RESUMO

A Reforma trabalhista, por ser uma proposta de viés notadamente neoliberal, trouxe em seu bojo diversos aspectos que contrariam a própria lógica do Direito do Trabalho, que, por sua vez, é garantir proteção à classe trabalhadora, parte hipossuficiente da relação laboral, frente aos abusos do poderio capitalista. Neste sentido, tornam-se cruciais estudos sistemáticos dos principais impactos produzidos pela nova legislação, em especial, sobre o mercado de trabalho, de maneira a se analisar e desmistificar pontos importantes introduzidos pelas alterações, verificando, desse modo, se estão sendo, de fato, benéficos ou não para os trabalhadores. Todavia, o que se nota, em verdade, é que houve uma grande disfunção pós-reforma neste ramo do direito, tendo em vista, a quantidade absurda de aspectos, muitos deles, prejudiciais para a classe obreira, observada em seu teor, onde foram inseridas, inclusive, muitas alterações que geraram forte retrocesso quanto a direitos seculares conquistados pela classe trabalhadora.

PALAVRAS CHAVES: Direito do Trabalho; Reforma Trabalhista; Impactos; Mercado de Trabalho; Flexibilização.

ABSTRACT

The Labor Reform, as a proposal of a neoliberal bias, brought in its core several aspects that contradict the very logic of Labor Law, which, in turn, is to guarantee protection to the working class, an abuses of capitalist power. In this sense, systematic studies of the main impacts produced by the new legislation, especially on the labor market, have become crucial in order to analyze and demystify important points introduced by the changes, thus verifying if they are in fact, beneficial or not for workers. What is really noticeable, however, is that there has been a great post-reform dysfunction in this branch of law, in view of the absurd amount of aspects, many of which are injurious to the working class, observed in their content, where many changes have been inserted that have generated a sharp setback for secular rights won by the working class.

KEY WORDS: Labor Law; Labor Reform; Impacts; Job market; Flexibilization.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.. 3

2 - LEI 13.467/17- PRINCIPAIS ALTERAÇÕES NA CLT E SEUS IMPACTOS SOBRE O MERCADO DE TRABALHO.. 8

2.1-  Contrato de Trabalho Intermitente.... 9

2.2 - Equiparação das dispensas imotivadas individuais, plúrimas ou coletivas. 12

2.3- Princípio da Intervenção Mínima. 14

2.4 - Prescrição Intercorrente. 15

2.5 - Equiparação Salarial 16

2.6 - Intervalos Intrajornadas. 18

2.7 - Do Empregado Hipersuficiente. 20

2.8 - Salário - parcelas salariais. 21

2. 9 - Dano extrapatrimonial 23

2.10 - Teletrabalho. 24

2.11 - Prevalência do negociado sobre o legislado. 25

3- CONSIDERAÇÕES FINAIS.. 27

4 - REFERÊNCIAS.. 29

1 INTRODUÇÃO

A função precípua do Direito do Trabalho é a garantia de proteção ao trabalhador, parte hipossuficiente da relação contratual de trabalho frente ao poderio econômico do capital empresarial. Segundo Karl Marx (1998), a compra e venda da força de trabalho é a base do capitalismo moderno, sendo o proletariado a classe daqueles que não possuem outro meio de vida, a não ser a venda de sua própria força de trabalho como mercadoria.

Destarte, as alterações introduzidas na Consolidação das Leis do Trabalho- CLT pela Lei 13.467 de 13 de julho de 2017, a Reforma Trabalhista, assim mais popularmente denominada, lei esta, de natureza neoliberal, e que tem como escopo a geração de novos empregos a partir da maior flexibilização das normas do trabalho, trouxe, em verdade, um inegável o retrocesso social, visto que gerou uma drástica redução de direitos arduamente conquistados pela classe trabalhadora.

Cumpre destacar que o texto da reforma alterou mais de cem artigos da CLT, bem como, criou novos institutos do Direito do Trabalho, como a extinção do contrato de trabalho mediante acordo (distrato), o teletrabalho (home office) e o trabalho intermitente, e também extinguiu outros, como a obrigatoriedade da contribuição sindical, que passou a ser facultativa.

Ademais, em que pese a flagrante inconstitucionalidade de muitos desses institutos, a Reforma Trabalhista estabeleceu ainda a prevalência do acordado sobre o legislado, estabelecendo que os acordos e convenções coletivas de trabalho devem prevalecer sobre as próprias leis a respeito da matéria trabalhista.

Neste sentido, nota-se a necessidade de trazer à baila a discussão, visto que, a classe operária, em que pese a proposta do governo de Michel Temer de criação de novos postos de trabalho, vê-se cada vez mais expropriada de garantias mínimas de proteção e valorização da sua força de trabalho.

Além disso, a maior flexibilização dos direitos trabalhistas, geram, em verdade, maior precarização das condições mínimas de trabalho e redução de direitos seculares arduamente conquistados pelos trabalhadores, muitos deles constitucionalmente estabelecidos e que foram revogados pela reforma, visto que, a lei mostra-se em grande parte inconstitucional, e fora formulada sem a participação dos setores sociais mais atingidos pela mesma, como os sindicatos dos trabalhadores e setores acadêmicos interessados.

Cumpre destacar que, em que pese os argumentos que defendem a reforma, o número de empregos formais diminuiu sensivelmente após a mesma. De acordo com dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Brasil perdeu no último ano uma média de 1 (um) milhão de vagas formais. Isso prova que a flexibilização dos direitos trabalhistas provocada pela reforma não foi eficaz para driblar a crise econômica pela qual atravessa o país, muito pelo contrário, agravou ainda mais o problema devido à redução da renda e consequente queda do consumo gerada pelo desemprego crescente.

Desta feita, mostra-se de suma importância a análise dessas mudanças provocadas pelas novas leis trabalhistas introduzidas pela reforma, seus impactos sobre o mercado de trabalho, bem como seus reflexos sobre a economia nacional, em especial, neste momento de crise econômica e política, com o fulcro de desmistificar os verdadeiros impactos da reforma sobre a sociedade brasileira, não apenas sobre a classe trabalhadora ou empresarial, dado que, alterações nas leis que regulam o mercado de trabalho geram forte impacto em toda a economia e consequentemente no cotidiano de todos os brasileiros independentemente da classe social a qual pertencem.

