O Princípio da Insignificância encontra-se intrinsecamente ligado ao Princípio da Intervenção Mínima, o qual estabelece que o Direito Penal somente deve atuar na proteção dos bens jurídicos relevantes para os indivíduos e para a sociedade, bens imprescindíveis à convivência pacífica dos homens e que não podem ser de outra forma tutelados.

 

Na definição de Zaffaroni e Pierangeli , “bem jurídico penalmente tutelado é a relação de disponibilidade de um indivíduo com um objeto protegida pelo Estado, que revela seu interesse mediante a tipificação penal de condutas que o afetam”.

Para Polaino Navarrete , bens jurídicos são os “bens ou valores mais consistentes da convivência humana em condições de dignidade, que merecem a máxima proteção jurídica, cuja outorga é reservada às prescrições do Direito Penal”.

Conforme Murilo Brião da Silva , “a relevância e especialidade do meio ambiente como bem jurídico fez com que fosse também considerado como bem jurídico protegido na seara penal. Seu significado social, qualificado pela imposição ao Poder Público e à coletividade do dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, justificou a tipificação criminal de condutas ilícitas, tornando-se bem jurídico penalmente protegido”.

Volvendo à questão da Intervenção Mínima, destaca-se que o principio revela-se como medida de orientação e limitação do poder punitivo do Estado.

Sendo a pena a intervenção mais radical na liberdade do indivíduo que o ordenamento jurídico permite ao Estado, é forçoso reconhecer que este não deve recorrer ao Direito Penal e à sua sanção se houver a possibilidade de garantir uma proteção suficiente com outros meios de controle ou instrumentos jurídicos não-penais, devendo ser as lesões mais leves ao ordenamento jurídico objeto de outros ramos do Direito.

Dessa forma, o Direito Penal somente deve intervir na vida em sociedade quando os demais ramos do Direito, comprovadamente, se mostrarem incapazes de proteger aqueles bens considerados mais importantes.

Neste sentido, a doutrina de Cezar Roberto Bitencourt :

O princípio da intervenção mínima, também conhecido como ultima ratio, orienta e limita o poder incriminador do Estado, preconizando que a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico. Se outras formas de sanções ou outros meios de controle social revelarem-se suficientes para a tutela desse bem, a sua criminalização será inadequada e desnecessária. Se para o restabelecimento da ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas, são estas que devem ser empregadas e não as penais. Por isso, o Direito Penal deve ser a ultima ratio, isto é, deve atuar somente quando os demais ramos do direito revelarem-se incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes da vida do indivíduo e da própria sociedade.

Do Princípio da Intervenção Mínima decorrem a natureza subsidiária do Direito Penal, bem como seu caráter fragmentário.

Por força da subsidiariedade não se justifica a utilização de um meio especialmente lesivo da liberdade se se dispõe de meios menos gravosos e mais adequados de intervenção. A norma penal exerce uma função suplementar da proteção jurídica em geral, apenas se justificando a intervenção deste ramo do Direito quando fracassam as demais medidas protetoras do bem jurídico estabelecidas por outros ramos do Direito.

Em crítica ao uso excessivo da sanção penal, José Henrique Guaracy Rebêlo preleciona que a lei penal não deve ser utilizada se o sistema não comportar sua aplicação, fazendo-se necessário sejam abolidos do sistema penal os delitos insignificantes, as condutas penalmente tipificadas que estão em contradição com mandamentos constitucionais, as condutas sem nocividade social, bem como as que passaram a ser toleradas e as puramente amorais, os comportamentos que podem ser evitados por fatores externos, os delitos sem vítima e os fatos cuja punição é mais danosa que a impunidade.

O caráter fragmentário do Direito Penal significa dizer que este ramo do direito não constitui um sistema exaustivo de ilicitudes ou de proteção de bens jurídicos, mas descontínuo, centrando-se em determinados pontos essenciais, selecionados consoante o critério de merecimento da pena, já que sua intervenção pressupõe o insucesso de outras intervenções, jurídicas ou não.

“Nem todas as ações que atacam bens jurídicos são proibidas pelo Direito Penal, nem tampouco todos os bens jurídicos são por ele protegidos.” Não deve, pois, o Direito Penal sancionar todas as condutas lesivas a bens jurídicos, mas limitar-se a somente castigar aquelas mais graves e danosas, incidentes sobre os bens mais relevantes. O bem jurídico somente é defendido penalmente perante determinadas formas de agressão consideradas intoleráveis, o que implica que apenas as condutas mais graves dirigidas contra bens fundamentais possam ser criminalizadas.

Daí o caráter fragmentário do Direito Penal, porque de toda a gama de condutas proibidas e bens jurídicos protegidos pelo ordenamento jurídico, nem tudo lhe interessa, ocupando-se ele apenas de uma parte.

Conforme já mencionado, também como decorrência da tendência de intervenção mínima do Direito Penal, utiliza-se o Princípio da Insignificância como princípio auxiliar para determinação da tipicidade, na tentativa de reduzir ao máximo o campo de incidência do Direito Penal, reservando-o apenas para a tutela de valores sociais indiscutíveis, o que reafirma seu caráter fragmentário e sua natureza subsidiária.

O Princípio da Insignificância foi introduzido pela primeira vez no sistema penal em 1964, por Claus Roxin e consiste no fato de o Direito Penal não dever ocupar-se de bagatelas e de não deverem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar qualquer bem jurídico.

Quando a doutrina evoluiu de um conceito formal para um conceito material de crime, surgiu a ideia da indispensabilidade da gravidade do resultado concretamente obtido para fins incidência da norma penal.

Não raro, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o aspecto formal, não apresentam qualquer relevância material no caso concreto. Nessas circunstâncias, pode ser a tipicidade penal afastada, porque, na verdade, o bem jurídico não chegou a ser lesado.

Dessa forma, se o fim do tipo penal é proteger determinado bem jurídico, quando a lesão torna-se imperceptível, não será possível proceder a seu enquadramento típico, por absoluta falta de correspondência entre o fato tipificado na lei e o comportamento ínfimo realizado. No tipo incriminador somente estão descritas as condutas aptas a ofender o interesse tutelado pela norma. Por esse motivo, os danos de pequena ou nenhuma monta devem ser considerados atípicos.

Na lição de Francisco de Assis Toledo ,

Segundo o princípio da insignificância, que se revela por inteiro pela sua própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas. Assim, no sistema penal brasileiro, por exemplo, o dano do art. 163 do Código Penal não deve ser qualquer lesão à coisa alheia, mas sim aquela que possa representar prejuízo de alguma significação para o proprietário da coisa; o descaminho do art. 334, § 1º, d, não será certamente a posse de pequena quantidade de produto estrangeiro, de valor reduzido, mas sim a de mercadoria cuja quantidade ou cujo valor indique lesão tributária, de certa expressão, para o Fisco (...), a injúria, a difamação e a calúnia dos arts. 140, 139 e 138, devem igualmente restringir-se a fatos que realmente possam afetar significativamente a dignidade, a reputação, a honra, o que exclui ofensas tartamudeadas e sem consequências palpáveis; e assim por diante”.

Por meio do Princípio da Insignificância, o juiz, observando a desproporção entre a conduta criminosa e a sanção penal, fará um juízo valorativo acerca da tipicidade material da conduta, recusando curso àquelas que embora formalmente típicas, não o sejam materialmente, ante sua irrelevância.

Em outubro de 2004, quando do julgamento do HC 84412/SP, o Supremo Tribunal Federal, por sua Segunda Turma, se manifestou acerca do Princípio da Insignificância, estabelecendo seus vetores, quais sejam: (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Considerou-se que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à proteção das pessoas e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, não devendo o Direito Penal se ocupar de condutas que produzam resultados cujo desvalor, por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes, não represente prejuízo importante.

