RESUMO

Este trabalho que busca  compreender a Advocacia-Geral da União no contexto jurídico brasileiro, apresentando suas atribuições institucionais, sua estrutura funcional e seus membros, e que, também, procura realizar uma análise crítica da instituição, indagando qual a postura institucional deveria ser por ela adotada, objetivando atender aos imperativos do Estado Democrático de Direito Brasileiro. Através de pesquisa bibliográfica, análise documental e estudo de casos, o trabalho apresenta os principais posicionamentos acerca da postura institucional da Advocacia-Geral da União no Direito Brasileiro, a saber, o da “Advocacia de Estado” e o da “Advocacia de Governo”, e, ao final, conclui pela insuficiência de ambos os modelos para atender as demandas de um Estado Democrático de Direito, construindo um modelo híbrido que procura conciliá-los.

Palavras-Chave: AGU. Atribuições. Estrutura. Membros. Postura.

ABSTRACT

“The General-Attorney of the Union in the Brazilian Democratic Law State” is an academic essay that seeks to comprehend the General-Attorney of the Union in the context of the Brazilian legal system, presenting its institutional attributions, its functional structure and its members, and that, also, seeks to implement a critical analysis of the institution, questioning which institutional posture should be adopted by it, in order to realize the imperatives of the Brazilian Democratic Law State. By the means of bibliographic research, documentary analysis and case study, this academic essay presents the two main positions about the institutional posture of the General-Attorney of the Union in Brazilian Law, which are the “State Advocacy” and “Government Advocacy”, and, in the end of the essay, concludes that both positions are insufficient to attend the needs of a Democratic Law State, creating an hybrid model that seeks to conciliate the two mentioned positions.    

Keywords: AGU. Attributions. Structure. Members. Posture.

INTRODUÇÃO

 

            O tema escolhido, a saber, --A Advocacia-Geral da União no Estado Democrático de Direito Brasileiro--, assume especial relevância hodiernamente, na medida em que vivemos sob a égide de um genuíno Wellfare State[1], um Estado que é constantemente chamado ao papel de provedor de políticas públicas aptas a garantir, efetivar, materializar uma vasta gama de direitos, outorgados aos cidadãos da República Federativa Brasileira pela sua Lei Maior.

            O artigo 131 da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB/88 proclama que a Advocacia-Geral da União - AGU é a instituição que representa, judicial e extrajudicialmente, a União Federal, bem como suas autarquias e fundações.

            Assim sendo, a AGU responde pelos atos do ente federativo central, bem como pelos atos de suas entidades descentralizadas, quando chamados em juízo para responder por seus atos administrativos de gestão e de legislação, assim como pela ausência dos mesmos.

            Além do papel no contencioso judicial, a AGU atua na consultoria aos Poderes da República, sem integrar qualquer deles, ressalte-se, realizando um verdadeiro controle prévio de constitucionalidade e legalidade dos atos administrativos do ente central político e de suas autarquias e fundações.

            Devido à amplitude do tema escolhido, sua abordagem nesse trabalho será limitada a apenas alguns de seus aspectos que, a nosso sentir, serão os mais relevantes para proporcionarmos ao leitor um panorama geral da Instituição e o prepararmos para, sobre ela, lançar um olhar mais crítico. Dessarte, o presente  estudo abarcará:

            a) Um panorama geral da AGU, em que exporemos suas atribuições constitucionais e legais, sua estrutura administrativa, seus membros, bem como as garantias e deveres dos mesmos, tudo isso com a salutar remição às leis de regência;

            b) Uma análise institucional crítica, em que a verdadeira problemática do tema proposto será apresentada, trabalhando questões altamente controversas como a autonomia funcional dos membros da AGU, sua autonomia administrativa, orgânica e orçamentária e, ainda, a grande questão acerca da AGU ser Advocacia de Estado ou de Governo e

            c) Finalmente, no desfecho do estudo, exporemos qual seria, a nosso sentir, o perfil institucional que a AGU deveria adotar no Estado Democrático de Direito Brasileiro, com vistas a defender e realizar seus mais caros imperativos.

            Esperamos ofertar ao leitor um trabalho interessante e prazeroso, que o incentive a conhecer mais sobre a Advocacia-Geral da União ou, sendo mais ambicioso, que o convide a futuramente integrá-la. 

 

DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO.

1. Breve Resgate Histórico.

O “Estado” é um fenômeno sociológico que traduz uma realidade fática em que um certo agrupamento de pessoas, com traços histórico-culturais comuns (povo), em um dado espaço geográfico (território), transfere a um novel ente social (o Estado propriamente dito), ente esse caracterizado por sua formalização existencial[2], parcela de sua autodeterminação, antes absoluta, tornando-o, assim, um ente capaz de se autodeterminar, sem quaisquer limites prévios (soberania). O surgimento do Estado teria como finalidade o resguardo da segurança e paz da coletividade e de cada um de seus membros.[3]

Criado o Estado como meio eficiente de compor os conflitos de seus integrantes, não demorou muito para que uma poética contradição se manifestasse: o Estado, surgido para prevenir e resolver divergências sociais, passou, ele mesmo, a protagonizar conflitos com seus integrantes. Nada mais natural, vez que, como sujeito de direitos e deveres, o Estado poderia, sim, titularizar interesses contrapostos aos dos particulares.

Isso posto, quem representaria o Estado no processo de equacionamento de conflitos?

À exemplo do que ocorre com os particulares, que perante o processo oficial estatal de solução de conflitos faziam-se representar por profissionais capacitados, advogados, o Estado também se fez representar por procuradores, que, pois, são verdadeiros “advogados do Estado”.

Dessa maneira, a atividade de representação do Estado no processo oficial de solução de conflitos passou a denominar-se advocacia Pública ou advocacia de Estado em sentido lato[4].

A origem da advocacia pública ou advocacia de Estado em sentido lato no Direito Pátrio deita raízes no Direito Português Medieval. Vejamos o excerto abaixo:

“Verdade que a advocacia do Estado foi a atividade precípua dos Procuradores D’El Rey, criados por Dom Affonso III, em 14 de fevereiro de 1289, origem do Parquet no universo lusobrasileiro, na opinião dos melhores historiadores da instituição. Aqueles agentes reais só secundariamente exerciam a iniciativa da ação criminal, quando a pena comportasse condenação pecuniária em prol da Coroa. Trazido para o Brasil Colônia, esse modelo foi herdado pelo Império Independente e repassado à República, tendo vigorado, no plano federal, até a inovação de 1988.”[5]

Todavia, o modelo português apresentava um grave inconveniente, a saber, o de que a advocacia pública[6] também competia ao Ministério Público, o que gerava situações inusitadas em que a mesma instituição demandava e defendia o Estado.

Bem observa isso SESTA:

“Na realidade, o modelo português não mais comportava o enorme alargamento da atividade administrativa, tomada em sentido técnico, maiormente exercida pelo órgão do chamado Poder Executivo, seja porque esse alargamento não raro propiciava situações em que o interesse público enquanto interesse estatal conflitava com o interesse público enquanto interesse da sociedade, criando para o Parquet o constrangimento do patrocínio simultâneo de interesses antagônicos, seja porque a atual amplitude da competência matriz dos antigos Procuradores D’El Rey passava a oferecer complexidade progressivamente crescente e exigir trato fortemente especializado.”[7]

Com o advento da influência francesa sobre o Ministério Público, durante o período napoleônico, a instituição passou a se distanciar das funções típicas de advocacia pública, entendida essa como a de representação dos interesses do ente estatal no processo oficial de composição de conflitos, tendo, outrossim, suas atribuições circunspectas à ação penal pública e fiscalização da lei.

Outrossim, as funções de advocacia pública alcançaram tamanho grau de complexidade, que se apresentou como exigência indeclinável de uma defesa eficiente do Estado a formação de profissionais (e a correlata criação de cargos) com conhecimentos especializados nesta área. 

Sendo retiradas do Ministério Público as funções típicas de advocacia pública[8], mostrou-se necessária a criação de uma instituição especializada que as titularizassem.

Os precursores na criação de uma instituição destinada precipuamente à advocacia pública foram os Italianos que, em 1876, constituíram a “Avvocatura Erariale”[9], aperfeiçoada em 1913, com a “Avvocatura dello Stato”[10].

As Constituições Brasileiras, à exceção da atual, fiéis à tradição portuguesa, confiaram as atribuições da advocacia pública ao Ministério Público o que, consoante já mencionado, precipitou o esgotamento do modelo.

Em 1988, com a promulgação da atual Constituição da República Federativa do Brasil, o constituinte, atento às experiências portuguesa, italiana, francesa e pátria, que evidenciaram a complexidade e a abrangência da advocacia pública, entendeu necessário criar uma instituição especializada nesta atividade, em todos os seus múltiplos aspectos de atuação, criando-se, assim, a AGU - Advocacia-Geral da União.

Depreende-se de nosso histórico que, ao contrário do que se poderia inferir da história pátria da Advocacia Pública[11], foi o Ministério Público que surgiu a partir da Advocacia Pública, pois é evidente que o interesse inicial de qualquer Estado é o de se manter (arrecadar tributos) e o de se afirmar perante seus integrantes (vencer os litígios contra os particulares); depois é que o Estado cogitaria de fiscalizar as leis e punir seus transgressores.

2. Apresentação da AGU: Atribuições, Estrutura e Membros.

2.1. Atribuições:

O artigo 131, da CRFB/88, dispõe que a “Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.”

Tal atribuição é repetida no art. 1º da Lei Complementar 73, de 10 de fevereiro de 1993.

A representação judicial da AGU engloba tanto a administração pública federal direta (a União/Fazenda Nacional[12]), como a indireta (as autarquias e fundações federais). Dessa maneira, em Juízo, a AGU representa a União e suas autarquias e fundações, mas com elas não se confunde: a saber, a AGU é uma instituição constitucional de brilho próprio, que não integra o Poder Executivo, ou quaisquer dos outros Poderes da União, e também não integra as autarquias judicialmente representadas.