As crises econômicas são inerentes ao processo capitalista de produção estruturado inicialmente pelo fordismo e pelo taylorismo. Desde a sua origem, o sistema capitalista vivenciou diversas crises de superprodução, ou seja, de queda do consumo devido à redução do poder aquisitivo das famílias.

Nos anos 1970, o sistema capitalista vivenciou uma das mais graves crises de sua história, também provocada pela redução do consumo em massa, visto que, os mercados internos dos principais centros produtores, em especial da Inglaterra e dos Estados Unidos, já se encontravam saturados, sendo, desta maneira, necessário impulsionar as exportações dos seus produtos.

Ademais, problemas fiscais ou de arrecadação também assolavam as economias dos países desenvolvidos, reflexos da política econômica do Welfare State, ou Estado do Bem-estar Social, até então adotada por estes países nos pós-guerras. Havia, nesse sentido, um excesso de gastos públicos sem a correspondente arrecadação de impostos para cobri-los. Além disso, a crise fiscal também fora agravada pela crise do Petróleo, que provocou um elevado aumento dos preços do produto a nível mundial, o que encareceu ainda mais a produção dos bens industriais.

Foi nesse cenário que surgiram as teorias neoliberais de Friederick Von Hayek e Milton Friedman. Estes estudiosos pregavam que o Estado intervencionista deveria ser reduzido a um Estado mínimo, apenas regulador do mercado, mas sem neste se interferir, promovendo privatizações, desinvestimentos e flexibilizações nos setores públicos.

Tal política ficou conhecida como Globalização, o processo de expansão das indústrias dos países do centro para os países periféricos, com instalações de filiais de empresas multinacionais nesses países produtores, utilizando-se de sua mão de obra mais barata e gerando nestes um amplo mercado consumidor dos seus produtos. Todavia, como a produção era padronizada, ou seja, em série e em grandes lotes, nem sempre havia mercado consumidor suficiente para os produtos fabricados, o que gerava a crise de superprodução e desempregos. Dessa maneira, este modelo fordista/taylorista de produção mostrou-se defasado e pouco lucrativo.

Nesse contexto é que entra em cena o Toyotismo no Japão, um modelo de produção mais flexível e enxuto, onde só se fabricavam aquilo que era solicitado pelo mercado consumidor, sem gerar com isso acúmulo de estoques (just in time) e custos extras. Tal política de produção, em curto prazo, resolveu o problema da superprodução do capitalismo, acompanhado do avanço da computação e da robótica acabou com a linha de montagem formada por inúmeros trabalhadores, ampliou as terceirizações, o que também reduziu os custos e a dependência das empresas com mão de obra.

No entanto, tal modelo de produção, também de cunho neoliberal, não resolveu o problema do desemprego estrutural fruto do próprio sistema de produção capitalista, muito pelo contrário agravou-lhe, visto que, cada vez mais o obreiro vem sendo substituído pelas máquinas e sendo obrigado a desenvolver diferentes atividades, cada vez mais variadas dentro das empresas, o que intensificou sobremaneira a exploração do trabalhador.

Ademais, cumpre acrescentar que o desemprego estrutural significa o desaparecimento do mercado de certas profissões e funções, ou seja, é um processo inerente ao próprio sistema capitalista de produção. Hoje em dia, o trabalhador precisa ser cada vez mais capacitado, polivalente e multifuncional para garantir a sua permanência no mercado de trabalho, visto que, o sistema capitalista não consegue por si só, resolver o problema do desemprego em massa que lhe é inerente. Assim, para que o trabalhador não perca seu emprego, este deve submeter-se a um acúmulo demasiado de funções, o que pode lhe provocar doenças, fadiga, elevado nível de estresse e medo constante de ser demitido.

É neste cenário atual que se revela de crucial importância a análise dos reflexos da Lei 13.467/17, a Reforma Trabalhista, então aprovada pelo presidente Michel Temer, sobre o mercado de trabalho brasileiro, visto que, a mesma fora aprovada como uma proposta de flexibilização das normas laborais com o escopo de, com isso, reduzir o desemprego e promover o crescimento da economia nacional, superando a crise econômica vivenciada nos últimos anos.

Todavia, conforme o exposto acerca do histórico do capitalismo e do que se pretende investigar a partir deste trabalho, baseando-o na análise das leis, doutrina e jurisprudência do Direito do Trabalho, buscar-se-á desmistificar estes argumentos e comprovar que esta reforma se mostra, em verdade, acentuadamente perversa, inconstitucional e violadora de direitos fundamentais da classe trabalhadora, já tão fortemente explorada pela própria lógica do sistema capitalista de produção.

Segundo Bobbio (2004), vivemos na era do direito, ou seja, vivemos em uma sociedade onde a pessoa humana é objeto de proteção pelo ordenamento jurídico, sendo-lhe garantido um mínimo para que possa ter uma vida digna. Nesse sentido, pode-se afirmar que, sob pena de se incorrer em um verdadeiro retrocesso social, há direitos que são intocáveis.

Isto posto, torna-se fundamental analisarmos em que grau a Reforma trabalhista vem impactando as relações de trabalho vigentes, como a doutrina e a jurisprudência vêm entendendo as mudanças introduzidas na CLT. Ademais, é importante avaliarmos também os reais impactos da reforma trabalhista no que tange a geração de novos postos de trabalho, visto que, este foi o principal motivo alegado pelos parlamentares e pelo presidente Michel Temer para legitimar a aprovação da mesma.

No que tange ao TST - Tribunal Superior do Trabalho, quanto aos aspectos processuais, o seu Pleno aprovou a Instrução Normativa 41/2018, onde explicita que a aplicação das normas processuais previstas pela reforma é imediata, sem atingir, no entanto, situações iniciadas ou consolidadas na vigência da lei revogada, ou seja as alterações de caráter processual introduzidas na CLT pela lei 13.467/17 não se aplicam aos processos iniciados antes da sua vigência. Nada mais justo, tendo em vista que, de acordo com o artigo 5º inciso XXXIV da Constituição Federal:  “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

2 - LEI 13.467/17- PRINCIPAIS ALTERAÇÕES NA CLT E SEUS IMPACTOS SOBRE O MERCADO DE TRABALHO

Neste capítulo vamos analisar as principais alterações inseridas na Consolidação das Leis Trabalhistas pela lei 13.467/17, a Reforma Trabalhista. Ao todo foram 106 artigos da CLT alterados pela reforma, sendo que 69 podem ser considerados favoráveis apenas aos empregadores, 33 neutros e referentes à aspectos processuais e apenas 4 artigos favoráveis aos trabalhadores, conforme opinião do juiz do trabalho substituto Alessandro da Silva da 3ª Vara de Florianópolis do TRT da 12ª Região. Segundo ele a introdução da reforma se deu em um momento de ruptura democrática, que mais favoreceu a classe patronal que a classe trabalhadora. Para ele os legisladores praticamente legislaram a favor dos empregadores apenas.

