SUMÁRIO. RESUMO; ABSTRACT; INTRODUÇÃO; CAPÍTULO 1. CÉLULAS-TRONCO; 1.1. CLONAGEM; 1.2. LEI DE BIOSSEGURANÇA; CAPÍTULO 2. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988; 2.1. PRINCÍPIO DE PROTEÇÃO À VIDA; 2.2. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

Resumo

Este trabalho analisa e discute os avanços de pesquisas médicas, utilizando células-tronco, em especial células-tronco embrionárias obtidas por meio do uso e descarte de embriões. Células-tronco são auto-replicáveis, ou seja, podem gerar copias idênticas de si mesmas. As embrionárias são as únicas que conseguem diferenciar-se em todos os 216 tecidos, que formam o corpo humano. Se privarmos o uso de células-tronco embrionárias a pretexto de salvarmos a vida em potencial de embriões, estaremos tirando a única e talvez a última possibilidade de vida digna para quem realmente está vivo e não de quem pode um dia estar, que é o caso do embrião que constitui uma vida em potencial, apenas. Sendo assim, concluímos que deve o nosso ordenamento jurídico permitir o uso de embriões para fins terapêuticos, mesmo havendo divergências nos aspectos éticos e religiosos, pois essa terapia pode significar a cura para milhares de indivíduos. Constitui-se na única esperança de vida digna, sendo este direito garantido a todos na Constituição Federal vigente. Não cabe ao ordenamento jurídico impedir os avanços tecnológicos e científicos que possam beneficiar a humanidade, mas sim, cabe a ele, estabelecer normas capazes de impedir a utilização destes avanços em práticas potencialmente perigosas e/ou nocivas para a raça humana.

Palavras–Chave: pesquisas; células-tronco; embriões; dignidade; vida; terapia.

Abstract

This work analyzes and argues the advances of medical research, using stem-cells, in special stem-cells embryonic gotten by means of the use and discarding of embryos. Stem-cells is auto-talked back, or either, they can generate you copy identical of itself same. The embryonic ones are the only ones that the 216 fabrics obtain to differentiate themselves in all, that form the human body. If to deprive use of stem-cells embryonic excuse to save life in potential of embryos, we will be taking off only e perhaps last possibility of life worthy for who really is alive and not of who can one day to be, that it is the case of the embryo that constitutes a life in potential, only. Being thus, we conclude exactly that it must our legal system must allow the use of embryos for therapeutical ends, having divergences in the ethical and religious aspects, therefore this therapy can mean the cure for thousand of individuals. One consists in the only hope of worthy life, being this right guaranteed to all in the effective Constitution. It does not fit to the legal system to hinder the technological and scientific advances that can benefit the humanity, but yes, fits it, to establish norms capable to hinder the use of these potentially dangerous and/or harmful practical advances in for the race human being.

Keywords: research; stem-cells; embryos; dignity; life; therapy.

Introdução

Em nosso cotidiano, praticamos inúmeras atividades, sejam elas físicas ou mentais, tais como, ir ao trabalho, estudar, praticar esportes, enfim, viver. Imaginemos a seguinte situação: um indivíduo ao ir para o trabalho sofre um acidente de trânsito, fraturando a coluna vertebral, tornando-se paraplégico. Inicialmente, a primeira idéia que nos vem à mente é de que este indivíduo jamais voltará a andar, porém estaríamos equivocados se pensássemos de tal forma.

A medicina tem desenvolvido inúmeras pesquisas, com o objetivo de ajudar pessoas que sofrem doenças graves, doenças auto-imunes, disfunções neurológicas, distúrbios hepáticos e renais, osteoporose e traumas da medula espinhal. Estas pesquisas são elaboradas e desenvolvidas com a utilização das chamadas “Células-tronco” ou “Stem-cells”. Stem em inglês significa caule, haste; o verbo to stem, por sua vez significa originar. Células-tronco têm esta denominação por ser um tronco comum, do qual se originam outras células.

Há basicamente dois tipos de células-tronco, que são: as adultas, encontradas no cordão umbilical, placenta, tecidos e na medula óssea e as denominadas células tronco embrionárias, encontradas em embriões. As células adultas ou maduras não possuem a capacidade de originar todos os tecidos, sendo, portanto este o motivo pelo qual os cientistas desejam tanto pesquisar as células embrionárias, pois estas são especialmente versáteis, podendo converter-se em qualquer um dos tecidos do organismo, sendo que somente com o uso delas poderiam ser tratadas as doenças neuromusculares degenerativas, que afetam uma em cada mil pessoas, estamos falando de quase duzentas mil pessoas só no Brasil.

É justamente, no uso das células-tronco embrionárias que está a polêmica, já que para sua utilização é necessário a utilização de embriões em seus primeiros estágios de desenvolvimento, provocando assim, a destruição do embrião. Tal problema gerou uma polêmica que envolve medicina, religião, ética, princípios morais, entre outros. A Igreja Católica e parte da Igreja Evangélica consideram a destruição de embriões equivalente ao aborto. O papa João Paulo II definiu o uso de embriões de apenas uma semana como "um atentado ao respeito absoluto da vida".

