Resumo: O Juizado Especial Cível reclama uma interpretação à luz emanada pelos valores de maciça relevância para a Constituição Federal de 1988. Isto é, cabe ao Arquiteto do Direito observar, de forma imperiosa, a tábua principiológica, considerada como essencial e exaltada como fundamental dentro da Carta Magna do Estado Brasileiro, ao aplicar a legislação abstrata ao caso concreto. A exemplo de tal afirmativa, pode-se citar tábua principiológica que orienta a interpretação das normas atinentes ao microssistema do Juizado Especial. Nesta senda, não se pode olvidar que os critérios que informam a atuação do Juizado Especial Cível são desdobramentos emanados dos princípios inspiradores do processo civil tradicional, aos quais se subordinam, estando em nível inferior, pois seria inconcebível que por força da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, fossem desprezados os preceitos fundamentais como o do contraditório e da ampla defesa, do devido processo legal (dwe process of law) e da fundamentação dos atos decisórios, compreendendo-se decisões e sentença. Com o alicerce no pontuado, salta aos olhos a necessidade de desnudar tal assunto, com o intento de afastar qualquer possível desmistificação, com o fito primordial de substancializar um entendimento mais robusto acerca do tema. Ainda nessa senda, o presente buscará, de maneira singela, explicitar a proeminência do princípio da pacificação, utilizando, para tanto, o instituto da conciliação como instrumento apto.

Palavras-chave: Juizado Especial. Autonomia Privada. Conciliação.

Sumário: 1 Comentários Introdutórios; 2 A Mens Legis da Lei dos Juizados Especiais; 3 A Valoração dos Princípios na Lei 9.099/1995: A Influência do Pós-Positivismo no Ordenamento Brasileiro; 4 Notas ao Princípio da Autonomia Privada em sede de Conciliação: Singelos Apontamentos

1 Comentários Introdutórios

Em uma primeira plana, ao se analisar sobre o tema colocado em debate, cuida salientar que a Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de arcabouço doutrinário e técnico, tal como as diversas ramificações que a constituem, vindica uma interpretação estruturada nos plurais aspectos modificadores que passaram a influir em sua formação. Nesta toada, explicitando, de maneira robusta, os aspectos característicos de mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-se imperioso frisar, com grossos tracejos, que não mais prospera a ótica que os preceitos são limitados e estanques, indiferentes às carências e mazelas sociais que passaram a emoldurar os arcabouços normativos. Desta feita, em decorrência das ponderações expendidas, denota-se que não mais subsiste a visão que, em período pretérito, sustentava e orientava a aplicação das leis, sendo, devido às necessidades da sociedade, suprimidos em uma nova sistemática.

Quadra desfraldar como pavilhão de interpretação o “brocardo jurídico -Ubi societas, ibi jus-, ou seja, -Onde está a sociedade, está o Direito-, tornando explícita e cristalina a relação de interdependência que esse binômio mantém[2]. Observa-se, desta maneira, que há uma interação edificada na mútua dependência, eis que o primeiro tem seus princípios sedimentados no constante processo de evolução da sociedade, com o objetivo de que seus Diplomas Legislativos e institutos não fiquem maculados de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta singular dependência das regras acinzeladas pelo Ordenamento Pátrio, cujo escopo principal é assegurar que não haja uma vingança privada, afastando, por extensão, qualquer ranço que rememore o longínquo passado em que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho, dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça um cenário caótico da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[3], imprescindível se fez adotá-la como maciço pilar de sustentação do Ordenamento Brasileiro, principalmente quando se objetiva a adequação do texto legal, genérico e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas necessidades que influenciam a realidade contemporânea. Nesta esteira de exposição, imperiosamente, há que se citar o voto magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua beleza”[4]. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência Jurídica descansa justamente na constante e imprescindível mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos Diplomas Legais.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma rotunda independência dos estudiosos e profissionais da Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma progressiva evolução acerca do valor atribuído aos princípios em face da legislação[5]. Destarte, a partir de uma análise profunda de sustentáculos, infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

