É fácil perceber a discrepância entre o cuidado com o meio ambiente natural e com o meio ambiente artificial. Ao primeiro dispensa-se maior cautela, como se a grande maioria da população não vivesse nos grandes centros urbanos, sujeita às suas influências.

Isso faz com que a poluição visual não seja enfocada com a importância necessária. Prova disso está na atenção dispensada pela doutrina brasileira ao tema, que lhe dedica pouquíssimas páginas, enquanto inúmeras são utilizadas para tratar da poluição que ataca o meio ambiente natural. Sem falar na jurisprudência que, diante de pesquisa feita junto ao site do C. Superior Tribunal de Justiça, apontou a existência de apenas um acórdão.

Esses dados objetivos demonstram que o tema poluição visual não vem recebendo a atenção devida. No nosso entender, essa falta de atenção decorre da premissa incorreta de que a poluição visual não faz mal à saúde, bem como em razão dos interesses econômicos de vulto que cercam o tema.

No atual momento da sociedade, em que predomina a informação de massa, os veículos de comunicação visual trazem benefícios econômicos certos, facilitando o escoamento da produção.

A atual situação, grave no nosso entender, demonstra a falta de atenção do governo, nas suas três esferas de atuação (federal, estadual e municipal), bem como a falta de consciência da população em geral, uma vez que parcela significativa da poluição visual decorre de atitudes comissivas ou omissivas da própria população.

Nos termos da recomendação nº 95, do Comitê de Ministros do Conselho da Europa, que trata da conservação integrada das áreas de paisagens culturais como integrantes das políticas paisagísticas, a poluição visual consiste na “degradação ofensiva à visualidade resultante ou de acúmulo de instalações ou equipamento técnico (torres, cartazes de propaganda, anúncios ou qualquer outro material publicitário) ou da presença de plantação de árvores, zona florestal ou projetos construtivos inadequados ou mal localizados.”.

A despeito do conceito acima explicitado ser amplo, entendemos que ele é ainda mais amplo na prática, na medida em que pode ser definida como poluição visual qualquer influência desarmônica no meio ambiente artificial, que agrida a visualidade humana. De se perguntar então: o que agride a visualidade humana?

A resposta é simples, todas as imagens que causam sensações ruins, como de confusão, desarmonia ou que estão fora dos padrões estéticos e/ou arquitetônicos. Está cientificamente provado que a mente humana registra involuntariamente milhares de imagens por dia. Imagens boas trazem sensações igualmente boas, gerando na pessoa sentimento de felicidade. Imagens ruins trazem sensações ruins. A sobrecarga dessas imagens acaba gerando o estresse que, verificado de forma continuada e somado a outros fatores, acarreta inúmeros problemas à saúde graves, como infartos e derrames cerebrais.

São fatores de poluição visual, por exemplo, o despejo de resíduos sólidos nas vias públicas e em terrenos baldios, a falta de pintura, limpeza e restauração de imóveis particulares, públicos e monumentos, assim como faixas, banners, cartazes e anúncios dispostos por toda a cidade.

A fim de evitar males à saúde das pessoas, deve haver a instituição de políticas ambientais que disciplinem as diversas modalidades de anúncio. A competência para a instituição dessas políticas é concorrente, cabendo à União instituir normas federais, que serão especificadas pelos Estados e Municípios.

O art. 182 da Constituição Federal estabelece que compete aos municípios instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, em conformidade com o Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 que, no seu art. 2º, VI, “f” e “g”, estabelece como um dos objetivos ordenar e controlar o uso do solo de forma a evitar a deterioração das áreas urbanizadas, bem como a poluição e a degradação ambiental.

No âmbito do Município de São Paulo, existe lei específica disciplinando as políticas públicas destinadas a evitar a poluição visual. De fato, a Lei Municipal nº 13.525, de 28 de fevereiro de 2003, dispõe sobre a ordenação de anúncios na paisagem do município.

A lei referida estabelece inúmeros requisitos para a instalação e permanência de anúncios, em vias públicas, em imóveis particulares e em estabelecimentos como Shopping Centers, estabelecendo sanções administrativas, para o caso de descumprimento, dentre as quais a pena de multa, de perda da autorização e, até mesmo, a retirada do anúncio, no caso dos anunciantes. Para a empresa que instala o anúncio, a pena aplicada pode ser de suspensão ou de perda do cadastro.

