INTRODUÇÃO

O conceito de família atualmente é muito distinto ao conceito estabelecido no século XIX. De acordo com o Código Civil de 1916, a família só poderia ser estabelecida através do casamento. Com todas as mudanças sociais que ocorreram ao longo dos anos, deixou-se de ter um conceito padrão, biológico, estagnado do que é família. Com o tempo, passou-se a reconhecer a importância dos vínculos afetivos e o companheirismo. Com isso, outros gêneros de família passaram a existir e serem reconhecidos pelo legislador, as quais tinham a finalidade de priorizar o amor, fidelidade, respeito, carinho e respeito.

Desta forma, a Constituição Federal de 1988 reconhece a família como suporte da sociedade, proporcionando-lhe inteira proteção. Referindo-se ao casamento, união estável e famílias formadas por um dos pais com os filhos. Ao analisar as normas de eficácia redutível, constata-se uma grande valorização regulamentária pelo casamento, uma discriminação pela união estável e uma completa negligência com as famílias monoparentais. No sistema jurídico ainda é intenso o preceito de monogamia, considerando que a bigamia permanece sendo crime, assim como a fidelidade é uma das bases do casamento.

Observamos um descaso e uma ausência suporte do Estado em relação às uniões paralelas, podendo ser chamadas também de poliamorismo, doutrinadores alegam que esta conduta do Estado estimula ainda mais a continuidade destas uniões. E o que seria poliamorismo? Poliamor é uma espécie de relacionamento entre três ou mais pessoas simultaneamente, onde todos os envolvidos tem o conhecimento e concordam com tal relação. É baseado na poligamia ou não monogamia, quando existe um relacionamento amoroso e sexual no qual os envolvidos entram consenso e decidem como será o relacionamento. A sociedade ocidental não aceita essa nova concepção de relacionamento, possuem o pensamento tradicional de que uma relação amorosa só pode existir entre duas pessoas e o envolvimento com mais parceiros é censurado.Destarte, quando se fala em relacionamentos, cada indivíduo tem o direito de escolher o que lhe faz feliz. Já no caso concreto, os magistrados irão analisar a legalidade das uniões poliafetivas para que produza seus efeitos jurídicos.

 

MATERIAL E MÉTODOS

A metodologia aplicada ao desenvolvimento da presente pesquisa tem como objetivo um estudo sobre o reconhecimento da pluralidade da família, tendo como base o poliamorismo como entidade familiar, bem como explorar os princípios norteadores do direito de família, os quais sejam: princípio da dignidade da pessoa humana, pluralidade familiar, da busca da felicidade e da afetividade.

Nesse sentido, os dados e métodos utilizados para o desenvolvimento do presente resumo foi com base em pesquisas bibliográficas através da análise de doutrinas e artigos aliados a sites jurídicos, bem como reportagens de casos concretos que afirmam sobre a temática em questão.

 

 

DESENVOLVIMENTO

O presente resumo tem como objetivo analisar as relações familiares existentes no ordenamento jurídico e se aprofundar na pesquisa dos princípios que norteiam o direito de família, bem como esses novos laços familiares trazem uma discussão polêmica a cerca dessas relações. Em alguns países, a poligamia é uma cultura bem antiga, na qual o fato de um homem se relacionar, ter uma união estável e até casar com mais de duas mulheres é mais do que normal e aceito pela sociedade. Porém no Brasil, este assunto já vem sendo discutido há alguns anos, e não tem sido aprovado por grande parte da sociedade que preza pela “moral e bons costumes”, devido uma visão cultural de que o casamento só possa existir entre duas pessoas e a formação de famílias baseadas no modelo pai-mãe-filhos.

Pensadores possuem a teoria que a contar do século XX, o ser humano acredite no romantismo, idealizando um amor eterno, que seja fiel, gerando assim, um vínculo de dependência. O que às vezes não ocorre, causando grandes desilusões, devido à grande expectativa depositada no parceiro. Desta forma, o polimorismo se trata de um novo conceito de amor, em que o fato de existir mais de um parceiro traz uma estabilidade, sem decepções. Não que seja necessário buscar outras pessoas para se relacionar a fim de complementar esse sentimento, e sim existir uma ligação de companheirismo, carinho, afeto, amizade e liberdade.

Com o tempo a sociedade passou por diversas mudanças tais como: religiosas, culturais, políticas, e essa idéia fixa de que o casamento era somente para constituir família, indestrutível, foi se dirimindo, para que a coletividade se adaptasse a essas mudanças. A família de hoje é baseada na relação de afeto e não mais no fator biológico. Segundo Maria Berenice Dias.

