Resumo: O presente trabalho se dedica a apresentar os critérios utilizados para quantificação dos danos extrapatrimoniais, com base na doutrina e entendimentos jurisprudenciais, sendo eles a gravidade da culpa, a condição socioeconômica das partes e a proporcionalidade e razoabilidade do dano. Analisa ainda os posicionamentos favoráveis e contrários à mercantilização do dano extrapatrimonial, observando seu caráter pedagógico e punitivo.

Palavras-Chave: Responsabilidade Civil; Danos Extrapatrimoniais; Critérios de Fixação; Jurisprudência; Direitos de Personalidade; Razoabilidade e Proporcionalidade

Abstract: This work is dedicated to present the criteria used to quantify the extrapatrimonial damages, being them the seriousness of the fault, socioeconomic condition of parts and the proportionality and reasonableness of the damage. Analyzes yet, the pro and con positions to commodification of extrapatrimonial damages, watching her teaching and punitive character.

Keywords: Civil Responsability; New Damages; Criteria for Fixation; Proportionality and Reasonableness

 

INTRODUÇÃO

Diante da verificação do dano ressarcível, resultado da violação de um interesse merecedor de tutela, por meio de uma conduta lesiva, muitas vezes antijurídica, faz-se necessário estabelecer um panorama entre as circunstâncias do dano causado e os limites da fixação dos critérios indenizatórios.

A responsabilidade civil concentra-se sobre a reparação dos danos causados em sociedade, fazendo com que a lesão ao interesse da vítima, independentemente da conduta do ofensor, seja objeto de preocupação judicial. A partir do momento em que há identificação do dano como uma lesão concreta, como violação de uma regra há o dever de indenização pelo ofensor.

Indubitavelmente, ao tratarmos sobre a quantificação e apuração dos danos patrimoniais/materiais causados ao ofendido possuímos uma maior facilidade para apuração dos valores a serem ressarcidos, eis que como o próprio nome diz, o dano atinge os bens integrantes do patrimônio da vítima, abrangendo todos os bens e direitos na expressão conjunto das relações jurídicas, quais sejam as coisas materiais, susceptíveis de avaliação pecuniária, podendo ser reparado diretamente ou indiretamente.

No tocante a possibilidade de reparação dos danos extrapatrimoniais não se discute se estes são ou não indenizáveis ou se podem ser cumulados com os danos patrimoniais, barreira esta que fora rompida com o advento da Constituição Federal de 1988, bem como através do Código Civil de 2002 e súmulas do STJ.

Articulam-se, assim, os danos extrapatrimoniais aqueles a proteção à personalidade e aos seus “bens”, como a vida, a integridade física, a honra, o bom nome, entre outros.

Entretanto, a quantificação dos danos extrapatrimoniais não se submete aos mesmos procedimentos na apuração dos danos materiais, e várias são as dificuldades para fixação correta do quantum reparatório.

O presente trabalho pretende analisar quais são os critérios majoritários adotados pela jurisprudência e doutrina brasileira no que se refere a quantificação do dano extrapatrimonial e o consequente quantum debeatur para a fixação dos valores pecuniários em cada caso concreto.

 

DESENVOLVIMENTO

Com a flexibilização dos filtros da responsabilidade civil, como no caso dos novos danos apresentados ao longo dos anos, em decorrência da vida em sociedade, novos interesses merecedores de tutela buscaram o poder judiciário. Consequentemente, ao tratarmos de novos danos, novos interesses extrapatrimoniais, muitas vezes frívolos, voltados à obtenção de indenização pelos acontecimentos mais banais da vida cotidiana, estes buscam na maioria das vezes apenas a reparação pecuniária, remetendo-se a função historicamente patrimonialista da responsabilidade civil.

Danos extrapatrimoniais que visam ser invocados para obter ganhos pecuniários, não para obter o desenvolvimento social de ideologias reparatórias ou um processo coletivo, mas sempre a mesma insistência da comunidade jurídica em oferecer às vítimas destes danos o pagamento de valores pecuniários (SCHREIBER, 2013, pg. 195).

Embora haja críticas na doutrina em desfavor à indenização pecuniária na reparação pelos danos extrapatrimoniais, o meio jurídico e jurisprudencial aplica veementemente a condenação do ofensor à reparação através de pecúnia.

Enquanto no dano material se exige prova cabal da sua ocorrência para que possa haver lugar para posterior indenização, o dano extrapatrimonial se dá pela simples demonstração da ocorrência do fato danoso, fazendo apenas com que se busque a natureza da indenização. (BONATTO, 2011, pg. 140).

