O conteúdo deste artigo visa detalhar um estudo sobre a obrigatoriedade em se submeter ao teste do bafômetro e exame laboratorial, bem como, procura explanar sobre a força probante de outros meios de provas (testemunha, exame clínico e vídeo), a fim de comprovar o crime de embriaguez ao volante, causado pelo uso de bebida alcoólica ou outra substância que determine dependência. A atual Lei Seca exige concentração de 06 decigramas de álcool por litro de sangue para a comprovação do uso de bebida alcoólica no volante, no entanto, um número relevante de motoristas não concordam em fornecer material para a realização de testes que determinem a quantidade de álcool ingerido, amparados no princípio de que ninguém esta obrigado a produzir provas contra si. A solução que vem sendo proposta, busca a inserção de outros meios de provas, como a testemunhal e o exame clínico, a fim de comprovar o comprometimento da capacidade psicomotora do motorista. Com base nos princípios constitucionais, bem como, com o estudo doutrinário e jurisprudencial, o presente artigo busca não só entender a obrigatoriedade de colaborar com a realização das citadas provas periciais, mas também abordar a capacidade que os novos meios probatórios possuem em delimitar a dosagem alcoólica presente na corrente sanguínea do indivíduo, considerando que várias são as garantias constitucionais que protegem a liberdade do indivíduo e precisam ser analisadas antes que uma conduta lhe seja imputada.

 

PALAVRAS-CHAVE: Álcool x Volante; Teste do bafômetro; Outros meios de provas; Garantias constitucionais.

ABSTRACT: This article aims to detail a study on the obligation on submit yourself to the breathalyzer test and laboratory examination as well, it intend to explain about evidential weight of other means of evidence (such as clinical examination, video and witnesses) to prove the crime of driving under influence caused by the use of alcohol or another substance that determine addiction. The current prohibition requires concentration of 0.6 decigram of alcohol per liter of blood for evidence of alcohol use on the driving, however, a significant number of drivers do not agree to provide material for testing to determine the amount of alcohol consumed, supported by the principle where nobody is obliged to produce evidence against himself. The solution has been proposed, seeking the inclusion of other means of evidence such as witness and clinical examination in order to prove the impairment of psychomotor ability of the driver. Based on constitutional principles, as well as the study of doctrine and jurisprudence, this article not quest understand just the obligation to cooperate with the implementation of the evidence already used, but also to approach the ability that new forms of evidence have in defining alcoholic strength present in the bloodstream of the individual, considering that there are several constitutional guarantees that protect the freedom of the individual and it should be analyzed before a conduct become imputed.

KEYWORDS: Alcohol x Wheel; breathalyzer test; Other means of evidence, constitutional rights.

1 INTRODUÇÃO

Com o advento da Lei nº 11.705/08, conhecida como “Lei Seca” , fora inserido uma quantidade mínima exigível de álcool no sangue para se configurar o crime de embriaguez ao volante, disposto no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro , qual seja a concentração igual ou superior a 06 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue, sendo certo que a comprovação da quantidade de álcool exigida pode ser identificada pela utilização do teste do bafômetro ou pelo exame de sangue, conforme amparo do Decreto 6.488 , de 19 de junho de 2008.

Contudo, nos dias atuais, citados meios de prova acabam por angariar inúmeras indagações, eis que para a sua realização se torna imprescindível que o condutor do veículo colabore com sua efetivação, seja soprando no bafômetro, seja fornecendo sangue para o exame clínico.

No entanto, diante da consagração do princípio de quem ninguém está obrigado a se autoacusar (memo tonetur se detereg ), constituído pelos princípios da ampla defesa e da presunção da inocência , vários motoristas não demonstram interesse em fornecer o material para a realização da prova pericial.

Assim, mediante presente contradição disposta no texto legal que regulamenta a “Lei Seca”, diferentes Projetos de Lei estão sendo propostos, onde necessário se faz destacar que vários deles, entre outras mudanças, visão a alteração dos meios de provas, hoje admitidos para configurar a conduta do delito em questão, dentre os quais, cita-se a inserção da prova testemunhal, o exame clínico e vídeos .

Não bastasse as indagações que surgem em face da obrigatoriedade em fornecer prova, ou não, para a realização do teste do bafômetro, é preciso discutir a causa em se admitir quaisquer meios de provas lícitas a identificar a conduta do artigo 306 do Código De Trânsito Brasileiro, eis que tal dispositivo exige a quantificação de álcool presente no organismo do indivíduo, o que pode ser comprovado somente por meio de provas técnicas , hábeis a apontar tal medida, conforme previsão legal.

Desta forma, é de suma importância associar tais meios de provas com as garantias constitucionais quais dispõe cada indivíduo, buscando identificar quais delas possuem força a estabelecer-se no ordenamento jurídico suprindo a necessidade das normas atuais, considerando que a liberdade de cada ser humana depende de como sua conduta será provada.

2 AS MODIFICAÇÕES DO ARTIGO 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO: COMBATE DO ÁLCOOL X VOLANTE

Considerando o elevado índice de acidentes que ocorrem diariamente em todo o Brasil, gerados pela combinação de álcool e direção , desde o advento da Lei nº. 9.503 de 1997 procura-se uma solução para controlar tal incidência negativa.

