No Brasil, é tradição da lei assegurar receitas aos partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral. Desta forma, os repasses do Fundo Partidário gerenciados e distribuídos pelo TSE (1) evidenciam que os partidos são instituições privadas tuteladas financeiramente pelo Estado. Tanto que conforme números oficiais, a contar do exercício de 2000 por exemplo, mais de R$ 510 milhões foram distribuídos às tesourarias partidárias. Diante disso, financiamento público exclusivo para campanhas eleitorais nos moldes preconizados pela Reforma Política é pleonasmo e desvio de finalidade.

Primeiro, porque se os valores mensalmente repassados às agremiações decorrem do Orçamento da União, já há um (significativo) financiamento de natureza pública.

Segundo, que a legislação partidária em vigor determina expressamente que o destino dos recursos seja para campanhas eleitorais. Não há necessidade de mais dinheiro público (2). Com isso, basta aos partidos gerenciar eficazmente os recursos que recebem mensalmente para que no período eleitoral seus candidatos sejam contemplados. Se ainda não existem critérios legais de determinação e controle para os repasses internos, que o Congresso Nacional proceda no aperfeiçoamento das regras para, por exemplo, tornar obrigatório que os órgãos nacionais repassem níveis de percentuais aos estaduais e municipais. Seria, inclusive, a maneira de regulamentar o hiato para dar um contorno de realidade ao “caráter nacional” fixado pela Constituição Federal em relação aos partidos (3).

Terceiro, que esta relação jurídica em vigor, movimentada por dinheiro público, apenas reforça uma relação privilegiada que não distingue o público do privado, preterindo, por exemplo, ONGs e outras instituições de cunho social.

Contudo, importante destacar que partidos políticos, independentemente do conceito público que vierem a gozar, são instituições absolutamente indispensáveis e essenciais para um regime democrático. Todavia, recentes e explosivas declarações de congressista revelando doação não declarada à Justiça Eleitoral bem como fraude nas prestações de contas explicitou a fragilidade do sistema vigente e irradiou inúmeras denúncias, diariamente incrementadas por depoimentos e documentos em CPIs que se encontram em desenvolvimento.

Também recentemente, por ampla maioria, o TSE decidiu pela ilegalidade e inconstitucionalidade da cobrança de contribuição partidária, o chamado “dízimo”, descontada sobre o salário de filiado ocupante de cargo ou função de confiança (4).

Conforme o didático voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio na resposta à Consulta 1.135/DF, a prática dos descontos contraria a óptica da plena disponibilidade da remuneração pelo servidor. Na concepção do Ministro Gilmar Mendes, que o acompanhou, ela é incompatível para aqueles que defendem a democracia e o princípio da liberdade de igualdade de condições.

A propósito, constou da ementa:

CARGO OU FUNÇÃO DE CONFIANÇA – CONTRIBUIÇÃO A PARTIDO POLÍTICO – DESCONTO SOBRE A REMUNERAÇÃO – ABUSO DE AUTORIDADE E DE PODER ECONÔMICO – DIGNIDADE DO SERVIDOR – CONSIDERAÇÕES – Discrepa do arcabouço normativo em vigor o desconto, na remuneração do servidor que detenha cargo de confiança ou exerça função dessa espécie, da contribuição para o partido político.

Respeitadas as opiniões diversas, se entende que a destinação de mais recursos públicos para partidos e candidaturas significa escárnio que a sociedade não merece, sobretudo porque campanha eleitoral, para alcançar êxito, não precisa ser onerosa e sim eficiente.

Décadas atrás inexistia tamanho paternalismo e nem por isso o Congresso Nacional deixou de ter parlamentares bem votados e decentes em suas Casas. Logo, o momento revela a necessidade de um amplo e desapaixonado aperfeiçoamento das questões que envolvem financiamento e receitas de partidos e de candidaturas, sob pena de comprometimento da credibilidade restante.

NOTAS:

1. Lei 9.096/95, Arts. 40 e 41.

2. Lei 9.096/95, art. 44, III.

3. CF/88, Art. 17, I.

4. Resolução TSE Nº 22.025/DF – Rel. Min. Marco Aurélio – DJ 25.07.2005 (Caso "dízimo partidário").

(Concluído em Agosto/2005)

 

Como citar o texto:

SANTOS, Antônio Mayer dos..Partidos políticos: financiamentos e finanças. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 141. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-eleitoral/744/partidos-politicos-financiamentos-financas. Acesso em 29 ago. 2005.

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