 2.591, o juiz de primeiro grau poderá rever os juros aplicados ao consumidor pela instituição financeira, até mesmo as inúmeras – e não esclarecidas adequadamente – demais taxas e encargos cobrados, tendo-se como base o Código de Defesa do Consumidor.

                  O critério utilizado pelo magistrado, como não há consenso sobre o parâmetro legal de limitação ou adequação da taxa de juros a ser aplicada no entender da jurisprudência, a tarefa dos magistrados não será fácil, tendo em vista que as normas da Lei n. 8.078/90 são gerais, ou seja, não dispõe de preceito explícito que trate da taxa de juros. Esse fator é o que determina as inúmeras divergências a respeito.

Pode até o magistrado considerar a taxa Selic a aplicável ao caso, já que é menos gravosa ao consumidor que a taxa de juros de mercado, a atualmente aplicada pelas instituições financeiras. Contudo, sem um critério específico, a decisão poderá não satisfazer o que preleciona o Código de Defesa do Consumidor, que possui princípios autônomos e importantíssimos.

                  Em relação à multa de mora decorrente do inadimplemento da obrigação não poderá ser superior a 2% (dois por cento) do valor da prestação, consoante prevê o artigo 52, § 1º do Código de Defesa do Consumidor.

                  No que tange aos princípios que regem a relação de consumo, serão analisados adequadamente, visto que ensejam a revisão dos juros aplicados, desmedida e abusivamente, pelas instituições financeiras.

II. A IMPORTÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSUMERISTAS

1. Dos princípios gerais de direito

Previstos na LICC (art. 4º), no CPC (art. 126) e na CLT (art. 8º), os princípios gerais do direito são conhecidos como analogia iuris. São as normas jurídicas mais gerais, ou seja, fundamentais, que orientam todo o sistema jurídico, inclusive o internacional público (BARROSO, 1999, p. 20).

Segundo Acquaviva (2001, p. 555), “princípios gerais de direito são os que decorrem do próprio fundamento da legislação positiva, que, embora não se mostrando expressos, constituem os pressupostos lógicos necessários das normas legislativas”.

Nesse aspecto, muito embora não estejam expressos, tais princípios existem, consistindo na manifestação do próprio espírito de uma legislação.

Os princípios gerais do direito são as diretivas idéias do hermeneuta, os pressupostos científicos da ordem jurídica. (MAXIMILIANO, 2000, p. 295) e são considerados da mesma maneira que os postulados de um sistema científico (BOBBIO, 1999, p. 77).

                  Sobre os princípios gerais de direito importa citar-se, também, Miguel Reale (1999, p. 305):

“A observação fundamental é que toda forma de conhecimento filosófico ou científico implica a existência de princípios, isto é, de certos enunciados lógicos admitidos como condição ou base de validade das demais asserções que compõem todo campo do saber”.

                  Numa abordagem lógica da palavra "princípio", pode-se dizer que os princípios são ´verdades fundantes` de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas. (REALE, 1999, p. 305).

                   Nesse sentido, de acordo com Miguel Reale (1999, p. 306), os princípios se dividem em três categorias.

                  A primeira é a dos princípios omnivalentes, que são válidos para todas as formas de saber, como é o caso dos princípios de identidade e de razão suficiente.

                  A segunda é a dos princípios plurivalentes, que são aplicáveis a vários campos de conhecimento, como se dá com o princípio de causalidade, essencial às ciências naturais, mas não extensivo a todos os campos do conhecimento.

                  Por fim, tem-se a categoria dos princípios monovalentes, que só valem para o âmbito de determinada ciência, como é o caso dos princípios gerais de direito.

                  A expressão princípios gerais de direito é ampla e um autor de grande autoridade como Rubens Limongi França (apud RODRIGUES, 2002, p.25), entende que são aos princípios de direito natural que o legislador manda recorrer na lacuna da normatividade. Todavia, há de se atribuir um sentido diferente a eles, uma vez que o legislador quer referir-se àquelas normas que o orientam na elaboração da sistemática jurídica, ou seja, àqueles princípios que baseados na observação sociológica e tendo como objetivo regular os interesses conflitantes, impõem-se, inexoravelmente, como uma necessidade na vida do homem em sociedade. (RODRIGUES, 2002, p. 25).

                  A esse respeito, Washington de Barros Monteiro (1997, p. 42), esclarece que nada existe de mais tormentoso para o intérprete, que a aplicação dos princípios gerais de direito, não especificados pelo legislador.

                  Com base nessa posição, note-se a resolução encontrada pelo direito suíço para o eventual problema da aplicação dos aludidos princípios gerais, conforme dispõe o art. 1º do seu Código Civil: “no silêncio da lei e não havendo um costume a regular uma relação jurídica, deve o juiz decidir segundo as regras que ele estabeleceria se tivesse de agir como legislador” (RODRIGUES, 2002, p. 25).

                  Assim, ao se examinar o direito positivo pátrio, o artigo 4° da Lei de Introdução ao Código Civil preleciona que, quando a norma jurídica for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

                  De acordo com o magistério de Miguel Reale (1999, p. 306), isto significa que o legislador, por conseguinte, é o primeiro a reconhecer que o sistema das leis não é suscetível de cobrir todo o campo da experiência humana, restando sempre grande número de situações imprevistas, algo que era impossível ser vislumbrado sequer pelo legislador no momento da futura lei.

2. DOS PRINCÍPIOS CONSUMERISTAS

                  Os princípios, na esfera do Direito do Consumidor, igualmente condicionam e orientam a aplicação e a integração de direitos. Dessa forma, o magistrado não deve hesitar em utilizá-los na prestação jurisdicional.

                  Segundo Cláudio Bonatto (2003, p. 27), “quando falamos de princípios aplicáveis ao Código de Defesa do Consumidor, tratamos, também, do estabelecimento de regras de hermenêutica fundamentais para o correto entendimento da Lei Protetiva”.

                  É importante frisar que a Lei n. 8.078/90 rompe de vez com o princípio do pacta sunt servanda ao reconhecer que em matéria de relação de consumo vige a regra da “oferta que vincula” (artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor), além do que os contratos são elaborados unilateralmente (contratos de adesão), ou, como já dito, nem sequer são apresentados aos consumidores (NUNES, 2005, p. 567).

                   Serão analisados neste item os seguintes princípios consumeristas: princípio da conservação do contrato; princípio da revisão contratual; princípio da boa-fé; princípio do equilíbrio ou da eqüidade; princípio da equivalência; princípio da igualdade; princípio da correta informação ou do dever de informar; princípio da transparência; princípio da vulnerabilidade do consumidor; princípio da hipossuficiência do consumidor.

                  O princípio da conservação do contrato, implícito na norma do inciso V do artigo 6º e explícito no § 2º do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, trata-se de se permitir a modificação e a revisão de cláusulas contratuais abusivas, objetivando-se manter o pacto firmado, no que com estas não for incompatível, sempre se levando em consideração a proteção do consumidor.

                  Por este princípio, o juiz deve se esforçar, apesar de declarar a anulação de determinadas cláusulas ou parte delas, em manter a integração do contrato, somente anulando o que for incompatível com a Lei Consumerista.

                  Conforme o magistério de Rizzatto Nunes (2005, p. 569)

“O princípio do inciso V do art. 6º, volta como norma de declaração de nulidade da cláusula desproporcional no art. 51 (inciso IV e § 1º), mas a nulidade não significa que o contrato será extinto. Como o inciso V garante a modificação, pelo princípio da conservação do contrato, o magistrado que reconhecer a nulidade deve fazer a integração das demais cláusulas e do sentido estabelecido no contrato, em função de seu objeto, no esforço de mantê-lo em vigor”.

                  Tanto o inciso V do artigo 6º quanto o § 2º do artigo 51 do Código Consumerista demonstra nitidamente a possibilidade de revisão de cláusulas que estabeleçam prestações desproporcionais, bem como em função de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas. Assim, o princípio da revisão contratual é ligado ao da conservação do contrato.[3]

                  O direito de revisar o contrato está ligado aos princípios da boa-fé e do equilíbrio (artigo 4º, inciso III), da vulnerabilidade do consumidor (artigo 4º, inciso I), sendo que este decorre da necessidade de aplicação concreta do princípio constitucional da isonomia (artigo 5º, caput¸ da Constituição Federal).

                  Ainda segundo Rizzato Nunes (2005, p. 569) o princípio da revisão “não se trata da cláusula rebus sic stantibus, mas sim de revisão pura, decorrente de fatos posteriores ao pacto, independentemente de ter havido ou não previsão ou possibilidade de previsão dos acontecimentos”.