Confira-se, a propósito, a ementa do Acórdão:

E M E N T A: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQÜENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DELITO DE FURTO - CONDENAÇÃO IMPOSTA A JOVEM DESEMPREGADO, COM APENAS 19 ANOS DE IDADE - "RES FURTIVA" NO VALOR DE R$ 25,00 (EQUIVALENTE A 9,61% DO SALÁRIO MÍNIMO ATUALMENTE EM VIGOR) - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF - PEDIDO DEFERIDO. O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL. - O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: "DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR". - O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. (STF, Segunda Turma, HC 84412 / SP, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.11.2004, p. 37) (gn)

Em 2008, o Tribunal Pleno do STF se pronunciou favoravelmente à aplicação do Princípio da Insignificância em caso específico que envolvia prática de crime ambiental atribuída ao então parlamentar Clodovil Hernandes. Na ocasião, teria sido constatado por perícia a abrangência mínima do dano (0,0652 hectares), estimando-se a recuperação da área mediante gasto de cento e trinta reais.

A aplicação do princípio para a absolvição do acusado foi solicitada pelo Ministério Público Federal, em suas alegações finais.

Destacam-se o voto do Ministro Relator (Marco Aurélio) e trechos do voto do Ministro Revisor (Gilmar Mendes):

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): A manifestação do Titular da ação penal procede. Trata-se, na espécie, de prática cuja significação jurídica é de menor importância. Teria sido alterado o meio ambiente visando à construção de rua, considerado o Parque Estadual da Serra do Mar e área pertencente a Vitor Godinho da Silva. Lançaram-se mourões de concreto e arame galvanizado, calçando-se a estrada aberta com pequenos blocos de plantas exóticas para ornamentação. Pois bem, o perito que atuou no caso, integrante do Instituto Florestal da Secretaria do Meio Ambiente, constatou abrangência mínima, ou seja, de 0,0652 hectares. Então estimou a recuperação da área mediante gasto de cento e trinta reais. Conforme lição de Francisco de Assis Toledo, contida em Princípios Básicos de Direito Penal, “segundo o princípio da insignificância, que se revela inteiro por sua própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas”. Sufragando essa óptica, a Segunda Turma, ao julgar o HC 92.463-8/RS, Relator o Ministro Celso de Mello, ressaltou o princípio da intervenção mínima do Estado em matéria penal. A circunstância de ter-se como bem protegido o meio ambiente não é de molde a afastar esse entendimento.

Em síntese, o fato apurado não consubstancia tipicidade suficiente a levar à condenação penal, presente a peculiaridade de se cogitar de desmatamento de vegetação capoeira em estágio inicial, conforme retratado na acusação (fl. 2). Voto pela absolvição do paciente, tal como preconizado pelo Procurador-Geral da República.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Revisor):

(…)

O Ministério Público Federal (MPF), pelo Procurador-Geral da República Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, apresentou alegações finais nos seguintes termos:

(...) 8. Descreveu a denúncia que Clodovil Hernandes causou danos diretos à Unidade de Conservação do Parque Estadual da Serra do Mar ao contratar pessoas que, por meio de terraplanagem, desmataram vegetação capoeira em estágio inicial e construíram uma estrada calçada.

9. As testemunhas comprovaram que o aterro e a instalação de bloquetes – que configuraram o dano à Unidade de Conservação – foram feitos por ordem do parlamentar com a finalidade de melhorar o acesso à sua residência (fls. 199/200, 201/202, 203, 204/205 e 228).

10. Ocorre que a área alterada pelo réu, segundo o Relatório de Vistoria de Campo realizado pelo Instituto Florestal da Secretaria do Meio Ambiente (fls. 22/30), foi de pequena extensão (0,0652 hectares) (...).

11. De acordo com a estimativa feita pelo perito do custo de recuperação da área – R$ 2.0000,00 por hectare – o custo previsto para a recuperação da área devastada pelo denunciado é de aproximadamente R$ 130,00.

12. Assim, muito embora tenham sido comprovadas a autoria e a materialidade do delito, a pequena extensão da área desmatada não justifica a imposição de uma sentença penal condenatória, uma vez que a atividade não afetou significativamente o meio ambiente.

13. Para o Professor Francisco de Assis Toledo, “segundo o princípio da insignificância, que se revela inteiro por sua própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas”.

14. Apesar das discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca da aplicação do princípio da insignificância penal em crimes contra o meio ambiente, prevalece o entendimento de que deve o julgador considerar as circunstâncias do caso concreto para aferir a relevância da conduta imputada ao infrator em relação ao meio ambiente e ao equilíbrio ecológico.

15. Essa corte já reconheceu que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público:

“Princípio da insignificância – Identificação dos vetores cuja presença legitima o reconhecimento desse postulado de política criminal – Conseqüente descaracterização da tipicidade penal em seu aspecto material – Delito de furto simples, em sua modalidade tentada – ‘Res furtiva’ no valor (ínfimo) de R$ 20,00 (equivalente a 5,26% do salário mínimo atualmente em vigor) – Doutrina – Considerações em torno da jurisprudência do STF – Pedido deferido. O princípio da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade penal. – O princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal – tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado – que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada – apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O postulado da insignificância e a função do direito penal: ‘de minimis, non curat praetor’. – O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor – por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes – não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social (HC no 92.463/RS, Rel. Min. Celso de Mello, 2a Turma, unânime, DJ 31.10.2007).”

Com estas razões, requeiro seja o denunciado Clodovil Hernandes absolvido da imputação criminal, dada a aplicação do princípio da insignificância. (Fls. 360-364.)

(…)

O art. 40 da Lei 9.605/98 prevê pena de reclusão, de um a cinco anos, para quem “causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art. 27 do Decreto no 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização”.

Como se pode constatar, a norma penal protege o valor fundamental do meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, assegurado pelo art. 225 da Constituição da República.

A finalidade do Direito Penal é justamente conferir uma proteção reforçada aos valores fundamentais compartilhados culturalmente pela sociedade. Além dos valores clássicos, como a vida, liberdade, integridade física, a honra e imagem, o patrimônio etc., o Direito Penal, a partir de meados do século XX, passou a cuidar também do meio ambiente, que ascendeu paulatinamente ao posto de valor supremo das sociedades contemporâneas, passando a compor o rol de direitos fundamentais ditos de 3a geração incorporados nos textos constitucionais dos Estados Democráticos de Direito.

Parece certo, por outro lado, que essa proteção pela via do Direito Penal justifica-se apenas em face de danos efetivos ou potenciais ao valor fundamental do meio ambiente, ou seja, a conduta somente pode ser tida como criminosa quando degrade ou no mínimo traga algum risco de degradação do equilíbrio ecológico das espécies e dos ecossistemas. Fora dessas hipóteses, o fato não deixa de ser relevante para o Direito. Porém, a responsabilização da conduta será objeto do Direito Administrativo ou do Direito Civil. O Direito Penal atua, especialmente no âmbito da proteção do meio ambiente, como ultima ratio, tendo caráter subsidiário em relação à responsabilização civil e administrativa de condutas ilegais. Esse é o sentido de um Direito Penal mínimo, que se preocupa apenas com os fatos que representam graves e reais lesões a bens e valores fundamentais da comunidade.

No caso em questão, o Réu, segundo consta da denúncia de fls. 2/3: causou danos diretos à Unidade de Conservação do Parque Estadual da Serra do Mar, consistente em desmatamento de vegetação capoeira em estágio inicial, bem como aterro por meio de terraplanagem e construção de uma estrada calçada. (Fl. 2.)

Consta também da inicial acusatória que o denunciado suprimiu vegetação capoeira em estágio inicial e aterrou o local por meio de terraplanagem a fim de construir uma rua, em uma área de 0,0652 hectares no interior do Parque Estadual da Serra do Mar, área esta pertencente a Vitor Godinho da Silva.

As circunstâncias do caso concreto levam-me a crer que a área alterada pelo réu foi de pequena extensão, não constituindo fato relevante para o Direito Penal.

No caso, portanto, há que se realizar um juízo de ponderação entre o dano causado pelo agente e a pena que lhe será imposta como conseqüência da intervenção penal do Estado. A análise da questão, tendo em vista o princípio da proporcionalidade, pode justificar, dessa forma, a ilegitimidade da intervenção estatal por meio do processo penal.