2 A Mens Legis da Lei dos Juizados Especiais

Em um primeiro momento, a fim de se compreender a essência orientadora dos Juizados Especiais, imprescindível faz-se abordar os Juizados Especiais de Pequenas Causas, instituído pela Lei Nº. 7.244, de 07 de Novembro de 1984[6], que dispõe sobre a criação e o funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas, o qual, quando de sua instituição, personificou um marco legislativo dotado de caráter inovador e ambicioso, conforme bem observou Dinamarco[7]. Tratava-se, assim, da primeira manifestação legislativa que buscava estruturar um Juizado cujas características estavam assentadas em um menor formalismo e voltadas, efetivamente, para a prestação jurisdicional mais célere. Neste sentido, ainda, cuida colacionar:

O Juizado de Pequenas Causas trouxe, no corpo de sua legislação criadora, uma série de novos princípios e paradigmas, os quais pretendiam romper a antiga estrutura processual fundada no formalismo da jurisdição civil comum, buscando, assim, alcançar o objetivo de facilitar o acesso à justiça por parte dos menos favorecidos na sociedade, tornando-o mais célere e eficaz, bem como funcionando como mecanismo de pacificação social[8].

Cuida reconhecer que, até aquele momento legislativo, a sociedade contemporânea não usufruía de qualquer instrumento que permitisse a concretização de suas pretensões, de maneira mais rápida e com resultados esperados, o que, por vezes, fomentava à descrença e a insatisfação com a tutela jurisdicional ofertada pelo Estado-juiz, bem como com a violação ao acesso à justiça, eis que, em decorrência da morosidade peculiar da justiça civil, o cidadão deixava de ajuizar demandas ou mesmo restava frustrada a pretensão já deduzida em juízo. Diante do cenário ora pintado, o legislador ordinário ambicionou instituir um mecanismo que compreendesse em seu bojo a pacificação social, como mecanismo capaz de abrandar as expectativas da população jurisdicionada, na proporção que assegurava um modelo de jurisdição especial mais célere, eficaz e acessível. Ainda nesta linha, é permitido diccionar que o Juizado de Pequenas Causas permitia que serviço jurisdicional apresentasse resultados úteis ao solucionar prontamente os conflitos, antes que eles se expandam e cheguem a incomodar mais do que o aceitável[9].

Prima sublinhar, também, que, conquanto tenha sido anteriormente à promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[10], que, em seu artigo 5º, inciso XXXV, hasteia como flâmula orientadora o acesso à Justiça, o Juizado Especial de Pequenas Causas já abarcava, em seu bojo, o escopo de garantir o acesso ao Poder Judiciário, contemplando, para tanto, mais simplicidade no procedimento adotado e maior celeridade no desenvolvimento da marcha processual. Em concatenação com o exposto, também se configura de suma importância frisar as palavras de Ronaldo Frigini, quando ele diz que “A Lei de Pequenas Causas não resolveu de todo o problema, mas inegavelmente aproximou da justiça o cidadão de baixa renda, fazendo-o vir aos umbrais do judiciário na certeza da composição rápida de seu litígio”[11]. Neste sentido, é pertinente enfatizar a doutrina de Cândido Rangel Dinamarco, quando assinala:

O mesmo art. 1º, que autoriza a criação desse órgão judiciário, di-lo competente para processo e julgamento, por opção do autor, das causas de reduzido valor econômico. Concebido para ampliar o acesso ao Poder Judiciário e facilitar o litígio para as pessoas que sejam portadoras de pequenas postulações (especialmente para as menos dotadas economicamente), a lei erigiu o próprio interessado em juiz da conveniência da propositura de sua demanda perante o Juizado Especial das Pequenas Causas ou no juízo comum – e, com isso, deu mais uma demonstração de que não se trata de discriminar pobres e ricos, uma vez que continuam aqueles, querendo, com a possibilidade de optar por este e pelo procedimento mais formal e demorado que ele oferece[12].

