1- Introdução; 2- Protocolo de Quioto; 3- Mecanismo de Desenvolvimento Limpo; 4- Redução Certificada de Emissão; 5- Mercado de Carbono; 6- Oportunidades; 7- Conclusão.

1 – Introdução

A crise ecológica revela uma crise ética em nossos dias, uma crise de valores, uma crise de relações humanas, e de convivência com as demais criaturas. Daí a importância da educação ambiental para a responsabilidade e o respeito à vida. Tal educação afirma valores e ações que contribuem para a transformação humana e social e para a preservação ecológica.

Ela estimula a formação de sociedades socialmente justas e ecologicamente equilibradas, que conservam  relações de interdependência e diversidade. A educação ambiental deve gerar, com urgência, mudanças na qualidade de vida e maior consciência de conduta pessoal, bem como harmonia entre os seres humanos. Essa educação ambiental está diretamente relacionada com o posicionamento das empresas em contribuir para o desenvolvimento de tecnologias que diminuem a poluição ambiental.

Os fatos que configuram o que se chama de crise ecológica são conhecidos e foram objeto de muitos estudos científicos e relatórios globais de instituições internacionais: a explosão demográfica, o efeito estufa e o aquecimento da atmosfera, o aumento da emissão de gases poluentes que rarefazem a camada de ozônio, a presença crescente de elementos químicos venenosos nos rios e mananciais, o comprometimento dos lençóis freáticos, o desmatamento e a erosão do solo, a extinção de uma multiplicidade de espécies e o desequilíbrio do ecossistema.

É bem provável que a consolidação dessas tendências conduzirá ao comprometimento da qualidade de vida e da sobrevivência de populações, bem como a lutas distributivas, nacionais e internacionais, ampliando a violência privada, ao emprego de armas químicas e bacteriológicas e de armas nucleares táticas, que, por sua vez, só agonizarão a crise ecológica.

O sensível aumento da degradação ambiental no planeta pode tornar-se ameaça endêmica ou epidêmica à qualidade de vida humana, principalmente, no tocante, às mudanças ao clima mundial.

O avanço científico associado às fortes evidências de uma alteração no clima mundial efetivou uma resposta internacional concreta que culminou na aprovação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (CQMC), durante a Convenção das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável, ocorrida no Rio de Janeiro em 1992.

Reconhecendo a mudança do clima como “uma preocupação comum da humanidade”, os governos que a assinaram tornaram-se Partes da Convenção, propondo-se a elaborar uma estratégia global “para proteger o sistema climático para as gerações futuras” (CONVENÇÃO DO CLIMA).

2- Protocolo de Quioto

Na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a partir de estudos científicos, estabeleceu-se que a principal causa da elevação da temperatura do Planeta estava no aumento das concentrações de gases com alto teor de compostos de enxofre, resultantes, principalmente, da queima de combustíveis fósseis.

A partir desta Convenção e com objetivos de se encontrar saídas para o problema ambiental do aquecimento global, diversas conferências têm sido realizadas, sendo que a de maior destaque foi a COP-3 (Conferência das Partes nº 3), realizada em dezembro de 1997, na cidade de Quioto no Japão, que resultou no estabelecimento do Protocolo de Quioto.

Contudo, apenas em 16 de fevereiro de 2005 o Protocolo entrou em vigor, 90 dias após sua assinatura pelo presidente da Rússia, Vladmir Putin, quando então foi possível cumprir os requisitos para tal, ou seja, ter sido ratificado por 55 nações-parte que respondam por pelo menos 55% das emissões globais, tornado-se norma internacional (Tratado) de observância obrigatória pelos países signatários que o ratificaram, que são mais de 140 países, em todo o mundo, correspondendo a 61,6% das emissões globais.

O Protocolo de Quioto, em linhas gerais, tem como objetivo frear a elevação da temperatura do planeta, através da diminuição da emissão do Dióxido de Carbono (CO2) e de cinco outros gases causadores do efeito estufa, provenientes principalmente da queima de combustíveis fósseis e da destruição dos ambientes naturais.

Diante do atual cenário mundial, em que a geração de energia é amplamente baseada em petróleo e carvão, esse é um árduo desafio, contudo, necessário para proteger o sistema climático e preservar a sadia qualidade de vida, para as gerações atuais e futuras.

