No próximo dia 25, a Lei 12.651/2012, que instituiu o chamado Novo Código Florestal (NCF), fará seu primeiro aniversário.

            Muitas foram as dúvidas sobre as mudanças que a nova legislação traria às ações civis públicas (ACP), com objetivo de exigir o cumprimento de obrigações relacionadas à área de preservação permanente (APP) e à reserva legal (RL), ajuizadas na vigência da legislação revogada.

            Apesar do pouco tempo de vigência da nova legislação, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) já analisou algumas das referidas ACP’s, o que permite visualizar os possíveis rumos da Jurisprudência do egrégio Tribunal.

            Passamos, pois, a analisar alguns posicionamentos do Tribunal.

 

I – AS ACP’S EM ANDAMENTO DEVEM SER ANALISADAS SOB A ÓTICA DO NCF?

            O TJ-SP tem entendido que o NCF deve ser aplicado a todas as ações em andamento, mesmo nos casos em que o julgamento de primeira instância analisou a demanda com base na legislação revogada.

            O trecho do julgado abaixo ratifica esse entendimento:

“(...)

Por primeiro, conquanto tenha sido proferida na vigência da legislação da época em que a ação foi proposta, necessário salientar a necessidade da aplicação da lei nova concernente à matéria sob exame (Leis n° 12.651/12 e 12.727/12), a teor do art. 462 do Código de Processo Civil, já tendo decidido a respeito o Colendo STJ: “As normas legais editadas após o ajuizamento da ação devem levar-se em conta para regular a situação exposta na inicial” (STJ-3ª T., REsp 18.443-0-SP EDcl-EDcl, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 29.6.93, DJU 9.8.93, p. 15.228).”

(...)

(2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0002196-12.2011.8.26.0210 – Relator Paulo Celso Ayrosa M. De Andrade – Julgamento: 25/04/2013)

            No mesmo sentido:

“(...)

A sentença foi proferida na vigência da legislação da época em que a ação foi proposta, o que não impede a aplicação da lei nova, a teor do artigo 462, do Código de Processo Civil. Nesse sentido, já se decidiu que “As normas legais editadas após o ajuizamento da ação devem levar-se em conta para regular a situação exposta na inicial” (STJ-3ª T., REsp 18.443-0-SP EDcl-EDcl, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 29.6.93, DJU 9.8.93, p. 15.228).

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0242689-66.2009.8.26.0000 (994.09.242689-3) – Relator: Antonio Celso Aguilar Cortez – Julgamento: 18/04/2013).

            Em outro julgado, os ilustres Desembargadores afirmaram que a nova legislação não modifica o entendimento estabelecido com base na legislação revogada. Confira-se:

(...)

Registre-se que com a promulgação do Código Florestal - Lei 12.651, em 25 de maio de 2012, com as alterações da Lei 12.727/12, a composição da lide deve se fazer com a aplicação da legislação nova, à vista do disposto no artigo 462 do Código de Processo Civil. E ainda que menos rigorosa, a legislação atual não modifica a interpretação pretoriana a respeito do tema, embasada no pilar central do ordenamento específico, isto é, o artigo 225 da Constituição Federal.

(...)

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0010412-48.2010.8.26.0322 – Relator: João Negrini Filho – Julgamento: 24/04/2013).

II – A POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DA ÁREA DE APP PARA COMPOSIÇÃO DA ÁREA DE RL MODIFICA A TRAMITAÇÃO DA ACP?

            No que diz respeito à possibilidade de cômputo da área de APP para composição da área de RL, grande vitória dos proprietários de terras nas discussões que antecederam a aprovação do NCF, o TJ-SP tem entendido que, não obstante ocorra substancial mudança na execução do objeto da ação, tal mudança não altera a tramitação da ACP, pois a composição da área de RL só será verificada, pelo órgão ambiental, no momento da análise do projeto de recuperação que será apresentado pelo proprietário da terra.

            Confira-se trecho de alguns julgados que ratificam esse entendimento:

“(...)

Observo que o novo diploma legal permite o cômputo da área de preservação permanente na reserva legal, desde que preenchidos os requisitos de seu art. 15, devendo a autoridade administrativa, quando da apreciação do projeto de instituição da reserva legal, observar se tais requisitos foram atendidos.

(...)”

(2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0002196-12.2011.8.26.0210 – Relator Paulo Celso Ayrosa M. De Andrade – Julgamento: 25/04/2013)

“(...)