No entanto, essencial esclarecer que os embriões usados seriam os descartados pelas clínicas de fertilização e que, mesmo se implantados no útero, dificilmente resultariam em uma gravidez, ou seja, embriões que provavelmente nunca se desenvolveriam, tendo em vista que estariam congelados há 3(três) anos no mínimo, pois a Lei de Biossegurança exige esse período mínimo de congelamento para que o embrião possa ser utilizado para fins terapêuticos. Milhares de embriões são jogados no lixo, literalmente, por clínicas de fertilização. Há cerca de 30.000 embriões estocados nas clínicas brasileiras de fertilização.

Capítulo 1. Células-tronco

Após a fusão das células reprodutivas, começa a se formar um aglomerado de células. Este primeiro grupo de células, são chamadas de totipontente por terem a capacidade de originar qualquer parte do organismo de um ser humano.  Após aproximadamente 4(quatro) dias, estas células começam a formar uma estrutura esférica, chamada de blástula, que apresenta duas partes, uma interna e outra externa.

Cerca de 5(cinco) dias após a fertilização, o embrião humano se torna um blastocisto, uma esfera com aproximadamente 100 células. A parte externa desta esfera formará a placenta e a parte interna formará o embrião. É na parte interna que estão as células capazes de gerar todas as células do organismo de um indivíduo. Estas células são chamadas de células pluripotentes e são estas as células-tronco ou "stem cells" ou células "mãe”. 

Células-tronco são células mestras que possuem a capacidade de se transformar em outros tipos de células, incluindo as do cérebro, coração, ossos, músculos e pele, dentre outros. Existem células-tronco adultas, encontradas em vários tecidos (como medula óssea, sangue, fígado) de crianças e adultos, mas em quantidade muito pequena. Há, ainda, células-tronco, adultas, no cordão umbilical e na placenta.

E por fim, há células-tronco embrionárias em embriões nas fases iniciais da divisão celular, isto é, na fase de blastócito.  É possível ainda, obter células-tronco embrionárias também através do mecanismo de clonagem terapêutica, na qual há transferência de núcleos de uma célula para um óvulo sem núcleo. Este núcleo pode ser uma célula de um adulto ou de um embrião.

Sendo assim, células-tronco adultas são mais especializadas que as embrionárias e dão origem a tipos específicos de células. São chamadas multipotentes. Algumas pesquisas sugerem que as células-tronco adultas podem se transformar em tipos muito mais variados de células do que se supunha anteriormente.

Pacientes com insuficiência cardíaca decorrente de ataques cardíacos ou de outras causas, passam a maior parte dos seus dias em casa, sentados ou deitados. Estes são pacientes dos quais as vidas poderiam ser melhoradas através da terapia com células-tronco, afim de restaurar a função do coração.

Até poucos anos atrás, acreditava-se que o coração seria incapaz de regenerar-se. No entanto, constatou-se que, no momento de um infarto, células-tronco migram para a área da lesão com o objetivo de regenerar o músculo cardíaco. Elas, porém, não são em quantidade suficiente.

Deste modo, cientistas imaginaram formas de transformá-lo num grande exército. O procedimento mais usual é retirar da medula óssea uma quantidade de células-tronco e transplantá-las diretamente para a área do músculo cardíaco lesionada. E, em apenas quarenta dias elas já se transformaram em células cardíacas, repovoando a porção necrosada pelo infarto.

O tratamento através de células-tronco é possível, pois estas têm a capacidade de se diferenciar, dando origem a células de funções específicas. As “stem-cell” são como folhas em branco onde se pode escrever os mais diferentes textos, tem a capacidade de se transformar em células específicas de qualquer tecido ou órgão que compõem o organismo humano.

No início do desenvolvimento humano, todas as células são indiferenciadas. Só depois elas dão origem aos diversos tecidos, que compõem o corpo humano. Sendo assim, as células-tronco transformam-se em qualquer célula do organismo ou fundem-se a uma célula doente, tornando-a saudável.

Geralmente, as demais células somente podem fazer parte de um único tecido, podemos citar como exemplo as células da pele, as quais somente podem constituir a pele. Células-tronco são auto-replicáveis, ou seja, podem gerar cópias idênticas de si mesmas. Funcionam em nosso corpo como células-curingas ou células-mãe, tendo a função de ajudar no reparo de uma lesão, tal como, uma lesão na coluna.

Contudo, já sabemos que as células-tronco de cordão umbilical e da placenta não possuem toda potencialidade desejada, a alternativa então, é o uso de células-tronco embrionárias obtidas de embriões não utilizados que são descartados em clínicas de fertilização. E, já sabemos também que as células-tronco adultas, retiradas do próprio paciente, não servem para tratar portadores de doenças genéticas como as distrofias musculares ou atrofias espinhais. Isto porque, nas doenças genéticas o problema está em todas as células, apesar de só se expressar em tecidos específicos.

Células-tronco embrionárias são as células formadas logo após a união de um óvulo com um espermatozóide. São células indiferenciadas, que ainda não geraram qualquer tecido, muito menos qualquer órgão, muito menos ainda qualquer traço de um ser humano.