Porém, diferentemente do dano patrimonial, em que o ressarcimento busca a restauração in natura, visando a forma mais perfeita de reposição do status quo ante, mediante o equivalente pecuniário desfalcado, os danos extrapatrimoniais não são “ressarcíveis”, mas “compensáveis”, em razão da diversidade de prejuízos à personalidade que envolvem e por não serem suscetíveis de quantificação pecuniária. (BONATTO, 2011, pg. 140 apud DIAS, 1960, p. 772).

Diante desta necessidade de compensação dos danos extrapatrimoniais que nosso ordenamento jurídico busca através de critérios razoáveis e proporcionais em cada caso concreto, atribuir a quantia pecuniária a ser compensada ao ofendido.

No Código Civil de 1916, havia previsão através do artigo 1.536, §1º, que mandava aplicar o arbitramento para a liquidação de dívidas não quantificadas, como se não bastasse diversas leis especiais que previam a tarifação legal, determinando que o magistrado estimasse o dano moral em valores entre 5 a 100 salários mínimos (Código Brasileiro de Aeronáutica) e ainda a Lei de Imprensa que limitava o valor de indenização por dano imaterial aos jornalistas e empresas de jornalismo, posteriormente afrontada pela Súmula nº 281 do STJ. (BATISTA, 2014, pg. 154).

Pela doutrina, temos posicionamentos no sentido de que não há critério legal para o arbitramento dos danos extrapatrimoniais, mas uma das formas mais eficientes é pelo arbitramento judicial, conforme disposto nos artigos 946 e 953, parágrafo único, ambos do Código Civil de 2002, cabendo ao juiz de acordo com seu arbítrio, com base na repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor, estimar uma quantia a título de reparação pelo dano extrapatrimonial (FILHO, 2014, pg. 123).

Sérgio Cavalieri Filho ainda defende que a fixação do quantum debeatur, não pode ser fonte de lucro, de modo que a indenização deva ser suficiente para reparar o dano e nada mais, visto que qualquer quantia a maior importaria em enriquecimento sem causa, atendendo-se ao princípio da razoabilidade, que é, ao mesmo tempo, adequado, necessário e proporcional. (FILHO, 2014, p. 125).

Em contrapartida, Anderson Schreiber, aponta ferozmente que a reparação em dinheiro aos danos extrapatrimoniais induz à conclusão de que a lesão a interesses é autorizada a todos, desde que esses ofensores estejam dispostos a arcar com o “preço” correspondente, porém, nas formas não patrimoniais de compensação, há maior satisfação aos anseios da vítima (SCHREIBER, 2013, pg. 197).

Ainda que a responsabilidade civil resulte sempre, ou principalmente, em uma indenização em dinheiro, no campo dos interesses extrapatrimoniais o ressarcimento em pecúnia vai apresentando cada vez mais a discussão sobre sua efetiva reparação, devendo ser adotados outros meios de tutelas, cujo qual o referido autor, trata, de forma geral, da despatrimonialização, de uma despecuniarização ou desmonetarização da reparação dos danos para a efetiva reparação da vítima e redução de ações banais (SCHEREIBER, 2013, p.199).

Outrossim, destaca-se também o entendimento jurisprudencial, onde nossos tribunais superiores costumam adotar critérios voltados a reparação pecuniária, com base na razoabilidade e em atenção ao caráter punitivo dos danos extrapatrimoniais.

O Superior Tribunal de Justiça ao tempo em que reconhece a inexistência de parâmetro legal, afirma que os princípios da razoabilidade e proporcionalidade são pilares para as decisões, para que o valor fixado desestimule o ofensor a repetir a falta sem que haja enriquecimento indevido do ofendido.[1]

Em sua maioria os critérios norteadores são a proporcionalidade e razoabilidade do evento danoso, porém, há aqueles que defendam a natureza punitiva do dano extrapatrimonial, como no caso da decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que condenou uma empresa de telefonia por práticas abusivas que iriam além de meros aborrecimentos, gerando efetiva angústia e mal-estar caracterizando o dano moral, cuja indenização teve caráter punitivo. [2]

Logo, para que se haja um correto arbitramento dos valores de compensação dos danos extrapatrimoniais sofridos deve ater-se a razoabilidade e proporcionalidade, a análise das circunstâncias do caso concreto e as condições socioeconômicas do ofendido e do ofensor.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O arbitramento do quantum debeatur dos danos extrapatrimoniais não pode ser considerado como fonte de lucro, ainda que nosso ordenamento vise o caráter sócioeducativo, e algumas vezes punitivo, do instituto da responsabilidade civil por dano extrapatrimonial, nitidamente se faz necessário a atribuição de valores em pecúnia para tentativa de compensação do dano sofrido pelo ofendido.

