O presente artigo tem como título "Possibilidade ou não do Ministério Público realizar investigação criminal"; ao enfatizar a natureza do trabalho, busca-se abordar as principais caracteristicas relacionadas Ministério Público e abordar os principais aspectos Inquérito Policial.

 

Desta forma, pretende-se ir além da descrição das abordagens das caracteristicas relacionadas ao Ministério Público e abordar os principais aspectos Inquérito Policial; o propósito é analisar a possiblidade ou não do Ministério Público realizar investigação criminal.

O primeiro capítulo tem o propósito de abordar as principais características relacionadas ao Ministério Público, que tem como principal função atuar como fiscal da lei, no art. 127 “caput” da Constituição Federal ressalta que: “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (BRASIL, 2012).

O segundo capítulo apresenta os principais aspectos do inquérito policial, que é um procedimento administrativo que visa juntar os elementos indispensáveis à constatação de infração penal. Obtendo-se a prova da existência do crime (PEC) e os indícios suficientes de autoria (ISA).

O terceiro capítulo é constituído pela controvérsia existente quanto à Possibilidade ou não do Ministério Público realizar investigação criminal. Para a primeira corrente é possível o Ministério Público realizar investigação, e a sua justificativa encontra respaldo com o art. 4º, parágrafo único, do CPP, que não confere exclusividade à Polícia para exercer a função investigatória. Já para a segunda corrente, não cabe ao Ministério Público realizar diretamente investigação criminal, e tem como principal argumento que tal tarefa cabe exclusivamente à Policia, em face do que dispõe o art. 144 da CF/88.

2 Principais Características e funções do Ministério Público

O Ministério Público tem como principal função atuar como fiscal da lei (“Custo legis”). E no âmbito processual penal, sua função peculiar vem descrita no art. 129, I da CF/88, ele é o titular da ação penal pública.

A Constituição Federal de 1988 definiu o Ministério Público no seu art. 127 (Caput): “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (BRASIL, 2012).

Vale destacar o princípio da autonomia, que vem descrito de forma expressa na Constituição no seu art. 127, §1°: “São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional” (BRASIL, 2012).

O insigne professor Luiz Flávio Gomes, descreve que o princípio da unidade, prevê:

Os membros que integram a instituição estão sob a égide de um único chefe, de forma que o Ministério Público deve ser visto como uma instituição única, sendo a divisão essencialmente funcional. O princípio da unidade, como se vê, tem natureza administrativa (Gomes, 2009).

O mesmo professor descreve o princípio da indivisibilidade:

Consequência direta da unidade revela a possibilidade de um membro ser substituído por outro, sem qualquer implicação prática, já que os atos são considerados prtaticados pela institução e não pela pessoa do Promotor de Justiça ou Procurador (Gomes, 2009).

E por fim, o princípio da independência funcional: “livre convencimento de cada membro do Ministério Público, ou seja, inexiste vinculação dos seus membros a pronunciamentos processuais anteriores” (GOMES, 2009).

No Código de Processo Penal a função do Ministério Público vem descritas no art. 257: “ Ao Ministério Público cabe: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma estabelecida neste Código; e II - fiscalizar a execução da lei” (BRASIl, 2012).

O art. 258 do CPP prevê uma atuação descomprometida do Ministério Público:

Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que Ihes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes (BRASIL, 2012).

Vale ressaltar a observação feita por Távora (2012) apud Eugênio Pacelli de Oliveira, que partindo de um ponto diverso de certos posicionamentos que ainda se encontra na prática judiciaria, o Ministério Público não é órgão acusador, mas sim legitimado para acusação nas ações penais públicas. Ainda completa o ilustre professor, que o Parquet não está obrigado a oferecer denúncia, e muito menos, caso ela já oferecida, pugnar pela condenação do réu, em qualquer caso, e estar sim vinculado a defender a ordem pública.