A versatilidade de uma células-tronco é medida pelo tempo em que ela consegue se manter indiferenciada durante o processo de reprodução em laboratório. Quanto mais ela se mantiver indiferenciada, maior é sua capacidade de se transformar em uma célula específica que seja útil para um tratamento de saúde. Esta versatilidade plena só existe até o embrião atingir 32 a 64 células.

As células-tronco embrionárias são essenciais para a pesquisa porque possuem capacidade como nenhuma outra de se diferenciar em qualquer tipo de tecido, ou seja, conseguem dar origem a qualquer um dos 216 tecidos que formam o corpo humano. E isto representa um grande potencial para a medicina.

1.1. Clonagem

A palavra clone, etimologicamente deriva do grego “klón”, que significa broto, sendo assim, devemos entender por clonagem, um modo de reprodução assexuada, na qual se obtém um novo ser, a partir de outro único ser.  Clone é uma palavra usada há muito tempo em Biologia para designar indivíduos originados de outros por reprodução assexuada.

O mecanismo da clonagem consiste, em por meio reprodução assexuada obter a partir de células ou fragmentos de uma mesma matriz cópias geneticamente idênticas de um mesmo organismo.

Podemos classificar a clonagem, quanto ao modo que ocorre, em duas espécies: natural ou induzida.

A natural dar-se quando há a reprodução de seres vivos, por meio assexuado, ou seja, sem a participação de células sexuais. Exemplos, desta espécie de clonagem são as que ocorrem em: bactérias, protozoários, vegetais inferiores e até mesmo alguns vegetais superiores e mamíferos.

Já a clonagem induzida ou artificial, consiste em produzir uma ou mais células idênticas entre si e também idêntica a célula-mãe, que originou estas. Exemplos desta espécie são os que ocorrem na plantação e na criação de enxertos, nos quais são implantados brotos de plantas selecionadas em caules de outros.

O primeiro mamífero clonado com sucesso foi ovelha Dolly, criada pelo embriologista Ian Wilmut nos laboratórios do Instituto Roslin, na Escócia. Podemos resumir, o procedimento desta clonagem do seguinte modo, pega-se células somáticas de um ser, armazena-se a parte nuclear das células, onde encontramos genes.

Na fase seguinte, os núcleos das células somáticas são introduzidos dentro dos óvulos de um outro ser, de onde haviam sido retirados os núcleos. Desta forma, formaram-se células artificiais. Através de um choque elétrico, as células são estimuladas, após um estado em que ficaram "dormindo".  Os genes passaram a agir novamente e formaram novos embriões.

No Brasil, a primeira clonagem de um animal ocorreu em 2001 com o nascimento de Vitória, uma bezerra desenvolvida pela equipe de Rodolfo Rumpf, coordenador do projeto de biotecnologia de reprodução animal da Embrapa. Após esta clonagem, nenhum outro animal foi clonado, embora alguns grupos venham desenvolvendo pesquisa.

Em ambas as espécies de clonagem, os seres vivos resultantes deste procedimento terão as mesmas informações genéticas do ser, denominado célula-mãe. 

Em 2001, foi elaborada pela ONU(Organização das Nações Unidas) uma Convenção Internacional Contra a Clonagem Reprodutiva de Seres Humanos, na qual a Organização das Nações Unidas repudia internacionalmente a clonagem como forma de reprodução de seres humanos.

Em março de 2005, a assembléia-geral da ONU (Organização das Nações Unidas) aprovou uma declaração aconselhando aos governos que proíbam qualquer forma de clonagem humana, inclusive a terapêutica. Depois de 4(quatro)anos de debates, o texto foi aprovado por 84 países contra 34 e 37 abstenções. 

Contudo, as questões éticas, em relação a clonagem não é recente, desde a década de 70, discute-se a possibilidade da clonagem substituir a reprodução pela duplicação. 

Em relação à finalidade da clonagem, podemos dividi-la também em duas: clonagem para reprodução e clonagem para fins terapêuticos.  Em ambas, o núcleo de uma célula adulta é introduzido no óvulo "vazio", no entanto, na clonagem terapêutica esse óvulo jamais será transferido para um útero, ao contrário do que ocorre na clonagem reprodutiva, na qual o óvulo é transferido para um útero de “aluguel”.

A clonagem terapêutica é permitida na Grã-Bretanha, desde que feita com embriões de até 14 dias, compostos por 16 células, sem implantação no útero. Para este procedimento é possível e permitido legalmente, na Grã-Bretanha, o uso embriões descartados em técnicas de reprodução assistida ou material genético de células do próprio paciente, inserido em um óvulo sem núcleo.

Sendo assim, unânime é o pensamento da maioria de que a clonagem reprodutiva deve ser proibida por lei, pois não existe a menor segurança. No entanto, a clonagem terapêutica, se liberada poderia ser extremamente útil para obtenção de células-tronco embrionárias.

Segundo nos ensina o Dr. Drauzio Varella[3]:

 Na clonagem reprodutiva, o núcleo de uma célula adulta é introduzido no óvulo "vazio" e transferido para um útero de aluguel, com a finalidade de gerar um feto geneticamente idêntico ao doador do material genético.