A jurisprudência desta Corte tem sido no sentido de que a insignificância da infração penal, que tenha o condão de descaracterizar materialmente o tipo, impõe o trancamento da ação penal por falta de justa causa (HC 92.411/RS, Rel. Min. Carlos Britto, Primeira Turma, unânime, DJ de 9-5-08; HC 88.393/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, unânime, DJ de 8-6-07; HC 84.687/ MS, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, unânime, DJ de 27-10-06; HC 84.412/SP, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, unânime, DJ de 19-11-04; e HC 83.526/CE, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Primeira Turma, unânime, DJ de 7-5-04).

Para a incidência do princípio da insignificância só se consideram aspectos objetivos, referentes à infração praticada, assim a mínima ofensividade da conduta do agente; a ausência de periculosidade social da ação; o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; a inexpressividade da lesão jurídica causada (HC 84.412/SP, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, unânime, DJ de 19-11-04).

Destaco que, no caso em apreço, o prejuízo material foi insignificante (R$ 130,40) e que a conduta não causou lesividade relevante à ordem social.

Entendo, portanto, pela aplicação do princípio da insignificância tendo em vista o atendimento de seus requisitos objetivos.

Sendo atípica a conduta, em razão da insignificância, a denúncia deveria ter sido rejeitada, nos termos do art. 43, inciso I, do Código de Processo Penal.

Ante o exposto, voto no sentido de acolher o parecer ministerial para julgar improcedente a ação penal e absolver o acusado.

O Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente a ação. A propósito, a ementa do acórdão:

CRIME - INSIGNIFICÂNCIA - MEIO AMBIENTE. Surgindo a insignificância do ato em razão do bem protegido, impõe-se a absolvição do acusado. (STF, Pleno, AP 439/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, Rev. Min. Gilmar Mendes, DJe-13-02-2009)

Também o Superior Tribunal de Justiça, em diversas ocasiões, admitiu a aplicabilidade do Princípio da Insignificância para afastar a tipicidade material de condutas que provocaram danos de pequena monta ao meio ambiente.

Nesse sentido, os seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34 DA LEI N. 9.605/98. AUSÊNCIA DE DANO AO MEIO AMBIENTE. CONDUTA DE MÍNIMA OFENSIVIDADE PARA O DIREITO PENAL. ATIPICIDADE MATERIAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. TRANCAMENTO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o princípio da insignificância tem como vetores a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. Hipótese em que, com os acusados do crime de pesca em local interditado pelo órgão competente, não foi apreendido qualquer espécie de pescado, não havendo notícia de dano provocado ao meio-ambiente, mostrando-se desproporcional a imposição de sanção penal no caso, pois o resultado jurídico, ou seja, a lesão produzida mostra-se absolutamente irrelevante. 3. Embora a conduta dos pacientes se amolde à tipicidade formal e subjetiva, ausente no caso a tipicidade material, que consiste na relevância penal da conduta e do resultado típicos em face da significância da lesão produzida no bem jurídico tutelado pelo Estado. 4. Ordem concedida para, aplicando-se o princípio da insignificância, trancar a Ação Penal n. 2009.72.00.002143-8, movida em desfavor dos pacientes perante a Vara Federal Ambiental de Florianópolis/SC. (STJ, Quinta Turma, HC 143208/SC, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 14.06.2010)

Habeas corpus (cabimento). Matéria de prova (distinção). Crime ambiental (caso). Antena de telecomunicações (instalação). Licença (deferimento). Estação de rádio (funcionamento). Autorização definitiva (concessão). Princípio da insignificância (adoção). 1. Determina a norma (constitucional e infraconstitucional) que se conceda habeas corpus sempre que alguém esteja sofrendo ou se ache ameaçado de sofrer violência ou coação; trata-se de dar proteção à liberdade de ir, ficar e vir, liberdade induvidosamente possível em todo o seu alcance. 2. Assim, não procedem censuras a que nele se faça exame de provas. Quando fundado, por exemplo, na alegação de falta de justa causa, impõe-se sejam as provas verificadas. O que se veda em habeas corpus, semelhantemente ao que acontece no recurso especial, é a simples apreciação de provas, digamos, a operação mental de conta, peso e medida dos elementos de convicção. 3. A melhor das compreensões penais recomenda não seja mesmo o ordenamento jurídico penal destinado a questões menores. 4. Antes, falou-se, a propósito, do princípio da adequação social; hoje, fala-se, a propósito, do princípio da insignificância. Já foi escrito: "Onde bastem os meios do direito civil ou do direito público, o direito penal deve retirar-se." 5. É penalmente insignificante, dúvida não há, o funcionamento de estação de rádio no período de dois meses entre o vencimento de licença ambiental e a concessão, em definitivo, de nova autorização pela autoridade administrativa. 6. A insignificância, é claro, mexe com a tipicidade, donde a conclusão de que fatos dessa natureza evidentemente não constituem crime. 7. Habeas corpus concedido. (STJ, Sexta Turma, HC 148061/SC, Rel. Min. Haroldo Rodrigues [Desembargador Convocado do TJ/CE], Rel. p/ Acórdão Min. Nilson Naves, DJe 23/08/2010)

HABEAS CORPUS PREVENTIVO. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. PESCA MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DE APARELHOS, PETRECHOS, TÉCNICAS E MÉTODOS NÃO PERMITIDOS (ART. 34, PAR. ÚNICO, II DA LEI 9.605/98). PESCA DE, APROXIMADAMENTE, 2 QUILOGRAMAS DE PEIXES. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO, NA ESPÉCIE, DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PEQUENA QUANTIDADE DE PESCADO APREENDIDA. SUPOSTO CRIME QUE CONSISTIU NA UTILIZAÇÃO DE UMA REDE SUPERIOR EM APENAS 50 CENTÍMETROS AO LIMITE ESTABELECIDO NA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. INEXISTÊNCIA DE DANO EFETIVO AO MEIO AMBIENTE. PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DA ORDEM. ORDEM CONCEDIDA, PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL MOVIDA CONTRA OS PACIENTES, POR SUPOSTA INFRAÇÃO AO ART. 34, PAR. ÚNICO, II DA LEI 9.605/98. 1. O princípio da insignificância, que está diretamente ligado aos postulados da fragmentariedade e intervenção mínima do Estado em matéria penal, tem sido acolhido pelo magistério doutrinário e jurisprudencial tanto desta Corte, quanto do colendo Supremo Tribunal Federal, como causa supralegal de tipicidade. Vale dizer, uma conduta que se subsuma perfeitamente ao modelo abstrato previsto na legislação penal pode vir a ser considerada atípica por força deste postulado. 2. Entretanto, é imprescindível que a aplicação do referido princípio se dê de forma prudente e criteriosa, razão pela qual é necessária a presença de certos elementos, tais como (I) a mínima ofensividade da conduta do agente; (II) a ausência total de periculosidade social da ação; (III) o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e (IV) a inexpressividade da lesão jurídica ocasionada, consoante já assentado pelo colendo Pretório Excelso (HC 84.412/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 19.04.04). 3. Para incidir a norma penal incriminadora, é indispensável que a pesca com equipamentos proibidos possa, efetivamente, causar risco às espécies ou ao ecossistema; nada disso, todavia, se verifica no caso concreto, em que dois pescadores, utilizando-se de somente uma rede - rede esta considerada ilegal porque superior em 50 centímetros ao limite legalmente estabelecido, como registrado no aresto -, tinham retirado da represa apenas 2 quilogramas de peixes, de espécie diversa. 4. Evidente a atipicidade material da conduta, pela desnecessidade de movimentar a máquina estatal, com todas as implicações conhecidas, para apurar conduta desimportante para o Direito Penal, por não representar ofensa a qualquer bem jurídico tutelado pela Lei Ambiental. 5. Parecer do MPF pela concessão da ordem. 6. Ordem concedida para trancar a Ação Penal movida contra os pacientes, por suposta infração ao art. 34, par. único, II da Lei 9.605/98 (STJ, Quinta Turma, HC 112840/SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO Fonte DJe 03/05/2010)

HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34 DA LEI 9.605/98. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO. INEXPRESSIVA LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. O princípio da insignificância surge como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima. 2. Indiscutível a sua relevância, na medida em que exclui da incidência da norma penal aquelas condutas cujo desvalor da ação e/ou do resultado (dependendo do tipo de injusto a ser considerado) impliquem uma ínfima afetação ao bem jurídico. 3. A conduta dos pacientes, embora se subsuma à definição jurídica do crime ambiental e se amolde à tipicidade subjetiva, uma vez que presente o dolo, não ultrapassa a análise da tipicidade material, mostrando-se desproporcional a imposição de pena privativa de liberdade, uma vez que a ofensividade da conduta se mostrou mínima; não houve nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade do comportamento foi de grau reduzidíssimo e a lesão ao bem jurídico se revelou inexpressiva. 4. Ordem concedida para determinar a extinção da ação penal instaurada contra os pacientes. Em conseqüência, torno sem efeito o termo de proposta e aceitação da suspensão condicional do processo, homologado pelo Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Londrina/PR (STJ, Quinta Turma, HC 86913/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves, DJe 04/08/2008)

HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. GUARDA, EM RESIDÊNCIA, DE AVES SILVESTRES NÃO AMEAÇADOS DE EXTINÇÃO (UMA ARARA VERMELHA, UM PASSARINHO CONCRIZ E UM XEXÉU, DOIS GALOS DE CAMPINA E UM PAPAGAIO). FLAGRANTE DURANTE BUSCA E APREENSÃO REALIZADA POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL EM OUTRO PROCESSO, QUE APURAVA CRIME TRIBUTÁRIO (OPERAÇÃO CEVADA). INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS DO PACIENTE DESAUTORIZADAS, NAQUELES AUTOS, POR FALTA DE CONDIÇÃO OBJETIVA DE PUNIBILIDADE (LANÇAMENTO DEFINITIVO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO). CONTAMINAÇÃO DAS PROVAS. FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INEXISTÊNCIA. DESNECESSIDADE DE MANDADO JUDICIAL. CRIME PERMANENTE. ESTADO DE FLAGRÂNCIA. ART. 5, XI DA CF. PRECEDENTES DO STJ. TRANCAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE LESÃO AO BEM JURÍDICO PROTEGIDO PELA NORMA PENAL DE PROTEÇÃO À FAUNA. ORDEM CONCEDIDA, PARA TRANCAR O INQUÉRITO POLICIAL INSTAURADO CONTRA O PACIENTE. 1. No HC 57.624/RJ, relatado pelo Ministro PAULO MEDINA (DJU 12.03.07), a que faz referência a inicial, restaram cassadas as autorizações judiciais para a quebra do sigilo das comunicações telefônicas do paciente, para o efeito de investigação de crime de sonegação fiscal, porque deferidas antes de configurada a condição objetiva de punibilidade do delito, qual seja, o lançamento definitivo do crédito tributário. Como o que ocorreu, no tocante ao crime ora em apuração, foi o flagrante, realizado no momento de busca e apreensão em sua residência, não vislumbro a ocorrência de contaminação das provas, até porque não está devidamente provado que essa busca resultou daquelas interceptações. 2. Afastam-se as teses de necessidade de mandado judicial ou de existência de violação de domicílio, pois o crime em questão, nas modalidades de guardar ou ter em cativeiro animal silvestre, é de natureza permanente, prolongando-se sua consumação no tempo e, consequentemente, o estado de flagrância, o que permite à autoridade policial adentrar na residência do paciente sem qualquer determinação judicial, ex vi do art. 5o., inciso XI da Carta Magna. 3. A Lei 9.605/98 objetiva concretizar o direito dos cidadãos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e preservado para as futuras gerações, referido no art. 225, caput da Constituição Federal, que, em seu § 1o., inciso VII, dispõe ser dever do Poder Público, para assegurar a efetividade desse direito, proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da Lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. 4 Dessa forma, para incidir a norma penal incriminadora, é indispensável que a guarda, a manutenção em cativeiro ou em depósito de animais silvestres, possa, efetivamente, causar risco às espécies ou ao ecossistema, o que não se verifica no caso concreto, razão pela qual é plenamente aplicável, à hipótese, o princípio da insignificância penal. 5. A própria lei relativiza a conduta do paciente, quando, no § 2o. do art. 29, estabelece o chamado perdão judicial, conferindo ao Juiz o poder de não aplicar a pena no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não ameaçada de extinção, como no caso, restando evidente, por conseguinte, a ausência de justa causa para o prosseguimento do Inquérito Policial, pela desnecessidade de movimentar a máquina estatal, com todas as implicações conhecidas, para apurar conduta desimportante para o Direito Penal, por não representar ofensa a qualquer bem jurídico tutelado pela Lei Ambiental. 6. Ordem concedida, para trancar o Inquérito Policial 2006.83.00.002928-4 instaurado contra o paciente, mas abrangendo única e exclusivamente à apreensão das aves, não se aplicando a quaisquer outros inquéritos ou ações de que o paciente seja participante, em que pese o parecer ministerial em sentido contrário. (STJ, Quinta Turma, HC 7223/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 05/11/2007 p. 307)

HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INEXISTÊNCIA DE DANO AMBIENTAL PASSÍVEL DE ENQUADRAMENTO LEGAL. ACEITAÇÃO DO SURSIS PROCESSUAL. ART. 89 DA LEI N.º 9.099/95. RENÚNCIA AO INTERESSE DE AGIR QUE NÃO FOI RECONHECIDA PELO STF, QUE DEFERIU ORDEM PARA DETERMINAR O EXAME DO MÉRITO PELO STJ. 1. O bem jurídico protegido pela lei ambiental diz respeito a áreas cujas dimensões e tipo de vegetação efetivamente integrem um ecossistema. A lei de regência não pode ser aplicada para punir insignificantes ações, sem potencial lesivo à área de proteção ambiental, mormente quando o agente se comporta com claro intuito de proteger sua propriedade, no caso, com simples levante de cerca, em perímetro diminuto, vindo com isso, inclusive, a resguardar a própria floresta nativa. 2. Ordem concedida para trancar a ação penal em tela. (STJ, Quinta Turma, HC 35203/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 01/08/2006 p. 464)

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por sua vez, em reiterados acórdãos, se posiciona no sentido de não admitir a aplicação do princípio da insignificância em relação aos crimes ambientais, alegando, para tanto, a indisponibilidade do bem jurídico protegido e a necessidade de dissuasão da prática dos delitos atentatórios ao meio ambiente. Argumenta-se, ainda, em alguns casos, que a biota, conjunto de seres animais e vegetais de uma região, pode se revelar extremamente diversificada, ainda que em nível local e que, em pequenas áreas podem existir espécimes só ali encontradas, de forma que determinadas condutas, inicialmente insignificantes, podem conter potencialidade suficiente para causar danos irreparáveis ao meio ambiente.

A respeito do tema, colacionam-se os seguintes arestos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE - ARTS. 40 E 41 DA LEI 9.605/98 - ATEAR FOGO NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DA SERRA DA MANTIQUEIRA - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - INAPLICABILIDADE - REJEIÇÃO DA DENÚNCIA - DESCABIMENTO. I - Não há falar-se em irrelevância penal da conduta incriminada (arts. 40 e 41 da Lei 9.605/98), consubstanciada em atear fogo na Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira, com infringência das normas pertinentes, causando, a princípio, dano ao meio ambiente, considerando que a indisponibilidade do interesse tutelado não admite transigir com a sua ofensa. II - Inaplicabilidade do princípio da insignificância em relação aos crimes ambientais, em razão da indisponibilidade do bem jurídico protegido e da necessidade de dissuasão da prática dos delitos atentatórios ao meio ambiente. Precedentes do TRF/1ª Região. III - Preenchidos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, incabível é a rejeição da denúncia. IV - Recurso provido. (TRF1, Terceira Turma, RSE 0001825-78.2010.4.01.3810/MG, RELATORA DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES, e-DJF1 p.175 de 31/03/2011)

PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. EXPLORAÇÃO DE ARGILA. ART. 2º, LEI N. 8.176/1991. ART. 55, LEI N. 9.605/1998. CONCURSO FORMAL. MATERIALIDADE E AUTORIA. DEMONSTRAÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. Os bens jurídicos tutelados pelos arts. 2º da Lei n. 8.176/1991 e 55 da Lei n. 9.605/1998 são distintos, vale dizer, patrimônio da União e meio ambiente, respectivamente. 2. Tratando-se de conduta única com o cometimento de dois crimes aplica-se a regra do concurso formal. 3. Havendo comprovação suficiente de que o réu não possuía autorização para a exploração do minério, nem tampouco licença ambiental que legitimasse tal atividade, impõe-se a sua condenação. 4. É uníssona a jurisprudência desta Corte Regional de Justiça, no sentido de que é inaplicável o princípio a insignificância em causas que envolvem crimes ambientais. 5. Sentença reformada. Recurso provido. (TRF1, Quarta Turma, ACR 0000171-79.2007.4.01.3804/MG Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO, e-DJF1 p.65 de 08/04/2010)

PENAL. PROCESSUAL PENAL. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. INDISPONIBILIDADE DO BEM TUTELADO. 1. Não há de se falar na possibilidade de aplicação do princípio da insignificância nos casos que versem sobre a prática, em tese, de crime ambiental praticado em área de preservação permanente, dada a indisponibilidade do bem tutelado. Precedentes desta Corte Regional Federal. 2. Sobre esse tema, já posicionou-se a 3ª Turma deste tribunal: "(...) Inviável, na hipótese, a aplicação do princípio da insignificância na matéria ambiental, pois a biota, conjunto de seres animais e vegetais de uma região, pode se revelar extremamente diversificada, ainda que em nível local. Em pequenas áreas podem existir espécimes só ali encontradas, de forma que determinadas condutas, inicialmente insignificantes, podem conter potencialidade suficiente para causar danos irreparáveis ao meio ambiente (...)" (ACR 2004.34.00.024753-1/DF). 3. "(...) A complacência no trato de questões ambientais constitui incentivo aos infratores das normas que cuidam da proteção do meio ambiente a persistirem em suas condutas delituosas, gerando, como conseqüência, a impunidade e desestimulando os Agentes de Fiscalização a cumprirem com suas obrigações (...)" (TRF da 1ª Região, RCCR 2001.43.00.001447-0/TO). 4. Recurso criminal provido para receber a denúncia. (TRF1, Quarta Turma, RSE 2007.34.00.044394-8/DF, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL HILTON QUEIROZ, Relator para Acórdão: JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, e-DJF1 p.302 de 10/02/2009)

Em uma ocasião, admitiu a possibilidade de se reconhecer o princípio da insignificância para a hipótese em debate, caso comprovada a atipicidade material da conduta:

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 38 LEI 9.605/98. ATIPICIDADE MATERIAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. DENÚNCIA. REJEIÇÃO. 1. O reconhecimento do princípio da insignificância é possível em crime contra o meio ambiente caso comprovada a atipicidade material da conduta. 2. Sob o enfoque da Lei 11.719/08, que modificou o processo penal, a rejeição liminar da denúncia é possível, afastando-se o princípio in dubio pro societate, tendo em vista que o mais, a absolvição sumária, equivalente ao julgamento antecipado da lide, tornou-se prerrogativa do Juiz. 3. Recurso em sentido estrito não provido. (TRF1, Terceira Turma, RSE 0001570-57.2009.4.01.3810/MG, Relator: JUIZ TOURINHO NETO, e-DJF1 p.41 de 30/07/2010)

No âmbito do Tribunal Regional da 2ª Região, o seguinte julgado:

PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34 DA LEI 9.605/98. ESPÉCIE DE CAMARÃO DO MAR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PORTARIA Nº 21 DE 11/02/99 DO MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. PESCA NO PERÍODO DO DEFESO. DESCONHECIMENTO DA ILICITUDE. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICAVÉL. I. A pesca predatória em mar territorial (art. 20, VI, CF) evidencia lesão a bens, serviços ou interesses da União. Competência da Justiça Federal. II. Inaplicável o princípio da insignificância na espécie. A quantidade de camarões apreendidos não desnatura o delito descrito no art. 34 da Lei 9.605/98, que pune a atividade durante o período em que a pesca seja proibida ou em locais interditados, certo que a pesca predatória acarreta dano ambiental. III. Alegações de bons antecedentes e primariedade, por si sós, não devem ser consideradas como circunstâncias, supostamente determinantes da prática delituosa, tampouco como fatores aptos a justificar a redução especial de pena ou absolvição do réu. IV. Recurso improvido. (TRF2, Primeira Turma, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL – 4468, Relator Desembargador Federal SERGIO FELTRIN CORREA, DJU - Data: 10/07/2007)

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região possui decisões ora pela aplicabilidade, ora pela inaplicabilidade do princípio aos crimes ambientais. A título de exemplificação, foram selecionados os seguintes julgados:

PENAL / PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. PESCA EM ÉPOCA PROIBIDA. ART. 34, CAPUT, DA LEI 9.605/98. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE TIPICIDADADE MATERIAL DA CONDUTA. DENÚNCIA REJEITADA. RECURSO DESPROVIDO. I - O princípio da insignificância, informado pelos postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Direito Penal, atua justamente no nível da tipicidade material, afastando a criminalização da conduta que, embora formalmente e subjetivamente típica, revela-se socialmente adequada (conduta insignificante) ou se mostra incapaz de produzir lesão relevante ao bem jurídico tutelado (resultado insignificante); II - Em que pese o fato de o acusado ter sido surpreendido praticando atos de pesca em época proibida, a sua conduta, individualmente tomada, não representa sequer um risco potencial de lesão ao equilíbrio ecológico, uma vez que foram encontrados em seu poder apenas 2 (dois) quilos de peixes, não se vislumbrando, assim, qualquer lesão considerável ao bem jurídico tutelado; III - Recurso desprovido. (Classe: RSE - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - 5663 Processo: 2009.61.06.001031-2 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA Data do Julgamento: 26/07/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA: 01/09/2010 PÁGINA: 518 Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI)

PENAL. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, II DA LEI N.º 9.605/98. PRELIMINARES AFASTADAS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. AUSÊNCIA DE NULIDADE DO FEITO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO RESPEITADOS. AUTORIA. MATERIALIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICÁVEL. REDUÇÃO DA PENA PRIVTIVA DE LIBERDADE. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. O réu foi denunciado como incurso nas sanções do art. 34, caput, e parágrafo único incisos I, II e III, da Lei nº 9.605/98. Preliminares afastadas. Competência para processar e julgar o feito é da Justiça Federal. Art. 20, inciso III c.c art. 109, inciso IV, da Constituição Federal. Rio Taquari banha mais de um Estado - Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Nulidade do feito não configurada. O d. magistrado "a quo" fundamentou de forma detalhada a dosimetria da pena nos termos do art. 59 do Código Penal. Cerceamento de defesa não caracterizado. Há provas de que foi assegurado o exercício do contraditório e da ampla defesa acerca da provas acostadas aos autos após o oferecimento das alegações finais. Ausência do prejuízo para a defesa. Autoria e materialidade comprovadas. Conjunto probatório mostra de forma clara e segura que o ora apelante praticou o delito de pesca em comento ao manejar, em local proibido, petrechos para pesca com medidas superiores àquelas permitidas pela legislação ambiental. Inaplicável o princípio da insignificância aos crimes ambientais, uma vez que o bem jurídico tutelado é essencial à vida e à saúde de todos, de maneira que os possíveis danos ambientais, ainda que aparentem ser de pequena monta, podem causar conseqüências graves e nem sempre previsíveis. Precedentes. Dosimetria da pena. Pena reduzida. Regime de cumprimento de pena fixado no aberto. Art. 33, §2º, alínea "c" do Código Penal. Apelante não preenche os requisitos subjetivos do art. 44 do Código Penal. Preliminares rejeitadas. Apelação parcialmente provida. (Classe: ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 27444 Processo: 2005.60.07.000156-7 UF: MS Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento: 27/07/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA: 04/08/2010 PÁGINA: 113 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR)