Quanto à imparcialidade do Ministério Público ela se encontra vinculada ao seu interesse à realidade dos fatos e pela busca da justiça, como descreve Távora (2012, p. 523) apud Manuel Sabino Pontes “ao verificar que no campo penal, a missão pendente e desprovida de qualquer sentimento que não seja o de Justiça”, neste mesmo contexto afirma o doutrinador “mesmo acusando crimes, o promotor não deixa de ser um fiscal da lei, apenas lhe sendo lícito promover denúncia se estiver convencido da criminalidade, bem como de existência de lastro probatório mínimo para fundamentar acusação” e por fim Pontes afirma que “obtendo prova da inocência do acusado ou discordando da pena imposta pelo juiz, por exemplo, tem o dever de atuar no processo em benefício do réu, buscando a correta aplicação da lei”.

Em relação a organização o Ministério Público, Távora(2012) descreve que a instituição abrange: o Ministério Público da União (Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Militar, Ministério Público do Distrito Federal), sendo chefe o Procurador Geral da República, nomeado pelo Presidente da República e depende de aprovação do Senado Federal. O autor supracitado descreve o Ministério Público dos Estados, sob chefia do Procurador Geral de Justiça e nomeado pelo Governador dos respectivos Estados, como descreve o art. 128 da CF/88, e tem sua atuação financeira e administrativa controlada pelo Conselho Nacional dos Ministérios Públicos.

O art. 128, § 5º, I, alíneas a, b e c, da Constituição Federal prevê garantias ao membros do Ministério Público:

I - as seguintes garantias: a) vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado; b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa; c) irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o disposto nos arts. 37, X e XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I; (BRASIL, 2012).

Já no inciso II, alíneas “a” a “f”, do referido artigo e parágrafo, prevê as vedações aos membros do Ministério Público:

II - as seguintes vedações: a) receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; b) exercer a advocacia; c) participar de sociedade comercial, na forma da lei; d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; e) exercer atividade político-partidária; f) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei (BRASIL, 2012).

E no que tange ao Processo Penal, as hipóteses de suspeição e impedimento do representante do Ministério Público, segundo o art. 258 do Código de Processo Penal:

Art. 258. Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que Ihes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes (BRASIL, 2012).

E por fim prevê os artigos 252 e 254 do Código de Processo Penal que:

Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que: I - tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito; II - ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha; III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão; IV - ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.

(...)Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles; II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia; III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes; - se tiver aconselhado qualquer das partes; V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes; Vl - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo (BRASIL, 2012).

3 Principais características do Inquérito Policial.

Previsto a partir do art. 4º do Código de Processo Penal, trata-se de um procedimento administrativo que buscar juntar os elementos necessários à constatação de infração penal. Presidido pelo delegado de polícia, contribuindo para a formação da opinião delitiva do titular da ação penal. Desta forma, obtêm-se a prova da existência do crime (PEC) e os indícios suficientes de autoria (ISA).

De acordo com Leles (2012):

Segundo posicionamento amplamente majoritário de nossos tribunais, incluindo os superiores, o Inquérito Policial é procedimento administrativo de traço inquisitorial e que, apesar do que está expresso no art. 5º, LV, da CR/88, não se lhes aplicam as garantias individuais fundamentais do contraditório e da ampla defesa. Ressaltando-se, outrossim, o entendimento de que os eventuais vícios ocorridos no procedimento do Inquérito Policial não têm o condão de contaminar a Ação Penal, não ensejando a nulidade do processo penal (LELIS, 2012, p. 21).

O inquérito será instaurado por portaria ou Auto de Prisão em Flagrante, mediante representação do ofendido, requisição do Ministro da Justiça, do Juiz ou do Ministério da Justiça (em determinadas situações), como prevê o art. 5º do CPP:

Art. 5o Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I - de ofício; II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. § 1o O requerimento a que se refere o no II conterá sempre que possível: a) a narração do fato, com todas as circunstâncias; b) a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou os motivos de impossibilidade de o fazer; c) a nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão e residência. § 2o Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso para o chefe de Polícia. § 3o Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito. § 4o O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado. § 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la (BRASIL, 2012).

Possui natureza jurídica, segundo Tavora (2012), de procedimento de índole eminentemente administrativo, de caráter informativo, preparatório da ação penal.