Na clonagem terapêutica, as células-tronco jamais serão introduzidas em algum útero. O DNA retirado de uma célula adulta do doador também é introduzido num óvulo "vazio", mas, depois de algumas divisões, as células-tronco são direcionadas no laboratório para fabricar tecidos idênticos aos do doador, tecidos que nunca serão rejeitados por ele.

Independentemente de julgamentos morais, a clonagem reprodutiva deve ser proibida por lei, porque não existe a menor segurança de que bebês gerados por meio dela serão bem formados.

Na clonagem terapêutica, no entanto, os tecidos são obtidos em tubos de ensaio.

Ressaltamos que as células-tronco embrionárias, obtidas por meio de clonagem terapêutica têm a vantagem de evitar rejeição, diferentemente das células-tronco embrionárias obtidas dos embriões congelados em clínicas de fertilização, na qual há necessidade de compatibilidade entre o doador e o receptor.

Entretanto, ainda que, clonagem terapêutica apresente em teses muitos benefícios são necessárias, muitas pesquisas e muitos estudos antes de ser aplicada em casos clínicos humanos, pois trata-se de uma nova tecnologia, sem precedentes. A técnica de clonagem ainda está em aperfeiçoamento, tendo em vista a alta taxa de mortalidade em experimentos com animais, cerca de 90%, diagnósticos pré-implantacionais e pré-natais, alarmam para o fato de ninguém saber determinar a normalidade dos embriões.

Hoje a corrida tecnológica da clonagem tem como países líderes os Estados Unidos, Escócia, Inglaterra, Japão, Nova Zelândia e Canadá. Salientamos, por fim que a nossa Lei de Biossegurança, aprovada e já regulamentada proíbe qualquer tipo de clonagem.

1.2. Lei de biossegurança

Em 24 de março de 2005, o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou, a Lei nº 11.105. Esta lei regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003.

Como podemos notar, a Lei de Biossegurança abrange temas distintos: a pesquisa e a fiscalização dos organismos geneticamente modificados (OGM); a utilização de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa e terapia; o papel, a estrutura, as competências e o poder da CTNBio; e, por fim, a formação do Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS e sua organização. Deste modo, ocorreu uma “confusão” legislativa, tendo em vista que esta Lei trata de temas totalmente distintos, como transgênicos e células-tronco.

Não estão estabelecidos, nesta Lei, os critérios que orientarão a realização das pesquisas; nem estão delimitados os critérios objetivos ao trabalho da CTNBio.

Apesar de sancionada a Lei de Biossegurança, ela necessitava ainda de regulamentação. E, esta regulamentação só ocorreu em 23 de novembro de 2005, pelo decreto 5.591, publicado no Diário Oficial da União.

 A regulamentação tem 95 artigos. Pelo decreto, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) terá 27 membros, e as decisões serão tomadas com votos favoráveis da maioria absoluta de seus integrantes, exceto nos processos de liberação comercial de organismos geneticamente modificados e derivados.

No artigo 5º da Lei Biossegurança, é liberado o uso de embriões estocados há no mínimo 3(três) anos em clínicas de fertilização, para obtenção de células-tronco embrionárias, desde que este uso seja autorizado por seu respectivos “proprietários”.

No entanto, a constitucionalidade deste artigo está sendo questionada por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin n° 3510), proposta pelo Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, e ainda não julgada. Segundo ele, a inconstitucionalidade do artigo está no fato de o embrião é ser humano, desse modo não se pode estabelecer gradação constitucional ao conceito de inviolabilidade da vida, pois esse conceito concede tutela completa. E ainda, que vida tem início com a fecundação, sendo assim, não pode ser liberado a utilização de embriões, ainda que cultivados em laboratório.

Em contrapartida, o Ministério da Saúde alega que a não é possível a Lei ser inconstitucional, pois a Constituição Federal, em momento algum, faz menção sobre embriões que ainda não se fixaram no útero, sendo que a Lei Biossegurança é a única regulamentação sobre este assunto. E ainda, que os códigos Civil e Penal tratam somente de gestação, ou seja, embrião dentro do útero.

Capítulo 2. A Constituição Federal de 1988

O Direito é uma ciência que visa a organizar as condutas sociais humanas, através de normas impostas à sociedade pelo Estado. Promulgada em 1988, nossa Constituição Federal representa Lei Maior, conferindo a todos nós, de modo igual, direitos e garantias fundamentais, tais como¸ o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, segundo disposto no caput, do artigo 5°[4]. No entanto, qual é o sentido de dignidade previsto em nossa Carta Magna? Ou ainda, o que é Direito à Vida e à Dignidade?

2.1. Princípio de proteção à vida

Ao tratarmos de Biodireito, devemos pensar em uma relação de harmonização entre princípios constitucionais e avanços genéticos, posto que, somente desta forma conseguiremos buscar os avanços desejados para suprir eventuais conflitos oriundos destes novos estudos biotecnólogicos.

No campo de Direito Penal, a biotecnologia tem ajudado e muito, em casos de verificação de DNA e investigação de paternidade, podendo citar como exemplo, o caso do adolescente Pedrinho, seqüestrado ao nascer e somente após muitos anos foi reencontrado por seus pais biológicos. Ou ainda, em caso onde através do exame do DNA de um simples fio de cabelo ou outro material genético, encontrado nas vitimas, pode-se encontrar e/ou determinar o verdadeiro criminoso.