Sobreleva anotar que quem está em Juízo é a autarquia federal ou a União, mas a capacidade postulatória é da AGU. Decorrência disso é o fato de que, processualmente, o correto é redigir os cabeçalhos das peças e petições da AGU, consignando, por exemplo, “a AGU, neste ato representando o INSS, vem contestar a presente ação previdenciária...”. O titular do direito posto ou contraposto em Juízo é a pessoa jurídica de direito público, mas quem detém a capacidade de postular em Juízo é a AGU, que se faz “presentada[13] por um de seus membros (advogados da União, procuradores fazendários ou federais).  

As atividades de assessoramento e consultoria se fazem pela elaboração de pareceres, súmulas, minutas de projetos de leis, minutas de medidas provisórias, consultas, etc..., atividades essas que garantem a harmonização dos entendimentos da Administração Pública e um eficiente controle interno de legalidade dos seus atos.

2.2. Estrutura:

            O art. 2º, da Lei Complementar 73, de 10 de fevereiro de 1993, dispõe que a Advocacia-Geral da União possui órgãos de direção superior, órgãos de execução e órgão de assistência direta e imediata ao Advogado-Geral da União.

2.2.1. Dos órgãos de direção superior.

            Os órgãos de direção superior são os órgãos que determinam e harmonizam o entendimento institucional da AGU, bem como dirigem sua vida administrativa e zelam pelo bom cumprimento dos misteres institucionais legais de seus membros. Tais órgãos englobam: (a) o Advogado-Geral da União; b) a Procuradoria-Geral da União e a da Fazenda Nacional; c) Consultoria-Geral da União; d) o Conselho Superior da Advocacia-Geral da União; e e) a Corregedoria-Geral da Advocacia da União.

            Com a Lei 10.480, de 02 de julho de 2002, foi criada a Procuradoria-Geral Federal, vinculada à Advocacia-Geral da União. Incumbe à Advocacia-Geral da União a supervisão da Procuradoria-Geral Federal.

            Sendo órgão vinculado à AGU e supervisionado pela mesma, acreditamos que a  Procuradoria-Geral Federal integra a estrutura da AGU, como órgão de direção superior.

           

2.2.2. Dos órgãos de execução.

            Os órgãos de execução são aqueles que realizam materialmente as atribuições institucionais da AGU. Englobam: a) as Procuradorias Regionais da União e as da Fazenda Nacional e as Procuradorias da União e as da Fazenda Nacional nos Estados e no Distrito Federal e as Procuradorias Seccionais destas; b) a Consultoria da União, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, da Secretaria-Geral e das demais Secretarias da Presidência da República e do Estado-Maior das Forças Armadas.

            A mesma Lei 10.480, de 02 de julho de 2002, já citada, em seu art. 10, §2º, dispõe que integram a Procuradoria-Geral Federal as Procuradorias, Departamentos Jurídicos, Consultorias Jurídicas ou Assessorias Jurídicas das autarquias e fundações federais, como órgãos de execução desta, mantidas as suas atuais competências e, além, disso, prevê nos §§ 4º e 5º, a criação de Procuradorias-Seccionais Federais.

            Dessarte, entendemos que são órgãos de execução da AGU as Procuradorias-Seccionais Federais.

2.2.3. Do Gabinete do Advogado-Geral da União

            O órgão de assistência direta e imediata ao Advogado-Geral da União é o Gabinete do Advogado-Geral da União, sendo dever de tal órgão prestar ao chefe da Instituição todo o amparo jurídico necessário ao bom desempenho de suas funções.

2.2.4. Do Advogado-Geral da União.

            O art. 131, §1º, da CRFB/88, repetido no art. 3º da LC 73/93, declara que a Advocacia-Geral da União tem por chefe o Advogado-Geral da União.

            Esse agente político é de livre nomeação pelo Presidente da República, respeitados os seguintes requisitos: maior de trinta e cinco anos, notável saber jurídico e reputação ilibada.

            O Advogado-Geral da União é “o mais elevado órgão de assessoramento jurídico do Poder Executivo, submetido à direta, pessoal e imediata supervisão do Presidente da República” (art. 3º, §1º, LC 73/93).

            O Advogado-Geral da União dispõe de uma miríade de atribuições, discriminadas em um extenso rol no art. 4º, da LC 73/93, atribuições essas que objetivam harmonizar e aperfeiçoar a defesa do Estado, merecendo especial menção as seguintes: a) dirigir a Advocacia-Geral da União, superintender e coordenar suas atividades e orientar-lhe a atuação; b) despachar com o Presidente da República; c) representar a União junto ao Supremo Tribunal Federal; d) defender, nas ações diretas de inconstitucionalidade, a norma legal ou ato normativo, objeto de impugnação; e) apresentar as informações a serem prestadas pelo Presidente da República, relativas a medidas impugnadoras de ato ou omissão presidencial; f) desistir, transigir, acordar e firmar compromisso nas ações de interesse da União, nos termos da legislação vigente; (Ver Lei 9.469, 10/07/97); g) assessorar o Presidente da República em assuntos de natureza jurídica, elaborando pareceres e estudos ou propondo normas, medidas e diretrizes; h) assistir o Presidente da República no controle interno da legalidade dos atos da Administração; i) fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e demais atos normativos, a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração Federal; j) unificar a jurisprudência administrativa, garantir a correta aplicação das leis, prevenir e dirimir as controvérsias entre os órgãos jurídicos da Administração Federal; k) editar enunciados de súmula administrativa, resultantes de jurisprudência iterativa dos Tribunais; e l) baixar o Regimento Interno da Advocacia-Geral da União.

2.2.5. Da Corregedoria-Geral da Advocacia da União.

            O órgão correicional da AGU é a Corregedoria-Geral da Advocacia da União. Cabe-lhe, na letra do art. 5º, da LC 73/93, como órgão disciplinar, fiscalizar as atividades funcionais dos Membros da Advocacia-Geral da União, promover correição nos órgãos jurídicos da Advocacia-Geral da União, apreciar as representações relativas à atuação dos Membros da Advocacia-Geral da União, coordenar e analisar o estágio confirmatório dos integrantes das Carreiras da Advocacia-Geral da União e instaurar, de ofício ou por determinação superior, sindicâncias e processos administrativos contra os Membros da Advocacia-Geral da União.

            Veja-se que o membro da Advocacia-Geral da União submete-se única e exclusivamente ao poder correicional da CGAGU, de maneira que órgãos de classe, como as Seccionais da OAB, não podem punir ou sequer instaurar processos disciplinares contra advogados públicos federais[14].

2.2.6. Do Conselho Superior da Advocacia-Geral da União.

            O Conselho Superior da Advocacia-Geral da União é o órgão institucional da AGU que dirige sua vida administrativa intestina, tendo, consoante o art. 7º, da LC 73/93, a missão de propor, organizar e dirigir os concursos de ingresso nas Carreiras da Advocacia-Geral da União, organizar as listas de promoção e de remoção, julgar reclamações e recursos contra a inclusão, exclusão e classificação em tais listas, e encaminhá-las ao Advogado-Geral da União, decidir sobre a confirmação no cargo ou exoneração dos Membros das Carreiras da Advocacia-Geral da União submetidos à estágio confirmatório.

            Integram o Conselho Superior da Advocacia-Geral da União o Advogado-Geral da União, que o preside, o Procurador-Geral da União, o Procurador-Geral da Fazenda Nacional, o Consultor-Geral da União, o Corregedor-Geral da Advocacia da União, um representante, eleito, de cada carreira da Advocacia-Geral da União, e respectivo suplente.

            À exemplo do quanto já expusemos sobre a estrutura da AGU, e confirmando o nosso entendimento, merece registro que o CSAGU é composto, também, pelo Procurador-Geral Federal e por um membro da carreira de procurador federal.

2.2.7. Dos órgãos vinculados

            Consoante já anotado, o art. 131, da CRFB/88, dispõe que “A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente...” (grifei). A dicção “através de órgão vinculado” faz alusão a órgão que, apesar de não integrarem a AGU, estão submetidas à sua supervisão.

            A expressão “vinculado” é de infelicidade ímpar, pois cria uma situação jurídica inexplicável. O órgão vinculado não pertence à AGU, mas submete-se à sua supervisão: isso posto, a quem pertence o órgão vinculado então? A Procuradoria-Geral Federal não integra a AGU, mas está vinculada a essa. Mas, afinal, a PGF é órgão de quem? Das autarquias? Da União?

            Fato é que essa atecnia legislativa conduz a certa confusão na Instituição, sendo preferível, para todos os efeitos, considerar o mencionado órgão vinculado (a PGF), como órgão integrante da AGU. Aliás, se observamos bem, isso já ocorre, na medida em que a PGF integra o CSAGU, os direitos, prerrogativas e deveres dos procuradores federais são os mesmos dos advogados da União.  

            O Capítulo IX, “Dos Órgãos Vinculados”, da LC 73/93, no seu art. 17, entende que os citados “órgão vinculados” são os órgãos jurídicos das autarquias e das fundações públicas.

            Insistindo na confusão legislativa, a Lei 10.480, de 02 de julho de 2002, em seu art. 9º, cria a Procuradoria-Geral Federal, vinculada à Advocacia-Geral da União (realcei).

            O ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004) elimina a confusa fragmentação da Instituição, dispondo, em seu art. 10,  que, são órgãos de direção superior da Advocacia-Geral da União: I – o Advogado-Geral da União;             II – o Conselho Superior da Advocacia-Geral da União;       III – a Corregedoria-Geral da Advocacia-Geral da União; IV – a Consultoria-Geral da União; V – a Procuradoria-Geral da União; VI – a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional; e VII – a Procuradoria-Geral Federal.

2.3. Dos Membros Efetivos da Advocacia-Geral da União

            Intitular-se-iam os advogados da União, procuradores fazendários, procuradores federais e do BACEN servidores ou membros da AGU? Há alguma diferença relevante na nomenclatura?

            Não é de hoje que magistrados se declaram membros do Judiciário, em oposição aos servidores da Justiça, que seriam aqueles que prestam serviços auxiliares ao da jurisdição, como os oficiais de justiça, escrivães, serventuários, etc.... Na mesma esteira, os procuradores da república entendem que são membros do Ministério Público.