Não obstante a existência de leis dispondo sobre os requisitos do licenciamento dos anúncios, a mera observação visual da cidade revela que as medidas são inócuas para refrear o processo de degradação da cidade de São Paulo. Proliferam pelos postes anúncios do tipo “compre ouro”, “perca peso”, “aulas particulares”, dentre outros, veiculados por meio de faixas, banners, lambe-lambes, etc., que demonstram a ineficácia da política pública estabelecida.

Como resolver a questão?

Em matéria de poluição ambiental, a tônica é a prevenção. O primeiro escopo de qualquer política ambiental, portanto, deve ser esse. Prevenção se obtém através do binômio educação/fiscalização.

Como é absolutamente impossível exercer fiscalização em larga escala, que impossibilite a configuração do dano, ambos os fatores devem ser conjugados. Especialmente os anunciantes e as empresas que veiculam anúncios devem ser orientados acerca da importância do respeito à legislação, seja sob o aspecto do bem comum, seja sob o aspecto do bem individual, consistente em evitar multas e punições pecuniárias, que representarão o chamado “passivo ambiental”.

Além dessa orientação específica para o setor, deve haver também a educação da população, uma vez que esta também é responsável pela poluição visual, quando joga lixo na rua ou mesmo quando não exerce o seu dever de fiscalização que, em se tratando de bem ambiental, é de todos, nos termos do art. 225, “caput” da Constituição Federal.

Paralelamente a isso, deve ocorrer assídua fiscalização por parte das diferentes esferas do poder público, a fim de inibir aqueles que poderiam vir a causar a poluição visual.

Não obtida a finalidade primeira que é a prevenção, deve-se buscar a reparação, ou seja, responsabilizar objetivamente o poluidor, a fim de que ele retorne ao bem ao estado anterior, ou seja, restaure, recupere ou, em isso não sendo possível, indenize. Conjugada com a reparação, deve estar a repressão, que representará a aplicação de sanções, civis, penais e administrativas ao poluidor.

A pesquisa na jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça demonstrou que poucos são os processos instaurados em decorrência da poluição visual. Geralmente, a poluição visual é objeto de termo de ajustamento de conduta que, uma vez não adequadamente fiscalizado, permite a persistência e ampliação da atividade poluidora.

A lei municipal nº 13.525, de 28 de fevereiro de 2003, da cidade de São Paulo, também concede, equivocadamente, inúmeras brechas aos poluidores, posto que dispensa do licenciamento anúncios transitórios, balões infláveis e placas e panfletos que anunciam, aos finais de semana, empreendimentos imobiliários. Estes, segundo a lei, dependem, tão-somente, de autorização.

Essa brecha acaba dificultando e confundindo a fiscalização, contribuindo para o caos urbano.

É sem dúvida um aspecto positivo a existência de uma política de combate à poluição visual, no município de São Paulo. Muito embora existente, tal política se mostra ineficaz, diante do caos visual verificado.

A legislação ainda precisa melhorar. Hoje percebe-se que inúmeros anúncios transitórios conturbam a paisagem urbana. Tal é o número de anunciantes que os anúncios transitórios acabam ficando permanentemente à vista da população, ora colocados por uns, ora colocados por outros.

A nosso ver, todo e qualquer anúncio deve estar sujeito ao licenciamento. Ainda que isso possa representar entrave a anúncios de menor impacto visual, tal sacrifício se mostra indispensável à manutenção da saúde urbana e da integridade do meio ambiente artificial.

As punições decorrentes da poluição visual devem, outrossim, ser mais pesadas, inclusive no tocante ao valor das multas e, principalmente, certas. O poluidor deve ter a certeza de que será punido. Hoje ele não tem sequer a dúvida.

Há algum tempo foi adquirido pelo município de São Paulo o veículo conhecido como “Tigrão”, veículo tipo furgão que contém inúmeras câmeras e computadores, que vão captando e processando imagens, com vistas à emissão de autos de infração.

Muito embora saiba-se que pelo menos dois desses veículos foram adquiridos, não se percebe, ainda, o benefício decorrente dessa fiscalização mais acirrada.

A fiscalização deve ser mais efetiva, a fim de que a punição seja certa.

Sob o ponto de vista patrimonial, o anúncio passará a ser um desestímulo para os infratores da legislação ambiental, uma vez que estes certamente perderão financeiramente mais do que ganham com os anúncios.

Tais sugestões certamente servirão para melhorar o caos em que atualmente se encontra o município de São Paulo.

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Como citar o texto:

ROLLO, Arthur..Considerações sobre a poluição visual na cidade de São Paulo. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 135. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-ambiental/696/consideracoes-poluicao-visual-cidade-sao-paulo. Acesso em 19 jul. 2005.

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