RESUMO: O artigo tem como escopo analisar a indenização punitiva sob a ótica da análise econômica do direito, tema este muito discutido pela doutrina e jurisprudência hodiernamente.

 

O estudo do tema proposto deve-se não só ao fato de que entre os estudiosos do Direito a matéria ainda é incipiente, mas também sobre a legalidade de tal utilização, uma vez que na legislação civil a reparação civil deve ser medida pela extensão do dano e também porque o direito e respeito à dignidade da pessoa humana são fundamentos da República.

Assim, será verificado como a análise econômica do direito pode ser utilizada como mais um elemento à disposição do Estado-Juiz para auxiliar no julgamento de demandas envolvendo reparação civil, especialmente nas que são envolvidos direitos de personalidade.

PALAVRAS-CHAVE: ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO – INDENIZAÇÃO PUNITIVA – DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – REPARAÇÃO CIVIL

ABSTRACT: This paper is to analyze the scope of punitive damages from the perspective of economic analysis of law, a topic much discussed by the doctrine and case law in our times.

The study of the proposed topic is due not only to the fact that among scholars of law matter is still in its infancy, but also on the legality of such use, since the civil law civil remedies should be measured by the extent of damage and also because the law and respect for human dignity are the foundations of the Republic.

It will thus be seen as the economic analysis of law can be used as an element available to the State Judge to assist in the prosecution of claims involving civil remedies, especially those that are involved personality rights.

KEYWORDS: Economic Analysis of Law - punitive damages - HUMAN DIGNITY - CIVIL REMEDY

1 INTRODUÇÃO

A interdisciplinaridade entre Direito e a Economia tem se destacado na atualidade, através da chamada análise econômica do Direito. A análise econômica tem como propósito interpretar o Direito com base nas premissas Econômicas.

Uma vez que a reflexão sobre as relações contratuais, ou até mesmo as extracontratuais, interessa ao Direito e à Economia o presente trabalho tem como objetivo realizar análise econômica sobre a indenização punitiva, tema bastante debatido pela doutrina e jurisprudência.

A escolha do tema, análise econômica nas indenizações punitivas, deve-se não só ao fato de que entre os estudiosos do Direito pairam dúvidas sobre a legalidade de tal utilização, uma vez que na legislação civil a reparação civil deve ser medida pela extensão do dano, mas também tendo em vista que o direito e respeito à dignidade da pessoa humana são fundamentos da República.

Assim, será verificado como a análise econômica do direito pode ser utilizada como mais um elemento à disposição do Estado-Juiz para auxiliar no julgamento de demandas envolvendo reparação civil, especialmente nas que são envolvidos direitos de personalidade.

2 A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

2.1 Conceito

A análise econômica do direito é a interpretação que, ao evidenciar a realidade de determinada questão jurídica, sob a perspectiva da Economia, pode auxiliar na compreensão daquelas e inclusive fornecer fundamentos para eventual modificação.

Ivo Teixeira Gico Júnior assim conceitua a análise econômica do direito:

A análise econômica do Direito, portanto, é o campo do conhecimento humano que tem por objetivo empregar os variados ferramentais teóricos e empíricos econômicos e das ciências afins para expandir a compreensão e o alcance do direito e aperfeiçoar o desenvolvimento, a aplicação e a avaliação de normas jurídicas, principalmente com relação às suas conseqüências. (GICO JÚNIOR, 2009, p.4)

Tem-se que atualmente é indispensável o diálogo entre o direito e a economia, neste sentido verbera Rachel Sztajn:

Reagir contra o diálogo entre Direito e Economia, para condená-lo, é posição que carece de racionalidade. Isso porque, ainda que os fatos sejam considerados sob a óptica quantitativa e empírica, própria do método econômico, em nada destrói a argumentação jurídica, qualitativa, Lembre-se que, no direito romano, o desempenho e o esforço dos pretores estavam voltados para a busca da eficiência na distribuição de justiça e no respeito às normas sociais. Isso em nada é muito diferente do que se faz em Law and Economics. Trata-se da aplicação da teoria da escolha racional ao Direito (quer se trate de Direito positivo, de usos e costumes, decisões dos Tribunais ou de normas sociais), uma forma de pensar as normas jurídicas levando em conta que os prêmios e punições estão associados tanto às instituições quanto à racionalidade econômica e, por isso, devem ser considerados elementos formadores do substrato normativo. (SZTAJN; ZYLBERSTAJN, 2005, p.82)

A análise econômica do direito em sistemas codificados, como é o caso do nosso ordenamento jurídico, facilita a compreensão a partir da demonstração de sua realidade e repercussão na Economia, o que pode ser relevante quando se tem questionamentos sobre a pertinência de determinada norma decisão ou o intuito de colher fundamentos para modificá-las (ALPA,1997).