As pessoas passaram a viver em uma sociedade mais tolerante e, com mais liberdade, buscam realizar o sonho de ser felizes sem se sentirem premidas a permanecer em estruturas preestabelecidas e engessadoras. As novas famílias buscam construir uma história em comum, na qual existe comunhão afetiva. Cada vez mais as pessoas têm o direito de escolha e podem transitar de uma comunidade de vida para outra que lhe pareça mais atrativa e gratificante (DIAS, 2011, p. 44).

Assim, foram surgindo outras espécies de famílias, tais como as monoparentais, parental ou anaparental, pluriparental, paralelas ou simultâneas, homoafetivas, poliafetivas. Porém, ainda há um preconceito e essas novas famílias não são bem vistas, e sequer aceitas pela sociedade retrógrada. Os simpatizantes dessa pluralidade familiar defendem suas opiniões com base nos princípios elencados na Constituição Federal, tais como o princípio da dignidade da pessoa humana, principio da igualdade, principio da afetividade, principio da pluralidade familiar, principio da afetividade.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os princípios existem para direcionar a compreensão e aplicabilidade de normas, são tidos como regras do ordenamento jurídico. Desta forma, os princípios inerentes aos vínculos familiares, devem servir como um direcionamento na hora de avaliar todos os tipos de relação que contenha questões familiares.

O atual perfil da família no ordenamento constitucional brasileiro afasta a idéia de um organismo autônomo e independente, mas também não apresenta a família passiva e dependente, exclusivamente, do protecionismo estatal. Sua função instrumental implica o reconhecimento de responsabilidades dos seus membros de tal forma que o sistema constitucional de proteção a família não pode ser compreendido no âmbito isolado dos deveres de proteção do Estado (PEREIRA, 2015, p. 61).

O principio da Dignidade da pessoa humana está disposto na Constituição Federal de 1988, e o Estado tem a obrigação de colocá-lo em prática por meio da atuação de seus governos. É a soma de princípios e regras, as quais têm como objetivo assegurar que todo cidadão tenha resguardado e respeitado seus direitos. Tem como função preservar o bem estar de todos os cidadãos.

Tal principio traz consigo uma valorização e proteção do indivíduo dentro da família, considerando-o como pessoa, prezando por sua vida, levando e consideração o respeito ao indivíduo, possibilitando que tenha seus direitos da personalidade resguardados.

Carmem Lúcia Antunes Rocha foi a pioneira destacando a relevância do princípio da dignidade humana em nosso ordenamento jurídico, salientando que foi a partir dele que formou um novo pensamento no sistema jurídico, se tornando a dignidade a ser princípio e fim do Direito:

Dignidade é o pressuposto da ideia de justiça humana, porque ela é que dita a condição superior do homem como ser de razão e sentimento. Por isso é que a dignidade humana independe de merecimento pessoal ou social. Não se há́ de ser mister ter de fazer por merecê-lá, pois ela é inerente à vida e, nessa contingência, é um direito pré́-estatal. (ROCHA, 1999, p.72)

Desta forma, comprova-se que o direito de família está estreitamente relacionado aos direitos humanos e à dignidade da pessoa, tendo reconhecimento jurídico na igualdade entre homem e mulher, entre filhos, bem como os variados exemplos de família.

O principio da afetividade é aquele que comanda o equilíbrio das relações socioafetivas, é o principal responsável por construir o padrão de família da atualidade. Antigamente as famílias seguiam o poder do patriarca. Os laços familiares eram estabelecidos através dos bens da família e poder econômico, com grande representação da política e religião. Paulo Luiz Netto Lobô afirma:

A realização pessoal da afetividade e da dignidade humana, no ambiente de convivência e solidariedade, é a função básica da família de nossa época. Suas antigas funções econômica, política, religiosa e procracional feneceram, desapareceram, ou desempenham papel secundário. Até mesmo a função procracional, com a secularização crescente do direito de família e a primazia atribuída ao afeto, deixou de ser sua finalidade precípua. (LOBÔ, 2004, p. 155)

O princípio da afetividade une os indivíduos pela afeição, o convívio e a opção de formar uma família. Encontra-se de forma implícita na Constituição Federal como uma inspiração da família, na qual as pessoas criam laços afetivos. A mulher não depende do marido, não é aquele casamento com imposições, no qual a mulher mantinha por questões financeiras e sociais. Para Rolf Madaleno:

O afeto é a mola propulsora dos laços familiares para dar sentido e dignidade à existência humana. Nos vínculos de filiação e parentesco a afetividade deve estar sempre presente, pois os vínculos consanguíneos não se sobrepõem aos liames afetivos, ao contrário, a afetividade pode sobrepor-se aos laços consanguíneos. (MADALENO, 2008, s.p.) 