Saliento que a nova lei permite o cômputo da área de preservação permanente na reserva legal desde que preenchidos os requisitos do artigo 15 do Novo Código Florestal. Logo, caso seja cabível, o requerente constará tal pedido no projeto de instituição da reserva legal, devendo a autoridade administrativa, quando da apreciação, observar se mencionados requisitos foram atendidos.

(...)”

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0008314-78.2011.8.26.0541 – Relator: Ruy Alberto Leme Cavalheiro – Julgamento: 28/02/2013).

III – COMO, EM SÃO PAULO, O CAR AINDA NÃO FOI INSTITUÍDO, A OBRIGAÇÃO DE AVERBAÇÃO DA RL NA MATRÍCULA DO IMÓVEL ESTÁ SUSPENSA?

            A obrigatoriedade de averbação da RL na matrícula do imóvel tem gerado grande controvérsia. O NCF estabelece, em seu artigo 18, §4, que:

“Art. 18 - A área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR de que trata o art. 29, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.

(...)

            § 4º - O registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis, sendo que, no período entre a data da publicação desta Lei e o registro no CAR, o proprietário ou possuidor rural que desejar fazer a averbação terá direito à gratuidade deste ato.”

            O texto não deixa a menor dúvida de que, no âmbito do NCF, o registro do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR) desobriga a averbação da RL na matrícula do imóvel.

Ocorre que o CAR, no estado de São Paulo, ainda não foi instituído. Não obstante a criação esteja prestes a ocorrer, surge a seguinte dúvida: se o CAR ainda não foi instituído, estaria suspensa a obrigação de averbar a RL na matrícula do imóvel?

            O TJ-SP tem entendido que, enquanto não instituído o CAR, o proprietário deve proceder à averbação da RL na matrícula do imóvel. Confiram-se alguns julgados que demonstram esse entendimento:

 “(...)

Mesmo porque a dispensa da averbação só seria possível, nos termos do § 4º do art. 18 do Novo Código Florestal, se esta estiver registrada no Cadastro Ambiental Rural (CAR), o qual ainda não foi implementado no Estado de São Paulo, e até que o seja, permanece a obrigação de se proceder à averbação, como determinava o antigo Código, nos termos do já decidido pela E. Corregedoria Geral de Justiça no Processo nº 44/20121.

“(...)

(2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0250933-76.2012.8.26.0000 – Relatora: Vera Angrisani – Julgamento: 21/03/2013)

“(...)

Nessas circunstâncias, frise-se, os apelantes deverão apresentar junto ao órgão ambiental o projeto de demarcação da área de reserva legal para aprovação e recomposição nos prazos estabelecidos pela Lei n° 12.651/12, e providenciar ainda o registro da área de reserva legal no órgão ambiental competente por meio de inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural, previsto nos arts. 29 e seguintes do novo Código Florestal. Insta anotar que nada obsta a que, enquanto não foi instituído o CAR no Estado de São Paulo, promovam os recorrentes a inscrição da área de preservação perante o Registro Imobiliário. Este registro não tem como finalidade única a delimitação da área de proteção ambiental de 20% do imóvel, impedindo que possa ser alterada ao bel prazer do proprietário rural, mas também dar ciência a terceiros de sua existência e localização, de molde a permitir a fiscalização de sua manutenção e preservação, comprometendo eventuais sucessores, posto que ‘propter rem’.

(...)

(2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0002196-12.2011.8.26.0210 – Relator Paulo Celso Ayrosa M. De Andrade – Julgamento: 25/04/2013)

“(...)

A reserva legal poderá ser inscrita no CAR ou no cartório de registro de imóveis, sendo dispensada neste último caso somente se houver a devida inscrição no CAR. No entanto, se no momento da execução ainda não houver a implantação do CAR ou se o registro não for aprovado naquele órgão, permanece a obrigação de averbar a reserva legal perante o respectivo cartório de registro de imóveis.

(...)”

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Apelação nº 0008314-78.2011.8.26.0541 – Relator: Ruy Alberto Leme Cavalheiro – Julgamento: 28/02/2013).

            É importante registrar que a Lei n.° 6.015/73, conhecida como Lei de Registros Públicos, também prevê a obrigação de averbar a RL na matrícula do imóvel. Conquanto o NCF tenha dispensado a averbação na matrícula quando o imóvel estiver cadastrado no CAR, o referido Código não revogou expressamente a obrigação contida na Lei de Registros Públicos.