Sobre a importância da análise econômica do direito Eduardo Goulart Pimenta pondera que:

Uma das razões do sucesso da análise econômica do Direito como método de estudo da legislação está na constatação de que, em um determinado modelo econômico, a legislação é uma importantíssima variável a ser considerada. Sua capacidade de influência sobre a ocorrência econômica estudada é potencialmente muito elevada e, por isso mesmo, não pode ser deixada de lado. (PIMENTA, 2006, p.4)

Visto, de uma maneira genérica, o conceito de análise econômica do direito, passaremos agora à análise de suas principais premissas.

2.2 Premissas da análise econômica do direito

A análise econômica do direito se pauta em uma série de premissas. Entretanto, para o presente estudo escolheu-se abordar os parâmetros de maximização racional, custos de transação e da norma enquanto estrutura de incentivos, não só por necessidade de delimitação da pesquisa, mas por serem premissas que guardam maior afinidade com o objeto de estudo deste estudo, qual seja, a indenização punitiva.

Por maximização racional entende-se que é a idéia de que o ser humano é tendencioso a ponderar previamente sobre as vantagens e desvantagens envolvidas em determinada conduta e, por conseguinte, a deliberar sua ação quando os prejuízos advindos não superarem as satisfações obtidas.

Sobre a maximização racional e sua relação com a análise sobre as perdas e benefícios obtidos com possíveis condutas, Bruno Salama assim se manifestou:

A premissa comportamental implícita na Teoria dos Preços é a de que os indivíduos farão escolhas que atendam seus interesses pessoais, sejam eles quais forem. Daí dizer-se que indivíduos racionalmente maximizam seu bem-estar. Note que a idéia é a de que todas as pessoas são maximizadoras racionais de bem-estar,

e também de que a maximização se dá em todas as suas atividades. Esse comportamento maximizador é, portanto, tomado como abrangendo uma enorme gama de ações, que vão desde a decisão de consumir ou produzir um bem, até a decisão de contratar com alguém, de pagar impostos, de aceitar ou propor um acordo em um litígio, de falar ao telefone celular ao dirigir e, até mesmo, de votar contra ou a favor de um projeto de lei. Claro que no cálculo de maximização entram os custos e benefícios monetários e também aqueles não monetários (tais como poder, prestígio, sensação do dever moral cumprido, etc.). (SALAMA, 2008).

Outra noção explorada na análise econômica do Direito é a de custos de transação. Os custos de transação são todos os gastos necessários para a negociação, celebração e execução de contratos, conforme Anna Paula Behrnes Romero informa:

Nas atividades econômicas, as trocas de bens, serviços, etc entre agentes geram os custos de transação. Custos de transação são aqueles que os agentes econômicos enfrentam quando recorrem ao mercado, ou seja, são os custos incorridos ao se negociar, redigir e garantir o cumprimento do contrato. (ROMERO, 2006, p.16)

Ronald Coase, no artigo The problem of social cost, salienta a relevância que se analisar as transações sejam considerados os custos envolvidos, inclusive na perspectiva de que, quanto maiores forem, menor será o estímulo dos agentes em estabelecer relações e vice-versa:

Até aqui, desenvolveu-se o argumento sob a suposição (explícita nas seções III e IV e tácita na seção V) de que não haveria custos para a realização das transações no mercado. Essa é, por óbvio, uma suposição bastante irrealista. Para que alguém realize uma transação, é necessário descobrir quem é a outra parte com a qual essa pessoa deseja negociar, informar às pessoas sobre sua disposição para negociar, bem como sobre as condições sob as quais deseja fazê-lo, conduzir as negociações em direção à barganha, formular o contrato, empreender meios de inspeção para se assegurar que os termos do contrato estão sendo cumpridos, e assim por diante. Tais operações são, geralmente, extremamente custosas. Custosas o suficiente para evitar a ocorrência de transações que seriam levadas a cabo em um mundo em que o sistema de preços funcionasse sem custo. (COASE, 1960, p.12)

Desta forma, verifica-se que os custos de transação são os custos necessários ao funcionamento econômico da firma.