                  O princípio da boa-fé é intrínseco a todos os contratos, porém, com mais razão nos de relação de consumo.

                  O referido princípio está previsto no capítulo da política nacional de relações de consumo (artigo 4º, inciso III) e na seção das cláusulas abusivas (artigo 51, inciso IV).

                  A boa-fé divide-se em objetiva e subjetiva. A incorporada pela Lei n. 8.078/90 é a chamada boa-fé objetiva.

                  A boa-fé subjetiva diz respeito à ignorância de uma pessoa acerca de um fato modificador, impeditivo ou violador de seu direito. A boa-fé objetiva, por sua vez, é uma regra de conduta, na qual está o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, o que estabelece o equilíbrio nas relações de consumo. (NUNES, 2005, p. 572).

                  A boa-fé subjetiva está presente nas relações civis, podendo ser encontrada em vários preceitos do Código Civil, como nos artigos 897; 1.201 e 1.202; 1.561.

                  Por fim, vale ressaltar que a boa-fé objetiva não depende forma alguma de verificação da má-fé subjetiva do fornecedor ou mesmo do consumidor.

                  O princípio do equilíbrio também presente no inciso III do artigo 4º da Lei n. 8.078/90 é por alguns doutrinadores denominado de princípio da eqüidade.

                  Tem razão Paulo Luiz Netto Lôbo quando afirma que “a boa-fé sempre se entroncou historicamente com a eqüidade. Apesar de trabalhar com critérios objetivos, com standards valorativos e com o efeito erga omnes da decisão, a eqüidade é entendida no sentido aristotélico de justiça do caso concreto”. (1991, p. 147).

                  Conforme observou a professora Mirella D’Angelo Caldeira, o princípio da eqüidade determina que o intérprete busque encontrar e manter as partes em equilíbrio na relação obrigacional estabelecida, com o escopo de proporcionar uma justiça contratual. (1998, p. 39).

                  O princípio da equivalência contratual está previsto no artigo 4º, inciso III do Código de Defesa do Consumidor, implicando nulidade a cláusula contratual que o violar (artigo 51, inciso IV e § 1º, inciso III da Lei Consumerista).

                  Tal princípio refere-se à equivalência entre as partes de prestações e contraprestações entre si. Este se confunde com o princípio da eqüidade ou equilíbrio na relação de consumo.

                  No que concerne ao princípio consumerista da igualdade, estabelecido no inciso II do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, está assegurado pelo princípio constitucional (artigo 5º, caput).

                  Pela norma estabelecida no inciso II em comento fica proibida a diferenciação de consumidores pelo fornecedor de produtos ou serviços. Dessa maneira, está o fornecedor obrigado a oferecer as mesmas condições a todos.

                  Como bem anota Rizzatto Nunes, “admitir-se-á apenas que se estabeleçam certos privilégios aos consumidores que necessitam de proteção especial, como idosos, gestantes e crianças, exatamente em respeito à aplicação concreta do princípio da isonomia” (2005, p. 576).

                  O princípio da correta informação ou do dever de informar é igualmente imprescindível à relação de consumo.

                  O referido princípio está previsto nos artigos 6º, inciso III e 31 da Lei n. 8.078/90.

                  Na sistemática da legislação consumerista o fornecedor está obrigado a prestar todas as informações a respeito do produto e/ou do serviço que está oferecendo, com suas características, qualidades, riscos, preço etc., de maneira clara, precisa e detalhada, não se admitindo inverdades, omissões ou falhas.

                  Interessante notar a extensão da proteção do consumidor dada pelo legislador, conforme se depreende do artigo 23 da Lei n. 8.078/90, mesmo que a informação correta sobre o produto ou o serviço não seja de conhecimento do fornecedor:

Art. 23. A ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o exime de responsabilidade.

                  Nesse aspecto, o fornecedor não pode se isentar de responsabilidade, nestes casos, utilizando-se da culpa como elemento de exclusão, porque a Lei Consumerista atribuiu à responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços como sendo objetiva, como prevêem os seus artigos 12 e 14. Logo, o consumidor deverá  provar na ação judicial somente o dano que sofrera e o nexo de causalidade entre este e a conduta do fornecedor, sem tem de se preocupar com o elemento culpa, intrínseco à responsabilidade subjetiva.

                  Esse princípio gera o dever acima citado mesmo antes da concretização da relação negocial-jurídica.

                  O princípio da transparência é concomitante ao do dever de informar. Este princípio estabelece que o consumidor tem o direito de conhecer as cláusulas contratuais previamente, isto é, antes de assumir qualquer obrigação.

                  Está prescrito no caput do artigo 4º e artigo 46, ambos do Código de Defesa do Consumidor. Em sendo descumprido tal direito, está o consumidor desobrigado de cumprir o contrato.

                  Finalmente, comentar-se-á sobre os princípios da vulnerabilidade e da hipossuficiência do consumidor.

                  O princípio da vulnerabilidade está descrito no artigo 4º, inciso I da Lei n. 8.078/90.

O reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor também é uma medida de realização da isonomia garantida na Constituição Federal, significando que o consumidor é a parte fraca da relação jurídica de consumo, e, portanto, deve ser protegido pelo intérprete.

                  A respeito, ensina Rizzatto Nunes (2005, p. 125-126).

“Essa fraqueza, essa fragilidade, é real, concreta, e decorre de dois aspectos: um de ordem técnica e outro de cunho econômico.

O primeiro está ligado aos meios de produção, cujo conhecimento é monopólio do fornecedor. E quando se fala em meios de produção não se está apenas referindo aos aspectos técnicos e administrativos para a fabricação e distribuição de produtos e prestação de serviços que o fornecedor detém, mas também ao elemento fundamental da decisão: é o fornecedor que escolhe o quê, quando e de que maneira produzir, de sorte que o consumidor está à mercê daquilo que é produzido”(grifado).

                  Já o princípio da hipossuficiência do consumidor está consagrado no artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor.

                  Consoante os ensinamentos da ilustre promotora de justiça Cecília Mattos, em sua dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, sob o título “O ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor”(1994, p. 236-237):

“A Lei nº 8.078/90 prevê a facilitação da defesa do consumidor através da inversão do ônus da prova, adequando-se o processo à universalidade da jurisdição, na medida em que o modelo tradicional mostrou-se inadequado às sociedades de massa, obstando o acesso à ordem jurídica efetiva e justa”.

                  O legislador conferiu ao arbítrio do juiz, segundo as regras ordinárias de experiências, a incumbência de – caso presente o requisito da verossimilhança das alegações ou quando o consumidor for hipossuficiente – poder inverter o ônus da prova a favor do consumidor-autor.

                  Diante da exposição dos princípios consumeristas, nota-se a importância que exercem na relação de consumo, notadamente no que concerne à revisão de cláusulas contratuais abusivas, sendo que o magistrado deverá sempre atentar para a prevalência da proteção do consumidor, que é a parte mais fraca na relação jurídica instaurada com o fornecedor.

III.           UM BREVE HISTÓRICO SOBRE A LEGISLAÇÃO E AS DECISÕES JUDICIAIS REFERENTES AOS JUROS ATÉ HOJE

                  É indispensável comentar a trajetória da aplicação dos juros aos consumidores antes de ser decidida a Adin n. 2.591.

                  Com o advento da Adin n. 2.591 colocou-se uma pá de cal na discussão sobre a possibilidade de revisão dos juros em juízo, sendo que possibilitou tal hipótese de maneira definitiva.

                  Em capítulo específico adiante serão estudadas as possibilidades viáveis para se obter uma decisão favorável em ação revisional de juros ou de cláusulas abusivas e desproporcionais.

                  Vale destacar a evolução histórica atinente ao tema, trazendo à baila a Lei 3.071 de 1º de janeiro de 1916, artigos 1.062 ao 1.064, que tratavam sobre os juros legais de forma geral. Tal ordenamento tratava dos juros da mora ou ainda dos juros remuneratórios quando as partes deixassem de pactuar seu percentual.

Em ambos os casos, o Código Civil de 1916 limitava tal percentual em 6% (seis por cento) ao ano[4] (ou 0,5% ao mês) possibilitando ainda no contrato de empréstimo de dinheiro a estipulação de taxa superior desde que existisse previsão contratual.

                  Em 7 de abril de 1933, com a necessidade de uma melhor regulamentação, foi editada a “Lei da Usura” (Decreto 22.626/33)[5], que logo em seu primeiro artigo, estipulou punição àquele que cobrasse juros acima do dobro do previsto no Código Civil (1916) então vigente.