CRIME AMBIENTAL - PESCA PREDATÓRIA - ART. 34 DA LEI 9.605/98 - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - INAPLICABILIDADE - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO 1. Autoria e materialidade delitiva comprovadas pelo conjunto probatório carreado aos autos. 2. Em se tratando de delitos ambientais, é inviável a aplicação do princípio da insignificância, com a exclusão da tipicidade, porquanto, ainda que determinada conduta, isoladamente, possa parecer inofensiva ao meio ambiente, é certo que, num contexto mais amplo, torna-se relevante, isto é, uma vez somada a todas as demais interferências humanas na natureza, o prejuízo global causado ao ecossistema por todas aquelas condutas isoladas, no conjunto, é evidente, devendo, assim, ser eficazmente prevenida e reprimida por normas administrativas, civis e, inclusive, penais. 3. Ademais, a Lei nº 9.605/98 prevê em seu bojo penas geralmente mais leves e que, por isso, possibilitam a aplicação de institutos despenalizadores, tais como a transação penal e a suspensão condicional do processo, a indicar que o princípio da insignificância somente pode ser aplicado em casos excepcionais, isto é, quando até mesmo a incidência daqueles institutos seja desnecessária à prevenção e repressão às condutas ilícitas causadoras da lesão ambiental. 4. Apelação ministerial provida. Condenação decretada. (Classe: ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 24306 Processo: 2002.61.25.001687-2 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA Data do Julgamento: 22/02/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA: 12/03/2010 PÁGINA: 292 Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI)

PENAL. CRIME AMBIENTAL. PESCA. LEI N.º 9.605/1998, ART. 34. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. POSSIBILIDADE, EM GRAU DE EXCEPCIONALIDADE. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO. 1. Em tema de direito ambiental, a regra é a de que não se aplica o princípio da insignificância; mas, excepcionalmente, à vista das circunstâncias do caso concreto, é dado reconhecer a bagatela. 2. Cuidando-se de pesca de um quilograma de peixe, praticada por lavrador desempregado, com baixa escolaridade, pai de seis filhos e ínfima renda mensal; e constatados a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, é dado proferir sentença absolutória com base no princípio da insignificância. 3. Apelação ministerial desprovida. (Classe: ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 23603 Processo: 2001.61.25.003614-3 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA Data do Julgamento: 23/02/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA: 04/03/2010 PÁGINA: 168 Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS)

No âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, pela inaplicabilidade:

PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. PESCA EM PERÍODO E LOCAL PROIBIDO. ART. 34 DA LEI 9.605/98. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. 1. Na linha da jurisprudência sedimentada nesta Corte Regional, que em se tratando de crimes cometidos contra o meio ambiente a aplicação do princípio da insignificância é admitido excepcionalmente, pois que incompatível com o cunho preventivo conferido à tutela penal ambiental. 2. Na hipótese dos autos, não havendo notícia sobre as condições pessoais do paciente (v.g.: entre outras, se era pescador profissional ou não), assim como em relação ao próprio crime (v.g.: se efetivamente o paciente nada sabia sobre o período e local proibido para pesca), para análise de eventual aplicação do princípio da insignificância, faz-se necessária dilação probatória, o que se revela absolutamente inviável nesta via célere do habeas corpus. (TRF4, Sétima Turma, Processo 5002617-10.2011.404.0000, Fonte D.E. 05/04/2011)

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. ART. 34 DA LEI 9.605/98. PESCA EM PERÍODO DE DEFESO, COM UTILIZAÇÃO DE PETRECHOS PROIBIDOS. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. 1. Em princípio, as infrações penais ambientais não admitem a aplicação do princípio da insignificância, a excluir a tipicidade material do delito, pois o bem jurídico agredido é o ecossistema, constitucionalmente tutelado pelo art. 225 da CF/88, de relevância imensurável, seja porque o meio ambiente é bem jurídico de titularidade difusa, seja porque as condutas que revelam referidos crimes assumem uma potencialidade lesiva que se protrai no tempo e pode afetar as gerações futuras, seja porque as violações ao meio ambiente, por menores que sejam, revelam-se demais preocupantes, à medida em que o aumento da destruição é proporcionalmente maior de acordo com o crescimento da população, tornando-se cada vez mais difícil de controlar, motivo pelo qual não se pode mais admitir transigência e deve-se cobrar de todos a máxima preservação. 2. Comprovadas a autoria e materialidade do delito previsto no art. 34 da Lei 9.605/98, havendo o réu pescado em período de defeso, com utilização de petrechos proibidos, de acordo com a portaria 84/2002 do IBAMA. (TRF 4, Oitava Turma, ACR, Processo 0001116-13.2006.404.7201, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS Fonte D.E. 05/04/2011)

PENAL. AMBIENTAL. LEI Nº 9.605/98, ART. 56. IMPORTAÇÃO E TRANSPORTE DE SUBSTÂNCIA PERIGOSA OU NOCIVA AO MEIO AMBIENTE. GASOLINA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE DA TESE AOS CRIMES AMBIENTAIS. 1. Comete o crime previsto no art. 56 da Lei nº 9.605/98 aquele que introduz e transporta no território pátrio substância de origem forânea (gasolina), perigosa ou nociva ao meio ambiente, em desconformidade com exigências legais e regulamentares. 2. O princípio da insignificância não encontra seara fértil em matéria ambiental, porquanto o bem jurídico ostenta titularidade difusa e o dano, cuja relevância não pode ser mensurada, lesiona o ecossistema, pertencente à coletividade. (TRF 4, Oitava Turma, ACR, Processo 2008.71.03.000150-2, Fonte D.E. 27/05/2010 Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ)

Pela possibilidade de aplicação do princípio:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. IMPORTAÇÃO CLANDESTINA DE COMBUSTÍVEL. ART. 56 DA LEI 9.605/98. NORMA ESPECIAL EM RELAÇÃO AO CRIME DESCRITO NO ART. 334 DO CP. OFENSA À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM GERAL E À SAÚDE PÚBLICA COMO UM TODO. INTERESSE DA UNIÃO, COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, INCISO IV, DA CF/88. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECONHECIMENTO EXCEPCIONAL DIANTE DA QUANTIDADE ÍNFIMA DA GASOLINA IMPORTADA E DOS TRIBUTOS EVENTUALMENTE ILUDIDOS. CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO. PRECEDENTES. 1. A importação ilegal de combustível - substância que, por ser considerada tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana e ao meio ambiente, atenta contra a administração pública em geral e a saúde pública como um todo - evidencia o interesse da União na causa, atraindo, assim, a competência da Justiça Federal (art. 109, inciso IV, da CF/88). 2. "Aplicabilidade do princípio da insignificância, pois ínfima a ofensa ao bem jurídico meio ambiente ou à proteção social ambiental, já que o potencial lesivo da conduta e do material transportado, seja pela quantidade de combustível, seja pelo valor dos tributos eventualmente iludidos, se mostra inapto a justificar a intervenção do direito penal". Precedentes desta Corte. (TRF 4, Sétima Turma, RSE, Processo 2008.71.03.000968-9, Fonte D.E. 24/02/2010 Relator TADAAQUI HIROSE)

APELAÇÃO CRIMINAL. DELITO CONTRA O MEIO AMBIENTE. PESCA IRREGULAR. ART. 34, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO II, DA LEI Nº 9.605/98. INSTRUÇÃO NORMATIVA-IBAMA Nº 20/2005. NORMA PENAL EM BRANCO. PRINCÍPIO DA BAGATELA. APLICABILIDADE. O princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, CF/88) assegura a qualquer cidadão saber previamente qual conduta sua pode ser alvo da repressão estatal, evitando arbitrariedades por parte dos intérpretes e aplicadores da lei. Certas condutas - caracterizadas pela contínua mutação - impedem que a respectiva norma incriminadora contenha descrição exaustiva de todos os elementos, a exemplo do que ocorre com os crimes contra a economia popular (Lei nº 1.521/51) e contra o meio ambiente (Lei nº 9.605/98). As normas penais em branco, tipos penais incompletos que dependem de outras normas para serem aplicadas, permitem a manutenção de um preceito básico, cuja adaptação a novas realidades se dá com a modificação da norma complementar, sujeita a procedimento elaborativo mais simplificado em comparação ao processo legislativo tradicional. Somente a expressiva ofensa ao bem jurídico relevante adentra na esfera penal e, mesmo assim, quando outros ramos do Direito não forem adequados para a proteção do bem jurídico. O direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico, de modo que não há falar em adequação típica diante de lesão irrelevante. A inexistência de qualquer espécime recolhido pelo réu não coloca em risco o equilíbrio ecológico, revelando-se insignificante no âmbito jurídico-penal. O maior perigo à biodiversidade nas regiões costeiras não provém das comunidades tradicionais, mas das grandes embarcações de pesca que desrespeitam zonas limítrofes de preservação. A aplicação do instituto da insignificância, em casos similares ao presente, não deixa desprotegidos os bens tutelados pela norma jurídica, pois a apreensão do equipamento de pesca resulta efetivo prejuízo ao acusado, de modo a coibir condutas idênticas e até mesmo a sua reiteração. Apelação provida. (TRF 4, Oitava Turma, ACR, Processo 2007.72.01.004540-6, Fonte D.E. 09/09/2009 Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE)