Impregnado por um cenário que cambaleava, em seus primeiros passos, em prol da facilitação do cidadão ao acesso ao Poder Judiciário, o legislador constituinte de 1988, entalhou, com profundos sulcos, no artigo 98, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil[13] inseriu a previsão dos Juizados Especiais Cíveis, como mecanismo de ratificação da experiência implantada pela Lei Nº. 7.244, de 07 de Novembro de 1984[14], que dispõe sobre a criação e o funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas, a fim de aprimorar a experiência obtida com a legislação supramencionada. Constata-se, assim, que a Lei Nº. 9.099, de 26 de setembro de 1995[15], que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências, ambicionou aprimorar o sistema, alargando a competência do Juizado, tanto em relação à matéria, quanto em relação ao valor. Dessa maneira, é possível pontuar que o cidadão comum encontrou o foro no qual procurava resolver suas pendências cotidianas, aquelas que antes ficavam afastadas da apreciação do Poder Judiciário, alimentando, assim, um sentimento de injustiça. “O caráter didático da atuação do Juizado hoje pode ser medido na atitude da pessoa comum que, diante de uma injustiça, não deixa de procurar seus direitos[16].

Salta aos olhos que o legislador infraconstitucional, ao insculpir a Lei Nº. 9.099, de 26 de setembro de 1995[17], que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências, pretendeu ofertar concretude ao comando constitucional que determinou a criação do microssistema dos Juizados Especiais, permitindo, via de consequência, o acesso a uma justiça essencialmente informal, célere e econômica, tanto em relação ao sistema jurisdicional, quanto para os jurisdicionados que dele dependem, tal como mais acessível àqueles que, até então, não ingressavam na morosa e excessivamente burocrática justiça comum. “Os juizados especiais cíveis, dotados da incumbência de conciliar, julgar e executar as causas de menor complexidade, têm sede na Constituição Federal em seu artigo 98, I, e, seguindo os princípios da oralidade, informalidade, economia processual, celeridade e simplicidade[18], cumprindo, assim, a missão de abrir as portas do Poder Judiciário às pessoas mais carentes, atendendo a uma demanda reprimida, mediante a oferta de um processo rápido, econômico e simples.

Nesse passo, carecido faz-se compreender de que a criação do microssistema dos Juizados Especiais deveu-se aos destinatários que possuíssem causas de solução dotadas de maior simplicidade e de diminuta expressão econômica, os Juizados Especiais Cíveis, instituídos em 1995, devem primar pela concretização dos objetivos de efetivação da tutela jurisdicional de forma rápida, ou seja, que se preste a satisfazer o interesse do cidadão em tempo razoável à utilidade daquela tutela. “A criação, então, dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, hoje denominados Juizados Especiais Cíveis, pretendeu, em última análise, dotar o Poder Judiciário de meios que permitissem a composição célere, adequada e efetiva dos litígios de pequena expressão econômica[19]. Arrimado no entendimento ora explicitado, é possível afirmar que o processo ajuizado perante o microssistema dos Juizados Especiais, além de ser célere, simples e informal, deve, igualmente, trilhar pela via mais econômica, buscando sempre o aproveitamento dos atos processuais, reduzindo os custos do processo e encontrando alternativas que representem um menor ônus tanto para o Poder Judiciário quanto para o cidadão que pretende ver seu interesse tutelado de forma mais econômica. Há que se repisar, oportunamente, que o microssistema dos Juizados Especiais se apresenta como robusto instrumento de materialização e vazão das demandas reprimidas, oportunizando o acesso à justiça, inclusive das camadas sociais mais carentes.

3  A Valoração dos Princípios na Lei 9.099/1995: A Influência do Pós-Positivismo no Ordenamento Brasileiro

Em uma primeira plana, anotar faz-se mister que os postulados e dogmas se apresentam como a gênese, o ponto de partida ou mesmo o primeiro momento da existência de algo. Neste alamiré, há que se evidenciar, com bastante ênfase, que os princípios se apresentam como verdades fundamentais, que suportam ou asseguram a certeza de uma gama de juízos e valores que norteiam as aplicações das normas diante da situação concreta, adequando o texto frio, abstrato e genérico às nuances e particularidades apresentadas pela interação do ser humano. Objetiva, por conseguinte, com a valoração dos princípios vedarem a exacerbação errônea do texto da lei, conferindo-lhe dinamicidade ao apreciar as questões colocadas em análise.