Tal Decreto vedou em seu artigo 4º a prática da cobrança de juros sobre juros (anatocismo), e admitiu em seu 5º artigo a elevação até o limite de 1% (um por cento) pela mora dos juros contratados.

A Lei n° 1.521, de 26 de dezembro de 1951, nominada Lei dos Crimes Contra a Economia Popular, tipifica o crime de usura, definindo-o como o ato de cobrar juros extorsivos, superiores à taxa permitida em lei, ou auferir lucro maior do que 20% (vinte por cento) do valor da operação.

Para tais infrações penais, estipula a Lei pena de detenção de seis meses a dois anos, além de multa. Com isso, o conceito de prática usurária não mais se limita à mera cobrança de juros, passando a assumir caráter de cobrança ilegal do encargo. Dessa forma, a cobrança de juros acima da taxa legal constitui crime contra a economia popular (artigo 4º, “a” da Lei 1.521/51).

Posteriormente, a Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 1964, chamada Lei da Reforma Bancária, dispôs competir privativamente ao Conselho Monetário Nacional a limitação das taxas de juros (artigo 4º).

Autorizado pelo artigo 9° dessa mesma Lei, o Banco Central do Brasil editou a Resolução n° 389, de 15 de setembro de 1976, autorizando os bancos a utilizarem livremente as taxas de mercado.

Este novo diploma legal passou a determinar por intermédio do inciso IX do artigo 4º a competência do Conselho Monetário Nacional para limitar as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras.

A Lei nº 4.595/64 conferiu, então, às instituições financeiras um tratamento especialno que se refere à cobrança de juros, frente às limitações da “Lei da Usura”.

Decisões conflitantes entre Tribunais Estaduais instigaram a edição da Súmula 596, abaixo transcrita, pelo Supremo Tribunal Federal, concluindo que a Lei de Usura não se aplica às instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, liberando as instituições financeiras do limite:

“As disposições do Decreto 22.626 de 1933 – lei de usura – não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional”.

                  Nesse aspecto, segundo entendimento firmado pelo BACEN (Banco Central do Brasil), na qualidade de membro do Sistema Financeiro Nacional, baseado no inciso I da Resolução nº 1.064, de 5.12.1985, de sua lavra, não vigorava mais no Brasil um limite à contratação de juros nos empréstimos e financiamentos firmados no sistema financeiro nacional.

                  Com o advento do novo marco constitucional traçado pela Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, este assunto ganhou nova roupagem. O parágrafo 3º do artigo 192 trazia a garantia de que a taxa máxima de juros poderia ser cobrada até o limite de 12% (doze por cento) ao ano.

                  Este dispositivo constitucional configurou um garantia fundamental ao cidadão, como um limite máximo aplicado aos juros referentes à concessão de crédito, como forma de proteção aos abusos do mercado.

                  Tal determinação constitucional também corroborou com o verdadeiro objetivo de um Estado Democrático de Direito, uma vez que juros menores propiciam um melhor exercício da cidadania, da dignidade da pessoa, da valorização da livre iniciativa, todos positivados no artigo 1º da Constituição Federal, e ainda, diretamente proporcionou o alcance dos objetivos fundamentais da República, como a construção de uma sociedade justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a redução das desigualdades sociais e regionais, constantes do seu artigo 3º.

                  Dessa forma, deixou de prevalecer o mencionado dispositivo da Lei n. 4.595/64, que deixava a critério do Conselho Monetário a taxa de juros aplicável, sendo tal competência extinta com o advento do preceito constitucional disposto no §3º do artigo 192. Assim, após a Constituição de 1988, o inciso IX do artigo 4º da referida Lei, passou a não mais fazer parte do ordenamento jurídico nacional, pela ocorrência do fenômeno da não recepção em face da nova ordem constitucional traçada.

                  Surgiu, em 11 de setembro de 1990, o vital instrumento para a promoção da cidadania e a redução das desigualdades: o Código de Defesa do Consumidor. Isso ocorreu pelo reconhecimento da vulnerabilidade das pessoas em relação à sociedade de consumo em massa, traçando a Política Nacional das Relações de Consumo, os direitos básicos do consumidor, as regras para a prestação de serviços e o fornecimento de produtos, a responsabilidade objetiva dos fornecedores, o instrumental da desconsideração da personalidade jurídica, a proteção contra práticas abusivas, a proteção contratual, as sanções civis, administrativas e penais; e por fim, a defesa e a prevenção no âmbito processual.

                  Na contra-mão deste avanço legislativo, o Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4-7/DF, julgada em 07 de março de 1991, data venia, equivocadamente (vide o §1º do artigo 5º da Constituição Federal – “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”), quanto à inaplicabilidade imediata do limite constitucionalmente previsto, necessitando este de regulamentação via lei complementar.[6]

                  Permissa venia, a disposição quanto à limitação de 12% (doze por cento) era auto-aplicável, enquanto o que realmente carecia de complementação era a regulamentação das modalidades do crime de usura a qual ficou reservada à Lei Complementar.

                  Essa foi a posição do Ministro Carlos Velloso no julgamento da referida Ação Direta de Inconstitucionalidade a respeito dos juros reais segundo o § 3º do artigo 192 da Constituição, o qual dispunha que “as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano”.

                  O mencionado Ministro assim decidiu a respeito:

“Porque ela é uma norma proibitória ou vedatória, ela é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, ou é ela uma norma auto-aplicável. E porque confere ela, também, um direito aos que operam no mercado financeiro, também por isso a citada norma é de eficácia plena. Não me refiro, evidentemente, à segunda parte do § 3º do artigo 192, que sujeita a cobrança acima do limite a sanções penais, porque esse dispositivo não precisa ser trazido ao debate. As normas constitucionais são, de regra, auto-aplicáveis vale dizer, são de eficácia plena e aplicabilidade imediata".

                  Entretanto, tal discussão foi definitivamente sepultada em maio de 2003, com o advento da Emenda Constitucional nº 40, que revogou o §3º do artigo 192 da Constituição Federal, extraindo de seu texto as disposições específicas quanto ao Sistema Financeiro Nacional, reservando a matéria à Lei Complementar.

                  O assunto veio a ser posteriormente sumulado pelo STF:

Súmula n. 648: “A norma do §3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 125 ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar.”

                  Mesmo os contratos firmados sob a vigência do artigo 192, § 3º da Carta Magna, por causa do entendimento da necessidade de ser regulamentado por lei complementar para sua aplicabilidade, cujos consumidores aguardavam uma decisão dos tribunais, e requereram a revisão dos juros baseados neste dispositivo constitucional, não tiveram sua pretensão atendida.

                  Segue trecho de um julgado do Tribunal de Justiça do Paraná a respeito:

“A sentença limitou juros reais em 12% (doze por cento) ao ano. Porém, a permanecer este estado de coisas, ocorreria errônea aplicação da norma do antigo art. 192, § 3º, da Constituição Federal, revogado pela Emenda Constitucional nº 40. Como é cediço, mesmo nos contratos firmados sob sua vigência, a aplicabilidade daquele dispositivo pendia de regulamentação por lei complementar. A questão ficou ainda mais pacificada com advento da súmula 648, do Supremo Tribunal Federal”. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0227111-6, da comarca de Campo Mourão, 2ª Vara cível. Apelante: Banco do Brasil S.A. RECURSO ADESIVO: Tauillo Tezelli. Rel. Sérgio Roberto Nóbrega Rolanski. Curitiba, 05 de abril de 2006).

A revogação do limite constitucional pela Emenda Constitucional nº 40 também não propiciou o retorno da competência para o Conselho Monetário, como nos orienta a ideologia do §3º do artigo 2º do Decreto-Lei n. 4.657/42 (LICC).

                  Já o atual Código Civil, em vigor desde 11 de janeiro de 2003, trouxe inovação no que se refere à taxa de juros.

                  O seu artigo 406, que trata dos juros legais, assim determina:

“Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional”.[7]

                  O novo Código Civil ainda traz limitação da fixação de juros em caso de mútuo (empréstimo), consoante se infere do seu artigo 591:

“Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual”.

                  Importa anotar o Enunciado n. 34, aprovado na I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, no período de 11 a 13 de setembro de 2002, sob a coordenação científica do Ministro Ruy Rosado do STJ:

“No novo Código Civil, quaisquer contratos de mútuo destinados a fins econômicos presumem-se onerosos (art. 591), ficando a taxa de juros compensatórios limitada ao disposto no art. 406, com capitalização anual.”.