É nesse contexto que vou analisar aqui as mais importantes dessas alterações, estabelecendo um paralelo de como eram os institutos antes e depois da reforma trabalhista. Ademais, é importante também ressaltar, que muitos desses parlamentares que votaram a favor da reforma, em verdade desejam enfraquecer a justiça trabalhista aqui no Brasil, pois muitos defendem posições de cunho neoliberal, ou seja, pró capital em detrimento da proteção ao trabalho humano. Ou seja, nessa luta de classes secular os trabalhadores mais uma vez saem perdendo.

Sem mais delongas, vou apresentá-los, então, os pontos, que considero mais prejudiciais ao trabalhador, introduzidos pela reforma trabalhista e as minhas respectivas justificativas para considerá-los desfavoráveis para os empregados em geral, conforme os itens abaixo relacionados em ordem de numeração:

2.1-  Contrato de Trabalho Intermitente

Essa nova modalidade de contrato de trabalho foi inserida no âmbito do direito trabalhista brasileiro através da lei 13.467/17 como alternativa para aumentar as contratações por parte das empresas e corresponde, conforme previsão na lei, ao contrato de trabalho no qual a prestação de serviço se dá de forma não contínua, ou seja, com alternâncias entre períodos de labor e de descanso pelo empregado, podendo este se dar em horas, dias ou meses. (RENZETTI, 2018, p. 126)

Nessa espécie de contrato de trabalho mantém-se a subordinação por parte do empregado e pode ser utilizado em qualquer atividade, com exceção para os aeronautas que são regulados por legislação específica. Ademais, tal contrato deve sempre ser celebrado por escrito, e deve especificar o valor da hora de trabalho, que por sua vez, não poderá ser inferior ao valor-hora do salário mínimo ou ao valor-hora do salário devido aos demais empregados do estabelecimento empresarial que exerçam função idêntica.

Outra característica desse contrato é que o empregado será convocado pelo empregador por qualquer meio de comunicação quando este tiver interesse que este lhe preste serviço, sendo que após essa convocação o empregado terá um dia para responder se aceita, sendo que o seu silêncio presume em recusa. Cabe salientar que nos termos da lei, a recusa do empregado à convocação de seu empregador não descaracteriza a subordinação. (RENZETTI, 2018, p. 127)

Além disso, prevê o texto da lei que os períodos de inatividade do empregado não são considerados tempo à disposição do empregador. Nesse caso poderá o empregado prestar seus serviços a outros contratantes ainda que para a mesma atividade que exerce na empresa, visto que não há exclusividade.

Outro ponto relevante é que nessa espécie contratual ao final de cada serviço o empregado já deverá receber imediatamente a remuneração devida pelos dias laborados, bem como férias proporcionais acrescidas do terço constitucional, parcela referente ao décimo terceiro salário proporcional, repouso semanal remunerado e adicionais devidos. Caberá ao empregador também efetuar o pagamento das contribuições previdenciárias e do FGTS respectivos, do qual deverá fornecer comprovante ao empregado.

Dentre alguns direitos do empregado intermitente está o de poder parcelar as suas férias em até 3 períodos assim como os demais empregados. Além disso, o pagamento das verbas salariais não poderá exceder o período de 1 mês contado do primeiro dia da prestação do serviço. Também terá direito o empregado a auxílio-doença e salário maternidade a cargo do INSS.

Decorrido o prazo de um ano sem qualquer convocação por parte do empregador a partir da última convocação ou do último dia de prestação de serviço, o que se der por último, o contrato de trabalho intermitente será rescindido automaticamente. Na ocasião da extinção do contrato de trabalho intermitente o empregado fará jus a metade do aviso prévio indenizado e da multa sobre o saldo do FGTS e receberá na integralidade as demais verbas rescisórias. Também poderá o empregado sacar até oitenta por cento do seu saldo na conta do FGTS, porém não poderá ingressar este no Programa Seguro-Desemprego.

Dessa maneira observa-se que a introdução do instituto do contrato de trabalho intermitente teve como suposto objetivo trazer maior flexibilidade no que tange às contratações de mão de obra por parte das empresas, principalmente das grandes empresas e daquelas que utilizam mão de obra sazonal. Assim, busca-se, com isso, reduzir os custos das mesmas quanto ao pagamento de parcelas salariais devidas, uma vez que, paga-se apenas pelo efetivo uso da mão de obra pelo tempo contratado. O tempo em que o empregado ficar sem prestar serviços ao empregador não será computado como tempo à disposição do mesmo, não tendo esse que pagar por tal período.

Com isso o empregador ficará sempre numa situação confortável, principalmente em se tratando de empresas maiores e com pouca concorrência no mercado, visto que, terão um exército de trabalhadores à sua disposição que poderá ser convocado quando esta tiver real necessidade da prestação dos seus serviços. Ao contrário, o empregado, fica numa situação onde o mesmo será obrigado a buscar outros empregos para complementar a sua renda perdida, transformando-se num verdadeiro autônomo. Terá o mesmo que se desdobrar prestando seus serviços a outros empregadores, o que lhe gera preocupação adicional em se locomover e satisfazer às exigências dos seus diferentes patrões, isso se conseguir outros empregos.

Assim, observa-se que, diferentemente do que pregou a reforma trabalhista, o instituto do contrato intermitente favorece única e exclusivamente ao empregador, que não mais precisa manter o empregado e seus encargos correspondentes em períodos ociosos.  Dessa maneira, terá sempre mão de obra especializada disponível, enquanto que o empregado terá de se desdobrar entre dois, três ou mais empregos para conseguir garantir um patamar de renda equivalente à de um empregado com contrato de trabalho fixo.

Conclui-se portanto, que tal instituto inserido pela reforma revela-se, em verdade, como um verdadeiro retrocesso social para os trabalhadores, visto que, por meio dele os empregados ver-se-ão cada vez menos protegidos contra a despedida arbitrária, estando estes desprovidos de quaisquer garantias de permanência no emprego, sujeitos às incertezas e riscos do mercado, o que não deveria ocorrer, tendo em vista que, os riscos do empreendimento empresarial devem ser arcados exclusivamente pelo empregador, conforme o princípio da alteridade.