O prazo para conclusão é em regra de 10 (dez) dias para indiciado preso e 30 (trinta) dias, para indiciado solto (art. 10 do CPP). Porém há exceções de 10 (dez) dias, para indiciado preso ou solto, por crimes contra a economia popular (art. 10, § 1º, da Lei nº. 1.521/51). Já a Lei 11.343/06, no seu art. 51, prevê um prazo mais elevado sendo de 30 dias, se preso, 90 dias, quando solto, e existe a possibilidade destes prazos serem duplicados pelo Juiz, se pedido pela autoridade policial e ouvido o Ministério Público. E por fim na Justiça Federal o prazo é de 15 dias podendo ser prorrogado por mais 15 dias, se preso, art. 66 da Lei 5.010/66, e se solto segue-se a regra do art. 10 do CPP, 30 dias.

A contagem do prazo será excluído o dia do começo e inclui-se o último dia, para o indiciado solto. Se preso, o dia da prisão já é computada no prazo.

As diligências a serem realizadas vem previstas nos art. 6º; art. 7º; art. 13; art. 14; art. 16:

Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. Art. 7o Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública. (...) Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial: I - fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos; II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; III - cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias; IV - representar acerca da prisão preventiva. Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade. Art. 16. O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia (BRASIL, 2012).

Vale ressaltar a regra prevista no art. 5º, LVIII da CF/88, que garante ao civilmente identificado não será submetido a este processo de Identificação Criminal , salvo os casos previstos em lei.

O Inquérito Policial de acordo com a regra esculpida no art. 20 do CPP será sigiloso, porém tal regra sofre exceção no que tange ao Defensor Público ou Advogado, dispõe a Lei 8.906/94, no art. 7º, XIII e XIV:

Art. 7º São direitos do advogado: (...) XIII - examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos; XIV - examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos; (BRASIL, 2012).

E esse entendimento veio consolidar com a edição pelo Supremo Tribunal Federal da Súmula Vinculante nº 14:

É direito do Defensor no interesse do representado, ter amplo acesso aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa (BRASIL, 2012).

Adverte Tavora (2012) que o valor probatório do inquérito policial é relativo, uma vez que, carece de confirmação por outros elementos colhidos durante a instauração processual. Para ter valor probatório, é necessário que seja realizado sobre o crivo do contraditório e ampla defesa.

Vale ressaltar o posicionamento de Tavora (2012) que vem prevalecendo tanto nos tribunais como na doutrina, que sendo o inquérito dispensável, uma vez viciado, não contamina a ação penal. Porém, caso a inicial acusatória esteja baseada apenas no inquérito viciado, deverá ser rejeitado por falta de justa causa.

O Inquérito Policial só poderá ser arquivado com requerimento do Ministério Público, seguindo a norma prevista no art. 28 do CPP:

Art. 28: Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender (BRASIL, 2012).

4 Possiblidade ou não do Ministério Público realizar investigação criminal

Recentemente ganhou cargo discussões doutrinárias e jurisprudências acerca da titularidade de realização das investigações. Para algumas correntes está concentrada somente nas mãos da polícia civil. Já outras correntes defendem, que pelo teor do art. 4º, parágrafo único do CPP, prevê a possibilidade de inquéritos não policiais, inclusive realizados pelo Ministério Público.

O principal argumento para esta segunda corrente está contido no art. 144 da Constituição Federal, onde não prevê a participação do Ministério Público nas investigações preliminares à ação penal, tarefa esta incumbida à polícia judiciária (polícia federal e civil). Mas é garantido ao Ministério Público, como prescreve Lourençon (2008), “a condição de supervisor da atividade policial, sendo que uma investigação conduzida apenas por este quebraria a harmonia e a garantia da investigação de uma infração penal”.

Tavora (2012) no mesmo sentido afirma que o que é desejado pelo Parquet não é a presidência do inquérito policial, pois por determinação Constitucional (art. 144, § 4°), é atribuído a polícia judiciária.