No entanto, como a redação disposta no artigo que penalizava a ação de conduzir veículo sob a influência de álcool, não estava suprindo a carência de norma regulamentadora, despertou-se a necessidade de sua reformulação.

Inicialmente, a conduta consistente em conduzir veículo automotor sob a influência de álcool era punida através da antiga redação do artigo 306 do Código de Transito Brasileiro, que assim dispunha in verbis : "Conduzir veículo automotor, na via pública, sob influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem ".

Destarte, para configurar o crime bastava tão somente que aquele que conduzisse veículo, sob influência alcoólica, demonstrasse as reações da bebida ou de qualquer substância psicoativa , capaz de gerar perigo potencial. Porém, tal norma não atendia o fim para que fora criada, vez que o número de mortes e lesões causadas por condutores embriagados só crescia.

Em detrimento a tal necessidade, em 19 de junho de 2008, surge a Lei Federal nº 11.705, intitulada Lei Seca, proposta com o fim de modificar o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, qual passou a ser regido com o seguinte fundamento:

Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:

Penas – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor .

Nota-se que em nada se alterou a pena cominada, sendo que a inovação ficou por conta da introdução da nova elementar no tipo penal, exigindo-se para a configuração do delito em questão, a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob influência de substância psicoativa que determine dependência .

Por evidente, para que a conduta típica esteja demonstrada, é imprescindível que se promova a constatação do quantum de álcool ingerido pelo indivíduo, ou a existência das citadas substâncias, somente, em tese, através do uso do bafômetro ou de exames clínicos.

Aludida norma possui como complemento o Decreto 6.488, de 19 de junho de 2008 , qual reitera a concentração de álcool por litro de sangue necessária a impedir o condutor de dirigir, e ainda, elenca o valor equivalente para efeito do exame, que pode ser constatado através do aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), ou popularmente conhecido como “bafômetro”, que é de 3 (três) décimos de miligrama por litro de ar expelido pelos pulmões , conforme emana o artigo 2º do citado decretol:

Para fins criminais de que trata o art. 306 da Lei 9.503, de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia é a seguinte:

I – exame de sangue: concentração igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de sangue; ou

II – teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro): concentração de álcool igual ou superior a três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões .

 

Antes da vigência desta lei não havia qualquer previsão sobre o teor alcoólico necessário para caracterizar o crime, vez que bastava o motorista apresentar indícios de perigo ao volante, causado pelo uso do álcool ou outra substância, que a conduta se amoldaria ao tipo penal.

Tem-se que com a nova redação do caput do citado artigo, deixou de ser necessário a exibição de ocorrência de perigo potencial para a efetivação da conduta .

Em detrimento ao pertinente assunto, faz-se necessário transcrever o pensamento de Marcelo Cunha de Araujo:

Desse modo, o motorista que for flagrado dirigindo veículo automotor contendo a cifra de álcool referida em seu sangue ou sob influência de substância psicoativa que cause dependência incidirá, em tese, no delito do artigo 306, ainda que não tenha criado perigo algum para outros indivíduos. O crime de perigo abstrato, presumindo a periculosidade da conduta, dispensa a comprovação do perigo, sendo suficiente para sua caracterização a prática de mera conduta descrita no tipo.

Agora não se exige mais um conduzir anormal, manobras perigosas que exponham o dano efetivo a incolumidade de outrem .

No entanto, a mudança primordial da nova lei está na previsão do teor alcoólico necessário, que surge para caracterizar o crime, devendo necessariamente ser provado que o condutor está sob a influência de álcool para então ser penalizado, o que antes não existia, visto que exame de alcoolemia não era imprescindível e poderia ser substituído por outras provas, haja vista que o importante era demonstrar a conduta anormal do indivíduo .

Logo, em vista da introdução da nova elementar no tipo penal, o exame técnico é visto como necessário, em primeira análise, considerando que sua ausência pode não configurar a materialidade do delito.

Todavia, o que parecia um recurso para combater o crime de embriaguez ao volante, com o decorrer do tempo, já não pode ser visto como tal, vez que os vícios do texto legal começam a surgir.

Diante da necessidade em detectar a quantidade de álcool no sangue, o que só é possível com a colaboração do indivíduo, muitos condutores passaram a negar-se a se submeter ao teste do bafômetro, apoiados no direito de não produzir prova contra si mesmo, conforme aduz o artigo 8º, inciso II, alínea g, da Convenção Americana de Direitos Humanos :

Artigo 8º. Garantias judiciais

I- (...)

II- Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:

(...)

g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada; e

(...)

Não obstante, o artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição da República, também busca reforçar o direito do indivíduo em não colaborar com sua própria condenação, quando ainda não pode ser considerado culpado do fato a ele imputado, como se vê:

Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado .

Como a proposta do legislador começou a apresentar problemas, as indagações passaram a compor o judiciário em busca pela solução, mediante tais contradições.

Enquanto isso, o número de acidentes, causados por condutores sob a influência de álcool, continuam frequentes e significativos, vez que ano a ano temos o número apurado de 35 mil casos em nosso país, destacando-se que em 2010 tal índice fora superado chegando a 40 mil vítimas .