                  Interessante transcrever, ainda, o verbete do Enunciado nº 20 do CEJ/CJF:

“A taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 é a do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, ou seja, 1% (um por cento) ao mês”.

                  Alguns doutrinadores sustentaram, no entanto, que o artigo 406 do Cógido Civil vigente referia-se à aplicação da Taxa SELIC.[8]

Segundo Mário Luiz Delgado Régis, um dos comentaristas do Novo Código Civil Comentado, coordenado por Ricardo Fiuza, traz a seguinte informação:

“A possibilidade de aplicação da Taxa Selic para cálculo dos juros de mora foi expressamente repelida na I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, no período de 11 a 13 de setembro de 2002, que aprovou enunciado nos seguintes termos: ‘A taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 é a do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, ou seja, 1% (um por cento) ao mês. A utilização da taxa SELIC como índice de apuração dos juros legais não é juridicamente segura, porque impede o prévio conhecimento dos juros; não é operacional, porque seu uso será inviável sempre que se calcularem somente juros ou somente correção monetária; é incompatível com a regra do art. 591 do novo Código Civil, que permite apenas a capitalização anual dos juros, e pode ser incompatível com o art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se resultarem juros reais superiores a 12% (doze por cento) ao ano’.

Todavia, em face da revogação do § 3º do art. 192 da Carta Magna, pela Emenda Constitucional n. 40, de 29-5-2003, entendemos dever ser revisto o enunciado acima.”

                  O conceito mais compreensível da Taxa SELIC é o encontrado no § 1º do artigo 2º da Circular n. 2.868, de 04.03.1999 do BACEN, repetido na Circular n. 2.900, de 24.06.1999, in verbis:

“Define-se taxa SELIC como a taxa média ajustada dos financiamentos diários apurados no Sistema Especial de Liqüidação e de Custódia (SELIC) para títulos federais”.

A Taxa SELIC[9] é um indicador da taxa média de juros nas operações chamadas overnight – modalidade de aplicação de investimento destinada a clientes que necessitam de liquidez diária para os seus recursos – e sua meta é a de, a um certo tempo, cobrir a defasagem da moeda ocasionada pela inflação e remunerar os investidores. A taxa reflete a liquidez dos recursos financeiros no mercado monetário.

Segundo entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, a partir da incidência da taxa SELIC, fica excluída a correção monetária, uma vez que representa a taxa de juros reais e a taxa de inflação no período considerado, não podendo ser aplicada cumulativamente com outros índices de reajustamento (REsp n. 211.155/PR), devendo-se excluir também os juros moratórios, desde então, não podendo ser capitalizados os índices daquela.

                  Vale salientar que algumas tentativas de revisão judicial dos juros foram baseadas nos artigos 406 e 591 do Código Civil atual e no §1º do artigo 161 do CTN, alegando-se que tal limitação se coaduna com a Lei n. 8.078/90, que genericamente traça a proteção necessária ao contratante mais vulnerável e hipossuficiente, o consumidor, pelos próprios princípios que regem a relação de consumo, devendo-se protegê-lo de cobranças abusivas de juros.

                  Todavia, não houve muito sucesso por parte dos consumidores, vez que o Superior Tribunal de Justiça editou a seguinte Súmula (DJ 09.09.2004):

Súmula n. 296. “Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado” (grifado).

                  Os Tribunais, assim, antes do julgamento da Adin n. 2.591, entendiam que a taxa de juros aplicada, ainda que se tratasse de relação de consumo, na maior parte das vezes, era a de mercado, ou seja, a mais prejudicial, porque é a mais onerosa, ao consumidor.

Espera-se que com a decisão da mencionada Adin – favorável ao consumidor – os próximos julgamentos sejam no sentido de revisar os juros do contrato de consumo de forma a equilibrar e proteger o consumidor, não se permitindo mais a taxa média de mercado incidir nos contratos consumeristas.

Indispensável comentar que, em alguns casos, as instituições financeiras trazem no contrato de adesão firmado com o cliente-consumidor a taxa de juros já estipulada, situação na qual não se aplicam os artigos 406 e 591 do Código Civil atual c.c. artigo 161, §1º do Código Tributário Nacional, cabendo ao juiz decidir, pela razoabilidade, já que não há limitação fora estes dispositivos, sobre a taxa de juros que deverá ser aplicada, se houver abusividade por parte da instituição financeira.

Nesses casos os tribunais se posicionam conforme segue ementa atinente, isto é, na maioria das vezes, aceitando os juros abusivos impostos pelos bancos e demais instituições financeiras:

CONTRATO - Empréstimo bancário e renegociações - Ação de revisão - Pretensão à limitação dos juros à Lei de Usura, sob a tese de que falta competência ao Conselho Monetário Nacional - Inadmissibilidade - Lei n. 4.595/64 em vigor em sua maior parte - Taxas de juros livremente contratadas, sem a prova pré-constituída de discrepância da média de mercado - Anatocismo inocorrente - Hipótese em que a cada renegociação de dívida, se dava a ocorrência da consolidação do débito, na qual os juros se fundem ao capital, e de conseguinte, em novo débito - Recurso improvido (Apelação Cível n. 1.007.424-9 - Comarca de Assis - 12ª Câmara de Direito Privado - Relator: Cerqueira Leite - J. 03.05.2006 - V.U. - Voto n. 12.481) (grifado).

Com o fito de melhor elucidar o presente estudo, importante destacar que, a taxa de juros remuneratória atinente a contrato de abertura de crédito em conta-corrente, por exemplo, quando não estipulada está sujeita a limitação presente no Código Civil (artigo 591 c.c. artigo 406 c.c artigo 161, §1º do Código Tributário Nacional).

Em sendo a mencionada taxa de juros estipulada não pode representar uma ofensa aos princípios e direitos prescritos no Código de Defesa do Consumidor[10] (artigo 6º, incisos II, III, IV, V e VI; artigo 39, incisos V, X e XI; artigo 51, inciso IV, X, XI, XIII e XV, e §1º, incisos I, II e III; artigo 52, incisos I, II, III, IV e V, §§ 1º e 2º; artigo 83).

Em relação à capitalização dos juros referida no artigo 591 do Código Civil, conforme corrente jurisprudencial, é vedada, como a seguir se percebe:

1.       “No caso de contrato de empréstimo contraído junto a Instituição Financeira, a taxa de juros remuneratórios não está sujeita ao limite estabelecido pela Lei de Usura (Decreto n. 22.626/33). A capitalização dos juros somente é permitida nos contratos previstos em lei, entre eles as cédulas e notas de créditos rurais, industriais e comerciais, mas não para o contrato de mútuo bancário. Precedentes” (STJ, 3ª T., Resp 184.958/RS, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 01.02.1999) (grifado).

2.       “Na forma de precedentes indiscrepantes, os juros no contrato de mútuo de que cuida este feito não são limitados, sendo, entretanto, vedada a capitalização” (STJ, 3ª T., REsp 248.266/RS, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 6.11.2000).

3.        “DIREITOS COMERCIAL E ECONÔMICO. FINANCIAMENTO BANCÁRIO. JUROS. TETO DE 12% EM RAZÃO DA LEI DE USURA. INEXISTÊNCIA. LEI 4595/64. ENUNCIADO N. 596 DA SÚMULA/STF. CAPITALIZAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO LEGAL. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO. I - ... II - Somente nas hipóteses em que expressamente autorizada por lei específica, a capitalização de juros se mostra admissível. Nos demais casos é vedada, mesmo quando pactuada, não tendo sido revogado pela Lei 4595/64 o art. 4º do Decreto 22.626/33. O anatocismo, repudiado pelo verbete nº 121 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação com o enunciado n.º 596 da mesma Súmula.” (REsp n. 122777, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 27/5/97).

4.       “JUROS. ANATOCISMO. A capitalização de juros é vedada pelo artigo 4º do Decreto 22.626 e a proibição aplica-se também aos mútuos contratados com as instituições financeiras, não atingido aquele dispositivo pela Lei 4.595/64.” (REsp 46515, Rel. Ministro Eduardo Ribeiro, julgado em 13/6/96).

Faz-se necessário destacar a súmula 121 do Supremo Tribunal Federal, a qual determina que “é vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada”.

No que tange à cobrança de comissão de permanência[11], existem duas súmulas do Superior Tribunal de Justiça que tratam do assunto, quais sejam:

Súmula n. 294. “Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato” (DJ 09.09.2004).

Súmula n. 30. “A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis” (DJ 18.10.1991).

