Analisando o livro -A Cidade Antiga- de Fustel de Coulanges, é possível identificar como eram as relações dos nossos antepassados com o fogo sagrado, e com suas famílias. O autor, expõe de forma clara e objetiva a cultura, a tradição, os ritos que se tornaram ultrapassados ao longo do tempo, mas que ainda hoje tem grande importância sob os fatos históricos e é curiosidade para muita gente.

Na Grécia, Itália e Oriente o costume de cultuar o fogo era muito comum, e mais que isso, era um rito sagrado. Era responsabilidade do pai ou chefe da casa, manter o fogo aceso dia e noite. Por trás do fogo havia uma crença muito forte, ele era algo divino, adorado e cultuado pelas famílias. Sob o fogo sagrado era dirigidas preces e oferendas com um pedido de saúde, riqueza e felicidade. Eram necessários muitos cuidados ao manejar o fogo sagrado, pois ele era visto como um deus.

 Com o passar do tempo o culto fogo foi deixado para trás pelo culto aos deuses representados como pessoas, aqui vemos a passagem do pensamento do homem da natureza para o material. Outra concepção dos nossos antepassados não muito comuns hoje é a visão da família, o princípio da família antiga não é apenas a geração e nem os laços sanguíneos, existe um distanciamento das relações de afeto nessas famílias regidas pelo direito grego e romano.

 A família antiga é uma associação religiosa, portanto, o que une essa família são as crenças, como o culto ao fogo e aos mortos. O casamento também passa a ser ligado inteiramente como a religião, a filha enquanto solteira vive e cultua a religião do pai, quando casada passa a cultuar a religião de seu marido, ou seja, sua nova família agora.

A continuidade da família é de extrema importância, pois uma família que se extingue é um culto que morre. Uma lei estipulada pelos antepassados segue viva até hoje, é o caso do divórcio, porém, na época esse contrato seria anulado apenas por esterilidade da mulher, diferentemente dos diversos casos que acontecem hoje. A adoção também era uma pratica comum na época, através dela seria possível a continuidade da família, a religião doméstica, o culto do fogo sagrado e o zelo pelo descanso aos antepassados mortos.

Com a ampliação da concepção sobre religião certo número de famílias formou um grupo ao qual os gregos designavam fátria e os latinos cúria. Contudo, nas fátrias ou nas cúrias, assim como na família, continuava necessária a existência de um Deus, mitos, fogo sagrado, antepassados e um líder.

A partir daí, os romanos e os gregos passaram a ter além da religião doméstica a religião da fátria. Porém, para pertencer a fátria dever-se-ia ter um casamento legítimo dentro da mesma, e essa união de famílias só poderia existir, pois se concebia a existência de um deus além do deus particular, de cada família.

Da união das cúrias originaram-se as tribos, que tinham um deus, religião, assembleias, justiça, promulgação de decretos, tribunal e um chefe. Mas, assim como, muitas fátrias haviam se unido em tribos, muitas tribos associaram-se, entre si, a partir do culto a um mesmo deus e, deste modo, iniciou-se o processo de formação das cidades. Pode-se afirmar que a cidade se desenvolveu à medida que a religião se expandia, pois a crença fortalecia tudo.

Na época entendia-se por cidade a associação religiosa e política das famílias e das tribos, a urbe era um local de reunião, o domicílio e, sobretudo, o santuário dessa associação. Isto é, a urbe era fundada para ser um santuário de culto comum. Enquanto na família existia o pater, na cidade havia o rei, o qual era o chefe religioso e o sacerdote do fogo público. A ideia de rei foi concebida como uma evolução natural de família a tribo e de tribo a cidade. O rei era considerado sagrado e o seu sacerdócio e poder eram inicialmente hereditários.

Na cidade a lei, assim como o rei, foi a consequência da crença sendo aplicada aos homens. As leis não poderiam ser revogadas e só eram aplicadas aos membros de uma mesma cidade, os quais não deveriam só residir na urbe, mas também deveriam ser cidadão da urbe. Contudo, a lei não era para os escravos, estrangeiros, clientes e mulheres, sendo, originariamente, direito exclusivo do pater.

A justificativa para a exclusão destas classes sociais não derivou da ideia de justiça, e sim da ideia de religião que eles possuíam. Ao passo que aumentava o poder jurídico do cidadão, o plebeu e o cliente começaram a lutar para também comungar dos mesmos direitos que os eupátridas. Uma vez que a cidade era constituída como se as classes inferiores (clientes e plebeus) não existissem.

O pater – que era um cidadão – era o único que tinha direito ao sufrágio e também eram o único contabilizado pelo censo realizado a cada quatro anos. Portanto, cabia ao patrono participar do censo para não perder seu direito de cidadania.

Percebe-se que a cidade antiga assim como a atual já apresentava desigualdades, todavia, a desigualdade da antiguidade era decorrente, principalmente, de crenças religiosas. Compreendendo a religião antiga podemos dimensionar porque a figura do pai, por longos anos, foi privilegiada em institutos como o direito civil e porque a mulher nem sempre pode usufruir os mesmos direitos que os homens.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. De Jonas Camargo Leite e Eduardo Fonseca. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

  

[1] Acadêmica do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. E-mail: quetilinoliveira@hotmail.com . Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6928424426506752

 

 

Elaborado em abril/2011

 

Como citar o texto:

BATISTA, Quetilin de Oliveira..A cidade antiga de Fustel de Coulanges - fichamento do capítulo: fogo sagrado e família. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1113. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-familia-e-sucessoes/2757/a-cidade-antiga-fustel-coulanges-fichamento-capitulo-fogo-sagrado-familia. Acesso em 22 out. 2013.

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