Se pensarmos em questões de Bioética, veremos que a cada dia, as discussões em torno de assuntos polêmicos como a clonagem, tem crescido a cada vez mais, o que nos leva a estudar com maior profundidade temas como este.

Por se tratar de um ramo do Direito Público, o Direito Constitucional destaca-se por ser extremamente necessário para o funcionamento e organização do Estado.

Tem como seu objetivo, organizar as instituições e órgãos do Estado, a constituição política do mesmo, e ainda, o modo de aquisição e limitação de poderes, por meio do estabelecimento de direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

O artigo 5° de nossa Magna Carta consagra o direito à vida, sendo, portanto, o mais importante de todos os direitos e garantias fundamentais, posto que, para a existência dos demais direitos e garantias, faz-se necessário como pré-requisito este direito.

Ao Estado caberá assegurar, a todos, o duplo sentido de vida: o primeiro diz respeito ao direito do individuo viver dignamente, e o segundo, à continuar vivo.

A cláusula constitucional não se limita à proteção somente daqueles que já nasceram, pois se assim fosse, afastada estaria a punição do crime de aborto. A vida deve ser protegida como um todo, ou seja, desde o seu início. Contudo, aqui nos surge a seguinte questão: quando se dá o início da vida?

A posição da Ciência e da Igreja, especialmente a católica, tem sido oposta e conflitante. Por um lado, cientistas de visão mais radical chegam até a afirmar que um embrião só pode ser considerado vida quando não depende mais da mãe, ou seja, após o nascimento. Por outro lado, a religião católica, a de maior influência no país, afirma que desde a concepção já se pode considerar que há vida. Mas assim como nem todos os cientistas têm uma única visão, nem todas as correntes religiosas também concordam entre si.

Igreja Católica ampara-se no ensino dos mestres da Bioética, que têm como cientificamente comprovado que a vida humana se inícia no momento em que o espermatozóide funde-se ao óvulo. Este processo originará, eventualmente, a criação de um zigoto, embrião, feto e recém-nascido. A Igreja Católica considera a vida humana um mistério grandioso em sua origem, e não mero episódio de união sexual.  A Igreja, mestra e profissional da fé defende o valor extraordinário da vida humana desde as profundezas de sua origem. Por isso, é definitivamente contra a destruição da vida por qualquer processo, científico ou não científico. Eliminar a vida é rebelar-se contra os desígnios de Deus criador.

Ainda sem ter como dar uma resposta definitiva e exata sobre o início da vida, a maioria dos cientistas se apóia na lógica para chegar a uma solução prática para a problemática, estabelecendo o marco inicial da vida após os 14 primeiros dias da concepção, quando começa a formação do sistema nervoso. "Quando a pessoa morre?” Quando o cérebro para de funcionar. Então hoje podemos considerar que a vida se inícia quando o cérebro começa a funcionar.

É o Código Civil, portanto, que determina o momento em que o ser humano (espécie Homo sapiens) adquire personalidade e capacidade jurídica: o momento do nascimento e, ressalte-se, nascimento com vida, mesmo que essa vida venha a se esvair momentos após.

Antes do nascimento com vida, o ser gerado não possui personalidade civil, mas, como nascituro (gerado, mas ainda não nascido), todos os seus direitos, desde a concepção, são resguardados pela lei, principalmente o direito à vida. Além do art. 5º, diversos outros dispositivos a Constituição de 1988 asseguram o direito à vida, tais como artigos: 196, 227, 230, entre outros.

2.2. Princípio da dignidade da pessoa humana

A palavra dignidade vem do latim “dignitas” que significa honra, virtude ou consideração. Então deve-se entender que dignidade é uma qualidade moral inata e é a base do respeito que lhe é devido.

O princípio da dignidade da pessoa humana, presente em nossa Magna Carta no artigo 1º, III. Este princípio exerce alcance, sobretudo nos chamados direitos e garantias fundamentais, os quais, por sua vez, não incidem diretamente sobre a pessoa humana em seu aspecto físico, mas ainda no desdobramento de sua personalidade. Ainda, no artigo 6º vamos encontrar desdobramentos do princípio da dignidade, pois ninguém tem existência digna sem educação, saúde, moradia, proteção à maternidade e à infância, dentre outros. Por fim, a família guarda estreita relação com a dignidade da pessoa humana, isso expressamente declarado no parágrafo 7º do artigo 226.

Viver, confinado em uma cama de hospital, respirando e alimentando-se através de aparelhos, não é viver dignamente. O que nos valer ter assegurado somente o direito a vida, se não tivermos assegurado o direito a vida digna. Deste modo, nosso legislador nos garantiu o direito não só a vida, mas também o direito a vida digna. Para verificarmos isto, basta analisarmos o artigo 5° caput com o artigo 1°, III da Constituição de 1988.