Em última análise, aparentemente, sobressalta-se que a Lei Seca além de não evitar mortes, acaba por gerar impunidades.

Enquanto se discute a constitucionalidade da presente lei, em face da recusa do condutor em submeter-se a testes, ou, se o mesmo poderá ser considerado culpado por tal rejeição, diferentes projetos de lei são propostos a fim de modificar a atual Lei Seca, principalmente no que concerne aos meios de provas admitidos para identificar o uso do álcool ou qualquer substância psicoativa atribuída à condução de veículo automotor.

Embora promulgada com o intuito de diminuir os índices do crime de embriaguez ao volante, com a previsão do quantum de álcool no sangue, como elemento objetivo do tipo penal, a Lei nº 11.705/08 passa a condição de norma penal mais benéfica quando não houver prova técnica da dosagem alcoólica no sangue do acusado pelas brechas que a redação da lei atual acaba por proporcionar.

Aquele que através do exame de alcoolemia apontar quantidade menor que 06 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue, não responderá por infração penal, mas tão somente por ilícito administrativo , o que pode gerar impunidade, haja vista, que uma equipe do Programa Acadêmico sobre Álcool e outras Drogas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostram que 75% dos acidentes fatais são causados por condutores que trafegavam sobre o efeito de álcool, sendo que um número significativo apresentava valor abaixo do qual está estipulado em lei .

Destaca-se uma proposta atualmente discutida: em 2009, o Deputado Federal Hugo Leal (Partido Social Cristão – Rio de Janeiro) propôs o Projeto de Lei (PL) nº 5.607/2009 , apontando mudança na punição no âmbito penal para o motorista embriagado, ainda que ele se recuse a soprar o bafômetro.

Assim passariam a valer provas admitidas em direito como testemunhas e vídeos , a exemplo do que já acontece para outros crimes. A pro¬posta ainda prevê valor de multa dobrado a quem diri¬gir sob influên¬cia de álcool ou de out¬ras drogas, destacando que, a recusa do cidadão em fazer o teste, atestaria positivamente sua embriaguez.

Embora criado com o anseio de combater o índice de mortalidade no trânsito, o citado projeto é composto por críticas, considerando a inovação nos meios de prova quanto à identificação da conduta do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro.

Não só o mencionado projeto visa modificar a Lei Seca atual, mas muito se discute a cerca do tema, considerando que a matéria legal que hoje pune a combinação de bebida alcoólica e volante, instituída pela Lei nº. 11.705/2008, abre margens para questionamentos insanáveis, mediante a recusa dos motoristas em submeter-se ao teste do bafômetro apoiados em garantias constitucionais.

3 MEIOS DE PROVAS ADMITIDOS NA LEI SECA

A prova possui importância sem igual, de significado relevante, pois dela depende a diferença entre uma sentença favorável, ou não, tendo como objeto a restrição da liberdade do indivíduo.

Para caracterizar o crime de embriaguez é imperioso que se apure a quantidade de álcool no limite estabelecido, ou de qualquer circunstância psicoativa, quais podem ser delimitadas, como já citado e demonstrado, pelo aparelho de ar alveolar (bafômetro) através do teste de alcoolemia, ou exame clínico.

“Não é possível o prosseguimento da persecução penal quando a materialidade está comprovada por outros meios que não os taxativamente previstos, haja vista não só o notório desrespeito ao texto legal e regulamentar, mas, também, a evidente falta justa causa” .

Insta destacar, que ambos necessitam da colaboração do motorista em fornecer material, o que nem sempre acontece em virtude da proteção constitucional de quem ninguém é obrigado a produzir provas contra si.

No entanto, nada é pacífico. Como é sabido o Projeto de Lei (PL) nº 5.607/2009 do Deputado Federal Hugo Leal visa apontar mudança na punição no âmbito penal para o motorista embriagado, ainda que ele se recuse a soprar o bafômetro, eis que propõe ampliar a possibilidade de provas de condução de veículo sob efeito de álcool no âmbito da lei seca .

A intenção do texto, ora aprovado na Câmara dos Deputados, é determinar que condutores que se recusarem a fazer estes testes também possam ser enquadrados e penitenciados criminalmente.

Especificamente prevê o uso de vídeos, prova testemunhal, bem como, outros meios de prova em direito admitidos, como forma de evidenciar a condução de veículo com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência.

Não há dúvidas de que a nova ideia, assim como outras propostas de mesma base, buscam reduzir os índices absurdos de lesões e mortes no trânsito, que hoje alocam o Brasil entre os países com maior mortalidade em tal categoria .

No entanto, muito se questiona se as mudanças procuradas estão sendo formuladas atendendo os princípios constitucionais, e ainda, se não estão sendo propostas com “tolerância zero” em um Estado Democrático de Direito, eis que se mostram direcionadas a inserir meios de provas como testemunhal, por exemplo, a fim de identificar uma elementar que somente pode ser encontrada através provas consubstanciadas no teste do bafômetro ou exame de sangue.

Eis a polêmica: como encontrar 06 decigramas de álcool ou substância psicoativa no organismo do indivíduo, através do depoimento de uma testemunha, ou ainda, com base em análise médica (exame clínico) , em outros termos, “olho médico”?