            O TJ-SP, na grande maioria dos julgados, ao analisar a obrigação de averbar a RL na matrícula do imóvel, não considerou a previsão contida na Lei de Registros Públicos. No entanto, encontramos um julgado da 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente onde a Lei de Registros Públicos é expressamente citada. Na referida decisão a colenda Câmara manteve o entendimento de que a averbação da RL na matrícula do imóvel só é obrigatória enquanto não instituído o CAR. Confira-se trecho do julgado:

“(...)

Além disso, o art. 167, inciso II, número 22, da Lei de Registros Públicos prevê que a reserva legal deve ser averbada no registro de imóveis:

 

Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.

 

II - a averbação:

 

 22 - da reserva legal; (Incluído pela Lei nº 11.284, de 2006).

Por todas essas razões, enquanto não instituído o CAR, persiste a obrigação de se averbar a reserva legal no registro de imóveis, como condição necessária para proteger o meio ambiente, devido à observância do princípio da publicidade.

(...)”

(2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0237312-12.2012.8.26.0000 – Relator: Roberto Midolla – Julgamento: 21/03/2013).

 

 

IV – O PROPRIETÁRIO É OBRIGADO A REPARAR O DANO QUE NÃO CAUSOU?

            A vigência do NCF não alterou entendimento do TJ-SP sobre a responsabilidade pelo dano ambiental. Prevalece o entendimento de que a obrigação de reflorestar é propter rem, ou seja, a obrigação se transfere ao atual proprietário ou possuidor, mesmo que ele não seja o causador do dano. Confiram-se alguns julgados nesse sentido:

“(...)

Com efeito, não vinga o argumento de que a responsabilidade pelo crime ambiental não poderia alcançar os apelantes, visto que o desmatamento ocorreu nos idos de 1965, período anterior à aquisição das terras e, segundo o qual, não havia proteção legal. De plano deve ser dito que no âmbito do Direito

Ambiental, a responsabilidade é ‘propter rem’, isto é, vincula a pessoa à coisa ou, por outras palavras, estende a responsabilidade pela reparação dos danos a todos que detenham a posse de imóvel, não importando se contribuíram ou não para o desmatamento.

(...)”

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0010412-48.2010.8.26.0322 – Relator: João Negrini Filho – Julgamento: 24/04/2013).

“(...)

Mais ainda e coerente com isso, a reserva legal ambiental possui feição ‘propter rem’. Ter a propriedade ou posse é o quanto basta. Inclusive, a jurisprudência evoluiu e se antes exigia o nexo causal, ao depois passou a entender que a obrigação adere ao imóvel, bastando à posse ou propriedade.

(...)”

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0008314-78.2011.8.26.0541 – Relator: Ruy Alberto Leme Cavalheiro – Julgamento: 28/02/2013).

V – AINDA SERÁ APLICADA A PENA DE SUSPENSÃO DO DIREITO AO ACESSO A INCENTIVOS FISCAIS E FINANCIAMENTOS?

Com relação à suspensão do direito ao acesso a incentivos fiscais e financiamentos, punição muitas vezes aplicada aos proprietários com imóveis em desacordo com a legislação ambiental, o TJ-SP tem entendido que tal punição não está adequada à sistemática trazida pelo NCF. Confiram-se alguns julgados que ratificam esse entendimento:

“(...)

Por último, nada aponta para a necessidade de punir antecipadamente os apelantes com a proibição de obter incentivos e benefícios fiscais e financiamento, de modo a dificultar ainda mais o cumprimento da sentença. Deve-se ressaltar, entretanto, que o artigo 78-A do novo Código Florestal determina que após cinco anos da data de sua publicação, `as instituições financeiras só concederão crédito agrícola, em qualquer das suas modalidades, para proprietários de imóveis rurais que estejam inscritos no Cadastro Ambiental Rural CAR e que comprovem a sua regularidade nos termos desta Lei`.

(...)”

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 9111975-59.2009.8.26.0000 (994.09.254199-8) – Relator Antonio Celso Aguilar Cortez – Julgamento: 18/04/2013)

(...)

Por fim, afasta-se a vedação ao recebimento de benefícios ou incentivos fiscais, bem como financiamento estatais e privados. Isto porque se mostra contraditória com as disposições do novo Código Florestal que buscou incentivar e facilitar a regularização ambiental, inclusive concedendo financiamentos. Além disso, a fixação de ‘astreintes’ se mostra suficiente para compelir ao cumprimento das obrigações impostas.

(...)