O princípio jurídico da dignidade exige como pressuposto a intangibilidade da vida humana. Sem vida, não há pessoa, e sem pessoa, não há dignidade. O preceito da intangibilidade da vida humana, não admite exceção, é absoluto e está, de resto, confirmado pelo caput do art. 5º da Constituição da República, um exemplo disto é a proibição da eutanásia. O próprio suicídio fere o princípio da intangibilidade da vida humana.

Toda nova tecnologia gera polêmicas, que nesta ocasião, somente impedem que pessoas as quais sofrem com doenças neuromusculares, renais, cardíacas, hepáticas ou diabetes, sejam tratadas, impedindo desta forma, que médicos e cientistas descubram a cura para uma série de doenças. Qualquer tecnologia tem seus riscos e benefícios.

Como adverte Wilkie[5]:

Como a espada da justiça, a tecnologia tem dois fios. Pode ser usada para o bem ou para o mal. As tecnologias que resultarão, e que já resultaram, dos avanços na genética humana podem aliviar o sofrimento e a miséria dos humanos. Cabe, porém, a nós leigos, e não aos profissionais, controlar o novo conhecimento e sua aplicação tecnológica.

As 63 (sessenta e três) academias de ciência do mundo defendem as pesquisas com células embrionárias para fins terapêuticos. Essas pesquisas estão liberadas na maior parte dos paises da Europa, no Canadá, Austrália, Japão e Israel. Sabe-se que 90% dos embriões gerados em clínicas de fertilização e que são inseridos em um útero, nas melhores condições, não geram vida. É evidente, a injustiça de se permitir à morte de uma criança ou um jovem afetado por uma doença neuromuscular letal para preservar um embrião cujo destino é o lixo. Permitir o uso de células-tronco embrionárias para fins terapêuticos não é por fim a vida de embriões, como afirma a Igreja Católica, mas sim criar vida, regenerando tecidos em uma pessoa condenada por uma doença letal.

Pessoas que se opõem a esse tipo de pesquisa em nome de uma pretensa defesa da vida, na verdade estão agindo contra a vida porque estão impedindo que pessoas, estas sim vivas, tenham condições de defender-se de doenças gravíssimas, considerar que um óvulo fecundado por um espermatozóide num tubo de ensaio, depois de três ou quatro divisões, é uma vida com o mesmo direito da criança que está na cadeira de rodas, sentindo-se cada vez mais incapacitada, é revoltante. Seria eticamente correto comparar a vida de uma criança em uma cadeira de rodas a de um embrião congelado?

Anos atrás, na Inglaterra, foram jogados pela pia milhares de embriões. Calcula-se que cerca de 20 mil blastocistos, estejam estocados nestas clínicas há pelo menos 3(três) anos, prazo limite para a utilização de embriões. Se serão colocadas no lixo, porque não usá-las para pesquisa terapêutica? Por que não dar um destino digno a essas células salvando vidas? 

Segundo o Dr. Drauzio Varella[6]:

Em nome de princípios religiosos, pessoas que se dizem piedosas julgam mais importante a vida em potencial existente num agrupamento microscópico de células obtidas em tubo de ensaio do que a vida de uma mãe de família que sofreu um infarto ou a de um adolescente numa cadeira de rodas? Estivessem elas ou tivessem um filho nessa situação, recusariam realmente esse tipo de tratamento?

A Igreja Católica Romana tem defendido a posição, igualmente aceita por alguns cientistas e filósofos não vinculados a ela, de que a vida de uma pessoa tem início na fecundação, desta forma não há justificativa eticamente adequada para tal tipo de pesquisa. A Igreja da Escócia, de orientação Cristã Protestante, também defende tal posição, mas aceita a realização de pesquisas com embriões, desde que tenha por objetivo solucionar situações de infertilidade ou decorrentes de doenças genéticas.

Ocorre que destes fundamentos surge uma contradição, pois em determinado momento, não se pode desenvolver pesquisas com células-tronco embrionárias para salvar vidas, como por exemplo, no caso de uma pessoa com uma patologia neurodegenerativa, porém pode-se realizá-las em casos de infertilidade ou decorrentes de doenças genéticas. Afinal, neste caso onde se encontra lugar para o direito à vida?

Ora, se o princípio da moralidade médica e cirúrgica é nunca realizar um experimento no ser humano que possa causar-lhe dano, de qualquer magnitude, ainda que o resultado seja altamente vantajoso para a sociedade, estaríamos afirmando no caso de um indivíduo que esteja condenado a morte em decorrência de patologia neurodegenerativa, que o correto seria morrer, sem ao menos ter a chance de lutar por sua própria vida. Isto é Direito à Vida, assegurado a todos em nossa Lei Maior?

Se assim fosse, teríamos que proibir de imediato o uso da “pílula do dia seguinte”, a qual pode ser ingerida até 72 horas depois da relação sexual, afim de conter-se uma gravidez indesejada, ou ainda, deveríamos proibir a realização de inseminações artificiais, pois os embriões que excedem são descartados em clínicas de fertilização, ou seja, vidas são descartadas, deixando, desta forma, de dar filhos aos pais que não podem tê-los.