A norma enquanto estrutura de incentivos é também uma das premissas utilizadas pela análise econômica do Direito.

Considerar a norma como estrutura de incentivos tem como propósito atentar para o fato que o homem, ser racional que é e maximizador de suas preferências, mesmo diante de normas, tende a agir ou não agir conforme a ponderação sobre os benefícios e prejuízos que podem advir se adotado determinado comportamento. Assim, o Direito, através de normas ou decisões, pode estimular ou desestimular condutas em sociedade conforme forem os benefícios e prejuízos estabelecidos para determinados atos.

James D Gwartney e Richard L Stroup assim se manifestam sobre o tema:

Toda a teoria econômica se baseia no postulado de que mudanças nos incentivos influenciam o comportamento humano de uma maneira previsível. Benefícios pessoais e custos influenciam nossas escolhas. Se os benefícios advindos de uma opção são grandes, as pessoas estarão mais inclinadas a escolhê-la. Contrariamente, se os custos pessoais de uma opção são grandes, as pessoas se mostrarão menos inclinadas a escolhê-la.

Esse postulado básico da economia é uma poderosa ferramenta, porque sua aplicação está amplamente disseminada. Os incentivos afetam o comportamento em praticamente todos os aspectos de nossas vidas, sejam atividades de mercado, administração do lar ou escolhas políticas. (GWARTNEY; STROUP, 1995, p.13)

Patrícia Bernardes e Vincenzo Demetrio Fiorenzano (2008, p.142) afirmam que “a norma jurídica falha quando não consegue colocar para os agentes a estrutura de incentivos adequada para movê-los na direção das condutas socialmente desejadas.”

Conforme exposto acima, ao longo do presente item, as noções de maximização racional, custos de transação, norma enquanto estrutura de incentivos estão intimamente relacionadas ao Direito e a Economia.

A compreensão do significado de tais premissas é relevante para o estudo de temas que envolvem a análise econômica do Direito, como o que será desenvolvido nos capítulos que se seguem, sobre a responsabilidade civil e a indenização punitiva.

3 RESPONSABILIDADE CIVIL

3.1 Conceito

Cavalieri Filho, ao conceituar responsabilidade civil entende que trata-se de um dever jurídico ligado a uma conduta externa de uma pessoa imposta pelo Direito Positivo por exigência da convivência social. Narra o referido autor que:

Não se trata de simples conselho, advertência ou recomendação, mas de uma ordem ou comando dirigido à inteligência e à vontade dos indivíduos, de sorte que impor deveres jurídicos importa criar obrigações. (CAVALIERI FILHO, 2005, p.23)

Já César Fiúza assim conceitua o instituto jurídico em comento:

Por elementos do ato ilícito, devemos entender aqueles elementos essenciais, sem o que não haverá delito civil, e os elementos não essenciais. O único elemento essencial é a antijuridicidade. Os demais, culpabilidade, dano e nexo causal entre culpabilidade e dano não são essenciais para a caracterização do ilícito, embora sejam requisitos para a caracterização do ilícito gerador de responsabilidade, segundo a regra imposta na cláusula geral do art. 186 do Código Civil.

Visto o conceito de responsabilidade, imperioso discorrer sobre os pressupostos da responsabilidade, ainda que de modo superficial.

3.2 Pressupostos da responsabilidade civil

Como cediço, a responsabilidade civil subdivide-se em objetiva e subjetiva, podendo ainda ser contratual e extracontratual. Para que seja verificada a responsabilidade civil subjetiva é necessária a ocorrência de uma ação ou omissão, depende ainda que dessa ação ou omissão resulte em dano para a vítima e que existir um nexo-causal entre a ação ou omissão e o dano provocado e por fim a verificação da culpa. Este instituto jurídico encontra-se positivado no art. 186 do Código Civil de 2002, o qual está disposto da seguinte forma:

Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Da transcrição do dispositivo acima fica claro que a responsabilidade civil subjetiva depende da verificação de quatro requisitos, quais sejam, ação ou omissão voluntária, conduta antijurídica e culposa, dano e nexo causal.

Sobre os elementos da responsabilidade civil Roberto Senise Lisboa verbera que:

Os elementos da responsabilidade civil são de duas categorias: os essenciais e os acidentais. Elementos essenciais são aqueles imprescindíveis para a responsabilização, a saber:

a) os elementos subjetivos: agente e vítima b) os elementos objetivos: conduta, dano e nexo de causalidade.