            Pois bem: membros são as pessoas físicas que titularizam as atribuições principais, as funções-fim, de uma Instituição, ao passo que servidores seriam as pessoas físicas que realizam as atividades de apoio, as funções-meio, de uma instituição.

            Com isso em mente, e sem apego a rigorismos inúteis, pode-se dizer que os advogados da União, procuradores fazendários, procuradores federais e do BACEN são membros da AGU; outrossim, o pessoal de apoio, como os contadores do Setor de Cálculos e os analistas administrativos do RH são servidores da AGU.

            O art. 20, da Lei Complementar 73, de 10 de fevereiro de 1993, prevê as carreiras de Advogado da União e de Procurador da Fazenda Nacional.

            A Medida Provisória nº 2048-26, de 29 de junho de 2000, em seu art. 35, cria a carreira de Procurador Federal no âmbito da Administração Pública Federal. Na mesma lei, consoante seu art. 39, foram transformados em cargos de Procurador Federal, os cargos efetivos de Procurador Autárquico.

            A Lei n.º 9650, de 27 de maio de 1998, em seu art. 1º, cria o cargo de procurador do Banco Central e, a partir da multicitada Medida Provisória n. º 2048-26 de 29 de junho de 2000, ganhou efetivamente a condição de Carreira da Advocacia Geral da União.

            O ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004), novamente em esforço de eliminar a fragmentação da Instituição, dispõe, em seu art. 78, que as carreiras da Advocacia-Geral da União são constituídas por cargos efetivos distribuídos em três categorias, sendo a inicial de Procurador da União, Procurador da Fazenda Nacional e Procurador Federal; a intermediária de Procurador-Regional da União, Procurador-Regional da Fazenda Nacional e Procurador-Regional Federal; e a final de Subprocurador-Geral da União, Subprocurador-Geral da Fazenda Nacional, e Subprocurador-Geral Federal.

              Ainda no anteprojeto, seu art. 162. transforma em cargos de Procurador Federal, da respectiva Carreira da Advocacia-Geral da União, os atuais cargos efetivos, vagos e ocupados, da Carreira de Procurador do Banco Central do Brasil.

 

3. Prerrogativas, Direitos, Deveres e Vedações dos Membros da AGU.

3.1. Prerrogativas e Direitos

            O art. 26, da LC 73/93, dispõe que os membros efetivos da Advocacia-Geral da União têm os direitos assegurados pela Lei nº 8.112/90 e na própria lei complementar. Todavia, o certo é que as prerrogativas e direitos dos membros da AGU estão disseminados em muitas leis, das quais tentaremos, agora, fazer uma compilação que, esperamos, seja útil aos membros da Instituição e ao leitor.

            A Lei 8.112/90 é o Estatuto do Servidor Público Federal.

            Inicialmente, como a lei 8.112/90 destina-se aos servidores públicos federais, mostra-se totalmente insuficiente a munir os membros da AGU dos direitos e das prerrogativas necessárias ao exercício de suas importantes atribuições legais.

            De qualquer forma, o citado diploma assegura aos membros da AGU os seguintes direitos[15]:   

            1) Remuneração, na forma de subsídio[16], acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, e constitucionalmente irredutível[17];

            2) Isonomia de remuneração para cargos de atribuições iguais ou assemelhadas do mesmo Poder;

            3) Impossibilidade de descontos sobre a remuneração ou provento[18], salvo por imposição legal, ou mandado judicial;

            4) A remuneração e o provento não serão objeto de arresto, sequestro ou penhora, exceto nos casos de prestação de alimentos resultante de decisão judicial;

            5) Indenização de ajuda de custo para  compensar as despesas de instalação do servidor que, no interesse do serviço, passar a ter exercício em nova sede, com mudança de domicílio em caráter permanente;

            6) Indenização de diárias para custear o afastamento do membro da AGU da sede do serviço, em caráter eventual ou transitório, para outro ponto do território nacional ou para o exterior, o que destina-se a indenizar gastos com pousada, alimentação e locomoção urbana;

            7) Indenização de transporte para custear as despesas com a utilização de meio próprio de locomoção para a execução de serviços externos, por força das atribuições próprias do cargo;

            8) Indenização de auxílio-moradia (Incluído pela Lei nº 11.355, de 2006), consistente no ressarcimento das despesas comprovadamente realizadas pelo membro da AGU com aluguel de moradia ou com meio de hospedagem administrado por empresa hoteleira, no prazo de um mês após a comprovação da despesa pelo membro da AGU[19];

            9) Gratificação natalina – é o popular 13º salário;

            10) Adicional de férias, calculado em 1/3 do subsídio mensal pago ao membro da AGU;

            11) Gratificação por encargo de curso ou concurso. (Incluído pela Lei nº 11.314 de 2006). Tal gratificação é eventual e contempla as hipóteses em que o membro da AGU atuar como instrutor em curso de formação, de desenvolvimento ou de treinamento regularmente instituído no âmbito da administração pública federal; (Incluído pela Lei nº 11.314 de 2006), participar de banca examinadora ou de comissão para exames orais, para análise curricular, para correção de provas discursivas, para elaboração de questões de provas ou para julgamento de recursos intentados por candidatos (Incluído pela Lei nº 11.314 de 2006), participar da logística de preparação e de realização de concurso público envolvendo atividades de planejamento, coordenação, supervisão, execução e avaliação de resultado, quando tais atividades não estiverem incluídas entre as suas atribuições permanentes (Incluído pela Lei nº 11.314 de 2006) e participar da aplicação, fiscalizar ou avaliar provas de exame vestibular ou de concurso público ou supervisionar essas atividades (Incluído pela Lei nº 11.314 de 2006);

            12) Retribuição pelo Exercício de Função de Direção, Chefia e Assessoramento[20] (Lei nº 9.527, de 10.12.97);

            13) Férias de trinta dias, que podem ser acumuladas, até o máximo de dois períodos (Redação dada pela Lei nº 9.525, de 10.12.97). As férias poderão ser parceladas em até três etapas, desde que assim requeridas pelo servidor, e no interesse da administração pública (Incluído pela Lei nº 9.525, de 10.12.97);

            14) Licença por motivo de doença em pessoa da família – com ou sem remuneração;

            15) Licença por motivo de afastamento do cônjuge ou companheiro – sem remuneração;

            16) Licença para atividade política – sem remuneração;

            17) Licença para capacitação (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) -   Prevê a lei que, após cada quinquênio de efetivo exercício, o membro da AGU poderá, no interesse da Administração, afastar-se do exercício do cargo efetivo, com a respectiva remuneração, por até três meses, para participar de curso de capacitação profissional;

            18) Licença para tratar de interesses particulares – o membro da AGU não pode estar em estágio probatório e, obviamente, a licença é sem remuneração;

            19) Licença para desempenho de mandato classista (Redação dada pela Lei nº 11.094, de 2005) – sem remuneração. Pelas especificidades da lei, a AGU pode ter poucos membros licenciados para exercer mandato classista;[21]

            20) Afastamento para servir a outro Órgão ou Entidade – no caso dos membros da AGU, o afastamento só pode se dar para que o mesmo ocupe o cargo de dirigente máximo de autarquia ou fundação;

            21) Afastamento para Exercício de Mandato Eletivo - tratando-se de mandato federal, estadual ou distrital, ficará afastado do cargo; investido no mandato de Prefeito, será afastado do cargo, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração;

            22) Afastamento para Estudo ou Missão no Exterior, mediante autorização do Presidente da República, Presidente dos Órgãos do Poder Legislativo e Presidente do Supremo Tribunal Federal[22];

            23) Afastamento para Participação em Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu no País, com a respectiva remuneração, no interesse da Administração, e desde que a participação não possa ocorrer simultaneamente com o exercício do cargo ou mediante compensação de horário (Incluído pela Lei nº 11.907, de 2009);

            24) Concessão de ausência ao serviço, por 1 (um) dia, para doação de sangue;

            25)   Concessão de ausência ao serviço, por 8 (oito) dias consecutivos em razão de casamento e falecimento do cônjuge, companheiro, pais, madrasta ou padrasto, filhos, enteados, menor sob guarda ou tutela e irmãos;

            26) Contagem do tempo de exercício da advocacia pública na AGU para todos os efeitos (para aposentadoria em outra carreira, por exemplo);

            27) Direito de Petição, sendo assegurado ao membro da AGU o direito de requerer aos Poderes Públicos, em defesa de direito ou interesse legítimo, sem, com isso, configurar advocacia administrativa;

            Na sequência, a Lei 8.906, de 4 de julho de 1994, acresce aos membros da AGU os seguintes direitos, garantias e prerrogativas:

            28) Igualdade institucional entre membros da AGU, magistrados e membros do Ministério Público, inexistindo subordinação ou hierarquia entre eles;

            29) Receber das autoridades, dos servidores públicos e dos serventuários da justiça, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia pública e receber as condições adequadas a seu desempenho;

            30) Exercer, com liberdade, seus misteres institucionais em todo o território nacional;

            31) A inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia; (Redação dada pela Lei nº 11.767, de 2008);[23]

            32) Comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis[24];

            33) Ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;

            34) não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, e, na sua falta, em prisão domiciliar;

            35) Ingressar livremente nas salas de sessões dos tribunais, mesmo além dos cancelos que separam a parte reservada aos magistrados, nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios de justiça, serviços notariais e de registro, e, no caso de delegacias e prisões, mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares, em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado;[25]

            36) Permanecer sentado ou em pé e retirar-se de quaisquer locais de audiência, secretarias, gabinetes, etc..., independentemente de licença;

            37) Dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada;

            38) Usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas;

            39) Reclamar, verbalmente ou por escrito, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade, contra a inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento;

            40) Falar, sentado ou em pé, em juízo, tribunal ou órgão de deliberação coletiva da Administração Pública ou do Poder Legislativo;

            41) Examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos;

            42) Examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos;

            43) Ter vista dos processos judiciais ou administrativos de qualquer natureza, em cartório ou na repartição competente, ou retirá-los pelos prazos legais;

            44) retirar autos de processos findos, mesmo sem procuração, pelo prazo de dez dias;

            45) Ser publicamente desagravado, quando ofendido no exercício da profissão ou em razão dela;

            46) Usar os símbolos privativos da profissão de advogado público, sobretudo os talantes da AGU;

            47) recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional;

            48) retirar-se do recinto onde se encontre aguardando pregão para ato judicial, após trinta minutos do horário designado e ao qual ainda não tenha comparecido a autoridade que deva presidir a ele, mediante comunicação protocolizada em juízo;

            49) Imunidade material quanto a suas manifestações, em juízo ou fora dele, no exercício de sua atividade, não constituindo as mesmas injúria ou difamação, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a CGAGU, pelos excessos que cometer;

            50) O membro da AGU somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício de seu cargo, em caso de crime inafiançável;

            A Lei 6.830, de 22 de setembro de 1980, em seu art. 25,  concede a seguinte prerrogativa:

            51) o Membro da AGU, na ação de execução fiscal, tem a prerrogativa de intimação pessoal, mediante vista dos autos, com imediata remessa ao mesmo, pelo cartório ou secretaria.