Segundo afirma a Dra. Mayana Zatz[7], professora-titular de Genética Humana e Médica do Departamento de Biologia do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP):

Em relação à destruição de "embriões humanos", novamente devemos lembrar que estamos falando de cultivar tecidos ou, futuramente, órgãos a partir de embriões que são normalmente descartados, que nunca serão inseridos em um útero. Sabemos que 90% dos embriões gerados em clínicas de fertilização e que são inseridos em um útero, nas melhores condições, não geram vida. Além disso, um trabalho recente (Mitalipova et al., 2003) mostrou que células obtidas de embriões de má qualidade, que não teriam potencial para gerar uma vida, mantêm a capacidade de gerar linhagens de células-tronco embrionárias e portanto, de gerar tecidos.Em resumo, é justo deixar morrer uma criança ou um jovem afetado por uma doença neuromuscular letal para preservar um embrião cujo destino é o lixo? Um embrião que, mesmo que fosse implantado em um útero, teria um potencial baixíssimo de gerar um indivíduo? Ao usar células-tronco embrionárias para regenerar tecidos em uma pessoa condenada por uma doença letal, não estamos, na realidade, criando vida? Isso não é comparável ao que se faz hoje em transplante quando se retiram os órgãos de uma pessoa com morte cerebral (mas que poderia permanecer em vida vegetativa).

Se afirmarmos, que ao utilizar uma célula-tronco embrionária para salvar a vida de um indivíduo, estaremos tirando a vida de outro, então certamente estaríamos comparando a vida de uma criança ou de um adulto à vida de um embrião, o qual poderá ou não se tornar uma criança, ou simplesmente vir a ser descartado em uma clínica de fertilização.

Não podemos privar a sociedade das inúmeras possibilidades terapêuticas que um embrião representa a pretexto de salvar uma vida. Não discordamos que, o embrião é um ser vivo em potencial, o que não significa dizer, que ao utilizarmos um embrião afim de salvar uma vida estaríamos tirando uma outra de uma pessoa humana.

Se observássemos nossa Constituição Federal, logo em seu primeiro artigo, no inciso III, reza que a Republica Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e que tem como fundamento à dignidade da pessoa humana.

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, Formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III – a dignidade da pessoa humana;

(...).

Se deixarmos que nosso preconceito nos impeça de realizar um melhor desenvolvimento científico através de novas pesquisas utilizando-se células embrionárias, descartadas em clínicas de fertilização e/ou clonadas terapeuticamente em laboratórios, a quem estaremos conferindo dignidade? A uma criança que sofre de uma patologia neurodegenerativa e encontra-se em estado terminal?

Segundo Franco[8] (1996, p. 22):

Nenhuma liberdade pode ser aceita, no campo da investigação científica, quando signifique o emprego de técnicas, o uso de métodos ou a adoção de fins que lesem ou ponham em perigo a dignidade que deve ser assegurada a toda pessoa humana em todo seu percurso vital.

E ainda:

É mister que se busque um ponto de equilíbrio entre as duas posições antiéticas: ou a proibição total de toda e qualquer atividade biomédica, o que significa uma freada no processo científico em curso, ou a permissividade plena, o que pode gerar prejuízos éticos, humanos e sociais inimagináveis. E este ponto de equilíbrio deve ser buscado num dos princípios estruturantes do Estado Democrático de Direito, isto é, na dignidade da pessoa humana.

Dignidade da pessoa humana é o valor constitucional supremo que agrega em torno de si a unanimidade dos demais direitos e garantias fundamentais do homem, expressos em nossa Magna Carta, tais como, o direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança, entre outros, direitos que são conferidos a todos de modo igual, segundo consta no “caput” do artigo 5°.

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...).

A Constituição de 1988, pela primeira vez na historia brasileira, elevou a saúde à condição de direito fundamental, pois em seu artigo 196 diz que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 

Adiante, fez constar em seu artigo 208, que o Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.

O texto constitucional protege todas as formas de vida, inclusive a uterina. Ocorre que células-tronco clonadas terapeuticamente são criadas “in vitro”, ou seja, cultivadas em laboratório, não são introduzidas em um útero humano, o que diferencia a clonagem terapêutica de uma clonagem reprodutiva. Os argumentos de pessoas que se opõem à clonagem terapêutica são que esta abrirá caminho para a clonagem reprodutiva e que isso geraria um comércio de óvulos e embriões.

Neste caso, é essencial lembrar que, para que isto ocorra existe um obstáculo insuperável, ou seja, a necessidade de um útero. Para isto, bastaria proibir a transferência destes embriões, criados através de clonagem terapêutica, para um útero.

Neste contexto, segundo Mayana Zatz:

Apesar de todos esses argumentos, o uso de células-tronco embrionárias para fins terapêuticos, obtidas tanto pela transferência de núcleo como de embriões descartados em clínicas de fertilização, é defendido pelas inúmeras pessoas que poderão se beneficiar por esta técnica e pela maioria dos cientistas. As 63 academias de ciência do mundo que se posicionaram contra a clonagem reprodutiva defendem as pesquisas com células embrionárias para fins terapêuticos. Em relação aos que acham que a clonagem terapêutica pode abrir caminho para clonagem reprodutiva devemos lembrar que existe uma diferença intransponível entre os dois procedimentos: a implantação ou não em um útero humano. Basta proibir a implantação no útero! Se pensarmos que qualquer célula humana pode ser teoricamente clonada e gerar um novo ser, poderemos chegar ao exagero de achar que toda vez que tiramos a cutícula ou arrancamos um fio de cabelo, estamos destruindo uma vida humana em potencial. Afinal, o núcleo de uma célula da cutícula poderia ser colocada em um óvulo enucleado, inserido em um útero e gerar uma nova vida!