2.2 - Equiparação das Dispensas Imotivadas Individuais, Plúrimas ou Coletivas.

A Reforma Trabalhista trouxe sensível modificação no instituto da despedida em massa. Antes da lei 13.467/17, o TST entendia que esta deveria ser precedida de negociação coletiva, através de acordo ou convenção coletiva celebrados pelos sindicatos profissionais e patronais. Após a alteração introduzida pela reforma, já não existe mais tal obrigatoriedade, sendo direito potestativo do empregador a dispensa imotivada dos seus empregados em qualquer uma das modalidades: individual, plúrima ou coletiva. Dessa maneira, excluiu-se a necessidade de interferência do sindicato representativo da categoria obreira, visto que, a despedida em massa, já não necessita mais de seu aval prévio.

Assim, é notório que a despedida em massa gera consequências muito sérias de ordem econômica e social, visto que, em muitos casos, poderá elevar os índices de desemprego em determinado setor provocando reflexos sobre os indicadores econômicos locais, regionais e nacionais, a depender da extensão da empresa.

Nota-se claramente que a possibilidade da despedida em massa não deveria ficar a critério única e exclusivamente da parte patronal, visto que, os contratos de trabalho, ainda que por equipe são individuais no que tange ao cumprimento de suas cláusulas por cada empregado, sendo que, a reciprocidade exigiria que decisões que afetam toda uma categoria de empregados deveriam ser tomadas com a participação dos entes sindicais envolvidos. É como também concorda Correia (2018):

Esse dispositivo traz prejuízos indiretos aos trabalhadores e também à sociedade e à economia do local, pois o empregador poderá dispensar centenas de empregados de uma só vez sem assegurar nenhuma contrapartida ou garantia de retorno ao trabalho caso a situação econômica da empresa melhore. A exigência do acordo ou convenção coletiva de trabalho atribuía maior relevância à atuação dos sindicatos da categoria profissional no momento da dispensa.

Logo, nota-se com essa modificação introduzida ao instituto da despedida em massa, uma forte flexibilização das relações laborais e uma drástica redução da força sindical no que tange à representação e proteção dos seus trabalhadores, o que só beneficia a classe empresária em detrimento da classe operária, o que não se justifica nem mesmo em situações de grave crise econômica conforme a vivenciada hodiernamente no país, visto que, o que gera crescimento econômico no longo prazo é a manutenção do emprego, que por sua vez, aumenta a circulação de renda e o consumo dos produtos, realimentando a cadeia produtiva em um ciclo virtuoso de crescimento.

Por outro lado, políticas contracionistas, com impactos sobre a geração de emprego e políticas de cortes com pessoal, como a despedida em massa, aumentam a recessão, visto que, o trabalhador agora sem renda, não mais poderá consumir produtos no mercado, o que gera a paralisação da produção por falta de consumo, ou seja, um ciclo vicioso que leva à estagnação.

Logo, flexibilizar a garantia de emprego e os mecanismos de proteção conferidos aos trabalhadores, ainda que em tempos de crise, não se revela como um argumento politicamente e muito menos juridicamente aceitável para o enfrentamento da recessão econômica, pois de um lado os trabalhadores perderão seus empregos e do outro as empresas perderão grande parte dos consumidores para os seus produtos.

2.3- Princípio da Intervenção Mínima

A lei 13.467/17 alterou significativamente a redação do art. 8º da CLT, bem como acrescentou-lhe mais dois parágrafos:

Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

§ 1º O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho.        

§ 2o Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei.   

§ 3o No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.

Todavia, a CLT, em seu art. 8º parágrafo único, antes da Reforma, previa apenas que: “O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste." Assim, da leitura atenta ao texto da CLT antes e após a reforma, observa-se que, em primeiro lugar, o direito comum passou a ser sempre fonte subsidiária do direito do trabalho, retirando do texto da lei a previsão de que seria incabível a sua aplicação quando este fosse incompatível com os princípios fundamentais do direito laboral, dando a entender que a sua aplicação se dará de maneira indiscriminada, em que pese, eventual incompatibilidade entre esses dois ramos do direito.

Ademais, com o acréscimo dos parágrafos 2º e 3º visou limitar a atuação do Poder Judiciário, instituindo um novo princípio ao direito do trabalho, o princípio da intervenção mínima, tendo em vista que vedou a edição de súmulas e enunciados de jurisprudência que inovem o ordenamento jurídico, visto que não podem restringir direitos ou criem obrigações que não estejam previstos na legislação.

Além disso, instituiu-se também que o Poder Judiciário quando analisar acordos e convenções coletivas de trabalho deverá analisar apenas se os elementos essenciais do negócio jurídico estão presentes, conforme disposição no art. 104 do Código Civil, conforme redação abaixo:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I - agente capaz;

II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Nesse sentido, nota-se que pretendeu-se, em verdade, com a reforma trabalhista engessar a atuação da Justiça do Trabalho limitando a atividade do julgador a analisar apenas a presença dos elementos essenciais do negócio jurídico a saber agente capaz objeto lícito possível determinado ou determinável e forma prescrita e não defesa em lei, estabelecendo, assim o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva e acentuando a hipossuficiência dos trabalhadores que ver-se-ão cada vez mais pressionados por seus empregadores à formalizarem acordos coletivos que poderão ser-lhes prejudiciais.

2.4 - Prescrição Intercorrente

De acordo com Saraiva e Linhares (2018), a prescrição intercorrente é a prescrição que ocorre durante o andamento da ação, em virtude da paralisação ou da não realização de atos processuais pelo exequente. Nesse sentido, a Reforma Trabalhista passou a admitir no âmbito do direito laboral, o instituto da Prescrição Intercorrente, tendo em vista, a inclusão do artigo 11-A na CLT, conforme redação abaixo transcrita:

Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos. 

§ 1º A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução. 

§ 2º A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.