Segundo Ernesto de Oliveira S. Thiago Neto (2007) “a comissão de permanência não se constitui em juros remuneratórios ou compensatórios, mas sim em instrumento de atualização monetária do saldo devedor. Exatamente por isto não pode ser cumulada com a correção monetária, e nem ultrapassar seus índices”.

Segue entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, com precedentes, a respeito:

“(...) É admitida a incidência da comissão de permanência após o vencimento da dívida, desde que não cumulada com juros remuneratórios, juros moratórios, correção monetária e/ou multa contratual. Precedentes (...)” (AgRg nos EDcl no REsp 886908 / RS; AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL 2006/0202974-7. Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T.; DJ 14.05.2007) (grifado).

Deve-se lembrar, ainda, que as instituições financeiras, por determinação legal (artigo 17 da Lei 4.595/64), são empresas que trabalham na intermediação de capital, recebendo e repassando numerário. Para essas operações existe um custo denominado spread bancário.

                  O spread bancário é a margem de lucro na prestação do serviço bancário, ou seja, é a diferença entre o que o banco paga para captar numerário (poupança, fundos de renda, e outras modalidades), e o cobrado quando do empréstimo a quem o procura (cheque especial, financiamentos etc.).

                  O banco paga ao consumidor num fundo de investimento o percentual que pode atingir 1,5% ao mês. Já quando empresta a título de cheque especial, por exemplo, cobra algo em torno de 8 a 12% em caráter mensal.

                  Portanto, há um notável desequilíbrio nessa relação jurídica, que, conforme estipula o § 4º (vedação ao abuso do poder econômico) do artigo 173 da Constituição Federal, deve ser reprimido.

                  O Código de Defesa do Consumidor é muito claro ao vedar a utilização do poder econômico no intuito de auferir vantagem indevida por um dos contratantes.

                  Isto se pode depreender do seu artigo 39, incisos V e XI, que trata das práticas abusivas, in verbis:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços:

(...)

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

(...)

XI - aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido;

                  A Lei Consumerista reprime cláusulas abusivas – artigo 51, inciso IV e §1º, incisos I e III –, conforme abaixo:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

(...)

§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

(...)

III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

                  Em que pese a proteção de que dispõe o consumidor após a vigência da Lei n. 8.078/90, o Superior Tribunal de Justiça sempre se mostrou inquebrantável no sentido de manter hígido o entendimento de que as instituições financeiras não se submetem às disposições do Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura) quanto à taxa de juros. Nesse sentido, os Recursos Especiais 258682/RS, 399716/RS e 500011/PR.

Os tribunais foram, na maior parte das vezes, em suas decisões, por tudo o que até o momento se asseverou, a favor das instituições financeiras, o que mais uma vez se pode verificar pela súmula nº 283 do Superior Tribunal de Justiça, abaixo descrita:

“As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso, os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura”[12].

                  Para melhor elucidar o tema ora discutido, podendo crer que o entendimento a respeito da revisão dos juros atribuídos em contratos entre instituições financeiras e consumidores deve mudar daqui para frente, segue a ementa da Adin n.2.591, antes do julgamento dos Embargos de Declaração – conhecidos e providos – interpostos pelo Procurador Geral da República, por omissão e contradição:

“CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5º, XXXII, DA CB/88. ART. 170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E A REMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA [ART. 3º, § 2º, DO CDC]. MOEDA E TAXA DE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DO BRASIL. SUJEIÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. 1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência. 4. Ao Conselho Monetário Nacional incumbe a fixação, desde a perspectiva macroeconômica, da taxa base de juros praticável no mercado financeiro. 5. O Banco Central do Brasil está vinculado pelo dever-poder de fiscalizar as instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das taxas de juros por elas praticadas no desempenho da intermediação de dinheiro na economia. 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consumidor [Lei n. 8.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OBJETIVO. EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE PARA A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO. 7. O preceito veiculado pelo art. 192 da Constituição do Brasil consubstancia norma-objetivo que estabelece os fins a serem perseguidos pelo sistema financeiro nacional, a promoção do desenvolvimento equilibrado do País e a realização dos interesses da coletividade. 8. A exigência de lei complementar veiculada pelo art. 192 da Constituição abrange exclusivamente a regulamentação da estrutura do sistema financeiro. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. ART. 4º, VIII, DA LEI N. 4.595/64. CAPACIDADE NORMATIVA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO, FUNCIONAMENTO E FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ILEGALIDADE DE RESOLUÇÕES QUE EXCEDEM ESSA MATÉRIA. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular de capacidade normativa --- a chamada capacidade normativa de conjuntura --- no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suas atividades no plano do sistema financeiro. 10. Tudo o quanto exceda esse desempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativo produzido pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção de atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitem ao funcionamento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando afronta à legalidade”. (grifado).

Como informado os Embargos de Declaração interpostos pelo Procurador Geral da República foram conhecidos e providos em virtude de omissão e contradição entre os votos dos Ministros e o teor da Ementa acima transcrita.

Para esclarecer, note-se, após o julgamento dos Embargos de Declaração, como restou a Ementa da Adin n. 2.591:

“ART. 3º, § 2º, DO CDC. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5o, XXXII, DA CB/88. ART. 170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE.

1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor.

2. “Consumidor”, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito.

3. Ação direta julgada improcedente”.

Para quem se interessar pelo assunto e quiser se aprofundar sobre o julgamento da Adin n. 2.591, ao ler a íntegra dos votos notará uma grande divergência, entre os Ministros, atinente à questão da competente Lei a dispor sobre os juros, se é complementar[13] ou pode ser ordinária – neste caso aplicando-se os juros delimitados pelo Código Civil, seus artigos 406 e 591, utilizando-se, como foi citado pelo Ministro Eros Grau[14] a taxa de juros Selic nos contratos consumeristas –, já que o Código de Defesa do Consumidor não determina expressamente uma taxa de juros aplicável, bem como se são ilegais as resoluções do Conselho Monetário Nacional que excedam o funcionamento e a fiscalização das instituições financeiras.

Como se percebe, os itens da Ementa que geraram divergências foram retirados em decorrência de terem sido providos os Embargos de Declaração.

O acórdão teria encerrado contradição ao proclamar a total improcedência da Adin e ao mesmo tempo se referido, algumas vezes, em interpretação conforme à Constituição.

O embargante alegou também ter havido contradição no acórdão referente à inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor quanto à fixação dos juros, sendo que a disciplina dos juros praticados pelas instituições financeiras não poderia ter sido excluída das atividades bancárias alcançadas pela Lei Consumerista, tal como consta na ementa, já que o afastamento da Lei n. 8.078/90 “não está contido em qualquer dos votos proferidos pelos Ministros”.

Argúi o embargante ainda que não cabe, de acordo com o julgamento, a restrição contida no item 6 (seis) da Ementa, excluindo o Código de Defesa do Consumidor de suporte para o controle e revisão, pelo poder judiciário, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros.

Pelo provimento dos Embargos de Declaração, o qual sanou algumas contradições prejudiciais à relação de consumo, a Adin n. 2.591 restou favorável ao consumidor, proporcionando que se valha da Lei Consumerista para pleitear a revisão dos juros contratados com instituições financeiras.

Importa ressaltar trechos do voto do Ministro Carlos Britto, proferido no julgamento dos Embargos de Declaração na Adin n. 2.591:

“Dizer que o CDC não se aplica às operações triviais dos bancos é fazer vista grossa para as numerosas taxas com que os bancos tonificam o custo dessas operações de microeconomia. (...) ‘Consumidor’ para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, ‘é toda pessoa física ou jurídica que utiliza como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito.’ Ora, atividade bancária e financeira e de crédito é evidente que incorpora composição de taxa de juros. O Código de Defesa do Consumidor não precisaria dizer: ‘composição da taxa de juros’. Isso já está embutido, logicamente, ao falar de atividade bancária, financeira e de crédito. (...) Quando li a ementa, também me surpreendi com o seguinte: ‘CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5º, XXXII, DA CB/88’ – que é um direito fundamental, faz parte da lista dos direitos e garantias individuais e coletivos. ART. 170, V, DA CB/88 – ou seja, a defesa do consumidor como princípio explícito da ordem econômica. Então, eu entendi que o acórdão estava colocando em ênfase a proteção ao consumidor. Agora vem: ‘INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E A REMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA (ART. 3º, § 2º, DO CDC)’. Ou seja, os bancos enquanto intermediários de dinheiro na economia, aqui, estão fora do Código de Defesa do Consumidor. Ora, os bancos existem pra isso, pra fazer essa intermediação financeira. E excluí-los da aplicabilidade, da abrangência, da proteção do Código do Consumidor é deixar sem sentido todo o Código de Defesa do Consumidor e os artigos 5º, XXXII, e 170 XV, da CF” (grifado).