O que pretende o Ministério Público é promover, por iniciativa própria a colheita das provas que julga indispensável à persecução penal. Neste sentido afirma Lourençon (2008) apud Mirabete:

Os atos de investigação destinados à elucidação dos crimes, entretanto, não são exclusivos da polícia judiciária, ressalvando expressamente a lei a atribuição concedida legalmente a outras autoridades administrativas (art. 4.º, do CPP). Não ficou estabelecida na Constituição, aliás, a exclusividade de investigação e de funções da Polícia Judiciária em relação às polícias civis estaduais. Tem o Ministério Público legitimidade para proceder investigações e diligências, conforme determinarem as leis orgânicas estaduais. É, aliás, de sua atribuição, "acompanhar atos investigatórios junto a organismos policiais ou administrativos,quando assim considerarem conveniente à apuração de infrações penais, ou se designados pelo Procurador-Geral" e "assumir a direção de inquéritos policiais, quando designados pelo Procurador-Geral" onde não haja Delegado de Polícia de Carreira (art. 15, incs. III e V, da Lei Complementar n.º 40, de 14-12-1981 LONMP). Pode, inclusive, intervir no inquérito policial em face da demora em sua conclusão e pedidos reiterados de dilação de prazos, pois o Parquet goza de poderes investigatórios e de auxílio à autoridade policial" (MIRABETE, 2000, p. 75).

O Tribunal de Justiça de São Paulo, conforme demonstrou Lourençon (2008), já manifestou de forma favorável a investigação realizada pelo Parquet, e em um dos seu julgados manifestou-se da seguinte forma:

Enquanto o membro do Ministério Público estiver diligenciando no estrito âmbito das suas atribuições, que inclui a instauração do procedimento investigatório para a reunião de elementos suficientes ao desenvolvimento da atividade persecutória que lhe é cabível, é impossível cogitar-se de constrangimento ilegal, porque ao reverso, tolhe-lhe o exercício da atividade que a lei acomete e de cuja implementação não pode se omitir. Se excesso ocorrer no desempenho de tal função, o Parquet ficará exposto à responsabilização administrativa" (TJSP – HC 436557-3/7, Bananal, 4.ª C, rel. Bittencourt Rodrigues – 04.11.2003, v.u., JUBI 93/04).

O Superior Tribunal de Justiça, através da Súmula de nº. 34 já se posicionou: “a participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia”.

O STJ também nos seus julgados manifestou de forma favorável, conforme demonstra mais uma vez Lourençon (2008):

1. "Tem-se como válidos os atos investigatórios realizados pelo Ministério Público, que pode requisitar esclarecimentos ou diligenciar diretamente, visando à instrução de seus procedimentos administrativos, para fins de oferecimento de peça acusatória. (...) A acusação do órgão ministerial não é vinculada à existência do procedimento investigatório policial – o qual pode ser eventualmente dispensado para a proposição da acusação" (STJ – RHC 8106/DF – Ministro Relator Gilson Dipp – 03.04.2001 – 5.ª Turma).

2. PROCESSUAL PENAL. DENÚNCIA. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. FATOS TÍPICOS. HABEAS-CORPUS. INQUÉRITO INSTAURADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA.

- Constando da denúncia a adequada descrição de fatos que, em tese, consubstanciam crimes, não procede a alegação de inépcia, já que observados os requisitos próprios, inscritos no art. 41, do Código de Processo Penal.

- O habeas-corpus, instrumento processual de assento constitucional destinado a assegurar o direito de locomoção, não se presta para a realização de longa incursão sobre fatos em exame no curso de ação penal, nem para a obtenção de absolvição sumária.

- O Ministério Público, como órgão de defesa dos interesses individuais e sociais indisponíveis (CF, art. 127), tem competência para instaurar inquérito policial para investigar a prática de atos abusivos, susceptíveis de causar lesão a tais interesses coletivos.

- A instauração de tal procedimento não provoca qualquer constrangimento ilegal ao direito de locomoção, revelando-se, por isso, impróprio o uso do habeas-corpus para coibir eventuais irregularidades a ele atribuídos.