Critérios como a razoabilidade e proporcionalidade que atribuem uma correta apropriação para reparar o dano, no sentido de que a indenização deve ser a menos invasiva possível na esfera patrimonial do ofensor, bem como seja o ofendido compensado às alturas do abalo sofrido. Além da análise do caso concreto, onde deve o magistrado observar a intensidade do ato ilícito (dolo ou culpa), juntamente com o abalo sofrido da vítima, afastando qualquer compensação pelo mero aborrecimento (BATISTA, 2014, pg. 165).

Há de se destacar também um terceiro critério, referente às condições socioeconômicas do ofensor e do ofendido, embora combatido por alguns autores, porém aplicado na maioria das decisões superiores, pois, servem para evitar que a reparação por danos patrimoniais sejam um fato de enriquecimento para o lesado e de baixo caráter punitivo para o ofendido, como nos casos da condenação de grandes empresas (BATISTA, 2014, pg. 165).

 

CONCLUSÃO

No sistema brasileiro atual a fixação dos danos extrapatrimoniais não possui tabelamento a fim de fracionar o dano em “baixo”, “médio” e “alto”.  O que pode atrair uma certa falta de segurança jurídica em nossos tribunais.

Ocorre que, critérios são necessários para a apuração e quantificação do dano sofrido, tendo em vista que a essência da responsabilidade civil extrapatrimonial vigente é inteiramente pecuniária.

O direito de ação, embora, em algumas vezes, a busca por indenizações fúteis, em decorrência dos novos danos causados pelo cotidiano da vida em sociedade possam massificar ações de natureza vil, merece tutela por parte do Estado.

Ainda que doutrinadores defendam que a reparação de danos extrapatrimoniais em dinheiro não possua o condão de educar os ofensores, sob a ótica de que esta postura mercantilista ensejaria muito mais danos, há de se destacar o posicionamento atual vigente, onde com base nos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, em análise ao caso concreto e observando as condições econômicas do ofensor e ofendido, tem-se proferido decisões de caráter educativo e também punitivo, não podendo haver nem indenizações altíssimas e tampouco irrisórias.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em Maio de 2016;

BATISTA, Francisco Diego Moreira. Critérios para Fixação dos Danos Extrapatrimoniais. 24 de fevereiro de 2014. Disponível em: < http://www.seer.ufv.br/seer/revdireito/index.php/RevistaDireito-UFV/article/download/230/37>. Acesso em junho de 2016;

BONATTO, Fernanda Muraro. A quantificação da indenização por dano extrapatrimonial: análise dos critérios jurisprudenciais na determinação do quantum debeatur. Revista Eletrônica PUCRS. Direito & Justiça. V. 37, N2. P. 136-154, julho/dezembro 2011. Disponível em: < http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fadir/article/viewFile/8935/6680>. Acesso em junho de 2016;

DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 4. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1960. 2v;

FILHO, Sergio Cavalieri, Programa de Responsabilidade Civil. 11ª Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2014;

SCHREIBER, Anderson. Novas Tendências da Responsabilidade Civil. In Responsabilità Civile e Previdenza, anno LXXI, n. 3, marzo 2006, Milano: Dott. A. Giuffrè, pp. 586-600. Disponível em: . Acesso em maio de 2016;

SCHREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil. Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos. 5ª Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2013.

NOTAS:

[1] STJ – AgRg no AREsp 301.765/MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/04/2013, DJe 03/05/2013.

[2] 13ª Câmara Cível, Ap. Civ. 36.495/2007, Rel. Des. Sergio Cavalieri Filho.

Data da conclusão/última revisão: 7/3/2018

 

Como citar o texto:

CALIXTO, Eduardo da Silva..A análise dos critérios para ressarcimento dos danos extrapatrimoniais e seu quantum debeatur. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 29, nº 1528. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-responsabilidade-civil/4037/a-analise-criterios-ressarcimento-danos-extrapatrimoniais-seu-quantum-debeatur. Acesso em 9 mai. 2018.

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