Certo está que a decisão da Adin n. 2.591 foi favorável ao consumidor. Mas por causa das divergências demonstradas nos votos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, não será tarefa fácil para os advogados formularem suas ações somente com base no Código de Defesa do Consumidor, visto que se trata de normas gerais.

Podem optar por invocar os princípios consumeristas, pedindo a anulação de cláusulas abusivas, quando existir o contrato escrito – no capítulo posterior explanar-se-á melhor sobre o assunto – requerendo a revisão dos juros por meio da adequação das cláusulas contraditórias e excessivas na cobrança de juros, encargos, taxas etc, de acordo com cada caso, tudo como dispõe a Lei Consumerista, que apesar de não ter determinado taxa específica de juros às relações de consumo, no § 2º do seu artigo 3º dela trata implicitamente, ou a aplicação da taxa Selic, segundo os artigos do Código Civil.

Da mesma maneira, não será tarefa fácil para os juízes decidirem se podem ou não interferir[15] – se entenderem pender tal matéria de Lei complementar ou se cabe ao Conselho Monetário Nacional versar sobre o assunto –, na taxa de juros, se a considerarem abusiva; se aplicam o Código Civil e a taxa Selic, mesmo sem a possibilidade do consumidor conhecer os juros, antecipadamente, que lhe serão aplicados, pois é variável e imprevisível, o que fere o Código de Defesa do Consumidor, ao mesmo tempo que lhe favorece muito em comparação à taxa de mercado.

Difícil será encontrar o parâmetro adequado ao que prescreve o Código de Defesa do Consumidor, uma vez que se corre o risco de contrariá-lo ou não satisfazer sua vontade por completo, o que ocasiona injustiça ao consumidor.

IV.            ASPECTOS JURÍDICO-LEGAIS ATINENTES À REVISÃO CONTRATUAL DOS JUROS CONFORME O CÓDIGO CONSUMERISTA

O Código de Defesa do Consumidor, no seu artigo 6°, inciso V, declara o direito básico do consumidor à modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, no que se enquadram as taxas de juros praticadas no mercado financeiro.

É vedado, ainda, ao fornecedor de serviços bancários e creditícios, práticas consideradas abusivas, tais como exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva (artigo 39). Além disso, são consideradas nulas as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações consideradas abusivas (artigo 51), como já mencionado.

A ordem proveniente da Constituição Federal, artigo 5o, inciso XXXII, determinando ao Estado promover a defesa do consumidor, foi o primeiro passo no sentido de consagrar em nosso ordenamento jurídico o princípio da tutela do hipossuficiente. Com efeito, ao se posicionar na defesa de uma das partes contratantes - o economicamente mais fraco na relação contratual -, o Estado limita a liberdade de contratar e faz do negócio jurídico, instrumento de justiça social.

Segundo o magistério de Cláudia Lima Marques (2000, p. 163):

“O primeiro instrumento para assegurar a eqüidade, a justiça contratual, mesmo em face dos métodos unilaterais de contratação em massa, é a interpretação judicial do contrato em seu favor. Inspirado no art. 1.370 do Código Civil Italiano de 1942, o CDC, em seu art. 47, institui como princípio geral a interpretação pró-consumidor das cláusulas contratuais(grifado).

Ainda a mesma autora esclarece que a Lei Consumerista,

“reduz o espaço antes reservado para a autonomia da vontade, proibindo que se pactuem determinadas cláusulas, impondo normas que visam proteger o consumidor, reequilibrando o contrato, garantindo as legítimas expectativas que depositou no vínculo contratual” (Idem, ibidem, p. 165).

No mesmo diapasão entende Nelson Nery Júnior (2005. p. 537):

“O princípio maior da interpretação dos contratos de consumo está insculpido no art. 47 do CDC: ‘as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor’. Isso quer significar que não apenas as cláusulas ambíguas dos contratos de adesão se interpretam em favor do aderente, contra o estipulador, mas o contrato de consumo como um todo, seja ‘contrato de comum acordo’ (contrat de gré à gré), seja de adesão, será interpretado de modo mais favorável ao consumidor”. (grifado).

O contrato deve ser interpretado a fim de proteger o consumidor, não se admitindo, já que é hipossuficiente na relação contratual-jurídica firmada com instituições financeiras, outra forma de interpretação, ou seja, não pode o consumidor restar prejudicado por cláusulas contratuais – de adesão – no que tange às taxas de juros remuneratórios ou advindas de eventual inadimplemento da obrigação.

Nesse sentido, isto é, em relação à modificação das cláusulas contratuais por excessiva onerosidade, está o ensinamento de Nelson Nery Júnior (2005, p. 535):

“Esse princípio modifica inteiramente o sistema contratual do Direito Privado tradicional, mitigando o dogma da INTANGIBILIDADE DO CONTEÚDO DO CONTRATO, consubstanciado no antigo brocardo pacta sunt servanda” (grifado).

E acrescenta:

O juiz, reconhecendo que houve cláusula estabelecendo prestação desproporcional ao consumidor, ou que houve fatos supervenientes que tornaram as prestações excessivamente onerosas para o consumidor, deverá solicitar das partes a composição no sentido de modificar a cláusula ou rever efetivamente o contrato. Caso não haja acordo, na sentença, deverá o magistrado, atendendo aos princípios da boa-fé, da eqüidade e do equilíbrio que devem presidir as relações de consumo, estipular a nova cláusula ou as novas bases do contrato revisto judicialmente. Emitirá sentença determinativa, de conteúdo constitutivo-integrativo e mandamental, vale dizer, exercendo verdadeira atividade criadora, completando ou mudando alguns elementos da relação jurídica de consumo já constituída”. (Idem, ibidem, p. 536) (grifado).

Em relação às cláusulas abusivas do contrato celebrado entre instituições financeiras e consumidores, deve-se frisar o que ensina o ilustre professor acima citado:

A proteção contra cláusulas abusivas é um dos mais importantes instrumentos de defesa do consumidor, importância que se avulta em razão da multiplicação dos contratos de adesão, concluídos com base nas cláusulas contratuais gerais. Além dessa circunstância, a impossibilidade de o aderente discutir as bases do contrato faz com que, no que respeita às relações de consumo, deva haver a necessária proteção contra cláusulas abusivas, que se originam amiúde das cláusulas gerais do contrato”. (Idem, ibidem, p. 519) (grifado).

E continua, o mesmo autor, esclarecendo que:

“O CDC adotou um sistema próprio de enumeração e de proteção contra as cláusulas abusivas. Conferiu-lhes o regime da ‘nulidade de pleno direito’, não estabelecendo graus de invalidade entre elas, tampouco tratando-as como causas de ineficácia da relação jurídica de consumo.

(...)

Não há lugar para falar-se, no sistema do CDC, em nulidade absoluta e nulidade relativa de cláusulas contratuais abusivas. No regime jurídico do CDC, as cláusulas abusivas são NULAS DE PLENO DIREITO porque contrariam a ORDEM PÚBLICA DE PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR. Isso quer dizer que as nulidades podem ser reconhecidas a qualquer tempo e grau de jurisdição, devendo o juiz ou tribunal pronunciá-las ex officio, porque normas de ordem pública insuscetíveis de preclusão”. (Idem, ibidem, p. 521) (grifado).

Diante disso, nota-se o quão importante é a necessidade da aplicação do Código de Defesa do Consumidor em relação aos contratos de adesão firmados entre instituições financeiras e consumidores, haja vista que, pela superioridade de condições que aquelas possuem em comparação com estes, inúmeros abusos ocorrem, sendo que muitas vezes não são reclamados em órgãos de defesa do Consumidor – PROCON – tampouco em Juízo, dadas as retaliações que são impingidas aos clientes, sendo cediço que atualmente os bancos, administradoras de cartão de crédito e demais instituições financeiras possuem a seu favor, além dos órgãos públicos de proteção ao crédito – SERASA E SCPC – um banco de dados interno, a fim de limitarem ou impedirem crédito a consumidores que, por exemplo, propõem ação no intuito de fazer valer seus direitos.

Pelo avanço tecnológico, muitas ofertas de crédito a clientes são realizadas via online, mesmo porque, a quem a instituição financeira tem interesse de emprestar dinheiro a juros altíssimos, a internet é o meio mais utilizado para operações bancárias, contemporaneamente.

Nestes casos, caso o empréstimo, por exemplo, seja realizado sem a presença de um gerente, isto é, por meio da internet, não será disponibilizado um contrato, e se o for, o será sem assinatura.