Neste instrumento foram estabelecidas metas específicas de redução de emissão de gases causadores do efeito estufa (GEEs) em pelo menos 5% em relação aos níveis emitidos pelos países em 1990. Estas metas, somente obrigatórias para os países do Anexo I, os países mais industrializados, também chamados de desenvolvidos, deverão ser atingidas no decorrer do chamado primeiro período de compromisso, que corresponde aos anos de 2008 a 2012. Para o segundo período, isto é pós-2012, ainda não foram estabelecidas metas de redução de emissões.

Para atingir os objetivos firmados, cada um dos países, cuja conduta se pretende regular através desta norma, deverá:

§ formular programas nacionais e regionais adequados para melhorar a qualidade dos fatores de emissão, e que contenham medidas para mitigar a mudança do clima bem como medidas para facilitar uma adaptação adequada à mudança do clima;

§ cooperar na promoção de modalidades efetivas para o desenvolvimento, a aplicação e a difusão, destes programas e tomar as medidas possíveis para promovê-los;

§ facilitar e financiar, conforme o caso a transferência ou o acesso a tecnologias, Know-how, práticas e processos ambientalmente seguros relativos à mudança do clima, dentre outras práticas previstas no artigo 10, do Protocolo de Quioto.

Também restaram estabelecidos os meios para o cumprimento destas metas, também chamados de mecanismos de flexibilização, que são arranjos técnico-operacionais para utilização por parte de empreses ou países. Eles oferecem facilidades para que as partes (países) incluídas no Anexo I possam atingir seus limites e metas de redução de emissões.

Tais instrumentos também têm o propósito de incentivar os países em desenvolvimento a alcançar um modelo adequado de desenvolvimento sustentável. São três os mecanismos de flexibilização previstos: Comércio de Emissões, realizado entre os países listados no Anexo I, de maneira que um país, que tenha diminuído suas emissões para abaixo de sua meta, transfira o excesso de suas reduções para outro país que não tenha alcançado tal condição; Mecanismo de Desenvolvimento Limpo; e Implementação Conjunta, ou seja, implantação de projetos de redução de emissões de GEEs em países que apresentam metas no âmbito do protocolo. Apenas o MDL aplica-se ao Brasil.

3- Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL

O artigo 12 do Protocolo de Quioto, prevê um mecanismo flexível, ou seja, uma alternativa, ou forma subsidiária, para que os países do Anexo I que não tenham condições de promover a necessária redução de gases em seu território possam atingir suas metas de redução de emissão de gases de efeito estufa, estimulando, ao mesmo tempo, o desenvolvimento estruturado daqueles países que não tenham atingido níveis alarmantes de emissão de poluentes.

Consiste basicamente na utilização das reduções atingidas pelos países em desenvolvimento (entre os quais está o Brasil) pelos países desenvolvidos para o cumprimento de suas metas obrigatórias.

Beneficia tanto os países desenvolvidos – do Anexo I - como os não listados neste que são os países em desenvolvimento, por meio do mecanismo denominado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), onde a tentativa de reversão do aquecimento global ganha contornos de um negócio lucrativo.

Neste mecanismo são confeccionados projetos que auxiliam a redução de emissão de carbono gerando créditos. Estas Reduções Certificadas de Emissões ou Certificados de Redução, conhecidos popularmente com “créditos de carbono” podem ser usados por empresas, entidades ou países do Anexo I para atingir suas metas de redução de emissões, ou seja, poderão ser comercializados.

Constata-se que o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo será realmente capaz de proporcionar benefícios substanciais para o desenvolvimento sustentável em conformidade com o próprio propósito do mecanismo. Para os países em desenvolvimento, pode ocorrer a preocupação com necessidades econômicas e ambientais imediatas, e a perspectiva de tais benefícios devem proporcionar um forte estímulo para participar da implementação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.

De acordo com as normas estabelecidas os projetos de MDL devem atender concomitantemente as seguintes condições:

a) participação voluntária;

b) implicar em redução adicional à que ocorreria sem a sua implementação;

c) contribuir para o desenvolvimento sustentável do país em que seja implementada;

d) demonstrar benefícios reais, mensuráveis a longo prazo relacionados com a mitigação da mudança do clima.

Ou seja, as atividades de projeto do MDL, bem como as reduções de emissões de gases de efeito estufa ou aumento de remoção do CO2 a estas atribuídas deverão ser submetidas a um processo de aferição e verificação por meio de instituições e procedimentos estabelecidos na COP-7.

Foi determinado ainda que somente poderão ser elegíveis projetos de MDL relacionados à:

a) investimentos em tecnologia mais eficientes;

b) substituição de fontes de energia fósseis por renováveis;

c) racionalização do uso de energia;

d) florestamento e reflorestamento.

