RESUMO: Diante de um crime é importante a colheita de provas para subsidiar uma futura ação penal com autoria e materialidade, esse procedimento em grande parte é realizado pela polícia judiciária via inquérito policial, porem surge no ordenamento jurídico pátrio a figura do Ministério Público colher seus próprias provas e realizar um procedimento investigatório autônomo, denominado PIC, que corre paralelo ao inquérito policial, gerando assim controvérsias acerca de sua legitimidade, sendo então necessário analisar os posicionamentos da doutrinas, das leis e do Supremo Tribunal Federal - STF pela possibilidade  legalidade de tal ação por parte do “Parquet”.

PALAVRAS-CHAVE: Ministério Público. Investigação Criminal. Inquérito Policial. Poderes Implícitos.

ABSTRACT: In the face of a crime, it is important to collect evidence to subsidize a future criminal action with authorship and materiality. This procedure is largely carried out by the judicial police through a police investigation. Own investigation and to carry out an autonomous investigative procedure, called PIC, that runs parallel to the police investigation, thus generating controversies about its legitimacy, being therefore necessary to analyze the doctrinal, legal and Supreme Federal Court (STF) positions for the legality of such Action by the "Parquet".

KEYWORDS: Public Prosecution Service. Criminal investigation. Police Inquiry. Implicit Powers

1.      INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por finalidade apresentar o que já foi alvo de diversos conflitos entre os tribunais brasileiros, doutrinadores e controverso para a polícia judiciaria, que divergiam na legitimidade de atuação do órgão do Ministério Público na fase pré-processual, ou seja, a intervenção do “Parquet” em face da obtenção de provas de autoria e materialidade e sua legitimidade legal na condução do inquérito ministerial.

A pouco tempo atrás diversos questionamentos foram levantados sobre a possibilidade de Ministério Público investigar e posteriormente oferecer a denúncia, sem ofender as atribuições dos agentes públicos responsáveis pelas investigações, visando ainda dirimir a importância da atuação do Ministério Público nas políticas criminais.

O referido conflito tem cunho constitucional, pois tais instituições afirmam que são partes legítimas para exercer o poder de investigação, e se baseiam nos fundamentos legais trazidos pela Constituição Federal de 1988.

De um lado, o “Parquet” defende que no momento em que a Constituição Federal lhe conferiu poderes legais para proteger os interesses individuais, coletivos e difusos indisponíveis a sociedade, sendo ele o guardião da lei, automaticamente também lhe foi concedido não só apresentar a ação penal pública, mas também executar diligências quando julgar necessário. Dessa forma, o “Parquet” é considerado uma instituição de suma importância na segurança do Estado Democrático de Direito.

O Ministério Público, não está vinculado ao Inquérito Policial, o Código de Processo Penal, traz em sua redação no parágrafo 5º do artigo 39, a possibilidade do “Parquet” promover a ação penal sem que seja instaurado o Inquérito Policial, dependendo apenas que sejam apresentados elementos suficientes, indício e materialidade, para a propositura da ação, podendo assim realizar sua própria investigação criminal, resultando essa na colheita de materialidade e na busca pela autoria das infrações penais sem, no entanto invadir a ceara do inquieto policial que é conduzido pela autoridade policial, o delegado de polícia civil.

Nestor Távora defende a posição que já que o Ministério Público pode o mais, que é propor a ação penal, ele também seria parte legítima para exercer o menos, que seria a parte de investigação, ou seja, conduzir o Inquérito Ministerial, segundo a Teoria dos Poderes Implícitos. (TÁVORA, 2016, p. 133 e 134)

Há também o posicionamento que o “Parquet” já exerce a investigação de crimes há muito tempo, e não poderia ser isso, objeto de conflito nos tempos atuais.

Tourinho Filho traz a seguinte ideia, “O inquérito policial é peça meramente informativa. Nele se apura a infração penal com todas as suas circunstâncias e a respectiva autoria. Tais informações têm por finalidade permitir que o titular da ação penal, seja o Ministério Público, seja o ofendido, possa exercer o “jus perseguendi in judicio”, isto é, possa iniciar a ação penal” (TOURINHO, 2010, p.249)

Já outra corrente tem posição completamente contrária, afirmando que o Ministério Público não poderia de forma alguma exercer diligencias para sustentar uma futura propositura de ação penal, pois não poderia a mesma pessoa investigar e acusar, não sendo parte imparcial, mas sim um colecionador de condenações.

A Constituição Federal traz em seus incisos VIII e IX, do artigo 129, a tarefa do Ministério Público exercer apenas o controle da atividade realizada pela Polícia Judiciária, como por exemplo, requisitar diligências e a instauração de inquéritos, bem como exercer outras funções com essa finalidade.

Sendo assim, são nítidas as divergências entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária referente à investigação criminal, então eis que surgem as controvérsias acerca do tema: é legítimo o Procedimento de Investigação Criminal-PIC, realizado pelo Ministério Público paralelo ao inquérito policial e como se posiciona a doutrina, as leis e o Superior Tribunal Federal em relação a tal procedimento?

