Pensa-se em perpetrar mais uma gravíssima ofensa aos princípios da moralidade pública.

Janene, deputado federal do Paraná, ficou doente. Tão doente que não consegue ser encontrado para responder a processo de cassação. Está estressado e não pode ser submetido ao agravamento desse estresse com seu comparecimento diante do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados para dizer, defender-se e provar sua tese na direção de que nada teve a ver com o mensalão e com a corrupção detalhada que foi denunciada, inclusive, pela nossa mídia.

Janene diz-se inocente. Não acreditamos. Janene diz-se doente. E a força probante de atestados médicos oficiais, vindos de médicos da própria Câmara dos Deputados, estariam dizendo isso. Sua doença, neste passo, ao que se diz, é permanente e irreversível. Cabe assim decretar sua aposentadoria permanente por incapacidade física.

Aí Janene resolve desfrutar de seu ócio em alguns dos belos lugares onde se descansa nesse extraordinário estado paranaense. E, verdadeiro milagre, recupera-se, fica bom, sem sombra de estresse a anuviar-lhe o futuro. Está novinho em folha.

Janene olha o calendário e dá-se conta que é junho. Vai ao seu partido, onde está filiado e apresenta-se como candidato a um dos mandatos que irão ser disputados em outubro. Aprovado pelos seus pares requer seu registro perante o TRE. E aí, pode ele ser candidato?

Em verdade, houve maledicentes que falaram ter, o deputado Janene, a intenção de aplicar um golpe na possibilidade de sua cassação que o inviabilizaria, tornado-o inelegível, como candidato ao próximo pleito. Acerca de possível presunção de má-fé ou burla a lei, não é possível tirar conclusões.

Mas, sobre o fato em si, da aposentadoria por invalidez permanente e do pedido de registro de candidatura é possível tirar conclusões.

Na época em que não havia reeleição não podia, o prefeito, afastar-se quatro meses antes do pleito, para candidatar-se à vice-prefeito. Sem qualquer previsão legal ou constitucional, o TSE construiu jurisprudência na direção de impedir tal candidatura para evitar a burla ao então vigente princípio da irrelegibilidade. Isto porque, o prefeito, quando eleito vice, poderia, em algum momento, vir a substituir ou a suceder o novo prefeito ferindo de morte a impossibilidade de reeleição.

É correta a afirmação de que a legislação constitucional que fixa condições de elegibilidade e a infra-constitucional que fala das inelegibilidades, não prevê a hipótese de aposentadoria por invalidez permanente como condição para impedir alguém de vir a candidatar-se em qualquer pleito. E a jurisprudência não existe para aumentar a restrição de direitos. A jurisprudência não elastece interpretações dessa natureza.

Mas não há como deferir-se tal registro sem ferir o princípio da moralidade insculpido na cabeça do art. 37 da Constituição Federal e que vale para todos os poderes da União, Estados e Municípios.

Não há como se aceitar, que possa um cidadão aposentar-se permanentemente de uma função por invalidez definitiva e depois, como num passe de mágica, tornar-se saudável e pretender exercer mandato, seja de deputado federal seja qualquer outro de caráter eletivo.

Ademais, em precedente que envolveu o ex-presidente Collor na sua primeira tentativa de ser candidato no Estado de S.Paulo, foi ele impedido de realizar seu intento visto que, tanto a Corte Paulista como o TSE entenderam que, se Collor estava impedido para o exercício da função tento em vista a cassação de seu mandato, não podia ele sequer ser candidato.

A conclusão vale para Janene. Se ele está tão doente (e nós acreditamos nisso!) que não pode exercer seu mandato ou submeter-se a processo de cassação o que o leva a requerer sua aposentadoria por invalidez permanente, não está apto para o exercício dessa função ou congênere, não podendo, como Collor no passado, só que por outra razão, candidatar-se a qualquer mandato eletivo.

E, afinal, a invalidez de Janene será permanente. O que o fará ficar, permanentemente afastado de nossas vidas.

Deo gratias!

 

Como citar o texto:

ROLLO, Alberto..Janene – doente e novamente eleito. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 165. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-eleitoral/1043/janene-doente-novamente-eleito. Acesso em 13 fev. 2006.

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