Na Quinta Região, também há precedentes do Tribunal Regional Federal, tanto pela inaplicabilidade do princípio da insignificância em matéria ambiental, quanto autorizando sua aplicação. Confiram-se:

PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM ECONÔMICA. ART. 2º, CAPUT, DA LEI Nº 8.176/1991. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. ART. 55 DA LEI Nº 9.605/1998. EXTRAÇÃO DE MINÉRIO (CALCÁRIO) SEM AUTORIZAÇÃO. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. ART. 59, CÓDIGO PENAL. ESTRITA OBSERVÂNCIA NA FIXAÇÃO DA PENA BASE. APELAÇÕES IMPROVIDAS.

I. O ART. 55 DA LEI Nº 9.605/1998 REFERE-SE, NO PLANO HIPOTÉTICO, A LESÃO AO MEIO AMBIENTE COMO UM TODO E, NO PLANO FÁTICO, TEM VINCULAÇÃO À TODA A ÁREA OBJETO DA EXTRAÇÃO DO CALCÁRIO, EM ESPECIAL NO TOCANTE À COBERTURA VEGETAÇÃO, IMPORTANTE À PROTEÇÃO DO SOLO EM PRESENTES E FUTUROS PROCESSOS EROSIVOS, E À QUANTIDADE RETIRADA, NO CASO CONCRETO QUARENTA CAÇAMBAS, NÃO APENAS DESTINADA AOS ALUDIDOS REPAROS NA ESTRADA QUE LEVA AO LOTEAMENTO EM QUE SE LOCALIZA O FATO DELITIVO, MAS, COMO RECONHECIDO NOS DEPOIMENTOS PRESTADOS NOS AUTOS, GANHO ECONÔMICO.

II. "EM REGRA, NÃO CABE A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA JURÍDICA EM DELITOS AMBIENTAIS, PORQUANTO A OFENSA AO BEM JURÍDICO TUTELADO NÃO PODE SER MENSURADO POR CRITÉRIOS QUANTITATIVOS, POIS A POTENCIALIDADE DO ATO ATINGE DIRETAMENTE A HIGIDEZ DO MEIO AMBIENTE, CUJA PRESERVAÇÃO É SALVAGUARDADA PELO PODER PÚBLICO PARA A PRESENTE E FUTURAS GERAÇÕES. (TRF/4ª REGIÃO, ACR Nº 2005.71.00.016071-6, OITAVA TURMA, REL. ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO, DJ 28/02/2007)." (TRF5, 4ªT., ACR-6054/RN, REL. DES. FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO - CONVOCADO, J. 12.05.2009, DJ 28.05.2009, P. 306). III. NA DOSIMETRIA DA PENA, AO SE CONSIDERAR AS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS ELENCADAS NO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL, NÃO SE TEM MERA SOMA ARITMÉTICA, CUJO RESULTADO DETERMINARÁ A PENA-BASE A SER FIXADA, MAS SIM A AQUILATAÇÃO DAQUELES VALORES ALI CONSTANTES, SOPESADOS, SOBRETUDO, DIANTE DO CASO CONCRETO. IV. A FIXAÇÃO DA PENA EM PATAMAR MÉDIO, EM CONTRASTE COM A APLICADA AO CORRÉU, POUCO ACIMA DO MÍNIMO, FOI BASEADA, COMO EXPENDIDO NA SENTENÇA, NO ELEVADO GRAU NEGATIVO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS, EM ESPECIAL NÃO SER O FATO DELITIVO EM ANÁLISE O PRIMEIRO POR ELES COMETIDO, MAS SIM UMA REPETIÇÃO DE ANTERIORES QUE NÃO PODERIA INDICAR O DESCONHECIMENTO DA ILICITUDE DO ATO, O QUE DEMONSTRA INOCORRER O ALEGADO NA PEÇA RECURSAL. V. APELAÇÕES IMPROVIDAS (TRF5, Quarta Turma, ACR 7501/SE, Rel. Desembargadora Federal NILCÉA MARIA BARBOSA MAGGI, Fonte: DJ e 17.03.2011)

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL (ART. 55, LEI Nº 9.605/98). RETIRADA ILEGAL DE AREIA DE DUNAS. QUANTIDADE IRRISÓRIA. ÁREA JÁ DEGRADADA. DANO JÁ REVERTIDO PELA AÇÃO NATURAL DO VENTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. APELO PROVIDO. 1. TRATA-SE DE APELAÇÃO CRIMINAL, INTERPOSTA CONTRA A SENTENÇA DE FLS. 150-156, PROLATADA PELO MM. JUIZ FEDERAL DA 11ª VARA-CE, DR. DANILO FONTENELLE SAMPAIO, QUE JULGOU PROCEDENTE A DENÚNCIA E CONDENOU NAS PENAS DO ART. 55 DA LEI Nº 9.605/98 E ART. 2º, §1º, DA LEI Nº 8.176/91 (RETIRADA ILEGAL DE AREIA DE DUNAS), C/C ART. 70 DO CÓDIGO PENAL (CONCURSO FORMAL) O ACUSADO, FIXANDO A PENA-BASE EM 1 (UM) ANO E 6 (SEIS) MESES DE DETENÇÃO, CUMULADA COM 30 (TRINTA) DIAS-MULTA, ATRIBUINDO A CADA DIA-MULTA O VALOR DE 1/30 (UM TRIGÉSIMO) INCIDENTE SOBRE O VALOR DO SALÁRIO MINIMO VIGENTE AO TEMPO DO FATOEM QUESTÃO, A SER CUMPRIDA INICIALMENTE EM REGIME ABERTO. ESTA PENA FOI SUBSTITUÍDA POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITO. 2. ADOÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AO CASO CONCRETO. REALMENTE, A RETIRADA DE APENAS 1 (UMA) CARRADA DE AREIA DE DUNAS DE ÁREA JÁ DEGRADADA AMBIENTALMENTE POR PESSOA DESEMPREGADA, PARA FINS DE SUSTENTO DE SUA FAMÍLIA, NÃO AFETA SIGNIFICATIVAMENTE O MEIO AMBIENTE DE SORTE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO RÉU. AINDA QUE SUA PENA AFLITIVA TENHA SIDO SUBSTITUÍDA POR DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO, VERIFICA-SE UMA FLAGRANTE DESPROPORÇÃO ENTRE O BEM JURÍDICO VIOLADO - A RETIRADA DE 1 CARRADA DE AREIA DE DUNAS - E A PUNIÇÃO INFLIGIDA AO AGENTE, QUE NO FINAL DAS CONTAS PRATICOU A CONDUTA PREMIDO POR URGENTES NECESSIDADES FINANCEIRAS: O SUSTENTO DA MULHER E DOS TRÊS FILHOS. 3. OS PRESSUPOSTOS CONTIDOS NA JURISPRUDÊNCIA SOBRE A IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM MATÉRIA DE CRIME AMBIENTAL "SÃO NO SENTIDO DE SE QUERER EVITAR QUE A IMPUNIBILIDADE LEVE À PROLIFERAÇÃO DE CONDUTAS A ELE DANOSAS, OU DIANTE DA POSSIBILIDADE DE IRREVERSIBILIDADE DO DANO, OU, AINDA, PORQUE OS DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE PODEM SER IRREPARÁVEIS", OBSERVANDO-SE, TODAVIA, QUE NENHUM DESTES PRESSUPOSTOS SE FAZ PRESENTE NO CASO SUB EXAMINE, POSTO QUE A REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA JÁ SE FEZ NATURALMENTE, POR INTERMÉDIO DA AÇÃO NATURAL DO VENTO, COM A INTEGRAL REVERSÃO DO DANO. 4. APELAÇÃO CRIMINAL CONHECIDA E PROVIDA. TRF 5, Primeira Turma, ACR 4302/CE, Rel. Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, DJ 21/12/2006: p. 219 - Nº: 102 - ANO: 2006