- Recurso ordinário desprovido. (STJ – REsp 192837/RJ – Ministro Relatora Vicente Leal – 18.10.2001 - 6.ª Turma)

Já o STF ainda não se encontra totalmente pacificado da legitimidade do Ministério público para realizar investigação criminal. Távora (2012) prescreve que:

Quem tem atribuição constitucional para exercer a ação, também deve possuir as ferramentas para levantar subsídios para esse mister (teoria dos poderes implícitos). Vale a transcrição do trecho do acórdão de relatoria do Ministro Celso de Mello, no julgamento do HC nº. 94.173/BA: “A outorga constitucional de funções de polícia judiciária à instituição policial não impede nem exclui a possiblidade de o Ministério Público, que é o “dominus litis”, determina a abertura de inquéritos policiais, requisitar esclarecimentos e diligências investigatórias, estar presente e acompanhar, juntos a órgãos policiais, quaisquer atos de investigação penal, mesmo aqueles sob o regime de sigilo, sem prejuízo de outras medidas que lhe pareçam indispensáveis à formação da sua “opinio delicti”, sendo-lhe vedado, no entanto, assumir a presidência do inquérito policial, que traduz atribuição privativa da autoridade. Precedentes. (STF- Segunda Turma – HC 94173 – Rel. Min. Celso de Mello – Dje 27/11/2009”.

Já a corrente contrária a investigação criminal realizada pelo Ministério Público tem como argumento a previsão estabelecida no art. 144 da Constituição Federal de 1988, onde postula que a tarefa investigativa estar contida no âmbito da polícia judiciária, ou seja, polícia federal e civil. Desta forma não encontra-se previsto tal atribuição ao Ministério Público.

Lourençon (2008), afirma que “ao Parquet já é garantida a condição de supervisor da atividade policial, sendo que uma investigação conduzida apenas por este quebraria a harmonia e a garantia da investigação de uma infração penal”.

Segundo Lourenço (2008) apud Nucci é inviável que o Parquet, cuja competência estabelecida pela Constituição foi de ser o titular da ação penal, assuma a titularidade investigativa, substituindo a polícia judiciária, produzindo e averiguando infrações penais. Desta forma, autorizar que o Ministério Público, realize investigação criminal, sem qualquer fiscalização, sem a participação do indiciado, seria quebrar a harmônica e garantista investigação de uma infração penal.

Interessante o trecho extraído do texto “Procedimento administrativo criminal realizado pelo Ministério Público”, que segundo Júnior (2010) apud Pitombo:

Procuradores da República e Promotores de Justiça necessitam dos serviços das autoridades policiais, para levar avante o pretenso procedimento preparatório, que venham a iniciar. Polícia judiciária, havida por inconfiável, os secundando, não obstante fiscalizada e corrigida, de maneira externa, pelo Ministério Público. Mais, ainda, a dúvida de quem faria o controle interno, do mencionado procedimento administrativo ministerial, operacionalizado pela polícia judiciária, a mando e comando dos Procuradores da República e Promotores de Justiça. (...). Dirigir a investigação e a instrução preparatória, no sistema vigorante, pode comprometer a imparcialidade. Desponta o risco da procura orientada de prova, para alicerçar certo propósito, antes estabelecido; com abandono, até, do que interessa ao envolvido. Imparcialidade viciada desatende à justiça (JUNIOR, 2010).

A maioria dos tribunais hoje se posiciona de forma favorável a investigação realizada pelo Ministério Público, mas para alguns é inviável, pois tal ato não iria de consonância com o estabelecido no art. 144 da Constituição Federal de 1988.

O Tribunal de Justiça de São Paulo como exemplo, em seus julgados manifestou-se como sendo inviável a presidência do Ministério Público durante as investigações:

Nada a objetar quando o representante do Ministério Público acompanha o desenrolar das investigações policiais e isto porque ‘é o Ministério Público o titular da ação pública, e ninguém melhor que ele para acompanhar aquelas diligências policiais’. Mas entre acompanhar diligências policiais e assumir, praticamente, a direção do inquérito policial a distância é grande. O inquérito é instrumento da denúncia, fato por demais sabido, cediço e constantemente proclamado. Mas, sua direção, é necessário que se insista, é da polícia judiciária. (...) Em decorrência, não cabe ao representante do Ministério Público, sem que haja a oficialização da prova, colher pareceres ou obter informes destinados a instruir o inquérito policial. Se o inquérito não se anula por esta circunstância, perde, contudo, sua validade como instrumento apto a instruir a propositura da ação penal. (...) não se pode deixar, repita-se, de levar em conta que todas as provas nele produzidas só podem sê-lo através da polícia judiciária ou, excepcionalmente, do magistrado. Não se discute caber ao Ministério Público a faculdade e o poder de requisitar diligência diretamente aos órgãos da polícia judiciária. Mas essas atribuições não podem e não se sobrepõem e nem hão de contrariar as normas processuais vigentes e bem assim os preceitos constitucionais que garantem o contraditório". (TJSP – HC 99018-3 –rel. Weiss de Andrade – 25.02.1991 - 2.ª C)

A Carta Magna de 1988 legitimou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII). Assim a norma constitucional não estabeleceu a para o parquet, a competência para realizar e presidir inquérito policial.