A ausência de um desses elementos impede a responsabilização civil. Note-se, contudo, que a dogmática estática e individualista do passado não autorizava o reconhecimento de vítimas indeterminadas, titulares de interesses socialmente relevantes que fossem violados por alguma pessoa. (LISBOA, 2004,p.473).

Portanto, a ausência de uma dessas figuras implica em ausência de responsabilidade civil.

Ação ou omissão voluntária são todas as condutas antijurídicas, decorrentes de atos próprios (omissivos ou comissivos) ou de atos de terceiros que se encontrem sob a guarda ou tutela do agente, bem como de danos provocados por coisas e animais que pertençam ao agente.

A culpa pode ser definida como conduta voluntária contrária ao direito, que acarreta à vítima um dano.

Por outro lado na responsabilidade civil objetiva não é necessária a verificação da culpa por parte do ofensor, mas apenas do dano e do nexo-causal. É o que se extrai da dicção contida no art. 933 do Código Civil de 2002, o qual estabelece que as pessoas elencadas no art. 932 do mesmo diploma legal, são obrigados a indenizar os danos causados ainda que não tenha havido culpa de sua parte.

Visto a definição de culpa, cabe agora definir nexo causal que é a ligação entre a conduta do agente e o dano por ele provocado. Se ausente o nexo de causalidade, ausente também o dever de reparar o dano.

O dano é o abalo patrimonial ou extrapatrimonial que a vítima sofre em virtude da conduta antijurídica do ofensor, ou seja, sem a constatação do dano não há se falar em dever de indenizar, ainda que verificados os outros pressupostos, pois reitera-se que é necessário a verificação de todos os elementos de forma concomitante.

Maria Helena Diniz assim conceitua dano:

Dano é a lesão, equivalente à diminuição ou destruição, que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa (física ou jurídica) ou mesmo uma dada coletividade, em detrimento de sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral.

Desta forma, o dano pode ser patrimonial ou moral, no nosso estudo nos interessa especialmente o dano moral causado pelo agente ofensor, sobre o tema Arnaldo Rizzardo nos ensina que:

Dano moral, ou não patrimonial, ou ainda extrapatrimonial, reclama dois elementos, em síntese, para configurar-se: o dano e a não diminuição do patrimônio. Apresenta-se como aquele mal ou dano – que atinge valores eminentemente espirituais ou morais, como a honra, a paz, a liberdade física, a tranqüilidade de espírito, a reputação, a beleza, etc. Há um estado interior que atinge o corpo ou espírito, isto é, fazendo a pessoa sofrer porque sente dores no corpo, ou porque fica triste, ofendida, magoada, deprimida. A dor física é a que decorre de uma lesão material do corpo, que fica com a integridade dos tecidos ou do organismo humano ofendida; a moral ou do espírito fere os sentimentos, a alma, com origem em uma causa que atinge as idéias. (RIZZARDO, 2005, P.72).

Importante ressaltar que antes do advento da Constituição Federal de 1988 muito se discutia acerca da possibilidade de se indenizar o dano moral. Os defensores da tese de que o dano moral não seria passível de indenização advogavam a tese de o dano moral não era reconhecido pela legislação, e uma vez não existindo direito não havia se falar em indenização, já que o art.159 do antigo Código Civil falava em reparação devido a uma ação ou omissão que violasse direito, ou causasse prejuízo a outrem (cláusula geral do ato ilícito), sem mencionar a figura do dano extrapatrimonial.

Já a outra corrente sustentava que o supracitado artigo não excluía a possibilidade de indenizar o dano moral, sendo o mesmo genérico, abarcando, assim, ambos os danos, o patrimonial e o moral. A questão foi resolvida quando do advento da Constituição da Republica de 1988, que em seu art. 5º, inciso V, dispõe “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.”

Diz que a responsabilidade civil é contratual quando o dano decorre da violação de um dever jurídico criados pelas partes em um contrato. Por responsabilidade civil extracontratual entende-se que é o ilícito causado por uma transgressão de um dever jurídico imposto pela lei.

3.3 Objetivo da reparação civil

O objetivo da reparação civil é restabelecer o status quo ante à vítima lesada, prejudicada seja numa relação de direito ou fática, ou seja, a reparação civil visa restabelecer o equilíbrio rompido em razão do ato ilícito.