            A Lei 9.028, de 12 de abril de 1995, em seu arts. 4º e 6º, estabelece outras prerrogativas:

            52) Poder requisitório[26] - Na defesa dos interesses da União, os órgão ou entidades da Administração Federal fornecerão os elementos de fato e de direito, e outros necessários à atuação dos membros da AGU, inclusive nas hipóteses de mandado de segurança, habeas data e habeas corpus impetrados contra ato ou omissão de autoridade federal, sendo que tais requisições terão tratamento preferencial e serão atendidas no prazo nelas assinalado. O servidor que não observar o prazo assinalado na requisição sujeitar-se-á a processo administrativo-disciplinar;

            53) Intimação pessoal de membro da Advocacia-Geral da União[27], em qualquer caso[28];

            Finalmente, a própria Constituição de 1988 estabelece direitos:

            54) Livre associação sindical;

            55) Direito de greve, nos limites da lei[29];

            56) Aposentadoria por invalidez e voluntária, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição;

            57) Pensão por morte; e

            58) Estabilidade, após 3 anos e cumprimento do período probatório de 24 meses.

            O ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004), em seu incansável esforço de compilação, reuniu, em um único estatuto, a quase totalidade das prerrogativas enumeradas nos diversos diplomas acima e retrocolacionados, merecendo especial menção as seguintes explicitações e inovações:

            1) Inviolabilidade por seus atos e manifestações, no exercício da profissão, nos limites da lei;

            2) Poder requisitório;

            3) Subsídios escalonados, de modo que a diferença entre os subsídios das categorias da carreira não exceda a 10%;

            4) Salário-família;

            5) Pro labore pela atividade de magistério, por hora-aula proferida em cursos, seminários ou outros eventos destinados ao aperfeiçoamento dos membros da instituição;

            6) Assistência médico-hospitalar, extensiva aos inativos, pensionistas e dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, paramédicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento e a aplicação dos meios e dos cuidados essenciais à saúde;

            7) Auxílio-moradia, em caso de lotação em cidade considerada como de difícil provimento, desde que o membro da Advocacia-Geral da União não disponha de imóvel próprio na localidade;

            8) Auxílio funeral, devido à família do servidor falecido na atividade ou aposentado, em valor equivalente a um mês da remuneração ou provento;

            9) Licença à gestante, por cento e vinte dias;

            10) Diária equivalente a 1/30 do subsídio do membro da AGU;

            11) Concurso de remoção anualmente, no mínimo;

            12) Prioridade em qualquer serviço de transporte ou comunicação, público ou privado, no território nacional, quando em serviço de caráter urgente;

            13) Porte de arma, independentemente de autorização;

            14) O Advogado-Geral da União será processado e julgado, nos crimes comuns, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Senado Federal, nos crimes de responsabilidade;

            15) Os membros da Advocacia-Geral da União serão processados e julgados, nos crimes comuns e de responsabilidade, pelos Tribunais Regionais Federais, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;

            16) Ser preso ou detido somente por ordem escrita do juízo competente ou em razão de flagrante de crime inafiançável, caso em que a autoridade policial fará imediata comunicação ao juízo competente e ao Advogado-Geral da União, sob pena de responsabilidade;

            17) Ser pessoalmente intimado e notificado nos processos judiciais e administrativos em que atuar[30];

            18) Manifestar-se em autos administrativos ou judiciais por meio de cota;

            19) O Advogado-Geral da União terá as mesmas honras e tratamento dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e os demais membros da instituição, as que forem reservadas aos magistrados perante os quais desempenhem suas funções.

            20) As garantias e prerrogativas previstas nesta Lei Complementar não excluem as que sejam estabelecidas em outras leis.

            Cumpre-nos asseverar que gostaríamos de tecer comentários amiudados sobre as garantias dos membros da AGU, avaliando a necessidade das mesmas, bem como sua idoneidade a viabilizar o bom cumprimento das atribuições institucionais da AGU. Também teríamos satisfação em analisar o argumento de alguns acerca da impertinência de certas garantias[31]. Todavia, tal labor demandaria uma dilação em nosso presente estudo que não se coaduna com nosso propósito inicial, que é o de dar uma visão mais ampla e geral da Instituição, apesar de claramente convidarmos o leitor à crítica e ao aprofundamento nos tópicos que mais lhes interessarem.

3.2. Deveres e vedações.

            Como membros de instituição pública de dignidade constitucional, os membros da AGU sujeitam-se aos imperativos constitucionais de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput, CRFB/1988).           Assim sendo, a Lei Complementar 73, de 10 de fevereiro de 1993 dispôs que os membros efetivos da Advocacia-Geral da União têm os deveres previstos na Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, sujeitando-se, ainda, às proibições e impedimentos estabelecidos na mesma lei complementar.

            Isso posto, aos membros efetivos da Advocacia-Geral da União é vedado:

            1) Exercer advocacia fora das atribuições institucionais;

            2) Contrariar súmula, parecer normativo ou orientação técnica adotada pelo Advogado-Geral da União;

            3) Manifestar-se, por qualquer meio de divulgação, sobre assunto pertinente às suas funções, salvo ordem, ou autorização expressa do Advogado-Geral da União.

            4) Exercer suas funções em processo judicial ou administrativo em que sejam parte; em que hajam atuado como advogado de qualquer das partes e em que seja interessado parente consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o segundo grau, bem como cônjuge ou companheiro;

            5) Os membros efetivos da Advocacia-Geral da União devem dar-se por impedidos quando hajam proferido parecer favorável à pretensão deduzida em juízo pela parte adversa

            6) Os membros efetivos da Advocacia-Geral da União não podem participar de comissão ou banca de concurso, intervir no seu julgamento e votar sobre organização de lista para promoção ou remoção, quando concorrer parente consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o segundo grau, bem como cônjuge ou companheiro.

            O ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004) sintetizou os deveres e vedações já discriminados e, ainda, na linha da consagração da moralidade administrativa e da eficiência, procedeu às seguintes inovações:  

            1) O membro da Advocacia-Geral da União deve cumprir os prazos processuais;

            2) Deve guardar segredo sobre assunto de caráter sigiloso, que conheça em razão do cargo ou função;

            3) Deve velar por suas prerrogativas institucionais e processuais;

            4) Deve prestar informações aos órgãos da administração superior da Advocacia-Geral, quando requisitadas;

            5) Deve atender ao expediente forense e participar dos atos judiciais, quando for obrigatória a sua presença; ou assistir a outros, quando conveniente ao interesse do serviço;

            6) Deve declarar-se suspeito ou impedido, nos casos previstos em lei;

            7) Deve instaurar os procedimentos cabíveis ou representar à autoridade competente, observada a via hierárquica, quanto a irregularidades de que tiver conhecimento ou que ocorrerem nos serviços a seu cargo;

            8) Deve tratar com urbanidade as pessoas com as quais se relacione em razão do serviço;

            9) Deve desempenhar com zelo e probidade as suas funções, bem como manter conduta compatível com a moralidade administrativa; e

            10) Deve guardar decoro pessoal na vida pública e na particular.

            Na mesma esteira, é vedado ao membro da Advocacia-Geral da União:

            11) Participar de gerência ou administração de empresa privada ou sociedade civil, e exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário;

            12) Exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério – veja-se que é UMA única de magistério;

            13) Exercer atividade político-partidária, ressalvada a filiação e o direito de afastar-se para exercer cargo eletivo ou a ele concorrer;

            14) Manter, sob sua chefia imediata, em cargo ou função de confiança, cônjuge, companheiro, ou parente até o segundo grau.

            Os deveres e impedimentos que se apresentam aos membros da AGU são compatíveis com o exercício da advocacia pública, demandando, outrossim, órgão correicionais diligentes e uma sociedade civilmente amadurecida para aperfeiçoar a cobrança e fiscalização social sobre a Instituição.

4. Análise Crítica do Papel Institucional da AGU.

Já oferecemos ao leitor uma visão geral da Advocacia-Geral da União, apresentando suas atribuições constitucionais e legais, sua estrutura administrativa e os membros que a integram, assim como as garantias e deveres dos mesmos.

Isso posto, neste momento, adentraremos em uma parte mais crítica e analítica do trabalho, em que enfrentaremos a seguinte discussão: o que o Estado Democrático de Direito Brasileiro quer da AGU? Deseja mais um Ministério Público a fiscalizar as ações estatais? Deseja, apenas, um órgão a lhe defender nas batalhas judiciais, de maneira subserviente e cega? O que então?

Para responder às indagações propostas, vamos proceder a uma salutar digressão jurídica. Senão, vejamos:

Primeiramente, em qualquer circunstância, quando falamos de advogado, ou procurador, estamos a cogitar de um contrato de mandato[32], seja com sede em Direito Público (mandato ex lege), seja com origem no Direito Privado (instrumento de procuração entre particulares). De qualquer sorte, podemos identificar no ato duas partes: mandatário e mandante, outorgante e outorgado.

O outorgado, mandatário, procurador, no caso a que ora nos dedicamos, é a AGU. Ela é que detém a capacidade postulatória para representar seu outorgante, mandante, representado.

E quem seria o outorgante, o mandante?