Em detrimento a tantas controvérsias vê-se estampada a necessidade em discutir a intolerância nos meios de provas, quando o dispositivo que pune a combinação de bebida e direção exige a presença de 06 decigramas de álcool no sangue.

3.1 Prova testemunhal e exame clínico

Na medida em que o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro passou a determinar conhecida quantificação, tecnicamente a prova pericial para identificação do volume de álcool se tornou indispensável, haja vista que qualquer quantidade inferior passa a ser insuficiente para configurar o crime . logo, conclui-se que a prova testemunhal , por exemplo, é descabida a identificar o quantum de álcool, hoje necessária para qualificar a conduta do citado dispositivo.

Ao considerar qualquer meio de prova, como a testemunhal ou o exame clínico, o condutor pode ficar a mercê do depoimento daquele que identifica a infração, assim sendo uma forma subjetiva de punir o indivíduo.

A prova testemunhal pode ser considerada como a mais frequentemente utilizada no processo penal, consistindo na declaração que uma pessoa realiza ao tomar conhecimento de um fato, podendo revelar a veracidade do ocorrido, agindo sob o compromisso de dizer a verdade . No entanto, apesar de ser admitida no processo penal como meio de elucidar uma conduta ilícita, a prova testemunhal não possui o condão de indicar a quantidade de bebida que o motorista ingeriu, qual necessário para configurar a conduta do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro , conforme se encontra tipificado.

Portanto, possui aceitação questionada.

Conforme aduz o artigo 202 do Código de Processo Penal, pode ser considerado como testemunha, todo ser humano, homem ou mulher, capaz de direitos e obrigações, que depõem sobre fatos, tais como se deram na sua visão. Contudo, nem sempre conseguem repassar exatamente o ocorrido, implicando em uma dose de interpretação por parte daquele que à ouve .

Em suma, todos os indícios apontam para a reprovação da prova testemunhal como meio de comprovação da condução de veículo com a capacidade psicomotora alterada pelo uso do álcool, considerando que o condutor ficaria a mercê dos conhecimentos do homem médio a fim de identificar o estado de embriaguez e, ainda, da boa-fé do mesmo.

É preciso lembrar que a condenação de um ser humano não pode ficar a mercê da boa-fé de testemunho ou de um exame clínico, que é passivo de uma simples observação médica.

Conforme preceitua José Carlos G. Xavier de Aquino e José Renato Nalini:

A narração dos fatos supõe evocação e memorização de prévia percepção, fenômenos estritamente psíquicos e exclusivos da pessoa física. O testemunho é representação fornecida pelo homem, um ato consistente na representação de um fato, concretizando-se, portanto, em uma manifestação da ideia que a testemunha tem do mesmo fato . (grifei)

 

Outro trecho há de ser observado como seguimento do raciocino ora exposto, conforme assevera Eugênio Pacelli:

Em primeiro lugar, é de se observar que a única verdade absoluta que se pode compreender é a verdade da fé, que nada indica que a cerca de seus pressupostos. A verdade do homem, ou a verdade da razão, é sempre relativa, dependente do sujeito que a estiver afirmando. A verdade da razão é apenas a representação que o homem tem e faz da realidade que aprende diuturnamente . (grifei)

“As provas no processo desempenham uma função muito bem definida a saber: a reconstrução da realidade histórica, sobre o qual se pronunciará a certeza quanto a verdade dos fatos, para fins de formação da coisa julgada” .

Para constatação de determinado ato deve haver meios de provas específicos.

Nesse instante, cumpre lembrar a regra da especificidade da prova, onde pode ocorrer restrições para determinados meios probatórios que não sejam hábeis a identificar determinado ato ilícito.

A restrição pode ocorrer quando o meio da obtenção da prova implica na violação de direitos e garantias constitucionais , como exemplifica-se no caso em comento, sendo que a prova testemunhal coloca a liberdade do indivíduo a disposição da boa-fé de terceiro, conforme já percebido.

O objetivo da presente demonstração não implica em afirmar que há hierarquia entre as provas, tanto a testemunhal quanto a pericial possuem relevância no ordenamento jurídico, no entanto, cada qual é utilizada conforme a capacidade que possui em identificar a conduta ilícita de cada tipo penal.

Para reforço a tal afirmação cita-se mais um trecho da pertinente obra de Eugênio Pacelli:

No caso da regra da especificidade, não haverá hierarquia, por exemplo, entre a prova pericial e a prova testemunhal. O que ocorrerá é que, tratando-se de questão eminentemente técnica, e ainda estando presentes os vestígios da infração, a prova testemunhal não será admitida como suficiente, por si só, para demonstrar a verdade dos fatos. Não se nega, contudo, qualquer valor à prova não específica, mas somente não se admite que ela seja a única e bastante para sustentar a ocorrência de um fato ou de uma circunstância desse fato. Nada mais.

 

O problema não invocasse com a idoneidade da testemunha, mas com o método testemunhal considerado como abstrato para conseguir aferir a quantidade de álcool na corrente sanguínea.