Com espeque em tais ideários, salientar faz-se pungente que os dogmas, valorados pelas linhas do pós-positivismo, são responsáveis por fundar o Ordenamento Jurídico e atuar como normas vinculantes, verdadeiras flâmulas desfraldadas na interpretação do Ordenamento Jurídico. Destarte, insta frisar que “conhecê-los é penetrar o âmago da realidade jurídica. Toda sociedade politicamente organizada baseia-se numa tábua principiológica, que varia segundo se altera e evolui a cultura e modo de pensar”[20]. Ao lado disso, em razão do aspecto essencial que apresentam, os preceitos podem variar, de maneira robusta, adequando-se a realidade vigorante em cada Estado, ou seja, os corolários são resultantes dos anseios sagrados em cada população. Entretanto, o que assegura a característica fundante dos axiomas é o fato de ser hasteado à condição de cânone escrito pelos representantes da nação ou, ainda, advir de regra costumeira à qual democraticamente aderiu o povo.

Nesta senda, os dogmas que são salvaguardados pela Ciência Jurídica passam a ser erigidos à condição de elementos que compreendem em seu bojo oferta de uma abrangência mais versátil, contemplando, de maneira singular, as múltiplas espécies normativas que integram o ordenamento pátrio. Ao lado do acinzelado, há que se evidenciar que tais mandamentos passam a figurar como supernormas, isto é, “preceitos que exprimem valor e, por tal fato, são como pontos de referências para as demais, que desdobram de seu conteúdo[21]. Neste passo, os princípios passam a figurar como verdadeiros pilares sobre os quais o arcabouço teórico que compõe o Direito se estrutura, segundo a brilhante exposição de Tovar[22].

Em decorrência de tais ponderações, destacar é crucial que o microssistema dos Juizados Especiais deve ser interpretado a partir de uma luz emanada pelos valores de maciça relevância para a Constituição Federal de 1988[23]. Isto é, cabe ao Arquiteto do Direito observar, de forma imperiosa, a tábua principiológica, considerada como essencial e exaltada como fundamental dentro da Carta Magna do Estado Brasileiro, ao aplicar a legislação abstrata ao caso concreto. A exemplo de tal afirmativa, pode-se citar tábua principiológica que orienta a interpretação das normas atinentes ao microssistema do Juizado Especial. Nesta senda, não se pode olvidar que os critérios que informam a atuação do Juizado Especial Cível são desdobramentos emanados dos princípios inspiradores do processo civil tradicional, “aos quais se subordinam, estando em nível inferior, pois seria inconcebível que por força da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade[24], fossem desprezados os preceitos fundamentais como o do contraditório e da ampla defesa, do devido processo legal (dwe process of law) e da fundamentação dos atos decisórios, compreendendo-se decisões e sentença. Com o alicerce no pontuado, salta aos olhos a necessidade de desnudar tal assunto, com o intento de afasta qualquer possível desmistificação, com o fito primordial de substancializar um entendimento mais robusto acerca do tema.

4 Notas ao Princípio da Autonomia Privada em sede de Conciliação: Singelos Apontamentos

Em uma primeira plana, cuida anotar que o princípio da autonomia privada não tem o condão de retirar do homem à liberdade, porém estabelece, com clareza ofuscante, que o exercício deste direito deve, imperiosamente, observar limites determinados e finalidades robustas. No que toca à conciliação, é possível frisar que o corolário da autonomia privada compreende substancial relevância, eis que possibilita a própria existência deste mecanismo de tratamento de conflitos. “As partes decidem adotar a mediação e a conciliação para por fim ao litígio existente ou para prevenir um litígio futuro e, após, decidem entabular ou não o acordo, sempre como fruto da válida manifestação da própria vontade[25]. Com destaque, o corolário em comento possibilita às partes a resolução de suas controvérsias por si mesmas, sem que isso seja encarado como uma afronta ao preceito de índole constitucional da inafastabilidade da jurisdição, segundo o qual a lei não poderá excluir, da apreciação do Poder Judiciário, a lesão ou a ameaça a direito.