A doutrina tradicional do direito civil assevera que a responsabilidade civil é limitada à reparação o dano.

Dispõe o art. 944 do Código Civil: “A indenização mede-se pela extensão do dano.” Nota-se que a intenção do legislador foi a de proteger exclusivamente a vítima do dano, buscando apagá-lo ou ao minorá-lo. Não, importa, assim, nos termos do citado artigo, a conduta do ofensor, a intensidade da sua culpa, o seu patrimônio, ou a vantagem obtida com o ato ilícito praticado. Ou seja, verificada a responsabilidade, o valor da indenização é medido somente pela extensão do dano ou prejuízo.

O problema reside quando não é possível a reparação in natura do dano. Nesses casos é estabelecida uma compensação pecuniária em favor da vítima imposta ao agente ofensor.

Assim, quando é violado um direito de personalidade esta violação não é passível de ressarcimento ou indenização e sim de reparação pecuniária, posto que uma vez violada a dignidade da pessoa, não é possível o seu retorno ao status quo ante. Silvio Rodrigues pontifica:

A idéia de tornar indene a vítima se confunde com o anseio de devolvê-la ao estado em que se encontrava antes do ato ilícito. Todavia, em numerosíssimos casos é impossível obter-se tal resultado, porque do acidente resultou conseqüência irremovível. Nessa hipótese há que se recorrer a uma situação postiça, representada pelo pagamento de uma indenização em dinheiro. É um remédio nem sempre ideal, mas o único de que se pode lançar mão. (RODRIGUES, 2000, p.186).

4 A INDENIZAÇÃO PUNITIVA

Acima abordamos o conceito de responsabilidade civil, trouxemos à baila seus pressupostos, bem como apresentamos seus objetivos.

Contudo, existem casos em que a simples a reparação é ineficaz, porque a reparação do dano é impossível, ou não constitui resposta jurídica satisfatória. A solução para resolução de tais casos está na figura da indenização punitiva, que se pauta no princípio da dignidade da pessoa humana e tem por objetivo proteger a dignidade da pessoa em sua plenitude.

Sobre o significado de dignidade da pessoa humana, valiosa a lição de Javier Hervada:

Em síntese, podemos dizer que a dignidade humana consiste na eminência ou excelência do ser humano, mediante uma intensa participação no mais alto grau do ser, que o constitui como um ser dotado de debitude e exigibilidade em relação a si mesmo e em aos demais homens. Em outras palavras, trata-se de um ente cuja ordem do ser compreende a ordem do dever-ser.[...] Então, a dignidade da pessoa humana significa que é um ser com uma dimensão espiritual. De modo particular, a maior perfeição do homem manifesta-se em duas coisas, próprias da dimensão espiritual: por um lado, o conhecimento intelectual, tanto se for conatural (por ser imediato) ou intuitivo (instantâneo) quanto se for racional (mediato por raciocínio ou argumentativo); por outro lado, o amor total ou abertura da vontade ao bem absoluto. Tudo isso unido à dimensão de debitude e exibilidade. (HERVADA, 2008. p. 311).

A indenização punitiva está ligada ao princípio da reparação integral, que, visando a reparação ou a compensação da vítima, tem um compromisso de reduzir os impactos do injusto prejuízo suportado, no pleno ressarcimento que se arrima na mais ampla reparação da lesão sofrida, sobre o assunto Rodolpho Barreto Sampaio Júnior narra que:

Nada além do retorno ao statu quo ante. Talvez seja a melhor definição do princípio do pleno ressarcimento, porquanto consiste, tal princípio, na integral reparação do dano que foi indevidamente infligido à vítima. O que se pretende é o ressarcimento por todos os danos causados, sejam estes morais ou materiais, presentes ou futuros. (SAMPAIO JÚNIOR, 2009, p. 228)

Outro não é o entendimento de Sérgio CavalierI Filho, que assim se manifesta sobre o assunto:

Com efeito, o ressarcimento do dano moral não tende à restitutio in integrum do dano causado, tendo mais uma genérica função satisfatória, com a qual se procura um bem que recompense, de certo modo, o sofrimento ou a humilhação sofrida.