Como a prova testemunhal, de mesma forma fica demonstrado a ausência de força probatória do exame clínico a fim de qualificar a conduta do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, considerando que, a simples consulta realizada por um profissional da saúde não consegue identificar a cifra de álcool referida no citado artigo no sangue do condutor, ou ainda, se o mesmo encontra-se sobre a influência de substância psicoativa.

“Desta forma, perfeitamente possível a estipulação de uma única modalidade probatória para que se alcance o valor existente no tipo penal, não havendo que se falar que depoimento pessoal ou exame clínico poderiam suprir a eventual não realização dos exames previstos no artigo 2º, I e II do Decreto 6.448/2011: em outras palavras, a não realização das referidas provas não comprova o elemento do tipo penal, qual seja, concentração de álcool igual ou superior a 6 (seis) decigramas” .

Em outras palavras, fica evidente que a prova testemunhal ou o exame clínico perdem suas forças em face da comprovação do delito do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, já que não possuem condições de apontar o quantum exigido pelo citado dispositivo.

3.2 Prova pericial (técnica)

Como já enfatizado, nosso sistema processual brasileiro, “não trabalha com a ideia da existência de uma hierarquia de provas” , no entanto, cabe esclarecer que a utilização da prova pericial a fim de identificar a conduta de dirigir alcoolizado ou sobre a influência de álcool é de suma importância, eis que somente elas possuem a capacidade de identificar a substância, determinada pela legislação, contida no sangue do motorista.

A embriaguez pode ser classificada como um estado temporário de intoxicação do indivíduo, provocada pela ingestão de álcool ou substância análoga ou ainda, de semelhantes efeitos, que possui a capacidade de privar o ser humano do seu próprio poder de controle, reduzindo e anulando a sua capacidade de entendimento .

Quando este estado estiver associado à direção de um veículo automotor, o condutor pode ser punido criminalmente na forma do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, caso for identificado que em sua corrente sanguínea há no mínimo 06 decigramas de álcool por litro de sangue, ou se estiver sobre a influência de qualquer outra substância que determine a dependência.

É necessidade enfatizar a importância em se identificar o quantum de álcool ingerido pelo condutor determinado pelo legislador, eis que os efeitos dependem de uma série de fatores, sendo que cada qual possui seu organismo e, portanto, pode reagir de diferentes formas ao uso da bebida alcoólica . Sobre a influência do álcool é importante citar a classificação trazida por Geraldo de Faria Lemos Pinheiro e Dorival Ribeiro:

Com menos de uma grama por litro de sangue, não existe estado de embriaguez: (a) de 1,10 a 1,50 g por litro de sangue, há uma embriaguez, porém sujeita a ressalva; (b) de 1,60 a 3,0 g é certo o estado de embriaguez; (c) de 3,10 a 4,0 g é completa; (d) de 4,10 a 6,0 g há uma embriaguez profunda; (e) de mais de 6 a 10 g trata-se de uma intoxicação profunda .

 

Para a figura penal é imprescindível que se apure a quantidade de álcool para caracterizar o estado de embriaguez, sendo importante os índices de concentração no sangue.

Consoante excelente doutrina de Arnaldo Rizzardo “A dosagem etílica, portanto, passou a integrar o tipo penal que exige seja comprovadamente superior a 6 (seis) decigramas.”

Insta destacar que a tipicidade do citado artigo, ocorre a partir da identificação das elencadas substâncias no limite estabelecido por lei, o que por óbvio, só pode ser determinado pelo aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), popularmente conhecido como “bafômetro”, ou com o exame de sangue, ou seja, através de provas técnicas.

 

4 É OBRIGATÓRIO FAZER USO DO BAFÔMETRO OU FORNECER SANGUE PARA EXAME CLÍNICO?

 

Além dos meios de prova, há outro problema constante que envolve a atual Lei Seca qual merece imensurável atenção.

É sabido que conforme dispositivo constitucional e princípios normativos, nenhum “ninguém está obrigado a fazer prova contra si mesmo”, logo, a comprovação do uso do álcool na direção de veículo automotor fica a depender da vontade do próprio motorista em realizar o teste do bafômetro ou a fornecer sangue para exame. Assim se tal recusa ocorrer, a ação penal jamais poderá existir e logicamente não haverá condenação .

De um lado encontramos o alto índice de mortalidade no trânsito em razão da combinação de bebida e volante, em contra posição, há um direito fundamental envolvido, qual seja o “memo tonetur se derege”, o princípio pelo qual ninguém está obrigado a produzir provas contra si.

Como o dispositivo legal vigente exige uma quantidade de álcool presente no sangue para punir a conduta em questão, por mais que haja evidência da ingestão do uso de bebida alcoólica, o crime não poderá ser configurado no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, se a coleta do material probatório for negada pelo infrator .

Grande número de motoristas, se recusam a colaborar com a produção de provas, eis que são protegidos por direitos constitucionais, sendo assim, aquele que se negar a soprar no bafômetro, ou a fornecer sangue para teste, atualmente pode responder tão somente na esfera administrativa pela infração do artigo 165 do Código de Trânsito qual seja:

 

Dirigir sobre a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:

Infração – gravíssima;

Penalidade – multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por (doze) meses;

Medida Administrativa – retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação .

Ocorre que em razão de instalada problemática, muitas ações foram propostas contra os condutores que não concordavam em soprar no bafômetro ou fornecer amostras de seu sangue. O resultar foi um grande aglomerado de processos, aguardando decisão unânime para então serem julgados.

Guilherme de Souza Nucci relata em sua obra, seu pensamento sobre o assunto:

Se o réu não tem o dever de se auto-incriminar, é lógico que não tem obrigação alguma de colaborar para a realização de prova pericial, cuja finalidade é prejudicá-lo. Assim, não necessita fornecer sangue para exame de constatação de dosagem alcoólica, como também não está obrigado a soprar o aparelho denominado bafômetro.

No mês de março deste ano, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu que apenas os resultados obtidos por meio de bafômetro e exame de sangue podem ser aceitos como prova de embriaguez no trânsito para desencadear uma ação penal, com possibilidade de detenção de seis meses a três anos. Esta limitação estabelecida pelo Supremo Tribunal de Justiça enfraqueceu a lei, já que o motorista pode se recusar a submeter-se ao teste ou ao exame, amparado pelo princípio constitucional de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si próprio.

Neste mesmo sentido decide a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. AUSÊNCIA DE EXAME DE ALCOOLEMIA. AFERIÇÃO DA DOSAGEM QUE DEVE SER SUPERIOR A SEIS DECIGRAMAS. NECESSIDADE. ELEMENTAR DO TIPO. 1. Antes da edição da Lei nº 11.705/08 bastava, para a configuração do delito de embriaguez ao volante, que o agente, sob a influência de álcool, expusesse a dano potencial a incolumidade de outrem. 2. Entretanto, com o advento da referida Lei, inseriu-se a quantidade mínima exigível e excluiu-se a necessidade de exposição de dano potencial, delimitando-se o meio de prova admissível, ou seja, a figura típica só se perfaz com a quantificação objetiva da concentração de álcool no sangue o que não se pode presumir. A dosagem etílica, portanto, passou a integrar o tipo penal que exige seja comprovadamente superior a 6 (seis) decigramas. 3. Essa comprovação, conforme o Decreto nº 6.488 de 19.6.08 pode ser feita por duas maneiras: exame de sangue ou teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), este último também conhecido como bafômetro. 4. Isso não pode, por certo, ensejar do magistrado a correção das falhas estruturais com o objetivo de conferir-lhe efetividade. O Direito Penal rege-se, antes de tudo, pela estrita legalidade e tipicidade. Assim, para comprovar a embriaguez, objetivamente delimitada pelo art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, é indispensável a prova técnica consubstanciada no teste do bafômetro ou no exame de sangue. 6. Recurso a que se nega provimento. (grifei)

Ao passo que o Supremo Tribunal de Justiça decide que só é possível punir o condutor, mediante comprovação do consumo de álcool por meio de exame de bafômetro ou de sangue, surge um conflito, ante que, ninguém pode ser obrigado a promover provas contra si e assim a atual lei seca fica inviabilizada de ser aplicada, pois como efetuar a aferição da quantidade de álcool sem a colaboração do motorista?

Conforme já citado, em virtude de tal aprovação proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, a Câmara dos Deputados, reconheceu na noite do dia 11 de abril deste ano, um projeto que amplia a possibilidade de provas de condução de veículo sob efeito de álcool no âmbito da lei seca, qual seja o Projeto de Lei (PL) nº 6.507/2009, do Deputado Federal Hugo Leal, com a intenção de permitir que, condutores que se recusarem a fazer estes testes possam ser responder na esfera criminal, onde apresenta como meios de provas o uso de vídeos, prova testemunhal e todos aqueles meios de prova em direito admitidos, como forma de comprovar a condução anormal de veículo diante do uso do álcool ou outra substância psicoativa.

Neste instante é necessário discutir se o viável não seria retirar a quantidade delimitada no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro que se refere à dosagem de álcool na corrente sanguínea, e deixar de lado o descumprimento ao que prevê, vez que ao considerar a prova testemunhal ou o exame clínico como meio probatório ao uso do álcool no volante, a norma vigente está sendo violada, já que estes meios não possuem o condão de delimitar valores da bebida ingerida.

Fato é que a embriaguez por bebida alcoólica aumenta de forma considerável o risco de acidentes fatais, e assim, é necessário a efetiva punição ao motorista que dirigir embriagado e diminuir o número de acidentes no trânsito provocados pela mistura de bebida e direção. No entanto, é preciso atentar-se aos direitos constitucionais já garantidos.

Diante de tantos paradigmas, observa-se que se a vontade do legislador era endurecer a lei a fim de diminuir o número de mortos e lesionados em acidentes de trânsito, vitimas de motoristas alcoolizados, deveria este ter analisado sua aplicação ao sistema jurídico-normativo, já que atualmente tal apresente índices contrários ao que fora proposto.

Todo o exposto retrata a necessidade o sistema legislativo discuta uma solução para o combate de mortes no trânsito diante da associação de bebida alcoólica e direção, contudo, sempre observando as garantias constitucionais.