Estão excluídas atividades ligadas ao manejo agro-postoril, como por exemplo, plantio direto e outras formas mais “sadias” de manejo agrícola, e também não são elegíveis atividades de manejo florestal (desmatamento evitado).

4 – Redução Certificada de Emissão - RCE

Os projetos de MDL somente estarão aptos a gerarem Certificados de Emissão Reduzida, se a redução for efetivamente certificada por organismos competentes, o que significa que os projetos de MDL deverão ser submetidos a um processo de aferição e verificação de critérios técnicos rigorosos por meio de procedimentos estabelecidos na COP-7 (Conferência Internacional das Partes nº 7).

A primeira etapa para a aquisição dos “Créditos de Carbono” é a elaboração do projeto de MDL, o qual deve conter obrigatoriamente, a descrição do negócio em todas as suas nuances; a metodologia que será utilizada para “fazer a conta” dos “créditos de carbono” (esta metodologia deve ser previamente aprovada pela ONU); e a forma de monitoramento do projeto.

Feito o projeto este deve ser validado por uma Entidade Operacional Designada (EOD), ente privado, devidamente inscrito na ONU (como por exemplo, a ISO). O projeto já validado deverá receber então uma carta de aprovação concedida pelo país onde se encontra o projeto, através da Autoridade Nacional Designada. No nosso caso, foi formada uma Comissão Interministerial a qual tem como objetivo regular a questão dos “créditos de carbono” no Brasil e emitir a carta de aprovação para os projetos de MDL.

Com a carta de aprovação o projeto é remetido à ONU para que seja registrado no Conselho Executivo do MDL. A próxima etapa é a do monitoramento do projeto e após a realização de verificação, feita, novamente, pela Entidade Operacional, o projeto obterá a Certificação de Emissões Reduzidas, as quais poderão ser vendidas no mercado.

Sendo assim, a Redução Certificada de Emissão (RCE) é uma unidade emitida pelo Conselho Executivo do MDL (ONU), em decorrência da atividade de um projeto de MDL e representa a não-emissão de uma tonelada métrica equivalente de dióxido de carbono pelo empreendimento.

Frisa-se, a partir dos pilares do direito privado que cuida do estudo das coisas, podemos classificar os “Créditos de Carbono”, concedidos mediante a entrega das Reduções Certificadas de Emissões (RCEs), como bens incorpóreos, imateriais ou intangíveis, tendo em vista que estes não têm existência física, mas são reconhecidos pela ordem jurídica (Protocolo de Quioto), tendo valor econômico para o homem, uma vez que são passíveis de negociação.

5 – Mercado de Carbono

Mercado de Carbono é o termo popular utilizado para denominar os sistemas de negociação de unidades de redução de emissões do GEEs. No âmbito do Protocolo de Quioto há dois tipos de mercados de carbono: mercado de créditos gerados por projetos de redução de emissões (Projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e Projetos de Implementação Conjunta), e mercado de permissões.

É importante ressaltar que o mercado “oficial”, ou seja, em conformidade com as regras estabelecidas pela ONU ainda não existe, está em fase de regulamentação. Na última Conferência Internacional das Partes (COP) é que se estabeleceu a forma de registro dos projetos, faltando ainda a regulação das outras etapas.

No entanto, muitas empresas já possuem projetos de MDL, os quais se encontram em diferentes etapas do procedimento. Um exemplo é a Companhia Açucareira do Vale do Rosário que possui um projeto de MDL envolvendo a co-geração de energia obtida a partir do bagaço da cana-de-açúcar, sendo que, já existem compradores para os “créditos de carbono” que serão gerados.

Uma das empresas que atuam no setor, dando assessoria técnica, investindo em projetos de MDL através de parcerias e intermediando a venda é a ECONERGY (www.econergy.com.br).

Apesar de o mercado “oficial” da ONU ainda não estar em funcionamento, “mercados paralelos” surgiram, onde projetos privados são negociados em bolsas de carbono localizadas principalmente nos EUA, possuindo, no entanto, regras e parâmetros diferentes dos adotados pela ONU em razão do Tratado de Kyoto. No entanto, os preços alcançados nesses mercados (por volta de US$ 5,00/ ton.) ainda é considerado baixo por alguns especialistas, pois se espera que o mercado regulado pela ONU tenha preços mais convidativos.

Um mercado de carbono “paralelo” também está em fase de implantação no Brasil conforme noticiado pela imprensa, pela BM&F/BVRJ, em convênio com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), visando estimular o desenvolvimento de projetos de MDL e viabilizar negócios no mercado ambiental de forma organizada e transparente.