Substitui-se o conceito de equivalência, próprio do dano material, pelo de compensação, que se obtém atenuando, de maneira indireta, as conseqüências do sofrimento. Em suma, a composição do dano moral realiza-se através desse conceito – compensação –, que, além de diverso do ressarcimento, baseia-se naquilo que Ripert chamava “substituição do prazer, que desaparece, por um novo”. Por outro lado, não se pode ignorar a necessidade de se impor uma pena ao causador do dano moral, para não passar a infração e, assim, estimular novas agressões. A indenização funcionará também como uma espécie de pena privada em benefício da vítima.(CAVALIERI FILHO, 2005, p.96).

Essa corrente, que tem como pressuposto o caráter punitivo ou retributivo à indenização por dano moral, encontra cada vez mais adeptos na comunidade jurídica nacional. Isso porque, seus defensores entendem que o pagamento de uma quantia em pecúnia é uma forma de sanção ao comportamento delitivo.

Nesse sentido José Carlos Moreira Alves afirmou

Em última análise – desculpem-me se estou praticando alguma heresia, entre tantos civilistas – penso nada mais ser o dano moral que uma pena privada, com uma circunstância ainda mais intensa que a pena privada conhecida, pois se transmite aos herdeiros; na realidade, está-se satisfazendo o desejo íntimo de vingança ao punir o cidadão causador do dano. Tanto isso é verdade que, quando se diz que foi atropelado o neto de um Rockefeller, por exemplo, o ressarcimento pode ser de milhões e milhões de dólares, embora, para a família, nada valha, pois o seu desejo é o neto; esse ressarcimento não trará satisfação alguma, para dizer-se que é uma compensação em relação à dor. Na verdade, o problema do dano moral sempre foi esse e é o que se sucede em relação ao civilista, que, quando julga matéria penal, é muito mais severo que o penalista, porque tende a ver a vítima - e o novo Código se afasta disso, de certa forma; o que lhe interessa é compor o dano. (ALVES, 2002)

Portanto, a indenização punitiva se mostra razoável quando da fixação do dano moral pelo do magistrado, pois a condenação deve servir para compensar o dano sofrido pela vítima, de desestímulo ao ofensor para que não incorra em novas práticas delitivas e de exemplo.

CONCLUSÃO:

O presente trabalho propôs realizar um estudo da análise econômica do Direito aplicado à indenização punitiva.

A partir de considerações de suas principais premissas observou-se que a análise econômica consiste em método de interpretação destinado a contribuir para a compreensão do Direito.

Constatou-se que a posição da doutrina tradicional civilista em restringir a reparação civil aos danos não atende a grande parte das noções de maximização racional, custos de transação, eficiência e da norma enquanto estrutura de incentivos.

Na perspectiva, portanto, de uma análise econômica sobre a indenização punitiva, atendem às premissas econômicas de maximização racional, equilíbrio, custos de transação e da norma enquanto estrutura de incentivos, que por sua vez desestimulam a reiteração em práticas danosas a terceiros.

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REFERÊNCIAS

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CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 6. ed. rev. aumen. São Paulo: Malheiros, 2005.

COASE, Ronald. O problema do custo social (1960). Tradução de Francisco Kümmel F. Alves e Renato Vieira Caovilla. The Latin American and Caribbean Journal of Legal Studies.[S.l], v.3, n.1, 2008. Disponível em: Acesso em: 10. Jul.2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 1993. v. 7.

FIÚZA, César. Direito Civil: curso completo. 10. ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

HERVADA, Javier. Lições Propedêuticas de Filosofia do Direito. Tradução Elza Maria Gasparotto. Revisão técnica Gilberto Callado de Oliveira. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2008.

LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil. 3. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. v. 2.

RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil: Lei 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

RODRIGUES, Sílvio. Responsabilidade civil. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

SALAMA, Bruno Meyerhof. SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é pesquisa em direito e economia? Disponível em: < http://www.ordemlivre.org/files/Bruno_Salama-O_que_e_pesquisa_em_DE.pdf>. Acesso em: 15. Jul. 2011.

SAMPAIO JÚNIOR, Rodolpho Barreto. O principio do pleno ressarcimento e a indenização punitiva. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquatro de Oliveira (Orgs.). Direito Civil: Princípios Jurídicos de Direito Privado: Atualidades III. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. "Dano Moral", São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 1998.

 

Data de elaboração: novembro/2011

 

Como citar o texto:

BAVOSE, Eduardo..A indenização punitiva na perspectiva da análise economica do direito . Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 18, nº 953. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil/2426/a-indenizacao-punitiva-perspectiva-analise-economica-direito-. Acesso em 20 jan. 2012.

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