4.1 Direitos e garantias individuais: princípios que norteiam o direito de não produzir provas contra si

Ao passo que a lei seca atual vem sendo aplicada, sua utilização demonstra alguns problemas conforme já citado. Diante da elementar que necessita o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro para a configuração da conduta de dirigir alcoolizado, qual seja a disposição de álcool ou substância psicoativa na corrente sanguínea, acaba por necessitar impreterivelmente da colaboração do condutor do veículo, realizando o teste do bafômetro ou ainda, do exame de sangue .

Diante disso nota-se que para desencadear uma ação penal é de suma importância que se identifique o grau de embriaguez do motorista, ou o mesmo será punido tão somente na esfera administrativa.

Esta recusa em fornecer provas está protegida por direito fundamental de magnitude inquestionável, qual seja o princípio do “memo tonetur se derege” (ninguém está obrigado a se autoacusar), qual está amparado pelos princípios da ampla defesa e da presunção da inocência.

4.1.2 Direito ao silêncio e não autoincriminação

Considerado um dos grandes pilares da esfera penal, o direito ao silêncio ou a garantia contra a autoincrimação, não só permite que aquele que esteja na eminência de sofrer uma acusação permaneça em silêncio durante toda a investigação, como impede que ele seja compelido a produzir provas ou a contribuir com a formação da prova contrária a seu benefício . Haja vista, que um ato contrário pode afetar os direitos fundamentais da pessoa humana.

O direito ao silêncio deriva da regra constitucional prevista no artigo 5º, inciso LXIII , da Constituição da República, já mencionado e descrito neste contexto .

Neste ínterim cumpre destacar o pensamento do glorioso Eugênio Pacelli:

A regra da não exigibilidade de participação compulsória do acusado na formação da prova a ele contrária, ressalvadas hipóteses previstas em leis e não invasivas da integridade física psíquica do agente, decorre, além do próprio sistema de garantias e franquias públicas instituído pelo constituinte de 1988, de norma expressa prevista no art. 8º da Convenção Americana sobre Direito Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969, integrada ao nosso ordenamento jurídico pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, no que toca ao direito ao silêncio e à proteção contra ingerências atentatórias da dignidade humana .

O direito ao silêncio, corelato a garantia de não autoincriminar-se, pode ser explicado como manifestação e realização da ampla defesa.

O princípio é a tradução de uma das exteriorizações da não autoincriminação e do nemo tenetur se detegere (ninguém é obrigado a se descobrir), tratando-se da ocorrência natural da junção dos princípios constitucionais da presunção da inocência disposto no artigo 5º, inciso LVII, e ampla defesa, propenso no artigo 5º, inciso LV, com o direito humano fundamental que permite ao réu manter-se calado (artigo 5º, inciso LXIII) todos da Constituição federal.

Como leciona Guilherme de Souza Nucci:

Se o indivíduo é inocente, até que seja provada sua culpa, possuindo o direito de produzir amplamente prova em seu favor, bem como se pode permanecer em silêncio sem qualquer tipo de prejuízo à SUS situação processual, é mais do que óbvio não estar obrigado, em hipótese alguma, a produzir prova contra si .

O Estado é considerado a parte mais forte na persecução penal, possuindo agentes e ferramentas capazes a buscar e descobrir provas contra o autor da infração, no entanto, necessita de sua colaboração. Para Nucci “Seria a admissão da falência de seu aparato e fraqueza de suas autoridades se dependesse do suspeito para colher elementos suficientes a sustentar a ação penal ”.

Insta destacar que como já mencionado os princípios da presunção da inocência e da ampla defesa, também angariam a proteção na não autoincriminação.

Seu objetivo é garantir que o ônus da prova cabe à acusação e não à defesa . “Se o Estado não atingiu meios determinantes para tanto, tornando imprescindível ouvir o réu para formar sua culpa, é porque se encontra em nítido descompasso”, consoante Guilherme de Souza Nucci .

Quanto ao princípio da ampla defesa ao réu é concedido o direito de se valer de amplos e extensos procedimentos para defender-se da imputação feita pela acusação. Como fundamento constitucional, cita-se o artigo da Constituição Federal que em seu artigo 5º, inciso LV, trás a aplicação do citado princípio. A ampla defesa gera inúmeros direitos exclusivos do réu .

Citados princípios norteiam a problemática que gira ao redor da lei seca, onde muitos condutores se recusam a fornecem provas a fim de identificar seu grau de embriaguez, o qual é fundamental para enquadrar a conduta do artigo que regula tal exigência normativa.

A comprovação da conduta de veículo automotor sobre a influência de álcool, conforme o Decreto Lei 6.488 de 19.06.2008, pode ser feita por duas maneiras: exame de sangue ou teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), este último também conhecido popularmente como bafômetro .

Por óbvio comenta-se um equívoco na edição da lei seca atual, eis que a contradição na exigência da comprovação de álcool na corrente sanguínea, bem como com a garantia constitucional de não produzir provas contra si a fim de autoincriminar-se.

“Isso não pode, por certo, ensejar do magistrado a correção das falhas estruturais com o objetivo de conferir-lhe efetividade. O direito penal rege-se, antes de tudo, pela estrita legalidade e tipicidade” .