Ressalte-se que, antes da reforma trabalhista o instituto da prescrição intercorrente não era aplicável à Justiça do Trabalho por força da súmula 114 do TST, todavia em virtude da inclusão do artigos 11-A pela lei 13.467/17 a prescrição intercorrente passou a ser aplicada também ao processo trabalhista a partir do momento em que o exequente deixar de cumprir determinação judicial no curso da execução, podendo ainda esta ser declarada em qualquer grau de jurisdição de ofício ou a requerimento da parte. (MIGLIORANZI; HABERMANN, 2017)

É notório que este dispositivo, em verdade, fortalece a impunidade quanto aqueles empregadores que não cumprem voluntariamente as determinações judiciais quando do comprimento da sentença. Ademais, nota-se também que determinadas medidas a serem adotadas durante a fase de cumprimento de sentença dependem de requerimento da parte exequente, que poderá encontrar dificuldades em obter as informações necessárias, como endereço da outra parte e a indicação dos bens sujeitos à penhora, de modo a cumprir tempestivamente às determinações judiciais, o que pode tornar a fase executória improdutiva, gerando grave prejuízo ao empregado, fulminando na prescrição intercorrente, sendo este mais um aspecto negativo quanto à reforma trabalhista.

2.5 - Equiparação Salarial

O texto anterior da CLT disciplinava que sendo idêntica a função a todo o trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador corresponderá idêntico salário. Após a Reforma trabalhista, todavia, foram acrescentados mais requisitos para a caracterização da equiparação salarial, tornando-a agora muito difícil de ser reconhecida. Antes bastava que a prestação dos serviços entre os empregados, desde que com a mesma produtividade e perfeição técnica, se desse por tempo não superior a dois anos, ressalvando-se apenas no caso de o empregador possuir pessoal organizado em quadro de carreira.

Todavia, com o advento da lei 13.467/17 é necessário que além destes requisitos, os empregados preencham também o requisito da contemporaneidade da prestação dos serviços, ou seja, que os empregados paragonado e paradigma laborem no mesmo estabelecimento da empresa e que a diferença de tempo de serviços entre estes não supere o período de 4 anos e acrescentou a exigência de diferença de tempo na função não superior a 2 anos, o que dificultou significativamente a possibilidade do reconhecimento deste instituto. (SOUTO; SARAIVA, 2018, p. 178-180)

Dessa forma, quis o legislador tornar mais dificultosa a comprovação da similaridade das funções, o que, por seu turno, mostra-se explicitamente contrário ao que preceitua a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7º, in verbis,

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

Assim, nota-se que a inconstitucionalidade consiste em criar diferenças desarrazoadas e explicitamente contrárias ao texto constitucional, como a exigência, dentre outras, de que os empregados laborem no mesmo estabelecimento do empregador para obterem o direito ao salário idêntico. Tal alteração, em verdade, mostra-se claramente discriminatória, tendo em vista estabelecer que até mesmo empregados que laborem em estabelecimentos diferentes, ainda que pertencentes ao mesmo empregador e no mesmo bairro ou região de um determinado Município, ainda que exerçam funções idênticas e possuam o mesmo tempo de serviço, poderão receber salários diferentes.

Resta claro, portanto, que essas alterações introduzidas pela lei 13.467/17 tornam a súmula 6 do TST parcialmente revogada. Ademais, outro ponto que também foi acrescentado por esse dispositivo foi a permissão de estabelecimento de plano de cargos e salários mediante regulamento empresarial, acordo ou convenção coletiva não exigindo mais homologação deste por parte do Ministério do Trabalho.

Outro aspecto importante presente na súmula nº 6 do TST, que também foi alterado pela reforma, é quanto a equiparação em cadeia, visto que, com a nova lei, resta proibida a equiparação salarial com paradigmas remotos, sendo este considerado, assim, outro ponto que reforça ainda mais o sentimento de grande retrocesso social trazido pela reforma trabalhista. (SOUTO; SARAIVA, 2018, p. 178-182)

2.6 - Intervalos Intrajornadas

Os intervalos intrajornada estão dispostos no artigo 71 da CLT, esses intervalos correspondem aos períodos necessários para repouso e alimentação do empregado dentro da sua jornada de trabalho. Nesse sentido, estabelece a CLT que para jornadas que excedam o limite diário 6 horas é obrigatória a concessão de um intervalo de no mínimo uma hora salvo acordo ou Convenção Coletiva não podendo o mesmo ultrapassar as 2 horas diárias, já para as jornadas que excedam há 4 horas diárias e não ultrapassem 6 horas diárias, o intervalo previsto na legislação é de apenas 15 minutos. (RENZETTI, 2018, p. 259)

Porém, a reforma trabalhista alterou este dispositivo da CLT em seu Parágrafo 4º estabelecendo que em casos de não concessão ou de concessão parcial do intervalo intrajornada o valor pago a título de indenização sobre apenas o período suprimido terá um acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal.  Antes da reforma, todo o período correspondente ao intervalo a que fizesse jus o trabalhador deveria corresponder a um acréscimo de no mínimo 50% sobre o valor da hora normal de trabalho, além disso, as verbas correspondentes possuíam natureza salarial. (RENZETTI, 2018, p. 260)

Observa-se, dessa maneira, um flagrante retrocesso quanto a este regramento que tem por fulcro a proteção da saúde do trabalhador, tendo em vista, que agora o mesmo ficará vulnerável a recorrentes violações por parte do seu empregador quanto ao cumprimento destes intervalos mínimos. Assim, além de deixar de conferir natureza salarial ao período de tempo correspondente a todo o seu intervalo suprimido, também permite ao empregador reduzir este intervalo legal para apenas 30 minutos diários desde que, haja autorização do Ministério do Trabalho e Emprego em estabelecimentos que possuam refeitórios de acordo com os padrões especificados pelo órgão.