O pluralismo familiar é considerado pelo Estado a possibilidade de vários padrões de família, das mais diversificadas formas possíveis. Para Ana Paula Araújo et all, o pluralismo familiar é de grande importância e tem uma função relevante na sociedade contemporânea e na formação das novas famílias:

A afetividade no decorrer do tempo, vem gerando consequências importantes e concretas, por sua marcante função social, bem como causando alterações profundas no modo  de pensar a família brasileira. (ARAUJO et all, 2016, p. 182)

De acordo com Maria Berenice Dias:

A mudança em tal direito é evidente, já não se fala mais da família constituída pela mulher e o homem através do casamento, a realidade de família vem mudando onde hoje já se torna possível a convivência com famílias recompostas de forma homoafetiva, monoparentais, pluralizando o conceito de família. (DIAS, 2005, s.p.)

Através do princípio da pluralidade familiar eliminou-se a exclusividade de só um modelo de família, assegurando desta forma a liberdade de constituir família da forma desejada, sendo aceitas famílias socioafetivas e plurais, e garantindo os direitos e garantias individuais. A incessante busca pela felicidade é um direito nato e não depende de inclusão no ordenamento jurídico. Não se pode proibir ou atrapalhar um indivíduo de ser feliz, isso contraria a moral e o direito de cada cidadão.

O Princípio da busca pela felicidade é implícito e deriva dos direitos fundamentais, onde também está inserido o principio da dignidade da pessoa humana Segundo Ronald Dworkin não cabe constitucionalizar o direito à busca de felicidade, mas assegurar que a dignidade humana seja preservada em suas diferentes dimensões, sob pena de termos uma verdadeira depressão coletiva constitucionalizada .(DWORKIN, 2002) Afinal, de acordo com um ditado popular, a felicidade pode despertar inveja e pessoas negativas. O ser humano deve buscar a harmonia entre uma vida real e com expectativa de plenitude em relação à felicidade.

                                                                                        

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Hoje em dia as pessoas priorizam a felicidade, o afeto, e não o padrão de família exigido na cultura de antigamente. A satisfação afetiva de cada indivíduo não vem prevista em lei. Ainda há muito o quê ser discutido em relação ao poliamorismo, pois não é justo que os indivíduos adeptos dessa relação afetiva não tenham direito de ter uma estrutura familiar por não estarem dentro dos padrões de família regulamentados em lei. A sociedade de transforma e renova a cada dia, e o Direito deve se adequar às necessidades e pretensões sociais. 

 

REFERÊNCIAS

ARAUJO, Ana Paula de.O pluralismo familiar e a liberdade de constituição de uma comunhão de uma vida familiar. In: Judicare: Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Alta Floresta, Alta Floresta, v. 9, n. 1, 2016, p. 182-191. Disponível em: < file:///C:/Users/Tau%C3%A3%20Verdan/Downloads/42-13-85-1-1020170629%20(1).pdf>. Acesso em 17 mai. 2018.

DIAS, Maria Berenice.  A ética do afeto. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, a. 10. N. 668, 4 mai. 2005. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/6668/a-etica-do-afeto>. Acesso em 17 mai. 2018.

DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

LÔBO, Paulo Luiz NettoFamílias. São Paulo: Saraiva, 2004.

MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. V. 5. 23.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. O princípio da dignidade humana e a exclusão social. In: XXVII Conferência Nacional de Advogados – Justiça: realidade e utopia Rio de Janeiro, 29 ago. 1999, p. 69-92. Disponível em: . Acesso em 17 mai. 2018.

Data da conclusão/última revisão: 20/5/2018

 

Como citar o texto:

CRUZ, Vanessa Pimentel Barros da; RANGEL, Tauã Lima Verdan..O reconhecimento da pluralidade da família: o poliamorismo como entidade familiar. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 29, nº 1533. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-familia-e-sucessoes/4076/o-reconhecimento-pluralidade-familia-poliamorismo-como-entidade-familiar. Acesso em 28 mai. 2018.

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