Assim foi o posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 81326 DF:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL/DF. PORTARIA. PUBLICIDADE. ATOS DE INVESTIGAÇÃO. INQUIRIÇÃO. ILEGITIMIDADE. 1. PORTARIA. PUBLICIDADE A Portaria que criou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial no âmbito do Ministério Público do Distrito Federal, no que tange a publicidade, não foi examinada no STJ. Enfrentar a matéria neste Tribunal ensejaria supressão de instância. Precedentes. 2. INQUIRIÇÃO DE AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE. A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII). A norma constitucional não contemplou a possibilidade do parquet realizar e presidir inquérito policial. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime. Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial. Precedentes. O recorrente é delegado de polícia e, portanto, autoridade administrativa. Seus atos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corporação, Chefia de Polícia, Corregedoria. Recurso conhecido e provido (STF, 2012).

Portanto incube ao Ministério Público a requisição de diligências, conforme prevê o art. 129, VIII, CF/88, e estas são dirigidas à autoridade policial. Desta forma não encontra no âmbito do Ministério Público a realização de investigação criminal.

5 Conclusão

Com o presente trabalho conclui-se que é de grande importância a discussão trazida em relação à possibilidade ou não do Ministério Público realizar investigação criminal, uma vez que, há fortes argumentos pelas correntes favoráveis e contrárias. Mas antes de adentrar a discussão, pode-se perceber que o Ministério Público é um órgão indispensável para realização da Justiça. Trata-se do fiscal da lei e sempre age com imparcialidade. No âmbito penal o Ministério Público age titular da ação penal pública, de acordo com o Código de Processo Penal e fiscalizar a execução da lei

Em relação ao inquérito policial é um procedimento de natureza administrativa que visa identificar o autor da infração penal, e os elementos que comprovem sua materialidade, contribuindo para a formação da opinião do titular da ação penal. Possui em regra prazo para o seu encerramento, mas comporta exceções de legislações especiais. E carece de valor probatório relativo, pois depende de confirmação de outros elementos colhidos no decorrer da instrução penal.

E por fim, em relação à discussão possibilidade ou não do Ministério Público realizar investigação criminal, a corrente favorável à realização de investigação criminal pelo Ministério Público, a que julgo correta, tem como principal argumento que a pretensão do Ministério Público é promover a colheita de provas para viabilizar o futuro ingresso da ação penal. E por ser titular da ação penal, não é coerente impedir que esse procure ferramentas para comprovar sua opinião delitiva.

Já a corrente contrária à realização de investigação criminal pelo Ministério Público, tem como fundamento tem como principal argumento a regra prevista no art. 144 da Constituição Federal, onde não prevê a participação do Ministério Público nas investigações preliminares à ação penal, tarefa esta incumbida à polícia judiciária (polícia federal e civil).

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código (1940) Código Processo Penal. Brasília: Senado, 1941.

BRASIL. Constiutuição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.

GOMES, Luiz Flávio. Ministério Público: princípio da independência funcional. Disponível em: http: . Acessado em: 15 de junho de 2012.

 

JUNIOR, Márcio. Ministério Público como órgão investigatório. Disponível em: Acessado em: 15 de junho de 2012.

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Data de elaboração: junho/2012

 

Como citar o texto:

OLIVEIRA, Murilo Barbosa e ..Possibilidade de realização ou não de investigação criminal pelo Ministério Público. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 19, nº 1002. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/2548/possibilidade-realizacao-ou-nao-investigacao-criminal-pelo-ministerio-publico. Acesso em 5 ago. 2012.

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