O TJGO em decisão de 31.01.2006, proc. DGJ nº 10.576-1/195 (200402468788), Comarca de Porangatu, rel. o Des. Leobino Valente Chaves, entendeu pela ilegitimidade do Município para demandar ação de prestação de contas de ex-Prefeito, referente recursos transferidos pelo Governo Federal. A ementa do acórdão tem o seguinte teor:

"Ação de Prestação de Contas. Ex-Prefeito. Ilegitimidade Ativa. Extinção do Processo. 1 - O município não tem legitimidade para propor ação de prestação de contas contra ex-prefeito, referente a verbas oriundas de convênio firmado com a União. 2 - A fiscalização financeira e orçamentária, no âmbito municipal, efetiva-se mediante o chamado controle externo exercido pela Câmara Municipal, com o auxílio do Tribunal de Contas dos Municípios, a teor das disposições do art. 31 e parágrafos da Constituição Federal. Remessa conhecida e improvida". DGJ nº 10.576-1/195 (200402468788), de Porangatu.”

Nos diversos Municípios brasileiros, se tornou corriqueiro o Prefeito sucessor, demandar ação de prestação de contas contra o seu antecessor, sobre recursos transferidos ao Município pelo Estado Federado ou a União. São inúmeras ações a encalhar o Poder Judiciário Estadual e Federal, por razões de efeito político.

A CF tratando da fiscalização do Município dispõe:

“Art. 31 - A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.

§ 1º - O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.”

São duas formas de controle: o externo, por meio da Câmara Municipal de Vereadores, com auxílio do Tribunal de Contas (na Bahia – o TCM – Tribunal de Contas dos Municípios); e, o interno, mediante mecanismo implantado pelo Município, as denominadas Controladorias. O TCM – BA, recentemente baixou a RES. nº. 1120, datada de 21.12.2005, concedendo o prazo de  270 dias, a contar de sua publicação,  para que, através de lei municipal, se efetive a criação de unidades nos órgãos/entidades municipais, às quais será atribuída a responsabilidade pela manutenção do Sistema de Controle Interno Municipal, de conformidade com as regras ali contidas.

O controle de que trata o art. 31 da CF, diz respeito aos recursos do Município, sejam os resultantes das transferências constitucionais, ou da arrecadação direta, excluindo-se, portanto, os recursos voluntários transferidos pela União, ou pelo Estado Federado onde for localizado o Município.

Quantos aos recursos voluntários transferidos pela União, a competência para apreciação das contas, é do TCU – Tribunal de Contas da União, nos exatos termos do art. 70 e seu parágrafo único da CF, com a seguinte redação:

“Art. 70 - A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Parágrafo único - Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. (Redação da E C nº 19, de 04/06/98).”

No que diz respeito aos recursos voluntários do Estado, a prestação das contas ocorre perante o TCE. Na Bahia, a Constituição Estadual dispõe:

“Art. 89 - A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Estado e dos Municípios, incluída a das entidades da administração indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções, renúncia de receitas (*), será exercida pela Assembléia Legislativa, quanto ao Estado, e pelas Câmaras Municipais, quanto aos Municípios, mediante controle externo e sistema de controle interno de cada Poder.

* A expressão e isenções fiscais, que constava do texto original, foi declarada inconstitucional pelo S.T.F. no julgamento da ADIn nº 461-1.

Parágrafo único - Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais o Estado e os Municípios respondam, ou que, em nome destes, assumam obrigações de natureza pecuniária.*

Pelo mecanismo adotado, o Gestor Público Municipal responsável pela aplicação dos recursos repassados pela União ou o Estado, encaminhará as Contas ao Órgão que os disponibilizou, e este, por sua vez, juntará às suas contas que serão integradas às do Poder Executivo respectivo. As contas dos recursos voluntários passados ao Município pelo Estado ou a União, serão apreciadas pelo TCE ou o TCU, na ordem respectiva.

Pela norma constitucional, a competência para o julgamento de contas públicas, é das Cortes de Contas, e não do Poder Judiciário, ao qual competente apenas apreciar a legalidade ou não do ato do Administrador Público. Razão assiste ao Colegiado do TJGO. Falece legitimidade processual ao Município para exigir do ex-Gestor Público Municipal, que lhe preste contas de recursos oriundos do erário público Estadual ou Federal.

Se a prestação de contas do ex-Prefeito sobre os recursos do Estado ou da União, for havida como irregulares, o chamamento a juízo do Gestor Municipal para efeito de ressarcimento de danos, far-se-á por intermédio da Procuradoria Geral do Estado – PGJ-, ou da Advocacia Geral da União – AGU. A decisão que imputar débito ao Gestor Público, servirá como título executivo, e o procedimento a ser empregado é o da execução por quantia certa contra devedor solvente.

Ao Município, somente cabe promover ação de ressarcimento de danos, se na aplicação dos recursos públicos federais ou estaduais, resultar dano ao erário ou aos bens público municipal, e mesmo assim, se a União, em casos de recursos federais, não demonstrar interesse na ação, como recentemente decidiu o STJ:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS TRANSFERIDOS À MUNICIPALIDADE POR FORÇA DE CONVÊNIO FIRMADO COM A UNIÃO FEDERAL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO PROPOSTA PELO MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO. LEGITIMIDADE DE PARTE. MANIFESTAÇÃO EXPRESSA DA UNIÃO PELA FALTA DE INTERESSE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. Cabe à Justiça Estadual processar e julgar ação de ressarcimento movida por Município contra ex-prefeito, pela não-aplicação de verbas federais repassadas por força de convênio (Súmula n.º 209/STJ). 2. Hipótese em que houve expressa manifestação de falta de interesse por parte da União em integrar a lide. 3. "Compete a justiça federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas publicas" (Súmula n.º 150/STJ). 4. Recurso especial improvido.( REsp 747644 / MT, 2ª Turma, rel. o Min.CASTRO MEIRA, j. de 13.12.2005, DJ 06.02.2006 p. 270).”   Observar-se-á que a decisão do STJ diz respeito à ação de ressarcimento, e não de prestação de contas. Mesmo na aplicação dos recursos municipais, sejam de transferências constitucionais ou da arrecadação direta, a prestação de contas é feita perante a Corte de Contas competente. No caso da Bahia, bem como em alguns outros Estados da Federação, a prestação das contas é feita ao TCM.

(Elaborado em fevereiro/2006)

 

Como citar o texto:

MONTALVÃO, Fernando D..Ação de prestação de contas contra ex-prefeito. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 179. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-publico/1258/acao-prestacao-contas-contra-ex-prefeito. Acesso em 22 mai. 2006.

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