Entrementes, cuida pontuar que não basta a simples dicção que a solução de controvérsias deriva do exercício da vontade do homem. Ao reverso, é carecido, também, que esta vontade seja edificada de maneira real, livre de vícios, refletindo, assim, o interesse de ambas as partes na construção de um acordo. Nesta senda de raciocínio, ao tratar do tema em debate, alguns autores se referem ao princípio da autodeterminação, em razão do qual o acordo edificado entre as partes deve ser obtido de forma voluntária, sem imposições ou coerções, alargando aos participantes a possibilidade de abandonar o processo em qualquer momento. Ao lado do exposto, prima pontuar que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[26] não consagrou, de maneira expressa, um dispositivo que versasse acerca do princípio da autonomia privada. Ao contrário, é possível ponderar que o corolário em comento é decorrente de uma edificação histórica dos direitos humanos de primeira dimensão, refletindo, em seu âmago sensível, os pilares de liberdade e autodeterminação do indivíduo.

Tem-se na conciliação e na mediação, como já se afirmou, a participação ativa e determinante dos sujeitos envolvidos no litígio. O processo decisório, nestas hipóteses, tem como base a construção dialógica do consenso, trazendo a lume a concretização dos interesses compostos. O princípio da realização efetiva e célere da justiça, fio condutor do projeto de novo Código de Processo Civil, torna imprescindível que os elementos edificantes do Direito Material, especialmente aqueles que pertinentes à realização do mandamento constitucional sejam conjugados, trazidos a figurar no âmbito processual com toda a carga axiológica já produzida pelo estudo do Direito Material. No campo da conciliação e da mediação, a introdução da autonomia da vontade como fundamente remete, necessariamente, a toda a teoria crítica do Direito Civil, contextualizada com a realidade contemporânea das necessidades e pretensões sociais quanto aos critérios de justiça[27].

Quadra sublinhar que o princípio da autonomia priva não é absoluto, mas está submetido aos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico, a fim de se promover corolários e bastiões igualmente densos, como o preceito da igualdade, da justiça e da promoção do bem de todos. De igual maneira, o corolário em estudo encontra barreira no próprio princípio da legalidade, a fim de se materializar a autonomia privada em consonância com as disposições legais estabelecidas. A partir de uma perspectiva material, a autonomia privada, erigida à condição de corolário fundamental, estabelece os ditames definidores do objeto da transação edificada em sede de conciliação.

Em sede de direito processual, as partes envolvidas em um litígio, utilizando-se do princípio da autonomia privada na edificação de um acordo, observando-se tão somente os limites normativos estabelecidos, podem decidir resolvê-lo sem recorrer aos meios judiciais, lançando mão, inclusive, de uma instituição particular para promover a conciliação. “Sendo esta a escolha, as partes acabam por escolher inclusive o procedimento a ser adotado, seja por prévia delimitação consensual, seja pela escolha de uma instituição que deve antecipadamente fazer publicar os seus regulamentos[28]. De igual modo, no exercício da autonomia privada, quando recorrem ao mecanismo extrajudicial de tratamento do conflito, as partes poderão, de comum acordo, externando a substancialização maior de tal corolário, o conciliador a conduzir o mecanismo em comento para a edificação de um acordo.

Importa anota que o Estado Democrático de Direito está pautado no fomento do diálogo na promoção e conquista da pacificação social, na medida em que proporciona aos envolvidos o empoderamento carecido para orientar o tratamento dos conflitos que surgem da interação social. Doutro modo, cuida anotar que, em decorrência do corolário da autonomia privada, o Estado não pode obrigar as partes à realização do acordo, eis que o terceiro que atua no processo no intuito de auxiliar as partes, não pode impor uma solução, nem mesmo obrigar a edificar uma transação. Ao contrário, não se pode olvidar que incumbem às partes, por si mesmas, por meio da negociação, construírem a solução do litígio. Plus ultra, a recusa das partes à conciliação não pode ensejar nenhum prejuízo, senão o prosseguimento do feito ou o ajuizamento da ação sucessiva, com decisão do litígio imposta pelo Poder Judiciário, florescendo a partir do livre convencimento motivado do Estado-juiz. Com destaque, cuida ponderar que O Estado coloca à disposição das partes a possibilidade de resolução amigável dos litígios envolvendo direitos patrimoniais de direito privado. Contudo, as partes têm ampla autonomia para resolver ou não o litígio através da transação.