Por outro lado, a cultura de tecidos é uma prática comum em laboratório, apoiada por todos. A única diferença, no caso, seria o uso de óvulos (que quando não fecundados são apenas células) que permitiriam a produção de qualquer tecido no laboratório. Ou seja, em vez de poder produzir-se apenas um tipo de tecido, já especializado, o uso de óvulos permitiria fabricar qualquer tipo de tecido. O que há de anti-ético nisso?

Quanto ao comércio de óvulos, não seria a mesma coisa que ocorre hoje com transplante de órgãos? Não é mais fácil doar um óvulo do que um rim? Cada uma de nós pode se perguntar: você doaria um óvulo para ajudar alguém? Para salvar uma vida?

Considerações finais

Concordamos, com o pensamento de que errado seria a proibição de tais pesquisas, pois deixaríamos de descobrir a cura para inúmeras doenças degenerativas e principalmente, deixaríamos de salvar vidas. Pensamos ainda, que o correto seria a utilização da clonagem terapêutica, com o objetivo de clonar células-tronco para este fim específico, onde as células são multiplicadas em laboratório com a finalidade de formarem novos tecidos e desta forma sim, salvar inúmeras vidas.

Cabe ainda, salientarmos as diferentes definições do direito à vida, para quem tem em casa um portador de moléstia degenerativa ou alguém que perdeu os movimentos, a definição de direito a vida se consubstancia em livrar o filho do respirador, suturar-lhe a fenda na barriga por onde se alimenta resgatar-lhe a dignidade.

Para a Igreja Católica e uma parcela dos evangélicos, a vida está num embrião congelado, ainda que este nunca conheça um útero.

Cabe nos ressaltarmos que em março de 2005, foi aprovada a Lei de Biossegurança, a Lei nº 11.105, de 24.03.2005 que regulamenta o uso de embriões congelados para pesquisas com células-tronco. Esse projeto veio regulamentar os incisos II e V do § 1º do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, fixando regras para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados.

 O texto da Lei permite que os cientistas brasileiros possam usar em suas pesquisas células-tronco de embriões humanos, desde que congelados até o dia da publicação da lei e devem ter, no mínimo, 3(três) anos de estocagem. Todavia, a Lei de Biossegurança veda a clonagem humana e a produção de embriões para a retirada de células-tronco, com o objetivo terapêutico, sendo só permitido o uso de embriões que seriam, necessariamente, descartados por clínicas de fertilização.

Por fim, concluímos que, a vida é o bem jurídico mais importante a ser tutelado. E ainda que, o uso de células-tronco embrionárias é uma técnica, não um pecado e que toda técnica, após descoberta ganha vida própria e pode fugir ao controle. No entanto, a técnica e sua descoberta não são os verdadeiros problemas, o problema real é o uso que a civilização faz, para o bem ou para o mal, de suas invenções.

Referências Bibliográficas:

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil: texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nºs 1/92 a 35/2001 e pelas Emenda. Brasília : Senado Federal, Subsecretaria De Edições Técnica, 2002.

FRANCO, Alberto Silva. Genética Humana e Direito Penal. Boletim IBCcrim. 1996.

VARELLA, Drauzio. Clonagem Humana. Disponível em: http://www.movitae.bio.br/ texto_dvarella_0405.htm . Acesso em: 14 mar. 2006.

WILKIE, Tom. Projeto Genoma Humano – Um Conhecimento Perigoso. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994.

ZATZ, Mayana. Clonagem e Células-Tronco.

Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php? pid=S0103-40142004000200016&script=sci_arttext &tlng=pt . Acesso em: 26 mar. 2006.

Notas:

 

 

[3] VARELLA, Drauzio. CLONAGEM HUMANA. Disponível em: http://www.movitae.bio.br/ texto_dvarella_0405.htm. Acesso em: 14 mar. 2006.

[4] Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...).

[5] WILKIE, 1994.

[6] VARELLA, Drauzio. CLONAGEM HUMANA. Disponível em: http://www.movitae.bio.br/ texto_dvarella_0405.htm . Acesso em: 14 mar. 2006.

[7] ZATZ, Mayana. Clonagem e células-tronco.

Disponível em: http://www.scielo.br/ scielo.php?pid=S0103-40142004000200016 &script=sci_arttext &tlng=pt. Acesso em: 26 mar. 2006.

[8] FRANCO, 1996. p. 22.

 

Como citar o texto:

CATANA, Tereza Oliveira; SOUZA, Vinícius Roberto Prioli de..Células-tronco e o Direito brasileiro. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 183. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-e-biogenetica/1331/celulas-tronco-direito-brasileiro. Acesso em 21 jun. 2006.

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