PENAL. DENÚNCIA. CONDUTA LESIVA AO MEIO AMBIENTE (LEI Nº 9.605/98, ART. 40). ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO DELTA DO PARNAÍBA. CORTE DE 71 COQUEIROS EM ÁREA DE 0,5 HECTARE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. - DENÚNCIA OFERECIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL CONTRA PREFEITO MUNICIPAL, IMPUTANDO-LHE O CRIME DE DANO A ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL, CONSUBSTANCIADO NO CORTE DE 71 COQUEIROS EM ÁREA DE 0,5 HECTARE, SITUADA NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO DELTA DO PARNAÍBA. - DEMONSTRADO PELA PROVA PERICIAL QUE O DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE FOI ÍNFIMO, NÃO ATINGINDO VEGETAÇÃO NATIVA, OCORRENDO EM ÁREA JÁ DEGRADADA E DE RESULTADO PERFEITAMENTE REVERSÍVEL, APLICA-SE À HIPÓTESE O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, PARA AFASTAR DE PRONTO A MATERIALIDADE DO CRIME. - "RECONHECENDO CABER INDUVIDOSAMENTE NA HIPÓTESE EXAMINADA O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, NÃO DEVE O DELEGADO INSTAURAR O INQUÉRITO POLICIAL, O PROMOTOR DE JUSTIÇA OFERECER DENÚNCIA, O JUIZ RECEBE-LA OU, APÓS A INSTRUÇÃO, CONDENAR O ACUSADO. HÁ NO CASO EXCLUSÃO DE TIPICIDADE DO FATO E, PORTANTO, NÃO HÁ CRIME A SER APURADO." (JULIO FABBRINI MIRABETE - MANUAL DE DIREITO PENAL, VOL. 1, ED. ATLAS, 13ª EDIÇÃO, PÁGS. 114/115). - DENÚNCIA REJEITADA. (TRF 5, Pleno, INQ 601/CE, Rel. Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, DJ 30.04.2003: p. 998)

Da análise dos precedentes jurisprudenciais transcritos, observa-se que não há consenso ou uniformidade quanto ao tratamento dado à matéria.

Muitos são os julgados que afastam a aplicação do Princípio da Insignificância em matéria ambiental, sob o argumento de que o interesse público tutelado, por ser essencial à vida e à saúde de todos, é indisponível, não sendo admissível transigir com a sua ofensa. Aduz-se que, ainda que determinada conduta, tomada de forma isolada, possa parecer inofensiva ao meio ambiente, é certo que, num contexto mais amplo, torna-se relevante, podendo conter potencialidade suficiente para causar consequências graves e nem sempre previsíveis e danos irreparáveis ao meio ambiente.

Sustenta-se, ainda, para fundamentar a inaplicabilidade do princípio, que o meio ambiente é bem jurídico de titularidade difusa, protegido constitucionalmente, seja porque as condutas que revelam referidos crimes assumem uma potencialidade lesiva que se protrai no tempo e pode afetar as gerações futuras, seja porque as violações ao meio ambiente, por menores que sejam, revelam-se bastante preocupantes, à medida que o aumento da destruição é proporcionalmente maior de acordo com o crescimento da população, tornando-se cada vez mais difícil de controlar, motivo pelo qual não se pode mais admitir transigência e deve-se cobrar de todos a máxima preservação.

Contudo, não são raros os precedentes, em que, consideradas as circunstâncias do caso concreto e verificada a mínima ofensividade da conduta e a inexpressividade da lesão perpetrada, é admitida aplicação do Princípio da Insignificância.

Ressalta-se, para tanto, que também se aplica à seara ambiental, o princípio da intervenção mínima do Estado em matéria penal, segundo o qual a proteção pelo Direito Penal somente se justifica em face de danos efetivos ou potenciais ao valor fundamental do meio ambiente, ou seja, a conduta somente pode ser tida como criminosa quando degrade ou no mínimo traga algum risco de degradação do equilíbrio ecológico das espécies e dos ecossistemas. Fora dessas hipóteses, o fato não deixa de ser relevante para o Direito. Porém, a responsabilização da conduta será objeto do Direito Administrativo ou do Direito Civil. Salienta-se que “o Direito Penal atua, especialmente no âmbito da proteção do meio ambiente, como ultima ratio, tendo caráter subsidiário em relação à responsabilização civil e administrativa de condutas ilegais, e que, portanto, deve-se realizar um juízo de ponderação entre o dano causado pelo agente e a pena que lhe será imposta como consequência da intervenção penal do Estado. A análise da questão, tendo em vista o princípio da proporcionalidade, pode justificar, dessa forma, a ilegitimidade da intervenção estatal por meio do Direito Penal (Cf. Voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes no julgamento da AP 439/SP).

Assim, em que pese à relevância do meio ambiente como bem jurídico especialmente protegido, não se entende razoável afastar completa e irrestritamente a aplicação do Princípio da Insignificância na matéria em análise. Deve-se, contudo, ter bastante cautela quando da referida aplicação, analisando-se de forma detalhada as circunstâncias que envolvem o caso concreto.

Nesse sentido, conclui-se a abordagem do tema destacando-se o entendimento de Murilo Brião da Silva :

No âmbito do Direito Ambiental deve-se utilizar tal princípio com a devida cautela, já que não se trata de analisar as conseqüências a curto prazo de um delito, mas sim as conseqüências a médio e longo prazo, que, se hoje não punidas, podem acabar incentivando a prática de ilícitos ambientais comprometendo inevitavelmente o ecossistema (p. 135)

(…) a aplicabilidade deve ser cautelosa, exaustivamente fundamentada e atentando-se aos casos concretos. Mas sem dúvida acredita-se desproporcional concluir-se pela completa inaplicabilidade do princípio bagatelar em direito penal ambiental, porque, apesar de talvez serem reduzidas as hipóteses de incidência, por certo, existirão outras em que inocorre lesão efetiva ou potencial ao bem jurídico tutelado, permitindo seu trânsito. (p. 144)

Apesar da relevância e especialidade do meio ambiente como bem jurídico, fazendo com que também restasse considerado bem jurídico protegido na seara penal (…) não se pode olvidar que o Direito Penal, mesmo no campo ambiental-penal, identicamente, não poderá ocupar-se de bagatelas, e deverá apenas ser chamado naquelas situações em que a relevância do bem jurídico protegido seja agregada à real reprovabilidade social da conduta efetivamente lesiva ao meio ambiente, e desta forma exija a inafastável intervenção penal, por ser esta a ultima ratio. (p. 146)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BONFIM, Edílson Mougenot; CAPEZ, Fernando. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2004.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 5. ed. rev. atual. ampl. Niterói: Impetus, 2005.

REBÊLO, José Henrique Guaracy. Princípio da Insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

SANTORO FILHO, Antônio Carlos. Fundamentos de Direito Penal: introdução crítica, aplicação da lei penal, teoria do delito. São Paulo: Malheiros, 2003.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1994.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro: parte geral. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

 

Data de elaboração: fevereiro/2012

 

Como citar o texto:

ASSIS, Rafael de Sousa Branquinho e..Da Aplicabilidade do Princípio da Insignificância em matéria Penal. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 19, nº 991. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/2530/da-aplicabilidade-principio-insignificancia-materia-penal. Acesso em 21 jun. 2012.

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