REFERÊNCIAS:

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[2] VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: .  Acesso em 01 jun. 2014.

[3] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,1988.  Disponível em: . Acesso em: 01 jun. 2014.

[4] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal. Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170, caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil. Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio. Julgado em 05 ag. 2009. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014.

[5]  VERDAN, 2009. Acesso em 01 jun. 2014.

[6] BRASIL. Lei Nº. 7.244, de 07 de Novembro de 1984. Dispõe sobre a criação e o funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014.

[7] DINAMARCO, Cândido Rangel. Manual das Pequenas Causas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986, p. 01.

[8] SILVA, Clarissa Teles. Juizados Especiais Cíveis: Origem, Finalidade e Princípios. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014, p. 02.

[9] DINAMARCO, 1986, p. 02.

[10] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,1988.  Disponível em: . Acesso em: 01 jun. 2014.

[11]  FRIGINI, Ronaldo. Comentários à Lei de Pequenas Causas. São Paulo: Livraria de Direito, 1995, p. 27.

[12] DINAMARCO, 1986, p. 04.

[13] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,1988.  Disponível em: . Acesso em: 01 jun. 2014.

[14] BRASIL. Lei Nº. 7.244, de 07 de Novembro de 1984. Dispõe sobre a criação e o funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014.

[15] BRASIL. Lei Nº. 9.099, de 26 de Setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014.

[16] BONADIA NETO, Liberato. Juizados Especiais Cíveis – evolução – competência e aplicabilidade – algumas considerações. Disponível em: <www.advogado.adv.br>. Acesso em: 01 jun. 2014, p. 03.

[17] BRASIL. Lei Nº. 9.099, de 26 de Setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014.

[18] BONADIA NETO, 2006, p. 03.

[19] SODRÉ, Eduardo. Juizados Especiais Cíveis: Processo de Conhecimento. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. xxvii.

[20] MARQUESI, Roberto Wagner. Os Princípios do Contrato na Nova Ordem Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 513, 2 dez. 2004. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014.

[21] VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: .  Acesso em 01 jun. 2014

[22] TOVAR, Leonardo Zehuri. O Papel dos Princípios no Ordenamento Jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 696, 1 jun. 2005. Disponível em: .  Acesso em 01 jun. 2014

[23] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,1988.  Disponível em: . Acesso em: 01 jun. 2014.

[24] SILVA JÚNIOR, Alcides Leopoldo e.  Arts. 1 e 2. In: TOSTA, Jorge (coord.). Juizados Especiais Cíveis.  Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2010, p. 06.

[25] MORI, Amary Haruo. Princípios Gerais aplicáveis aos Processos de Mediação e Conciliação. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014, p. 20.

[26] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,1988.  Disponível em: . Acesso em: 01 jun. 2014.

[27] FACHIN, Luiz Edson; GONÇALVES, Marcos Alberto Rocha. Hermenêutica da Autonomia da Vontade como Princípio Informador da Mediação e da Conciliação. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 48, n.190, abr.-jun. 2011. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014, p. 12.

[28] MORI, Amary Haruo. Princípios Gerais aplicáveis aos Processos de Mediação e Conciliação. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2014, p. 23.

 

 

Elaborado em junho/2014

 

Como citar o texto:

RANGEL, Tauã Lima Verdan..Notas ao Princípio da Autonomia Privada em sede de Conciliação: Singelos Apontamentos. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 22, nº 1175. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/cronicas/3125/notas-ao-principio-autonomia-privada-sede-conciliacao-singelos-apontamentos. Acesso em 28 jun. 2014.

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