Diogo de Figueiredo Moreira Neto, em festejada tese, formulou a concepção tríplice das Procuraturas Constitucionais[33], concepção essa que muito nos ajudará na abordagem do problema. Assim, temos três tipos de advocacias, ou procuraturas:

a) a advocacia da sociedade, entendida essa como a defesa da coletividade, determinada ou indeterminada, detentora de direitos difusos, coletivos ou transindividuais homogêneos, realizada pelo Ministério Público;

b) a advocacia dos necessitados, compreendida como a defesa daqueles desprovidos de recursos para viabilizar o livre acesso à Justiça, defesa essa operacionalizada pela Defensoria Pública; e, finalmente

c) a advocacia do Estado (“do” Estado, e não “de” Estado), consubstanciada na defesa dos interesses públicos, primários e secundários, titularizados pelo ente público com capacidade política (realcei), instrumentalizada pela Advocacia Pública Institucionalizada (Advocacia-Geral da União, Procuradorias dos Estados-Membros e Procuradorias Municipais).

            Assim sendo, e como assinala o art. 131, da CRFB/88, o outorgante, no caso vestibular, é a União Federal e suas autarquias e fundações. 

Ora, União Federal é pessoa jurídica de direito público, com capacidade política; autarquias e fundações são pessoas jurídicas, ou universalidades de bens, de direito público interno.

Todavia, a despeito da simplicidade da definição legal dos outorgantes, a mesma encerra uma inconveniente perplexidade: a União é o Governo que a dirige ou representa politicamente, mesmo que por prazo certo, ou a União é o Estado Brasileiro, unidade política atemporal e sem pessoalização? Pondo a situação de maneira mais direta e prática para o que nos interessa: a AGU é advocacia de Estado ou de governo? 

Se a AGU é advocacia de governo, torna-se, com efeito, a garantidora judicial e, em certa medida,  administrativa, de políticas públicas e, portanto, de um programa de governo, devendo, assim, ficar à disposição do representante eleito.

            De outro giro, se a AGU é advocacia de Estado, o compromisso da instituição é com o Estado Brasileiro, na figura da União Federal e de suas demais entidades descentralizadas, de modo que a mesma vincular-se-ia à defesa dos interesses constitucionalmente conferidos a esses entes (interesses públicos primários), e não a um determinado programa de governo. 

4.1. Advocacia de Estado e Advocacia de Governo.

Amadurecida a discussão, impende, nesse momento, fornecermos uma conceituação mais palpável das teses ou posicionamentos da Advocacia de Estado e da Advocacia de Governo, para, então, no desfecho deste trabalho, podermos delinear qual seria o melhor papel da AGU no Estado Democrático de Direito Brasileiro.

O atual Advogado-Geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, em entrevista à Revista Isto É Brasil, asseverou o seguinte:

“ISTOÉ – Seus antecessores se esforçavam para dizer que a AGU era um órgão de Estado. Qual é, de fato, o papel da AGU?

Adams – Concebo a AGU como advocacia. E não existe advogado sem cliente. Advogado sem cliente é magistrado. Nosso cliente primeiro é o Estado, mas o Estado existe como uma figura etérea. Então, nosso cliente é o governo concreto eleito.” (REVISTA ISTO É BRASIL, 2009)[34]

            Depreende-se que o líder da AGU entende que o “cliente” da Instituição é o Governo, “governo concreto eleito”. Disse, ainda, o dignatário, que o Estado é uma “figura etérea”.

            Da entrevista acima, extrai-se os caracteres principais da conceituação de uma Advocacia de Governo:

            1) o governo eleito é que dá os contornos materiais necessários à perfeita definição dos interesses públicos tutelados pelo Estado; Estado esse que, sem o governo, seria mera “figura etérea”;

             2) o governo eleito é o real cliente da Advocacia Pública, devendo, assim, a defesa de suas políticas públicas, traçadas no plano de governo, pautarem a atuação dos membros da Advocacia Pública Institucionalizada e

            3) há uma junção ou confusão dos conceitos de interesse público primário e secundário.

            O interesse público primário é o que traduz o fim, o interesse-fim, a ser perseguido pelo Estado; é aquele que materializa a satisfação de um direito salvaguardado na Constituição ou em outras leis.

            De seu turno, o interesse público secundário é o instrumental, o interesse-meio, para a realização do interesse primário; são materializados pelas políticas públicas.

            Exemplo elucidador do quanto acima se definiu é o seguinte: Poder Público desapropria determinada área para a construção de uma escola em um bairro da periferia de um município. O interesse público secundário, que, aliás, serviu de finalidade para o ato de desapropriação, é o de construir uma escola em comunidade carente; o interesse público primário tutelado pela política pública é o de assegurar o direito à educação, esculpido no artigo 6º, da CRFB/88.

            Para os partidários da Advocacia de Governo, só haveria a implementação do direito à educação (interesse primário), na exata medida em que há uma política pública do governo destinada a materializar tal direito, com atos materiais de satisfação, como o é o ato de construção da escola, contratação de professores, cantineiros, compra de mobiliário escolar novo, etc... (interesse secundário). O interesse primário e o secundário não podem ser dissociados.

            Decorre dessa junção de conceitos que, ao defender uma dada política pública, está a Advocacia Pública Institucionalizada a defender o interesse público primário da coletividade.

            É o governo eleito que dá ao interesse público o especial colorido para ser implementado no mundo dos fatos.

            Veja-se que a tese da Advocacia de Governo não é tão abjeta e repelente como muitos o fazem crer[35], sendo, até certo ponto, de pragmatismo eficaz. Vejamos:

            De fato, o governo, o administrador, deve escolher as políticas públicas que melhor viabilizarão os interesses públicos primários. Inclusive, as políticas públicas que o governo realizará, consignadas em seu plano de governo, já contam com a prévia chancela popular.

            Dessa maneira, com a prévia legitimação popular, as políticas públicas devem ser defendidas pelo advogado público em juízo, sem questionamento de seu mérito, pois, como consagrado, o mérito do ato administrativo, sua conveniência e oportunidade, pertencem ao administrador.

            Na sequência, veja-se que a dicção de que Estado sem governo é um “ente etéreo” também tem forte apelo pragmático, vez que se proclamar o direito à educação, sem ninguém para realizá-lo, é inviável.

            Outrossim, temos que a Lei Complementar 73/93 dispõe que é vedado aos membros da AGU contrariar súmula, parecer normativo ou orientação técnica adotada pelo Advogado-Geral da União, de maneira que, parece, a uma primeira vista, que o Estado Brasileiro deseja uma advocacia de Governo.

            Todavia, devemos consignar que uma Advocacia de Governo purista, em que a Advocacia Pública torna-se um apêndice do governo, não é desejável, por vários motivos:

            1) Ao não questionar a relação de adequação entre política pública (interesse secundário) e o interesse primário a ser viabilizado, o Estado Brasileiro perderá importante mecanismo de controle de legalidade dos atos administrativos;

            2) A defesa acrítica de políticas públicas pode conduzir à defesa de administradores que perpetram ofensas ao erário, através de malversação de verbas, licitações questionáveis, obras de utilidade duvidosa e contratações escusas e perniciosas;

            3) Ter uma Advocacia Pública que não pode discordar do governo é incompatível com um regime democrático, que é justamente caracterizado pela pluralidade de opiniões;

            4) A defesa cega de políticas públicas alija o cerne máximo do Estado Democrático de Direito, que é a sujeição do próprio Estado às Leis –  e quem melhor para analisar a conformidade da atuação do Estado com a Lei do que a Advocacia Pública, com suas hostes de profissionais extremamente especializados neste tipo de análise; e

            5) Qualquer agente público, cujo ingresso na Administração Pública opera-se por concurso, e não eleição, retira a validade de sua atuação da obediência às Leis, notadamente à Constituição, a Lei Máxima, de sorte que, se o advogado público observar a política pública (interesse público secundário, fomentado a partir de decisão majoritária, eleição), às expensas da Lei (Constituição e demais leis), perderá legitimidade,  e, em última instância, perderá sua razão de ser, que é servir ao povo.

            Em posição diametralmente oposta à tese acima esboçada, temos a Advocacia de Estado. Na Advocacia de Estado, os interesses primários e secundários não se misturam, sendo que caberia à Advocacia Pública defender, primordialmente, os interesses primários da Coletividade, e os secundários, somente na medida em se destinassem a realizar eficientemente àqueles.

            Dessa maneira, caberia à Advocacia Pública realizar um exame de adequação entre o interesse-fim (primário) e o interesse-meio (secundário), traduzido na política pública. Se, e somente se, a política pública (o interesse-meio) for idônea a realizar o interesse-fim é que a Advocacia Pública deverá encampar sua defesa.

            Voltemos ao exemplo retrocitado, que retratou a desapropriação de terreno para a construção de uma escola em bairro da periferia de um município. O advogado público deveria analisar se a política pública, qual seja, a construção da escola na periferia (interesse público secundário), seria meio eficiente a se realizar o direito à educação (interesse primário).

            Se, por exemplo, o advogado público constatasse que a construção da escola no bairro da periferia seria providência inidônea a assegurar o direito à educação, vez que há poucas crianças no bairro, os meios de transporte até o mesmo são poucos e ineficientes e o custo da obra ficaria muito caro pela distância dos fornecedores de materiais de construção, deveria ele emitir parecer desfavorável à construção da escola e, se em juízo, não deveria defender o ato de desapropriação. Deveria, outrossim, promover a responsabilização do administrador pela má administração dos recursos públicos.

            O caso acima, agora, convida-nos a uma brevíssima análise do ordenamento jurídico pátrio:

            Na Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, Lei da Ação Civil Pública, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, assim como suas autarquias e fundações, podem propor a referida ação de tutela coletiva, inclusive como litisconsortes de quaisquer das partes (realcei), de sorte que a Advocacia Pública, representando o ente político estatal, poderia se insurgir contra o administrador. Veja-se que, com isso, estabelece-se uma ostensiva dicotomia entre a pessoa jurídica de direito público e seu dirigente (administrador), entre Estado e Governo.

            Outrossim, a lei da ação popular, Lei 4.717, de 29 de junho de 1985, em seu art. 6º, §3º, estabelece que “A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.”