Ademais, a reforma trabalhista também introduziu na CLT instituto da jornada de trabalho no sistema 12 x 36, que antes era apenas regulamentado pelo próprio TST através da súmula nº 444, a qual permitia a utilização deste sistema de jornada de trabalho apenas para os empregados nas áreas hospitalares, de vigilância, bombeiros e motoristas, desde que houvesse previsão em acordo ou convenção coletiva de trabalho. (CORREIA; MIESSA, 2018, p. 184-188)

Sabe-se que, nesse sistema de jornada não há pagamento do adicional de 50% sobre o período de tempo que ultrapasse a oitava hora, uma vez que, o obreiro trabalhará 12 horas seguidas e terá um intervalo de 36 horas de descanso, dispensando-se, assim, o pagamento de horas extras. Além disso, de acordo com o novo texto da CLT introduzido pela Reforma, não há mais necessidade de norma coletiva, bastando um simples acordo individual escrito entre empregado e empregador para o estabelecimento da jornada 12 x 36. (CORREIA; MIESSA, 2018, p. 184-188)

Nesse sentido, de acordo com Correia (2018), os intervalos intrajornadas durante as jornadas de 12 x 36 poderão ser observados ou indenizados, e poderá o trabalhador laborar seguidamente, sem intervalos durante todo esse período de 12 horas, o que poderá lhe gerar graves danos à sua saúde e riscos a sua segurança no ambiente de trabalho. Outro fator a ser considerado no que tange a esse sistema de jornada é que agora este encontra-se permitido para qualquer atividade da empresa, não existindo ressalvas proibitivas no dispositivo. Também de acordo com o ilustre professor:

[...] o ser humano não é máquina, sendo necessária a concessão de intervalo para descanso e refeição durante a prestação de 12 horas de trabalho. A ausência de intervalo intrajornada traz diversos malefícios à saúde e aumenta a possibilidade de ocorrência de acidentes de trabalho. (CORREIA, 2018, p. 700)

Outro ponto crítico quanto ao instituto é o fato de que não há previsão da necessidade de autorização ou inspeção prévia de autoridade competente, a saber, do Ministério do Trabalho e Emprego, para haver prorrogação do horário de trabalho dos empregados submetidos a esse sistema de jornada quando expostos a ambientes insalubres, o que pode gerar riscos para a saúde e segurança dos empregados que laborem nesse sistema.

2.7 - Do Empregado Hipersuficiente

Esse pode ser considerado um dos pontos mais polêmicos da reforma, tendo em vista, que a Constituição Federal, em seu art. 7º inciso XXXII, proíbe a distinção entre as diferentes espécies de trabalho e entre os diferentes profissionais, o que também é reforçado pelo art. 3º da CLT e seu parágrafo único. Sendo assim, uma vez que a cada um é dada a sua parcela de função social, não se revela constitucional o estabelecimento de limites ao alcance da lei para determinados grupos de trabalhadores. A lei é para todos e deve ser igualmente observada por todos.

Dessa maneira, a reforma trabalhista mostra-se mais uma vez inconstitucional ao disciplinar o instituto do empregado hipersuficiente, que seria aquele empregado que possui nível superior e que percebe salário mensal igual ou superior a duas vezes o valor do teto dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, podendo este empregado e seu empregador, estipularem livremente as cláusulas que regerão o contrato de trabalho. (CORREIA; MIESSA, 2018, p. 335-337)

Logo, observa-se, portanto, que de acordo com esse conceito, esvazia-se um dos elementos intrínsecos à relação de emprego, a saber, o elemento da subordinação jurídica, tendo em vista que, empregados que ganham salários maiores, não estariam única e exclusivamente subordinados à obediência da lei, verdadeiro elemento que caracteriza a hipossuficiência do empregado frente ao empregador. O que, em tese, permitiria que o obreiro abrisse mão de seus direitos de forma até mesmo prejudicial, ferindo, assim, o princípio da inalterabilidade contratual lesiva e o princípio da alteridade, visto que, os riscos da atividade econômica devem ser arcados única e exclusivamente pelos empregadores. (CORREIA, 2018, p. 182)

2.8 - Salário - parcelas salariais

Este foi um dos pontos onde as alterações introduzidas pela reforma foram bem significativas, haja vista, a alteração da natureza de algumas verbas trabalhistas. Nesse sentido, a redação antiga do artigo 457 da CLT previa, por exemplo, que as comissões, percentagens, gratificações, diárias para viagens até 50% da remuneração e os abonos pagos pelo empregador possuíam natureza salarial.

Todavia, com o advento da reforma esse dispositivo foi alterado sensivelmente, sendo retirada a natureza trabalhista de algumas verbas. Dessa maneira, a lei 13.467/17 limitou a natureza salarial a apenas: a importância fixa estipulada, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador. Ademais, estabeleceu que as importâncias pagas a título de ajuda de custo, diárias para viagem, auxílio-alimentação, vedado o seu pagamento em dinheiro, abonos e prêmios, por seu turno, não integram a remuneração do empregado, e portanto, não constituem base de cálculo para encargos trabalhistas e previdenciários conforme redação expressa no parágrafo segundo do artigo 457 da CLT. (CASSAR, 2018, p.178)

Nesse sentido, buscou o legislador limitar ainda mais a incidência de encargos trabalhistas e previdenciários sobre as verbas pagas a título de remuneração aos empregados o que, em verdade, reduz ainda que indiretamente, os ganhos do trabalhador, visto que, o mesmo terá redução das verbas correspondentes aos recolhimentos relativos ao décimo terceiro salário FGTS e do futuro salário de benefício. Logo, não restam dúvidas de que o dispositivo em comento constitui em enorme retrocesso social e em significativa redução da qualidade de vida e direitos arduamente conquistados pela classe trabalhadora.

Ademais, tal alteração mostra-se explicitamente inconstitucional, haja vista, que independentemente da nomenclatura dada a determinada verba trabalhista o fato de a mesma ser paga com habitualidade confere-lhe a natureza salarial, como exemplo de contraprestação paga ao empregado pela prestação dos seus serviços. Esse mesmo é o entendimento presente no enunciado nº 17 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho a respeito da Reforma Trabalhista, conforme sua leitura abaixo:

PARCELAS REMUNERATÓRIAS SOB A LEI 13.467/2017 1. EXPRESSÃO "AINDA QUE HABITUAIS" CONSTANTE DO § 2o DO ART. 457, DA CLT, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 13.467/17. A interpretação sistemática dos artigos 195, I e 201, caput e § 11, da Constituição Federal revela que a contribuição social incide sobre os ganhos habituais, a qualquer título, para se preservar o equilíbrio financeiro e atuarial do RGPS - Regime Geral da Previdência Social com igual razão, a interpretação do art. 457, § 2o, da CLT, em conformidade com a constituição, denota que não importa o título atribuído pelo empregador à parcela, porquanto, para ter natureza jurídica salarial, basta que ela seja habitual e decorrente do trabalho prestado por conta alheia, sendo meramente exemplificativo o rol do § 1o e admitindo-se outras parcelas salariais, tais como adicionais, importâncias variáveis e gratificações legais e convencionais. A não integração na remuneração das parcelas relacionadas no art. 457, §§ 2o e 4o, da CLT depende de que efetivamente sirvam a propiciar condições para realização do trabalho ou se retiram a situações excepcionais ao cotidiano da relação de emprego. [...]