O banco sabe que, muitas vezes pela extrema necessidade – não o seria diferente, visto que os juros bancários são altíssimos – o cliente não se importa em tomar as devidas informações sobre o que está contratando pela internet. Por isso, talvez, também não se preocupa em esclarecer devidamente ao cliente as condições a que estará obrigado por transferir à sua conta corrente o valor que tomou emprestado.

Dessa maneira, sem contrato, sem as devidas informações a respeito dos juros, taxas e demais encargos que deverá suportar pelo empréstimo, o consumidor, com razão maior, poderá revisar, em caso de abusividade, os juros e todas as taxas e encargos que entender abusivos, até porque o banco deixa, como mencionado, de dar as adequadas informações ao cliente, desrespeitando o tão importante princípio da publicidade contemplado pelo Código de Defesa do Consumidor.

Caso o banco alegue que a anuência ao contrato “disponibilizado” no momento da contratação online pelo cliente se deu de forma adequada aos padrões de sua página na internet, o consumidor deverá requerer a inversão do ônus da prova a seu favor prescrita no artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor, alertando o magistrado de que o banco é o único a ter acesso a tal site, podendo alterá-lo quando lhe for conveniente.

Uma via judicial para o consumidor poder ter acesso ao contrato que firmou com a instituição financeira, caso uma via de igual teor não lhe seja entregue no momento da contratação na presença de um funcionário da instituição ou não lhe seja disponibilizada uma via se contratar o serviço de crédito, por exemplo, pelo telefone, pela internet ou diretamente no caixa eletrônico[16], para que posteriormente possa requerer a revisão de cláusulas contratuais abusivas, é a propositura de uma cautelar de exibição de documentos (artigo 844, inciso II do Código de Processo Civil).

 De qualquer forma, com ou sem contrato, seja na presença de um representante da instituição financeira, seja por telefone, pela internet ou diretamente no caixa eletrônico, o consumidor sempre poderá se valer da revisão dos juros judicialmente, tendo em vista que a relação de consumo deve ser equilibrada, e o contrato entre as partes deve exercer sua função social, não se podendo admitir que uma parte, a mais forte, prevaleça sobre a hipossuficiente recebendo vantagens inadmissíveis, como ocorre com a cobrança de juros abusivos.

V.               Considerações finais

A proteção do consumidor possui dimensão constitucional, sendo um direito fundamental (artigo 5º, inciso XXXII da Constituição Federal) e um princípio conformador da ordem econômica (artigo 170, inciso V da Constituição Federal).

Restou também superado o argumento de que as características dos serviços financeiros não permitiriam jamais a incidência de relação de consumo após a improcedência da Adin 2.591. Tal argumento era utilizado pelas instituições financeiras alegando-se que, por ser a moeda um bem essencialmente circulante, tornaria difícil enquadrar o usuário de serviço bancário como o seu destinatário final.

Entretanto, está declarado que o artigo 3º, § 2º do Código de Defesa do Consumidor é aplicável a instituições financeiras e seus respectivos clientes, neste dispositivo enquadrados, em qualquer tipo de negociação ou contrato.

Nesse sentido, após o julgamento da ADin n. 2591, não se discute mais acerca da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação de consumo estabelecida entre os clientes bancários e instituições financeiras.

Por tal razão, os juros, de acordo com os princípios e preceitos consumeristas expendidos, podem ser revisados e alterados judicialmente, inclusive as cláusulas contratuais consideradas abusivas podem ser anuladas, total ou parcialmente, a qualquer momento e grau jurisdição, ex officio, inclusive, como se viu, porque contrariam a ORDEM PÚBLICA de proteção ao consumidor

  A improcedência da ADin n. 2.591 foi extremamente importante para a segurança e a garantia da dignidade e da proteção do consumidor, que pode se valer, em casos de abusividade na cobrança de juros, da Lei Consumerista para que a relação de consumo seja equilibrada e satisfaça, como relação negocial-jurídica que é, a sua função social, tendo em vista que o Poder Judiciário, desde o Primeiro Grau de Jurisdição, pode adequar os juros, se considerados abusivos.

Todavia, não existindo limitação para a taxa de juros, pelo menos por enquanto, a tarefa do juiz guarda grande complexidade, devendo amparar-se nos princípios e preceitos consumeristas, optando pela saída jurídica, ao revisar os juros, que melhor comportar ao caso concreto.

Por fim, é preciso acreditar que em decorrência da ADin n. 2.591, favorável ao direito consumerista, as decisões advindas de ações revisionais de juros serão coerentes e atenderão à vontade da Justiça, a qual será respeitada se se observar o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor, não se deixando sucumbir à pressão do Poder Econômico, visto que o juiz tem de se amparar num princípio basilar da prestação jurisdicional ao “dizer o direito”, qual seja, o do livre convencimento motivado, lembrando-se de que sua função é de suma importância para uma sociedade mais justa e menos desigual.

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Rodrigues, Silvio. Direito Civil. 28. ed.  São Paulo: Saraiva, vol. 3, 2002.

Notas:

 

 

[1] Vide: http://www.receita.fazenda.gov.br/Pagamentos/jrselic

[2] CONTRATO – Prestação de serviços – Serviços bancários – Juros – Lucro bancário – Inexistência de limitação – Ausência de vedação que o lucro bancário seja superior ao quinto do capital empregado , nos termos do artigo 4º, “b”, da Lei n. 1.521/51 Não configuração de prestação manifestamente desproporcional – Inocorrência de lesão enorme - Recurso provido. (Apelação cível n. 1.011.301-0 – São Paulo - 17ª Câmara de Direito Privado – Relator: Tersio José Negrato – 07.02.07 – M.V. – Voto n. 17925)

[3] CONTRATO – Prestação de serviços – Serviços bancários – Abertura de crédito em conta-corrente (cheque especial) – Possibilidade de revisão judicial de contratos bancários extintos, com a finalidade de afastar cláusulas abusivas – Saldo devedor decorrente da cobrança de tarifas e taxas em conta sem movimentação pelo correntista – Juros contratuais fixados em percentual muito elevado (210,16% a.a.) – Aplicação, na hipótese, da teoria da lesão enorme – Incidência, “in casu”, das disposições do Código de Defesa do Consumidor para a redução da taxa dos juros remuneratórios – Ação procedente – Decisão mantida, mas por fundamentos diversos – Recurso da instituição bancária parcialmente provido. (Apelação Cível n. 944.435-9 – Santos – 20ª Câmara de Direito Privado – Relator: Des. Vasconcellos Boselli – 19.12.05 – V.U. – Voto n. 10.806)

[4] JUROS - Remuneratórios - Contratos bancários - Revisão - Encadeamento de inúmeros contratos de empréstimo bancário - Fixação de juros que varia de 68,42% a.a. a 14.176,49% a.a. - Ausência em um dos contratos de taxa expressa - Inadmissibilidade - Estipulações abusivas e, portanto, nulas - Necessidade de limitação dos juros com base na lei civil - Disposição contratual nula que se considera inexistente - Limitação em juros legais de 6% ao ano nos termos do Código Civil - Inaplicabilidade da Lei de Usura e do limite constitucional, cujo dispositivo, hoje revogado, não era auto-aplicável - Prova pericial comprovando o "spread" abusivo praticado pelo banco - Hipótese em que a limitação em juros legais por si só rechaça tal excesso - Recurso nesta parte parcialmente provido (Apelação Cível n. 929.578-3 - Campinas - 23ª Câmara de Direito Privado - Relator: J. B. Franco de Godoi - 26.10.05 - V.U. - Voto n.12222).

[5] Os Tribunais não acolheram o limite prescrito pela Lei de Usura. Veja ementa a respeito: CONTRATO BANCÁRIO - Mútuo comum - Hipótese em que a avença está representada por pacto de empréstimo - Inaplicabilidade, em regra, da limitação dos juros em 12% ao ano, estabelecida na Lei de Usura (Dec. 22.626/33) (STJ) - RT 819/165.

[6] JUROS CONTRATUAIS - Contrato bancário - Submissão às normas do Código de Defesa do Consumidor - Avença não trazida aos autos - Impossibilidade do conhecimento das taxas de juros aplicadas - Simples análise dos extratos que demonstra a cobrança de juros abusivos - Limitação a 12% ao ano - artigo 192, § 3º da Constituição Federal - Inadmissibilidade - Dispositivo não auto-aplicável, necessitando de legislação complementar regulamentadora, estando, ademais, revogado - Hipótese, entretanto, que a fixação da taxa sem conhecimento do consumidor é abusiva, nos termos do Código de Defesa do Consumidor - Limitação do juros reais em 6% ao ano - Arts. 1062 e 1063 do Código Civil de 1916 - Recurso provido em parte para este fim. (Apelação 973.466-9 - Andradina - 23ª Câmara - j. 15/06/2005 - Rel. Desembargador J.B. FRANCO DE GODOI - V.U.) (grifado).