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0008314-78.2011.8.26.0541 – Relator: Ruy Alberto Leme Cavalheiro – Julgamento: 28/02/2013).

            Portanto, a tendência é que o tribunal, em um primeiro momento, deixe de aplicar a referida pena.

VI – QUAL PRAZO SERÁ CONCEDIDO PARA APRESENTAÇÃO DO PROJETO DE RECUPERAÇÃO?

            Diante das obrigações impostas pelo NCF, o TJ-SP tem aumentado o prazo para apresentação do projeto de recuperação da RL e da APP. O prazo costumeiramente concedido, de 90 dias, passou a ser de 180 dias. Confira-se:

“(...)

Concede-se, assim, o prazo de 180 dias para apresentação ao órgão ambiental estadual competente, do projeto de demarcação da área de reserva legal, após cuja aprovação deverá, em até dois anos contados a partir da data de publicação da Lei n° 12.651/12, ser iniciado o processo de sua recomposição.

(...)”

(2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0002196-12.2011.8.26.0210 – Relator Paulo Celso Ayrosa M. De Andrade – Julgamento: 25/04/2013)

VII – DIANTE DA PREVISÃO CONTIDA NO ARTIGO 59, PARÁGRAFO 5º, DO NCF, COM FICARÃO AS SANÇÕES DECORRENTES DO DANO AMBIENTAL?

No que se refere à suspensão das sanções decorrentes de infrações ambientais, prevista no artigo 59 e seguintes do NCF, encontramos um julgado afirmado que tal benefício só deve ser concedido a novas infrações e que o referido dispositivo não prejudica o dever de recomposição. Confira-se o trecho do julgado:

“(...)

A regra de que trata o art. 59 da Lei n. 12.651/2012 deve ser interpretada de modo restritivo e se aplica apenas às novas autuações e medidas derivadas do exercício do poder de polícia do Estado. Ou seja, a norma se refere à suspensão da punibilidade e exigibilidade das sanções decorrentes de infrações administrativas, por supressão de vegetação ocorrida antes de 22 de julho de 2008, não atingindo provimentos jurisdicionais relativos à responsabilidade civil ambiental.

Ademais, a anistia regulamentada pelos arts. 61-A e ss. do novo estatuto florestal não isenta o degradador dos deveres de recompor a área de preservação permanente e constituir a reserva legal, que devem se dar nos moldes autorizados pelo órgão ambiental competente, observadas as regras estabelecidas nos referidos preceitos legais.

(...)

Portanto, o novo Código Florestal não extinguiu de modo geral e irrestrito a ilicitude de condutas anteriores a 22 de julho de 2008, descabendo falar em superveniência de falta de interesse processual.

(...)”

(1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Processo nº 0001448-77.2011.8.26.0210 – Relator: Paulo Alcides – Julgamento: 18/04/2013).

            Vale registrar que o colendo Superior Tribunal de Justiça já analisou um recurso onde se questiona a situação das multas ambientais após a vigência do NCF. Na oportunidade, o Ministro Herman Benjamin entendeu que os autos de infrações, lavrados na vigência da lei revogada, permanecem “válidos e blindados como atos jurídicos perfeitos”. Confira-se o julgado:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. NOVO CÓDIGO FLORESTAL (LEI 12.651/2012). REQUERIMENTO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO CONTRA ACÓRDÃO.

INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. RECEBIMENTO COMO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC NÃO APONTADA. AUTO DE INFRAÇÃO. IRRETROATIVIDADE DA LEI NOVA. ATO JURÍDICO PERFEITO.

DIREITO ADQUIRIDO. ART. 6º, CAPUT, DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO.

1. Trata-se de requerimento apresentado pelo recorrente, proprietário rural, no bojo de "ação de anulação de ato c/c indenizatória", com intuito de ver reconhecida a falta de interesse de agir superveniente do Ibama, em razão da entrada em vigor da Lei 12.651/2012 (novo Código Florestal), que revogou o Código Florestal de 1965 (Lei 4.771) e a Lei 7.754/1989. Argumenta que a nova legislação "o isentou da punição que o afligia", e que "seu ato não representa mais ilícito algum", estando, pois, "livre das punições impostas". Numa palavra, afirma que a Lei 12.651/2012 procedera à anistia dos infratores do Código Florestal de 1965, daí sem valor o auto de infração ambiental lavrado contra si e a imposição de multa de R$ 1.500, por ocupação e exploração irregulares, anteriores a julho de 2008, de Área de Preservação Permanente nas margens do rio Santo Antônio.