Assim, para que se comprove efetivamente a embriaguez, objetivamente exigida pelo artigo 306 do Código de trânsito Brasileiro, é indispensável “a prova técnica consubstanciada no teste do bafômetro ou no exame de sangue” , porém, não se pode obrigar ao indivíduo que esqueça de suas garantias constitucionais, quais lhe asseguram o direito de não fornecer elemento a produção de provas.

Outra questão polêmica fica destacada pela entrada de qualquer meio de prova admitido em direito para a comprovação do teor alcoólico no sangue, sendo proposto por novos projetos de lei.

Não bastasse a divergência na obrigatoriedade em produzir provas, ou não, para a aplicação da lei seca, agora temos uma nova proposta que visa atormentar às garantias constitucionais, sendo que o teor alcoólico continua expresso no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro .

Ao admitir a prova testemunhal, por exemplo, o condutor fica a mercê da boa-fé do agente identificador da infração, ou ainda, de outras pessoas envolvidas. Ou seja, o que está em jogo é a liberdade do indivíduo, qual não pode correr risco, em meio a tantos aparatos constitucionais.

Em última análise, conclui-se que necessário seria modificar o texto da legislação, evitando concertá-lo delimitando capacidade de defesa do indivíduo.

A norma deve nascer direcionada à proteção de direitos fundamentais e legitimada a incidir sobre outros direitos fundamentais. Deve surgir numa perspectiva proporcional e razoável.

É necessário que as normas sejam interpretadas de forma sancionadoras à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, da segurança jurídica e dos direitos fundamentais.

5 CONCLUSÃO

Baseado em estudos doutrinários e jurisprudências, pode ser compreendido a magnitude da importância em se classificar os meios de provas admitidos para identificar a conduta de digerir veículo automotor, sobre a influência de bebida alcoólica ou qualquer outra substância psicoativa.

A seriedade citada se justifica ao passo que garantias constitucionais envolvem a norma que regulamente a atual Lei Seca, eis que alguns meios de provas utilizados para identificar a conduta podem acabar condicionando a liberdade do indivíduo.

Como visto, atualmente a norma que busca o combate a combinação entre álcool e volante exige a quantificação da substância que altera a capacidade psicomotora do motorista, o que só se enfatiza mediante colaboração do mesmo, seja em soprar no bafômetro, ou fornecer sangue para o exame clínico, qual muitas vezes é negado, visto a existência do princípio da não autoincriminação e todos aqueles que a envolvem.

No entanto, inúmeros motoristas recusam a se submeter a tais testes, alegando em contraposição o seu direito de não produzir provas contra si mesmo, o que acabar por expressar a sensação de que a norma vigente não está atendo o objetivo para qual foi criada.

Portanto, há um dilema: como efetivar a aplicação da Lei Seca sem a alteração das garantias constitucionais?

Mesmo expondo as garantias constitucionais abrilhantadas em nosso sistemas jurídico, e ainda, relacionando-as com a norma vigente, não é possível observar uma resposta concreta ao conflito instaurado em face dos meios de provas a identificar a embriaguez ao volante. Como explanado os únicos métodos favoráveis à identificação são o uso do bafômetro, bem como o exame de sangue, conforme expresso no texto legal.

Mediante tantas inseguranças que norteiam a Lei Seca, certo é que algo necessita ser mudado ao ponto de efetivar a norma regulamentadora.

Muito embora se possa alertar ainda, que o condutor que hoje não se submete ao teste do bafômetro, pode responder única e exclusivamente na esfera administrativa e não criminal, diante da falta de elementar, qual seja a quantidade de bebida alcoólica ingerida.

No entanto, é preciso lembrar que ninguém é obrigado a produzir provas contra si, e muito menos, pode ser punido com provas que não possuem o condão de identificar a quantidade de bebida de álcool ingerida, mediante tantas garantias constitucionais que compõe o nosso Estado Democrático de Direito.

Para a conclusão de dilema é preciso analisar a obrigação que o condutor tem em fornecer elementos para a realização da prova pericial, realizada pelo aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro) ou o exame laboratorial, bem como, se é correto admitir qualquer meio de prova, como a testemunhal ou exame clínico, a fim de identificar o quantum de álcool exigido para a configuração do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro.

Enquanto perdurar a quantificação da ingestão do álcool ou qualquer substância psicoativa, será necessário que tal delimitação seja comprovada, ou não haverá como imputar a conduta do artigo 306 do CTB ao agente.

São lamentáveis as cifras numerosas de mortes que ocorrem no trânsito, causadas por motoristas que ingerem bebida alcoólica e cometem a ousadia de conduzir um veículo automotor, porém, não se podem cercear os direitos que o indivíduo possui em garantir sua liberdade para diminuir a incidência de acidentes.

Conclui-se, não por uma resposta ao dilema, mas que a solução não está em tentar enfatizar a lei atual sem atentar-se que a mesma está sendo aplicada em um Estado Democrático de Direito, tentado imputar conduta incriminadora por meios de provas que não possuí a técnica de identificar a quantidade de álcool exigida.

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Data de elaboração: outubro/2012

 

Como citar o texto:

ALBUQUERQUE, Katieli Fernanda..Lei seca: A constitucionalidade dos meios de prova. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 19, nº 1033. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/2672/lei-seca-constitucionalidade-meios-prova. Acesso em 5 dez. 2012.

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