Com o objetivo de esclarecer as divergências acerca do tema proposto e pontuar se é válida a atuação do Ministério Público na investigação criminal paralela ao Inquérito Policial este artigo se valeu da utilização de diversas fontes, entre elas: bibliográficas doutrinárias, legislações esparsas, jurisprudência do STF como também a luz da Constituição Federal de 1988, utilizando dos métodos dedutivos.

O presente trabalho compõe-se de três seções, a primeira busca demonstrar como funciona o sistema de investigação criminal em diversos países e como se divide a estrutura acerca da investigação no âmbito do Ministério Público e quais as suas atribuições e poderes, posteriormente apresentando um breve relato histórico acerca de como o Brasil evoluiu ao longo do tempo em relação a investigação criminal.

Na segunda seção, o objetivo é apresentar os princípios penais  constitucionais que são os balizadores para o estado democrático de direito, seguindo para as instituições do Ministério Público e da Polícia Judiciário e o papel social que exercem e finalizando na abordagem dos procedimentos de investigação vigentes em nosso ordenamento jurídico.

Na terceira seção busca-se apresentar o que é o foco do referente trabalho, busca responder como de fato o Ministério Público realiza a função de órgão de investigação, a base legislativa e a posição jurisprudencial da Suprema Cortem frente ao referido tema.

 

2. A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MUNDO

Com a evolução da humanidade e consequentemente a necessidade de uma melhor organização na busca de se viabilizar a vida em sociedade, se tornou necessário punir aqueles que infringiam as leis, costumes ou regulamentos adotados em dado momento por um grupo de indivíduos.

 Na Antiguidade a aplicação de pena mais comum era a expulsão indivíduo, o que poderíamos para os dias atuais comparar a vedada pena de banimento em nosso ordenamento jurídico pátrio, sendo assim aquele indivíduo era expulso e teria que sobreviver por conta própria, sendo a morte na maioria dos casos o destino mais comum, devido a fome, ataque de animais ferozes ou doenças, porém já era necessário uma forma de investigação ou um meio de se provar a culpa daquele que viria a ser condenado. (Nucci, 2016, p. 60)

Pois bem, se torna importante uma visão global dos procedimentos de investigação criminal em alguns países, antes de abordarmos como essa investigação é realizada no Brasil.

Na França o Ministério Público  conduz o inquérito policial, sendo que a policia judiciaria colhe as provas, indícios e toma suas ações sob o comando do “Parquet”, conforme cita Valter Foleto Santin (SANTIN, 2001, p. 93).

“Ocorrido um crime, a policia atende a ocorrência e comunica ao Ministério Público encarregando-se do processo verbal, dirigido pelo “Parquet”. Depois, a Procuradoria da República, por meio de ato de requisição aciona o Juizado de Instrução, nas hipóteses obrigatórias. Ao final da instrução, a pedido do Ministério Público, o Juiz de Instrução decide sobre o prosseguimento da acusação ou determina o arquivamento. Se for decisão de prosseguimento, a instrução é avaliada por uma Câmara de Acusação (“Chambre d’ Accusation”). Posteriormente, o Ministério Público sustenta a acusação e o julgamento é realizado pelo Judiciário, por órgão diverso do Juiz de Instrução” .

Na Alemanha quem dirige o procedimento de investigação criminal é o Ministério Público, podendo esse criar normas a serem seguidas pela policial judiciaria como também ter a discricionariedade de escolher quais crimes investigará, deixando os demais a cargo da policia judiciária. Por fim cabe ressaltar que é dever do Ministério Público alemão fiscalizar a polícia, entretanto não existe a subordinação. (ANDRADE, 2008, p. 70 e 71.)

Portugal admite a investigação direta do Ministério Público na fase de investigação, podendo esses praticar todos os atos ou procedimentos para a produção de provas e a formação de sua convicção acerca da existência da infração penal ou não, porém todo esse poder de investigação é auxiliado pela polícia criminal, que desempenha suas funções subordinadas ao “Parquet”. (CARNEIRO, 2007, p. 72)

O Ministério Público na Itália compõe a Magistratura italiana, juntamente com os Juízes de Direito, não havendo separação de carreiras, conforme o Código de Processo Penal italiano. O Ministério Público Italiano é o responsável legal pela investigação criminal, “indagini preliminari”, assim cabe a ele as investigações preliminares de investigação sem prejudicar os atos da polícia criminal italiana. (SANTIN, 2001, p. 115).

Temos casos como na Inglaterra onde não existe um órgão de acusação do Estado, sendo esse um modelo do “Common Law”, onde entidades civis ou o próprio ofendido procura seus direitos, ficando para a Polícia a figura da investigação criminal produzindo que subsidiam as futuras ações movidas por aqueles. (CABETTE, 2009, pg 17).