 O primeiro passo foi a criação de um Banco de Projetos de MDL, um sistema eletrônico que registrará projetos de redução de carbono, que já tenham sido validados por uma Entidade Operacional Designada, ou que ainda estejam em fase de estruturação. Também, os investidores, serão pré-qualificados e cadastrados na Bolsa para divulgar suas intenções em adquirir no mercado de créditos a serem gerados por projetos de MDL.

6 - Oportunidades

Frente a esses novos desafios inicialmente estabelecidos em Quioto, as empresas que se encontram nos países enquadrados no grupo dos países industrializados sofreram um significativo impacto, uma vez que deverão atingir metas determinadas de emissão máxima de gases poluentes.

Caso ultrapassem suas respectivas quotas, a alternativa dada a esses países é a utilização do mecanismo de compensação estabelecido no Protocolo, segundo o qual as empresas dos países industrializados poderão comprar os chamados “créditos de carbono” de empresas localizadas em países em desenvolvimento.

Estima-se que a partir de 2008, quando efetivamente passam a valer as regras do Protocolo, aproximadamente 13 bilhões de dólares serão movimentados no mercado internacional para que se financiem projetos de aprisionamento de carbono. O Brasil tem capacidade de absorver uma grande parcela desses investimentos, por meio de empresas que explorem atividades que se enquadrem nos critérios do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e que viabilizem juridicamente seu projeto.

Tais investimentos aquecem a possibilidade de ampliação de iniciativas sustentáveis na atividade industrial, em diversas áreas. Um dos setores que mais desperta a atenção dos empreendedores, principalmente do setor sucroalcooleiro, é a possibilidade de co-geração de energia elétrica pelo aproveitamento do bagaço de cana. Trata-se de um dos melhores exemplos de aproveitamento de energia renovável para projetos que tenham em vista a injeção monetária externa decorrente das regras do Protocolo de Quioto.

No Brasil, no setor energético, já existe uma gama de projetos para a geração de energia por meio de fontes renováveis e alternativas de co-geração, objetivando-se assim a redução da utilização dos combustíveis fósseis, um dos principais agentes no agravamento do efeito estufa.

Uma atividade também passível de adequação ao Protocolo é a do tratamento de resíduos, com a transformação de lixões em aterros sanitários, aproveitando-se o metano liberado na decomposição do lixo para a produção de energia elétrica. Outro mercado atrativo é o do reflorestamento, já que o Brasil possui grandes reservas naturais em seu território, além da maior floresta tropical do mundo.

7 – Conclusão

Apesar de parecer, no mínimo, estranho falar em comercialização de “Créditos de Carbono”, após um breve estudo sobre o tema, não nos restam dúvidas de que o Protocolo de Quioto é uma iniciativa mundial que promete trazer inúmeros benefícios de ordem ambiental, econômica e social.

Principalmente quando se trata dos mecanismos de flexibilização, em especial, o MDL, torna-se possível reduzir as emissões globais de GEEs e, ao mesmo tempo, abre-se importante alternativa para o desenvolvimento sustentado dos países emergentes.

Assim, se por um lado é um importante passo ao desenvolvimento de uma política global de desenvolvimento sustentável, por outro é uma formidável oportunidade negocial que deve ser observada com criteriosa análise por empresários brasileiros.

As empresas brasileiras possuem grandes possibilidades de viabilizarem projetos de MDL, contudo, para o Brasil solidificar seu potencial de atração de investimentos será necessário tomar algumas medidas urgentes.

Uma das principais medidas se refere à definição da natureza jurídica do crédito de carbono, que dará ensejo à definição de outras questões que hoje são controversas, a saber: a tributação que deverá recair sobre os CERs; a contabilização destes no balanço das empresas, além da regulação do fluxo de recursos para o Brasil e para o exterior decorrente de negociações com CERs. Referidas providências trarão maior segurança aos investidores neste mercado.

Na competição por atração de investimentos, cabe às autoridades brasileiras o papel de incentivar este mercado. O país que sair na frente deverá colher os frutos do pioneirismo. Neste sentido, a celeridade das providências visando fomentar este mercado deverá ter papel decisivo na captação de investimentos.

(Artigo escrito em Dezembro de 2005)

 

Como citar o texto:

COSTA, Dahyana Siman Carvalho da..Mercado de -créditos de carbono-. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 161. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-ambiental/996/mercado-creditos-carbono-. Acesso em 16 jan. 2006.

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