O artigo 301 do Código de Processo Penal assim define: “qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.

Portanto, é perfeitamente possível a prisão em flagrante nas infrações penais de menor potencial ofensivo.

O que o legislador quis ao prever a não possibilidade de prisão em flagrante nas infrações de menor potencial ofensivo, previsto no parágrafo único do artigo 69 da Lei 9.0099/95, foi a aplicação dos critérios norteadores contidos na mencionada lei. Assim, em se tratando de Juizados Especiais Criminais, os princípios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade, deverão ser observados logo que a Autoridade Policial, no caso, o Delegado de Polícia, tome conhecimento dos fatos e, em uma análise preliminar, se convença da ocorrência de uma infração penal de menor potencial ofensivo. Observados os requisitos para a não lavratura da prisão em flagrante, quais sejam, o encaminhamento imediato do autor do fato ao Juizado logo após a lavratura do termo circunstanciado ou se o autor assumir o compromisso de a ele comparecer, não será elaborado o auto de prisão em flagrante, nem se exigirá fiança.

O parágrafo único do artigo 69 da Lei 9.0099/95 deve ser interpretado de forma extensiva, pois nestas infrações, como já afirmado, poderá ocorrer a prisão em flagrante, como realidade prática, ou seja, a captura e a apresentação ao Delegado de Polícia de alguém que está cometendo ou acaba de cometer uma infração penal. Mas não poderá haver a prisão em flagrante como realidade formal, ou seja, apresentado o autor do fato, não será lavrado o auto de prisão em flagrante, mas apenas o termo circunstanciado de ocorrência e o termo de compromisso. No entanto, caso não assuma o compromisso de comparecer ao Juizado, o auto de prisão em flagrante será lavrado nos termos do artigo 304 do Código de Processo Penal.

A paz jurídica e a ordem social devem ser preservadas e resguardadas nas devidas proporções, razão pela qual não se poderá afastar a possibilidade da realização da captura do autor de crime ou infração de menor potencial ofensivo em situação de flagrância por quem quer que seja. Não devemos confundir a prisão em flagrante com autuação em flagrante. A primeira possui caráter material, previsto no ordenamento processual penal e na própria Constituição Federal. A segunda se refere tão-somente ao seu aspecto formal e, somente será procedida em não havendo a possibilidade de adotar-se o procedimento especial previsto na Lei 9.099/95.

O auto de prisão em flagrante é uma peça que requer tempo para sua elaboração, exigindo-se a oitiva de condutor, testemunhas, vítimas e autor dos fatos, o que afasta, sobremaneira, todos os princípios que regem os Juizados Especiais Criminais. No mais, prima-se pela tentativa de conciliação por meio do instituto da transação penal, fase esta preliminar a discussão da matéria fática. Não haveria o porquê adentrar no mérito na fase policial se na fase judicial o que se busca de início é a solução do conflito visando à reparação dos danos e a aplicação de pena não privativa de liberdade.

Ora, seria incoerente admitir-se, de forma hipotética, a captura por parte de policiais militares de alguém em flagrante por infração de menor potencial ofensivo, onde o autor é conduzido preso e algemado no compartimento da viatura policial e, ao chegar na Delegacia de Polícia, deixá-lo livre apenas em razão da lei dizer que não será elaborado o auto de prisão em flagrante, nem se exigirá fiança se o autor do fato, logo após a lavratura do termo circunstanciado, for encaminhado imediatamente ao Juizado ou se assumir o compromisso de a ele comparecer.

Porém, a realidade prática é bem diferente. Uma vez capturado em situação de flagrância, ao ser conduzido até a presença do Delegado de Polícia, o autor do fato estará sob a custódia do Estado e algumas medidas cautelares deverão ser tomadas pelos agentes da Autoridade Policial, quer para se evitar a sua fuga antes de assumir o compromisso, ou a realização de pesquisa acerca de sua correta identificação para se evitar a imputação de uma conduta a um inocente, pois é plenamente possível o capturado fornecer dados incorretos acerca de sua identidade. Certo é que o cerceamento de liberdade do autor do fato já ocorreu desde o momento de sua captura, ainda antes de sua chegada na Delegacia de Polícia e deverá perdurar o tempo necessário para formalização de todos os atos previstos em lei, vale a pena mencionar, bem menos demorado que uma autuação em flagrante. O que deverá prevalecer é a justa causa e o bom senso na manutenção de sua custódia. Assim, somente o tempo desnecessário ou ato policial que não vise de maneira profícua esta formalização de forma imediata, poderá ser entendido, em tese, como crime de abuso de autoridade.

(fonte: Curso de Pós-Graduação da UNAES, Especialização em Processo Penal. Monografia Jurídica: Poder Discricionário do Delegado de Polícia na Prisão em Flagrante (última atualização: 01/11/2005))

 

Como citar o texto:

PAULA, Wilton Vias Boas de..A prisão em flagrante nas infrações penais de menor potencial ofensivo. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 201. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/1587/a-prisao-flagrante-nas-infracoes-penais-menor-potencial-ofensivo. Acesso em 21 out. 2006.

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