            Assim sendo, seriam características da Advocacia de Estado:

            1) A pessoa jurídica de direito público não se confunde com seus representantes políticos;

            2)  A pessoa jurídica de direito público e seu representante podem ter interesses divergentes, ou seja, o interesse público secundário pode colidir com o primário, porquanto a política pública governamental pode ser ineficiente, ou completamente inidônea, a perseguir a realização do interesse público primário – interesses públicos primário e secundário não se confundem e, finalmente,

            3) No caso de divergência entre os interesses públicos primário e secundário, deve prevalecer aquele, inclusive podendo a pessoa jurídica de direito público colocar-se ao lado do autor, contestando o ato impugnado.    A pessoa jurídica de direito público tem interesses próprios, os interesses públicos primários, e são esses que devem ser defendidos pela Advocacia Pública, assim como demonstram os excertos legais acima. O interesse público secundário só seria defendido se estivesse em perfeita sintonia com o primário.

            Pela análise das leis retrocitadas, parece-nos que o Estado Brasileiro acenou positivamente à tese da Advocacia de Estado.   

            Todavia, levando às últimas consequências a Advocacia de Estado, teríamos resultados nefastos:

            1) Se todas as políticas públicas pudessem ser liberalmente impugnadas pela Advocacia Pública, não teríamos a realização material do interesse público primário;

            2) O Estado Brasileiro não teria governabilidade, pois os planos de governo dificilmente seriam implementados e

            3) Teríamos duas instituições no ordenamento pátrio quase com as mesmas atribuições, o Ministério Público[36] e a Advocacia Pública, o que seria um dispêndio desnecessário de recursos e pessoal qualificado.          

            Trabalhadas as duas teses, a da Advocacia de Estado e a da Advocacia de Governo, reservaremos para a conclusão do trabalho nosso posicionamento acerca de qual o perfil de Advocacia Pública melhor atenderia as necessidades do Estado Brasileiro.

4.2. Análise da AGU como Função Essencial à Justiça e seus desdobramentos:

A CRFB/88 dispõe que a Advocacia-Geral da União é uma instituição (art. 131). Com efeito, e para viabilizar nosso estudo, tal disposição constitucional reclama que perquiramos o que seria, de fato, uma “Instituição”. Sobre isso, socorre a lição de  Aldemário Araújo Castro:

“Cumpre observar uma importante referência nos estudos da sociologia para a ideia de instituição. Com efeito, Emile Durkheim, considerado por muitos o principal artífice da sociologia moderna, concebeu a sociedade como um conjunto integrado de funções (funções sociais) exercidas por instituições (instituições sociais). Assim, as instituições sociais buscam a satisfação de necessidades sociais bem definidas e entrelaçadas.”[37]

Isso posto, ressume da lição que instituição é um organismo social com a função de satisfazer uma certa necessidade social; é um instrumento para a realização de imperativos sociais.

Transplantado a conceituação supracitada para o caso da AGU, temos que a mesma é um organismo social, com existência jurídica formalizada em sede constitucional, cuja função é a de exercer a atividade de representação judicial e extrajudicial da União federal e de suas autarquias e fundações, bem como de prestar as atividade de assessoramento e consultoria jurídica ao Poder Executivo.

A AGU é um instrumento da sociedade para realizar a representação jurídica e o assessoramento do ente político central por ela constituído e, se suas finalidades são essas, deve o Estado, que é a sociedade organizada por excelência, propiciar à instituição todos os meios necessários à consecução de seu fim: recursos financeiros, materiais e humanos.

Poderia o constituinte pátrio ter determinado que a representação jurídica, judicial e extrajudicial, a consultoria e o assessoramento da União Federal fossem realizados por pessoas pertencentes aos próprios quadros da União? Poderia, porquanto o poder constituinte originário é expressão direta da soberania popular, sendo ilimitado. Nada obstante tal possibilidade, o constituinte houve por conferir a uma instituição especializada as atribuições acima elencadas.

Veja-se que o constituinte entendeu que uma instituição composta por profissionais especializados e não pertencentes ao ente representado ofereceria um melhor desempenho das funções sociais de representação jurídica, judicial e extrajudicial, consultoria e assessoramento da União Federal, porquanto tais funções devem ser exercidas de maneira crítica, criteriosa e legalmente balizada. 

Pelo exposto, deve a AGU ser encarada como uma instituição autônoma em relação aos entes que representa e, também, devem seus membros manter vinculação apenas com ela, AGU. Vejamos, agora, que o ordenamento jurídico pátrio reforça e amadurece tal visão, a despeito de não realizá-la em sua inteireza.

4.2.1. Da autonomia orgânica da AGU

A qualificação da AGU como instituição essencial à Justiça, e não como órgão da Presidência da República, Ministério ou autarquia especial vinculada ao Ministério da Justiça, traz o primeiro aspecto que reforça a autonomia orgânica da mesma, na medida em que a AGU não foi colocada como integrante do Poder Executivo. Observe-se que o afastamento orgânico da AGU em relação ao Poder Executivo, traz a conclusão de que a mesma representa judicialmente os três Poderes da República, o Ministério Público e a Defensoria Pública.

Não elide a autonomia orgânica da AGU em relação ao Executivo o fato de que o Advogado-Geral da União é escolhido pelo Presidente da República, vez que os Ministros do STF  e o Procurador-Geral da República também o são[38].

Outrossim, também não elide a mencionada autonomia o fato de que Advogado-Geral da União tem “status” de Ministro de Estado, pois os requisitos para a ocupação do cargo de Advogado-Geral da União são os mesmos exigidos para os Ministros do Supremo Tribunal Federal.

            Como a discussão acerca da autonomia orgânica da AGU enseja matéria de interpretação constitucional, vez que a AGU é uma instituição de dignidade constitucional, pertinente colacionarmos, mais uma vez, recente posição do STF sobre o assunto, consubstanciada no voto do Min. Dias Tóffoli:

 

“Ora, o que temos aí? Temos que tanto o Ministério Público, quanto a Advocacia Pública, quanto a Defensoria Pública são instituições que não integram nenhum dos Três Poderes. Ele estão separados do Legislativo, quanto do Executivo, quanto do Judiciário. É bem por isso que não temos, na nossa tópica constitucional, a possibilidade de dizer que o procurador é da autarquia. Não existe isso na nossa disciplina constitucional. Se formos analisar a Advocacia-Geral da União, a lei de organização do Poder Executivo não faz referência a ela. Quem integra o Poder Executivo, única e exclusivamente,é o Advogado-Geral da União, e não a Advocacia-Geral da União. E nem poderia ser diferente, porque, no texto constitucional, ela não está dentro do Poder Executivo. Bem por isso, que os procuradores federais, que fazem a representação judicial e o trabalho de consultoria das autarquias federais, não integram essas autarquias.” (TOFFOLI, Ministro Dias, RE 558.258, 2010)[39]

            Pelo exposto, fica pontificado que a AGU é uma instituição constitucional autônoma em relação ao Executivo.

            Malgrado tal autonomia orgânica, a AGU ainda não foi contemplada com a devida autonomia orçamentária e administrativa, instrumentos esses indispensáveis à consecução de seus misteres sociais e institucionais. Para cumprir seu papel de instituição essencial à Justiça, a AGU deve gozar de autonomia plena: orçamentária, administrativa e orgânica.

            O ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

(Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004), em seu art.5º, busca sanar o problema da autonomia orçamentária, dispondo que o plano plurianual, a lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual dotarão a Advocacia-Geral da União dos recursos necessários ao desempenho de suas funções constitucionais, conforme propostas apresentadas pelo Advogado-Geral da União ao Presidente da República, para encaminhamento ao Congresso Nacional. Acresce, ainda, no parágrafo único do artigo, que as dotações orçamentárias destinadas à Advocacia-Geral da União não estão sujeitas a contingenciamento ou redução de qualquer espécie.

            Ainda no mesmo anteprojeto, a autonomia administrativa é tratada no art. 6º, com a previsão de que as propostas legislativas da Advocacia-Geral da União de criação e extinção dos seus cargos, órgãos e serviços auxiliares e de remuneração dos seus membros e servidores serão apresentadas pelo Advogado-Geral da União diretamente ao Presidente da República para encaminhamento ao Congresso Nacional.

 

4.2.2. Da autonomia funcional dos membros da AGU.

As competências atribuídas à AGU e aos seus membros não são exercidas em sistema de hierarquia funcional, caracterizado por sucessivas cadeias de comando, sendo esse um traço distintivo do Poder Executivo.

Outrossim, veja-se que membros de uma instituição essencial à Justiça, que não integra o Executivo Federal, não podem ficar vinculados a Ministérios ou autarquias. Em vista disso, foi ajuizada a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4297, a fim de que se considerem inconstitucionais duas expressões contidas na Lei Complementar 73/93, que tratam da subordinação administrativa da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e das consultorias jurídicas da Advocacia Geral da União ao Ministério da Fazenda e aos Ministros de Estado, respectivamente. O argumento básico para a declaração de inconstitucionalidade das expressões reside no fato de que a AGU e seus órgão integrantes foram criados para atender, com independência, aos Três Poderes da República.

Todavia, as atribuições dos membros da AGU não podem ser exercidas com absoluta autonomia, sob pena de se comprometer o papel da mesma de viabilizar o implemento e defesa de boas políticas públicas.

Assim sendo, é necessário conferir-se aos membros da AGU certo grau de discricionariedade, possibilitando-lhes a análise discricionária de certas situações, para viabilizar transigências judiciais e extrajudiciais, bem como o reconhecimento de pedidos administrativos e judiciais, tudo com vistas a se defender o interesse público. É que a Lei, bem como os hierarcas de qualquer instituição, não podem prever todas as situações que se apresentarão no cotidiano da vida administrativa, devendo aquele agente, em contato direito com um problema específico, dar-lhe a melhor providência. Aliás, essa capacidade de adaptação e resposta é que irá avaliar a capacidade de uma instituição cumprir sua missão social.