2. 9 - Dano Extrapatrimonial

A lei 13.467/17 criou uma tabela limitando os valores a serem pagos em casos de condenação pelos magistrados por dano moral ou extrapatrimonial.  Além disso, a própria lei já estabeleceu de forma expressa no texto do artigo 223-C o que deve ser considerado dano extrapatrimonial, a saber, a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física como bens juridicamente tuteláveis pelas pessoas físicas. E estabeleceu, por outro lado, como bens tuteláveis às pessoas jurídicas: a imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo de correspondência, tornando esses dispositivos numerus clausus, ou seja, não poderá o julgador ampliar tais conceitos.

Logo, nota-se, com isso uma verdadeira tarifação do dano extrapatrimonial no âmbito do direito do trabalho, o que não é admitido nem mesmo em outros ramos do direito, como no civil ou penal. O juiz trabalhista passou agora a ficar adstrito aos valores previsto na lei, o que acaba por violar os princípios do livre convencimento do magistrado, bem como o princípio da separação dos poderes, haja vista, que o legislador, nesse caso, ultrapassou a sua função legiferante, acabando por engessar a própria atuação jurisdicional.

Tal inconstitucionalidade é tão absurda que, não considera a impossibilidade de definir de antemão a extensão de um dano moral, o qual logicamente só pode ser avaliado pelo próprio julgador quando da análise do caso concreto. Ademais, consta no próprio artigo 5º da CF/88 incisos V e X, o direito de resposta e de indenização, elevados à direitos fundamentais, são considerados cláusulas pétreas, logo, não podem ser reduzidos ou suprimidos, nem mesmo por emenda constitucional. E esse também é o entendimento do próprio STF, tendo em vista, decisão na ADPF 130/09 onde afasta definitivamente a introdução de qualquer hipótese de tarifação do dano moral por lei ordinária no ordenamento jurídico pátrio.

2.10 - Teletrabalho

Esta nova modalidade de prestação de serviços também foi inserida pela reforma trabalhista, visto que, não havia tal previsão na antiga CLT. Entende-se por teletrabalho, o trabalho remoto ou o trabalho realizado à distância, fora das dependências do estabelecimento do empregador e a partir da utilização de meios informatizados e de telecomunicações.

É importante salientar que esta nova modalidade de prestação de serviços não constitui trabalho externo, havendo, portanto, o controle da jornada de trabalho por parte do empregador. Todavia, esse controle não significa a observância de intervalos intra e interjornadas, tendo em vista, que os empregados submetidos a esse regime de labor à distância, não fazem jus ao recebimento de horas extras, pois foram excluídos do capítulo da CLT que trata da "Duração do trabalho". Dessa forma, também não fazem jus ao adicional noturno.

Ademais, de acordo com a nova redação da Consolidação, introduzida pelo artigos 75-D da lei 13.467/17, deverá ser prevista em contrato escrito a responsabilidade quanto à aquisição, à manutenção dos equipamentos e da infraestrutura das instalações, bem como, quanto ao reembolso de despesas a serem utilizadas para a prestação o trabalho à distância. Nesse sentido, depreende-se da leitura do artigo supra que, buscou legislador compartilhar ou até mesmo possibilitar a transferência dos riscos do negócio ao obreiro, o que acaba ferindo o princípio da alteridade, tendo em vista, que é o empregador quem deve suportar os riscos da sua atividade econômica. (RENZETTI, 2018, p. 58)

Todavia, em que pese estes pontos controversos do instituto, vislumbra-se que o teletrabalho é uma tendência do mundo contemporâneo, e já vem sendo largamente adotado em vários países desenvolvidos, tanto no setor privado, quanto no setor público. Aqui no Brasil, por exemplo, esse sistema de home office já é bastante utilizado em diversos órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, a exemplo, de diversos Tribunais Regionais de Trabalho que mantêm servidores laborando nesse sistema, o que por sua vez, reduz bastante os custos com manutenção de pessoal, energia, locação de espaços e manutenção de equipamentos.

Ademais, é notório que o sistema de teletrabalho pode ser muito benéfico para o próprio trabalhador, uma vez que, o mesmo poderá prestar seus serviços diretamente de sua residência, não precisará perder horas do seu dia no trânsito, poderá passar mais tempo com a sua família e ser mais produtivo, visto que, poderá reorganizar melhor o seu tempo. Nesse sentido, percebe-se que o instituto do teletrabalho possui impactos favoráveis sobre a vida do trabalhador e do mercado de trabalho como um todo, revelando-se como uma das poucas alterações positivas para a classe trabalhadora introduzida pela nova lei. (RENZETTI, 2018, p. 59)

2.11 - Prevalência do negociado sobre o legislado

A prevalência dos acordos e convenções coletivas sobre as leis trabalhistas relativos aos direitos previstos no artigo 611- A da CLT, introduzido pela lei 13.467/17, veio para consagrar a flexibilização das leis no âmbito laboral, afastando o caráter publicista de alguns institutos do direito do trabalho. Esse dispositivo juntamente com seus quinze incisos acabou, em verdade, não apenas por flexibilizar, mas por sepultar importantes direitos conferidos à classe trabalhadora.

O artigo 611-A dispõe a respeito de institutos que poderão ser livremente pactuados entre sindicatos e empregadores através de acordos ou convenções coletivas de trabalho, e acrescentou que essas normas coletivas sempre terão prevalência sobre a lei, colocando assim os instrumentos de negociação coletiva acima da própria, invertendo a pirâmide de Kelsen. Ademais, é importante esclarecer que o rol previsto nesse artigo é meramente exemplificativo, dada a expressão “entre outros” constante em seu caput.

É importante trazer à baila também que além da previsão de que normas coletivas prevalecem sobre as leis, o poder judiciário quando do exame dos contratos coletivos em questão, só poderá analisar se estes encontram-se em conformidade com os elementos essenciais do negócio jurídico, conforme disposto no art. 104 do Código Civil, o que de fato, revela mais uma vez a intenção do legislador de engessar a atuação do magistrado trabalhista, violando mais uma vez, o princípio da separação dos poderes, pois adentra na própria esfera julgadora do Poder Judiciário, visto que, o mérito apenas a este cabe decidir, conforme estabelece a Constituição Federal.