2. O requerimento caracteriza, em verdade, pleito de reconsideração da decisão colegiada proferida pela Segunda Turma, o que não é admitido pelo STJ. Nesse sentido: RCDESP no AgRg no Ag 1.285.896/MS, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Segunda Turma, DJe 29.11.2010; AgRg nos EREsp 1.068.838/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe 11.11.2010; PET nos EDcl no AgRg no Ag 658.661/MG, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, DJe 17.3.2011;RCDESP no CC 107.155/MT, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Segunda Seção, DJe 17.9.2010; RCDESP no Ag 1.242.195/SP, Rel.Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 3.9.2010. Por outro lado, impossível receber pedido de reconsideração como Embargos de Declaração, sob o manto do princípio da fungibilidade recursal, pois não se levanta nenhuma das hipóteses do art. 535 do CPC.

3. Precedente do STJ que faz valer, no campo ambiental-urbanístico, a norma mais rigorosa vigente à época dos fatos, e não a contemporânea ao julgamento da causa, menos protetora da Natureza: O "direito material aplicável à espécie é o então vigente à época dos fatos. In casu, Lei n. 6.766/79, art. 4º, III, que determinava, em sua redação original, a -faixa non aedificandi de 15 (quinze) metros de cada lado- do arroio" (REsp 980.709/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 2.12.2008).

4. Ademais, como deixa claro o novo Código Florestal (art. 59), o legislador não anistiou geral e irrestritamente as infrações ou extinguiu a ilicitude de condutas anteriores a 22 de julho de 2008, de modo a implicar perda superveniente de interesse de agir. Ao contrário, a recuperação do meio ambiente degradado nas chamadas áreas rurais consolidadas continua de rigor, agora por meio de procedimento administrativo, no âmbito de Programa de Regularização Ambiental - PRA, após a inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural - CAR (§ 2°) e a assinatura de Termo de Compromisso (TC), valendo este como título extrajudicial (§ 3°). Apenas a partir daí "serão suspensas" as sanções aplicadas ou aplicáveis (§ 5°, grifo acrescentado). Com o cumprimento das obrigações previstas no PRA ou no TC, "as multas" (e só elas) "serão consideradas convertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente".

5. Ora, se os autos de infração e multas lavrados tivessem sido invalidados pelo novo Código ou houvesse sido decretada anistia geral e irrestrita das violações que lhe deram origem, configuraria patente contradição e ofensa à lógica jurídica a mesma lei referir-se a "suspensão" e "conversão" daquilo que não mais existiria: o legislador não suspende, nem converte o nada jurídico.

Vale dizer, os autos de infração já constituídos permanecem válidos e blindados como atos jurídicos perfeitos que são - apenas a sua exigibilidade monetária fica suspensa na esfera administrativa, no aguardo do cumprimento integral das obrigações estabelecidas no PRA ou no TC. Tal basta para bem demonstrar que se mantém incólume o interesse de agir nas demandas judiciais em curso, não ocorrendo perda de objeto e extinção do processo sem resolução de mérito (CPC, art. 267, VI).

6. Pedido de reconsideração não conhecido.”

(PET no Resp 1240122/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/10/2012, DJe 19/12/2012). Grifos nossos.

            Esse é, portanto, o atual posicionamento da Jurisprudência de Tribunal de Justiça de São Paulo, no que diz respeito às ações civis públicas ajuizadas na vigência do Código Florestal revogado.

            É importante registrar que, como é um assunto ainda muito novo, o posicionamento pode ser alterado a qualquer momento. Também é importante registrar que o Superior Tribunal de Justiça ainda não se manifestou sobre a grande maioria dos pontos abordados neste trabalho, sendo certo que o entendimento do referido tribunal pode modificar o posicionamento do TJ-SP.

            Estamos à disposição para esclarecer eventuais dúvidas.

Cleiton Soares de Souza

OAB/SP: 232.499

Site: www.cssouza.com

 

 

Elaborado em maio/2013

 

Como citar o texto:

SOUZA, Cleiton Soares de..Primeiro aniversário do novo código florestal: entendimento do TJ-SP sobre a aplicação da nova legislação nas ações civis públicas ajuizadas na vigência do código revogado. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1115. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-agrario/2809/primeiro-aniversario-novo-codigo-florestal-entendimento-tj-sp-aplicacao-nova-legislacao-nas-acoes-civis-publicas-ajuizadas-vigencia-codigo-revogado. Acesso em 1 nov. 2013.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.