Contudo, a discricionariedade dos membros da AGU não pode ocasionar entendimentos discrepantes entre si, deflagradores de insegurança jurídica, razão pela qual, quando uma questão alcançar repercussão geral, em vários órgãos de uma entidade, e alcançarem, também, maturidade jurídica, através de amplo debate democrático, deve o Advogado-Geral da União, ou o Conselho-Superior da AGU, emitir súmulas e pareceres, unificando os entendimentos. Tais uniformizações de entendimento vincularão aos membros da AGU.

Dessarte, se inexistir súmula ou parecer vinculante do Advogado-Geral da União ou decisão do STF em controle concentrado ou difuso de constitucionalidade, poderá o membro da AGU exercer sua autonomia funcional de maneira ampla, respeitando-se, evidentemente, outras limitações decorrentes de lei expressa[40]

O ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004), em seu art. 3º, explicita que são princípios institucionais da Advocacia-Geral da União a unidade, a indivisibilidade, a indisponibilidade da defesa do interesse público e, nos termos desta Lei Complementar, a autonomia funcional (realcei). Quando o projeto dispõe que a autonomia funcional será exercida nos termos da lei, cabe o entendimento de que a autonomia será conformada pelos deveres e vedações impostos ao membro da AGU, limites esses já expostos no item 5.3.2.

        

CONCLUSÃO: O PAPEL DA AGU NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO BRASILEIRO.

 

No ensaio vestibular, adentramos o desfecho do estudo vertente, e após nos debruçarmos sobre uma multitude conceitos, analisarmos e compilarmos várias leis, dissecarmos complexas teses e propormos toda sorte de intrincadas questões jurídicas, devemos ao leitor uma conclusão, uma contribuição para o mundo jurídico, de maneira que, no presente ensejo, não poderemos nos furtar de responder a seguinte indagação: qual o perfil de Advocacia Pública para a AGU demanda o Estado Democrático de Direito Brasileiro?

Duas teses bem conhecidas se nos apresentam para definir tal perfil. Relembremos:

a) A da Advocacia de Governo, em que a Advocacia Pública deve defender o Governo, compreendido esse como o conjunto de pessoas, eleitas ou por elas indicadas, que desempenham o papel de confeccionar as deliberações superiores de Estado ou, por outras palavras, de determinar as políticas públicas constitutivas de seu plano de governo, programa esse chancelado pela maioria do povo. Nesse viés, a Advocacia Pública materializaria sua atuação na defesa dos interesses do Governo, os interesses públicos secundários, materializados nas políticas públicas governamentais, sem se ocupar da análise de sua coerência com os interesses públicos primários.

b) A da Advocacia de Estado, em que a Advocacia Pública defenderia o Estado, materializado nas pessoas jurídicas de direito público, que possuem interesses próprios (interesses públicos primários) e autônomos em relação aos interesses de seus representantes político-administrativos (interesses públicos secundários). O perfil da Advocacia de Estado implica que o compromisso da Advocacia Pública seria com os interesses públicos primários titularizados pela pessoa jurídica de direito público e esculpidos na Lei (Constituição e demais leis), mesmo que contrariando políticas públicas.

Para melhor responder a indagação de coroamento do estudo e escolher corretamente um perfil para a Advocacia Pública Pátria, precisamos entender para quem escolhê-lo.  Dessarte, devemos ter em mente que escolheremos um perfil de Advocacia Pública para um Estado Democrático de Direito: deve, assim, atender aos imperativos do Estado, da Democracia e do Direito.

Os imperativos do Estado são atendidos quando a Advocacia Pública age com vistas a manter e afirmar a existência do mesmo, ciente de que a própria existência do Estado é um instrumento para a promoção do bem comum. O Estado, por sua vez, só pode harmonizar a convivência em sociedade e propiciar a todos os direitos fundamentais (interesses públicos primários), se dispuser de políticas públicas eficientes (interesses públicos secundários) e implementá-las.

Os imperativos da Democracia pedem que a Advocacia Pública defenda a pluralidade política no Estado, assumindo, por vezes, postura contra-majoritária, defendendo as minorias. Assim, se uma política pública ofender à direitos fundamentais de um grupo minoritário, deve a Advocacia Pública emitir pareceres desfavoráveis à mesma, ou, mesmo, recusar sua defesa judicial.

Os imperativos do Direito só serão implementados se a Advocacia Pública, como instituição constitucional, balizar sua atuação na obediência às leis. Se uma política pública esbarrar em vedação legal, a Advocacia Pública não poderá encampar sua defesa e deverá repudiá-la no controle interno de legalidade.

Isso posto, qual dos dois perfis já apresentados preenche todos os imperativos do Estado Democrático de Direito? A nosso sentir, nenhum deles. Consoante já asseveramos no tópico 5.4.1., todos os modelos, se conduzidos a purismos, apresentarão graves inconvenientes, ou inviabilizando a governabilidade do Estado, ou conduzindo-o a uma promiscuidade administrativa.

Dessa maneira, o modelo de Advocacia Pública que melhor atenderia o Estado Democrático de Direito Brasileiro seria um que eliminasse os graves inconvenientes dos outros dois modelos, mas que conservasse seus traços positivos. Com isso, resta-nos construir um modelo que: 1) opere o controle e vigilância dos atos estatais sem, com isso, desamparar o administrador, 2) harmonize os interesses públicos primário e secundário, vez que ambos são relevantes ao Estado, 3) promova a governabilidade e eficiência do Estado sem sacrificar a autonomia da Advocacia Pública e 4) promova a prevenção e rápida solução de litígios.

Estamos, assim, a pedir por um modelo híbrido de advocacia pública que realize a harmonização de interesses, o amortecimento de tensões, e a pacificação social, ou seja, que defenda o princípio democrático, munindo os entes estatais e seus representantes dos meios necessários (políticas públicas) para promover os interesses públicos primários de que são titulares. Intitulemos, assim, tal modelo de Advocacia Pública Democrática. Expliquemo-lo, pois:

Os caracteres distintos da Advocacia Pública Democrática são:

1) A Advocacia Pública Democrática propõe-se a defender a pessoa jurídica de direito público e, também, seus dirigentes, na exata medida em que os mesmos atuem dentro nos limites legais, pois, quando esses assim o fazem, não transbordam do mandato público de que estão investidos.

Dessarte, os “clientes” da Advocacia Pública Democrática serão as pessoas jurídicas de direito público, que titularizam os interesses públicos primários, e, também, seus dirigentes, autores das políticas públicas, confeccionadas dentro dos limites legais.

Com isso, a Advocacia Pública concorrerá para o controle da atividade estatal, sem, contudo, desamparar o bom administrador.

2) A Advocacia Pública Democrática propõe-se a defender imediatamente as políticas públicas e mediatamente os interesses públicos primários, o que se processará pela harmonização daquelas com esses. Veja-se que ambos os interesses serão defendidos simultaneamente.

Os interesses públicos primário e secundário têm existências jurídica e política autônomas e não se confundem, mas são duas realidades que podem ser compatibilizadas e, teleologicamente, devem sê-lo, a bem da paz e harmonia sociais. É que o interesse público secundário, como interesse-meio, tem sua razão de ser precisamente na sua capacidade de realizar o interesse público primário, o interesse-fim.

Dessa maneira, o papel da Advocacia Pública deve ser o de auxiliar o administrador público a confeccionar políticas públicas idôneas a concretizar os interesses públicos primários. A idoneidade da política pública nascerá de sua obediência à Constituição e às demais leis, obediência essa não só formal, como substancial, pois não só o processo de criação, aplicação e fiscalização da política pública deve estar em consonância com a Constituição, mas, também, sua substância, sua sintonia material com o espírito da Lei Maior. 

A Advocacia Pública, conduzindo o processo de análise de adequação, material e formal, de uma política pública à Constituição e às demais leis, realizará eficiente controle de legalidade e constitucionalidade da atividade Estatal e concorrerá diretamente para a confecção de políticas públicas melhores.

3) A Advocacia Pública Democrática propõe-se a racionalizar a defesa do Estado e de seus dirigentes, através da uniformização interna de entendimentos administrativos, sem, com isso, sacrificar uma salutar autonomia a seus membros.

Havendo vários entendimentos sobre uma política pública, todos eles legais, o entendimento a ser adotado pela Advocacia Pública deve ser aquele preferido pela Administração Pública, vez que é ela é a legitimada a eleger o melhor interesse-meio, evitando-se, assim, a discrepância de tratamentos e insegurança jurídica. 

Tal preferência da Administração Pública por um certo entendimento deve ser formalizada por súmulas e pareceres do dirigente máximo da Advocacia Pública, que vincularão a seus membros nas situações por eles compreendidas.

Ressalte-se, todavia, que as súmulas e pareceres do Dirigente Máximo da Advocacia Pública, contendo as uniformizações de entendimento, devem ser reservadas apenas para casos que, à exemplo das súmulas vinculantes, tenham repercussão geral e uma discussão jurídico-política amadurecida. Inclusive, o Conselho Superior da Advocacia Pública, como órgão plúrimo, deveria participar da edição de tais atos.

Fora dos casos acima, a autonomia funcional dos membros da Advocacia Pública deve ser garantida, sob pena de sufocarmos a pluralidade de opiniões exigida em qualquer democracia, e inviabilizarmos a capacidade da Administração adequar-se ao caráter múltiplo dos fatos da vida.  

Esse procedimento garantirá governabilidade e eficiência ao Estado, segurança jurídica à coletividade, sem se olvidar da autonomia funcional dos membros da Advocacia Pública, o que propiciará uma pluralidade de opiniões, consagradora do regime democrático.

4) A Advocacia Pública Democrática propõe-se a realizar a prevenção e rápida solução dos litígios, pelo manejo de substitutivos da Jurisdição, como é o caso das Câmaras de Arbitragem[41], e ampliação da possibilidade de transações judiciais, sendo essas sempre motivadas.

Expostos os elementos de uma Advocacia Pública Democrática, verifica-se que, com a promoção da governabilidade e eficiência Estatais, do implemento do controle de suas atividades e da confecção de políticas públicas acordes com a Constituição e demais leis da República, a mesma oferta à coletividade segurança, entendimento e paz sociais, conquistas seculares do Direito, realizando, assim, a mais eficiente defesa do princípio democrático. Decorrência desse seu papel relevante de defender o princípio democrático de maneira tão eficaz e imediata é a sua transformação em cláusula pétrea do Estado Brasileiro, pois, se as hipóteses do art. 60, §4º, da CRFB/88, são cláusulas pétreas pois são instrumentais à defesa do regime/princípio democrático, com muito mais razão deve sê-lo a Advocacia Pública.