Vale aqui fazer um adendo, visto que, esse dispositivo, flagrantemente, fere princípios basilares do direito trabalhista, como o princípio da prevalência da condição mais benéfica para o trabalhador, o princípio do in dubio pro misero, o princípio da irrenunciabilidade e princípio da aplicação da norma mais favorável ao trabalhador. Portanto, de acordo com esses princípios, no âmbito do direito laboral a norma a ser aplicada às relações trabalhistas sempre será aquela que seja mais benéfica para o empregado, independentemente da sua posição hierárquica, como bem explica Cassar (2018, p. 30):

O princípio da norma mais favorável deriva também do princípio da proteção e pressupõe a existência de conflito de normas aplicáveis a um mesmo trabalhador. Neste caso, deve-se optar pela norma que for mais favorável ao obreiro, pouco importando sua hierarquia formal. Em outras palavras: o princípio determina que, caso haja mais de uma norma aplicável a um mesmo trabalhador, deve-se optar por aquela que lhe seja mais favorável, sem se levar em consideração a hierarquia das normas.

Além disso, cumpre acrescentar que, em que pese o artigo acima citado estabelecer de maneira exemplificativa o rol de direitos que podem ser negociados através de acordos e convenções coletivas, o artigo 611-B veda que matérias de natureza constitucionais possam ser livremente estipuladas pelas partes. Assim, enumera taxativamente uma série de direitos, basicamente, todos os direitos sociais já previstos no artigo 7º da Constituição Federal.

Todavia, as normas insertas na CLT pelo artigo 611-A já se revelam bastante prejudiciais aos trabalhadores caso sejam flexibilizadas, tendo em vista, que muitas delas tratam-se de aspectos relativos à saúde e segurança do trabalhador, o que, de fato, deveriam ter sua fiscalização ampliada, de maneira a evitar doenças e acidentes no ambiente de trabalho.

3- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, pode-se afirmar categoricamente que a reforma trabalhista trouxe graves e profundas mudanças sobre a vida dos trabalhadores e pouca ou nenhuma efetividade no que tange à geração de novos postos de trabalho. O que se percebe até o momento é que, em verdade, a reforma precarizou ainda mais as relações de trabalho, retirando direitos da classe trabalhadora e incentivando as demissões em massa e sem justa causa.

De acordo com a opinião de entidades sindicais do país, observa-se atualmente uma maior insegurança por parte do trabalhador quanto a ingressar ou não na justiça do trabalho para reclamar o pagamento de verbas rescisórias devidas pelo antigo empregador. Para esses órgãos, isso se deve ao fato de existir entre os trabalhadores, após as alterações na legislação processual trabalhista, maior temor quanto à possíveis condenações ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais. O que, de fato, vem provocando forte redução das demandas apresentadas à justiça do trabalho.

Ademais, é importante destacar também que a reforma trabalhista, por possuir cunho neoliberal primou por flexibilizar as regras insertas na CLT de modo a privilegiar maus empregadores, que muitas vezes, deixam de cumprir com suas obrigações contratuais propositalmente. Por outro lado, o empregado vê-se cada dia mais desprotegido e entregue à própria sorte, sem proteção por parte do governo e nem por parte do poder judiciário, submetendo-se, muitas vezes, à condições nocivas e humilhantes de trabalho.

Portanto, nota-se que além do próprio desemprego estrutural inerente ao sistema capitalista de produção, alterações na legislação trabalhista desse viés geram um impacto negativo ainda maior sobre o mercado de trabalho, bem como sobre a economia como um todo. É evidente que, sem empregos as famílias não terão renda suficiente para voltar a aquecer o mercado consumidor, levando as empresas a produzirem cada vez menos, e, por conseguinte, gerando ainda mais desemprego, perpetuando, assim, o estado de recessão, num verdadeiro círculo vicioso.

Por fim, conclui-se que a sociedade é construída por várias peças, cada uma delas com a sua própria função, como numa verdadeira engrenagem onde tudo se encaixa para que esta gire perfeitamente. Apenas quando todas as peças estão funcionando bem e corretamente é que a economia consegue funcionar em pleno emprego e a sociedade seguir caminhando rumo a um futuro promissor, como pode ser ilustrado dignamente pelos simples, porém eternos versos do notável poeta alemão do século XX, Bertolt Brecht:

Primeiro levaram os negros

Mas não me importei com isso

Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários

Mas não me importei com isso

Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis

Mas não me importei com isso

Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados

Mas como tenho meu emprego

Também não me importei

Agora estão me levando

Mas já é tarde.

Como eu não me importei com ninguém

Ninguém se importa comigo.

4 - REFERÊNCIAS

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BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm

BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>

BRASIL. Lei 13.467 de 13 de julho de 2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13.467.htm.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho; apresentação de Celso Lafer. 7 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

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CORREIA, Henrique; MIESSA, Élisson. Manual da Reforma Trabalhista: O Que Mudou?. 1. ed., São Paulo: Juspodivm, 2018.

CORREIA, Henrique; MIESSA, Élisson. A Reforma Trabalhista e Seus Impactos.1. ed., São Paulo: Juspodivm, 2017.

De 106 artigos alterados, 69 favorecem empregadores, afirma juiz do trabalho de Florianópolis sobre a Reforma Trabalhista. Disponível em: <http://www.sintrafesc.org.br/de-106-artigos-alterados-69-favorecem-empregadores-afirma-juiz-do-trabalho-de-florianopolis-sobre-reforma-trabalhista/>. Acessado em 14 de setembro de 2018.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 16 ed. São Paulo: LTr, 2017.

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LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. 9 ed., São Paulo: Saraiva, 2018.

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MARTINS, Sérgio Pinto. Terceirização do Direito do Trabalho. 15 ed., São Paulo: Saraiva, 2018.

MARX, Karl. O Capital: Livro 1, O Processo de Produção do Capital. vol 2. 1 ed., São Paulo: Civilização Brasileira, 1998. Tradução: Reginaldo Anna.

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SARAIVA, Renato; TONASSI, Rafael; LINHARES, Aryanna. CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, 21 ed. Juspodivm, 2018.

Data da conclusão/última revisão: 6/8/2019

 

Como citar o texto:

JESUS, Vanessa Ribeiro de..A Reforma Trabalhista e a Precarização dos Direitos dos Trabalhadores. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1644. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-trabalho/4494/a-reforma-trabalhista-precarizacao-direitos-trabalhadores. Acesso em 15 ago. 2019.

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