[7] JUROS CONTRATUAIS – Contrato bancário – Inaplicabilidade da limitação da taxa de juros de 12% ao ano, estabelecida no Decreto n. 22.626/33 - Necessidade, entretanto, de fixação de patamares para sua aplicação, de modo que o índice dos juros, somados à correção monetária, deve ser balizado pela taxa SELIC, cujo percentual reflete a taxa média de mercado - Refazimento do cálculo, afastando-se a capitalização - Necessidade - Sentença reformada, determinando-se, na hipótese de haver saldo em favor do autor, a restituição de valores, acrescidos de encargos correspondentes a juros remuneratórios, correção monetária, comissão de permanência, juros de mora e multa – Recurso provido. (Apelação Cível n. 996.583-3 – São Paulo - 14ª Câmara de Direito Privado – Relator: Virgilio de Oliveira Junior - 08.02.06 - V.U. – Voto n. 4.254) (grifado).

[8] “REsp. 328.501 2. A utilização dos juros, tomando-se por base a taxa SELIC, afasta a cumulação de qualquer índice de correção monetária. Este fator de atualização de moeda já se encontra considerado nos cálculos fixadores da referida taxa”.

[9] JUROS CONTRATUAIS – Contrato bancário – Inaplicabilidade da limitação da taxa de juros de 12% ao ano, estabelecida no Decreto n. 22.626/33 - Necessidade, entretanto, de fixação de patamares para sua aplicação, de modo que o índice dos juros, somados à correção monetária, deve ser balizado pela taxa SELIC, cujo percentual reflete a taxa média de mercado - Refazimento do cálculo, afastando-se a capitalização - Necessidade - Sentença reformada, determinando-se, na hipótese de haver saldo em favor do autor, a restituição de valores, acrescidos de encargos correspondentes a juros remuneratórios, correção monetária, comissão de permanência, juros de mora e multa – Recurso provido. (Apelação Cível n. 996.583-3 – São Paulo - 14ª Câmara de Direito Privado – Relator: Virgilio de Oliveira Junior - 08.02.06 - V.U. – Voto n. 4.254).

[10] JUROS REMUNERATÓRIOS - Cheque especial - Cobrança - Empréstimo - Cláusula potestativa - Revisão com base no Código de Defesa do Consumidor - Aplicação da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça - Credor que não informou previamente ao consumidor qual a taxa que seria cobrada para o mês seguinte - Possibilidade do juiz modificar a taxa aplicada - Recurso não provido. (Apelação Cível n. 1.040.701-5 - São Paulo - 15ª Câmara de Direito Privado - Relator: Antonio Ribeiro - 22.11.05 - V.U. - Voto n. 2261).

[11] COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – Contratos Bancários – Revisão – Possibilidade da incidência da comissão de permanência prevista – A cláusula que prevê a comissão de permanência é lícita desde que calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil e desde que não cumulada com juros remuneratórios, limitada a taxa de contrato (Súmula 294 do STJ) – Recurso parcialmente provido (Apelação Cível n. 7.022.493-6 - Piracicaba - 20ª Câmara de Direito Privado - Relator: Francisco Giaquinto – 30.01.07 - V.U. - Voto n.1.205).

Comissão de permanência - Contrato - Abertura de crédito em conta corrente - Exigência às maiores taxas de mercado - Inadmissibilidade porque viola o art. 51, incs. III e X do Código de Defesa do Consumidor , estabelecendo obrigação abusiva, incompatível com a boa-fé e equidade, através da variação unilateral de preço - Possibilidade da cobrança desde que prevista no contrato, porém só até o limite do juros remuneratórios previamente fixado pelas partes - Ação de revisão de clausulas contratuais parcialmente procedente - Recurso desprovido. (Apelação n. 1164268-9 - Viradouro - 14ª Câmara de Direito Privado - 14/12/05 - Rel. Pedro Alexandrino Ablas - v.u - V. 256).

[12] JUROS – Remuneratórios – Cartão de crédito – Ação de revisão de saldo devedor e repetição de indébito em dobro – Improcedência – As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras não sofrendo as limitações da lei de usura – Alegada abusividade afastada na cobrança de juros remuneratórios acima dos 12% ao ano, independentemente da estabilidade inflacionária no período – Abusividade que deve ser declarada, caso a caso, à vista de taxa que comprovadamente discrepe, de modo substancial, da média do mercado na praça do empréstimo, salvo se justificada pelo risco da operação – Improcedência mantida – Recurso improvido (Apelação Cível nº 7.085.046-7 – Santos – 11ª Câmara de Direito Privado - Relator: Gilberto dos Santos – 05.10.06 – V.U. – Voto n. 8.360)

[13] Trecho do voto do Ministro Néri da Silveira, proferido no julgamento dos Embargos de Declaração na Adin n. 2.591: “[...] Há dois planos distintos. É interditada a aplicação do Código do Consumidor em se tratando daquelas matérias concernentes ao art. 192, da Constituição, para as quais a Lei Maior previu a edição de lei complementar. São aquelas matérias que respeita à estrutura do sistema financeiro e ao funcionamento das instituições financeiras. São normas que a própria Constituição estipula ficarem sujeitas à regulação de lei complementar”.

[14] Trecho do voto do Ministro Eros Grau, proferido no julgamento da Adin n. 2.591: “Daí porque tenho como indispensável a coibição de abusos praticados quando instituições financeiras acrescentam à taxa base de juros, a chamada taxa SELIC, taxas adicionais de serviços e outros que tais. Vale dizer: tudo quanto exceda a taxa base de juros, os percentuais que a ela são adicionados e findam por compor o spread bancário, tudo isso pode e deve ser controlado pelo Banco Central e, se o caso, pelo Poder Judiciário. Não incide, contudo, sobre esta matéria --- repito: definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia --- não incide, dizia eu, o micro sistema do Código de Defesa do Consumidor, mas sim o Código Civil”.

[15] Trecho do voto do Ministro Eros Grau proferido nos Embargos de Declaração na Adin n. 2.591: “A ementa efetivamente é explícita ao afirmar que incumbe ao Conselho Monetário Nacional a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia, providência essencial à formulação das políticas monetária e de crédito do Estado, cuja racional elaboração é essencial à efetividade da soberania nacional. Atribuir a órgãos de defesa do consumidor e/ou mesmo ao Poder Judiciário essa definição seria insensato e colocaria em risco a continuidade da atividade estatal”.

Trecho do voto do Ministro Marco Aurélio proferido no julgamento dos Embargos de Declaração na Adin n. 2.591: “Com efeito, a submissão das instituições financeiras ao Código do Consumidor não pressupõe a afirmativa de que tal conjunto de normas efetivamente dispõe sobre juros, ou ainda de que sirva como fundamento de validade para que os órgãos jurisdicionais modifiquem, arbitrariamente, as taxas de juros. Certamente, o Código do Consumidor não outorga competência para a definição da política financeira e orçamentária. Como demonstrou S. Excelência o ministro relator (Eros Grau), ‘essa poderosa capacidade de criação de riqueza abstrata não pode ficar sujeita a administração desde a perspectiva das relações microeconômicas, sob pena de comprometimento dos objetivos que o artigo 192 da Constituição visa a realizar, o desenvolvimento equilibrado do País e a satisfação do interesse da coletividade’”.

[16] CONTRATO – Bancário – Revisão – Contratação realizada através de Caixa Eletrônico - Ausência de estipulação do percentual dos juros remuneratórios – Fixação em 1% ao mês – Precedentes – Capitalização de juros – Inadmissibilidade – Hipótese em que, referido contrato não é regido por legislação especial – Decisão reformada – Recurso provido (Apelação Cível n. 7.046.034-9 – São Paulo – 22ª Câmara de Direito Privado – Relator: Campos Mello – 28.03.06 – V.U. – voto n. 13703).

(Elaborado em 23/05/2007)

 

Como citar o texto:

ÁRIAS, Elisângela Fernandez.A revisão judicial dos juros bancários sob a égide do Código de Defesa do Consumidor. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 230. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-consumidor/1767/a-revisao-judicial-juros-bancarios-sob-egide-codigo-defesa-consumidor. Acesso em 27 mai. 2007.

Importante:

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