Em arremate, e pelo que expusemos no corpo deste trabalho, acreditamos que a Advocacia-Geral da União deve adotar uma postura institucional que a amolde ao perfil de uma Advocacia Pública Democrática, pois, palmilhando esse caminho, a Instituição alçará o patamar que a sua importância história, política e social reclamam, a de instituição constitucional permanente e insuprimível do Estado Democrático de Direito Brasileiro.     

 

REFERÊNCIAS.

 

ADIN 4297, Relator Ministro Celso de Melo, Proposta por UNAFE – União dos Advogados Públicos Federais em face do Congresso Nacional e do Presidente da República.

ACÓRDÃO STF, RE 558258/SP, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, DJE n 51, Divulgado em 17-03-2011, Publicado em 18-03-2011, Ementário n. 2484-01.

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ANTEPROJETO DE LEI ORGÂNICA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO, elaborado pelo grupo de trabalho previsto na Portaria n° 386, de 16 de julho de 2004.

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CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL de 5 de outubro de 1988.

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LEI 8.112, de 11 de dezembro de 1990.

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NEVES, André Luiz Batista. Advocacia Pública: problemas e soluções. In: PAIVA, Mário Antônio Lobato de. A importância do advogado para o direito, a justiça e a sociedade. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

OLIVEIRA, José Otaviano de. Artigo: Advocacia Geral da União: estrutura e funcionamento. Revista Virtual da AGU, Ano VI, n.º 48, de janeiro de 2006. Disponível em: http://www.agu.gov.br/sistemas/site/TemplateTexto.aspx.

SABÓIA, Marcelo Rocha e Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. Artigo: Advocacia-Geral da União. Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados: Brasília, 2005.

SESTA, Mário Bernardo. Artigo: Advocacia de Estado: Posição Institucional. In: Revista de Informação Legislativa, nº 117/197, 2006.

ANEXO I: LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS.

AGU – Advocacia-Geral da União.

Art. - Artigo.

CSAGU – Conselho Superior da Advocacia-Geral da União.

CGAGU – Corregedoria-Geral da Advocacia-Geral da União.

CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil.

INSS – Instituto Nacional do Seguro Social.

LC – Lei Complementar.

MP – Ministério Público.

MS – Mandado de Segurança.

PGF – Procuradoria-Geral Federal.

PFN – Procuradoria da Fazenda Nacional.

PU – Procuradoria da União.

RE – Recurso Extraordinário.

Resp – Recurso Especial.

STF – Supremo Tribunal Federal.

  

[1]     Estado do --bem-estar social--, caracterizado, justamente, por ser um Estado promotor de políticas públicas garantidoras de diversos direitos, majoritariamente direitos de segunda e terceira geração, quais sejam, direitos sociais e difusos, que dependem, para seu implemento, de uma postura positiva do Estado, uma postura de realização material de atos concretos de gestão, aplicação de recursos.

[2]     Formalização existencial que o aparta de outras realidades sociais de pessoas, como a família.

[3]     O surgimento do Estado encontra explicação fértil em Teorias como a do “Pacto Social”.

[4]     A Advocacia de Estado em sentido estrito será tratada mais a frente, e faz alusão à tese de que a Advocacia Pública está comprometida com o interesse público primário, e não com o secundário, materializado nas políticas públicas.

[5]     SESTA, Mário Bernardo. Artigo: Advocacia de Estado: Posição Institucional. In: Revista de Informação Legislativa, nº 117/197, 2006.

[6]     Utilizaremos as expressões Advocacia Pública e Advocacia de Estado em sentido lato como sinonímias.

[7]     SESTA, Mário Bernardo. Idem,

[8]     Como vimos, foi necessários subtrair-se do MP tais funções típicas de advocacia pública, devido à alta complexidade das funções de Advocacia Pública e devido às incongruências de, por vezes, a mesma instituição ver-se obrigada a encampar interesses contraditórios (demandar e defender o Estado).

[9]     Era, de fato, Advocacia Pública, mas se concentrava primordialmente na área Fiscal-Tributária.

[10]    A Avvocatura dello Stato, pode-se dizer, além da atuação tributário-fiscal da Avvocatura Erariale, desempenhava atuações dentro do direito administrativo, constitucional e civil, passando, assim, a desempenhar uma advocacia estatal plena, quase como a que hoje se concebe.

[11]    Utilizamos Advocacia Pública com iniciais maiúsculas para se referir à Instituição, e minúsculas para a atividade em si.

[12]    Fazenda Nacional nada mais é que o aspecto financeiro da União.

[13]    Na célebre expressão de Pontes de Miranda.

[14]            Processo MS nº 0011562-68.2010.403.6100 - 1ª Vara Cível da Subseção Judiciária de São Paulo.

[15]    Veja-se que não são todos os direitos previstos na lei 8.112 que são assegurados aos membros da AGU, isso porque a natureza do cargo impõe tratamento diferenciado. Por exemplo, como a jornada de trabalho dos membros da AGU é maleável, sendo cumprida, por vezes em locais outros que não a sede do serviço, adicionais de insalubridade, trabalho noturno e extraordinário são despiciendos. Todavia, a matéria é polêmica.

[16]    Art. 39, §4º, CRFB/88.

[17]    Art. 37, XV, CRFB/88.

[18]    Proventos são as remunerações pagas à título de aposentadorias e pensões.

[19]    A concessão de tal benefício está sujeita a tantos condicionantes e comprovações que é melhor nem cogitar do mesmo.

[20]    São as populares DASs.

[21]    Art. 92. É assegurado ao servidor o direito à licença sem remuneração para o desempenho de mandato em confederação, federação, associação de classe de âmbito nacional, sindicato representativo da categoria ou entidade fiscalizadora da profissão ou, ainda, para participar de gerência ou administração em sociedade cooperativa constituída por servidores públicos para prestar serviços a seus membros, observado o disposto na alínea c do inciso VIII do art. 102 desta Lei, conforme disposto em regulamento e observados os seguintes limites: (Redação dada pela Lei nº 11.094, de 2005) (Regulamento)

      I - para entidades com até 5.000 associados, um servidor; (Inciso incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)

      II - para entidades com 5.001 a 30.000 associados, dois servidores; (Inciso incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)

      III - para entidades com mais de 30.000 associados, três servidores. (Inciso incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)

[22]    Creio que o dispositivo equivoca-se ao colocar a conjunção aditiva “e” após a menção às altas-autoridades. Deveria ter sido utilizado a conjunção adversativa “ou”, para cada chefe de Poder decidir sobre a conveniência de se liberar o servidor para o estudo ou missão no exterior. No caso de membro da AGU, seria o presidente da República a autoridade máxima a deliberar sobre a conveniência da liberação.

[23]    Não é por se tratar de Instituição Constitucional Pública que as dependências que abrigam as Procuradorias da AGU perdem a garantia em comento.

[24]    Situação essa que pode ocorrer quando um membro da AGU atuar na defesa de servidor público.

[25]    Veja-se que tal garantia, inclusive, está na identidade funcional dos membros da AGU.

[26]    Tal prerrogativa estende-se a todos os membros da AGU, vide artigo 2o, da Lei 11.094/2005.

[27]    Tal prerrogativa estende-se a todos os membros da AGU, vide art. 17, Lei 10.910, de 15 de julho de 2004.

[28]    Veja-se que a lei diz “em qualquer caso”, de sorte que tal prerrogativa não pode ser suprimida por meio de argumentos falaciosos e questionáveis como o de que a intimação pessoal dos membros da AGU não se coaduna com o rito dos juizados especiais federais.

[29]    Na prática, até o presente momento, não se tem os limites legais do Direito de Greve, mas se sabe que os serviços essenciais não podem parar e outros serviços devem garantir um contingente de funcionamento mínimo – plantões.

[30]    Ideal seria se a intimação pessoal fosse por meio de remessa dos autos ao membro da AGU.

[31]    Principalmente da intimação pessoal, que muitos membros do Judiciário consideram um privilégio inconveniente.

[32]    Art. 653 e seguintes, do Código Civil Brasileiro.

[33]            NETO, Diogo Figueiredo Moreira. Artigo: As funções essenciais à Justiça e as procuraturas constitucionais. Revista Jurídica APERGS: Advocacia do Estado. Ano 1, nº 1 Set. 2001. Porto Alegre: Metrópole.

[34]    ISTO É BRASIL, Revista. Edição 2087. Publicação 18 de novembro de 2009. Entrevista com o Advogado-Geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, p. 6-8.

[35]            CASTRO, Aldemário Araújo. Advocacia de Estado versus Advocacia de Governo. Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/. O autor é veemente em seu repúdio à Advocacia de Governo.

[36]    Veja-se que, a princípio, caberia ao Ministério Público a defesa direta do interesse público primário.

[37]            CASTRO, Aldemário Araújo. A Advocacia-Geral da União como instituição. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2186465/a-advocacia-geral-da-uniao-como-instituicao

[38]    Art. 84, XIV e XVI, CRFB/88.

[39]            ACÓRDÃO STF, RE 558258/SP, Relator Ministros Ricardo Lewandowski, DJE n 51, Divulgado em 17-03-2011, Publicado em 18-03-2011, Ementário n. 2484-01, Voto do Ministro Dias Tóffoli, p. 1.

[40]    Como o limite de 60 salários mínimo para acordos nos juizados especiais federais.

[41]    É espécie de contencioso administrativo, substitutivo da jurisdição, em que os litígios resolvidos, preventivamente, ou mesmo com processo em curso, no seio da Administração.

 

 

Elaborado em outubro/2014

 

Como citar o texto:

GONÇALVES, Daniel Diniz.A Advocacia-Geral Da União No Estado Democrático De Direito Brasileiro. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1214. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-constitucional/3309/a-advocacia-geral-uniao-estado-democratico-direito-brasileiro. Acesso em 1 dez. 2014.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.