Por fim, nos Estados Unidos não existe apenas um órgão que poderá investigar, sendo cabível a Polícia como também ao Ministério Público. O processo penal possui duas fases: a primeira de investigação que pode ser atribuição tanto da Polícia como do “Parquet”, e a segunda a de julgamento por juiz ou júri. (CARNEIRO, 2007, p. 70 e 71)

 

2.1 HISTÓRIA DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL

Podemos iniciar o estudo da investigação criminal no Brasil com as Ordenações do Reino. Como não existia no Brasil, no seu descobrimento, leis e nenhuma legislação vigente, passou-se a adotar as leis de Portugal. Em uma sequencia temporal vigoraram: Ordenações Afonsinas (1446), Ordenações Manuelinas (1521), Ordenações Filipinas (1603 a 1830), criou-se o Código Criminal do Império (1830), advindo do projeto elaborado por Bernardo Pereira de Vasconcellos. (Nucci, 2016, p. 67 e 68)

O Código Criminal do Império, 1830, trouxe uma visível discriminação, a classe burguesa buscou usar a lei para impor aos escravos penas diferenciadas como a pena de morte em casos específicos, sendo ainda julgados por um júri e sem a possibilidade de qualquer recurso. Diferentemente a classe burguesa era protegida em excesso e não eram responsabilizados por vários crimes. (Nucci, 2016, p. 67 e 68)

Em 1832 surge o Código de Processo Criminal do Império, esse novo código trouxe alguns avanços como o instrumento do Habeas Corpus que era previsto em seu artigo 4º: “todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento em sua liberdade, tem o direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor”. Atualmente esse instituto continua previsto em nossa Constituição Federal de 1988, no art. 5.º, LXVIII. (Avena, 2017, p. 879)

Em 1941 surge o Código de Processo Penal, que trouxe em seu bojo a continuidade da realização do inquérito policial que já era utilizado desde o período do Império. (Avena, 2017, p. 597)

Em 1941 o Brasil adotava a superada investigação preliminar policial, o novo Código de Processo Penal (1941), trouxe via inquérito policial uma inovação já usada na época na Europa (França, Espanha, Itália e Alemanha), introduzindo assim o juiz de instrução. (Lopes, 2017, pg. 119)

Já em 1988, a Constituição Brasileira, que trouxe uma gama de direitos e garantias fundamentais e afastou de vez a autoridade o autoritarismo penal que visava unicamente manter a ordem pública impondo ao povo os anseios dos governantes. Nesse sentido houve de fato uma divisão do procedimento penal em fase investigativa, que seria realizada pela polícia, e a fase processual na qual figuraria o Ministério Público. Art. (Avena, 2017, p. 34 e 35)

3.  PRINCÍPIOS PENAIS A LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

A Constituição Federal de 1988 traz diversos princípios constitucionais já versavam acerca do direito penal e processual penal, trazendo garantias ao cidadão que estivesse em meio a uma investigação penal ou um processo penal em andamento, alguns desses princípios estão expostos de forma explicita e outros de forma implícita, por fim esses princípios devem ser observados por todos aqueles agentes envolvidos no processo penal ou na investigação criminal. (OLIVEIRA, 2017, p.33).

Alguns princípios trazem consigo uma ligação intensa com o os direitos penais e processuais penais como: princípio da legalidade, culpabilidade, da “ultima ratio”, proibição de excesso, proporcionalidade.

O princípio da Legalidade está previsto no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal, que diz: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Alguns doutrinadores pregam que o princípio da legalidade engloba também o princípio da reserva legal, sendo esse uma “espécie” do principio da legalidade, sendo que somente lei poderia impor alguma obrigação legal. (OLIVEIRA, 2017, p.173).

Como via de regra o cidadão é livre, porém diante de um acontecimento que ingresse na esfera criminal a culpabilidade é um importante princípio a ser seguido no sentindo de não se condenar previamente uma pessoa que não foi julgada e condenada por sentença transitada em julgado, ou seja, o poder punitivo do Estado é limitado ao preenchimentos dos requisitos legais pré-estabelecidos, limitando o poder punitivo estatal.(OLIVEIRA, 2017, p.018).

Ao falarmos desse princípio no direito penal ou processual penal, entendemos que antes da intervenção do direito penal é necessário a utilização dos outros ramos do direito para a solução dos conflitos de maneira menos invasiva possível a vida do cidadão, sendo então o direito penal a “ultima ratio”, ou o ultimo recurso utilizado pelo o Estados para exercer o seus poder punitivo. (OLIVEIRA, 2017, p.077).

O princípio da proibição do excesso traz em seu bojo que é dever do Estado de punir o cidadão conforme pré-estabelecido pela lei, em contrapartida o criminoso não deve ser punido além dos limites legais, logo no cumprimento do dever de aplicar a punição o Estado deve garantir que sejam executadas as normais legais e os princípios constitucionais. (OLIVEIRA, 2017, p.197).

3.1 MINISTÉRIO PÚBLICO E A POLÍCIA JUDICIÁRIA

A figura do Ministério Público aparece de forma tímida nas Ordenações Manoelinas em 1521, trazendo algumas prerrogativas ao Promotor de Justiça, já em 1603 nas Ordenações Filipinas, o Promotor de Justiça era nomeado pelo Rei e chamava-se “Promotor de Justiça da Casa de Suplicação”, em 1609 seria editada uma lei que traria de forma taxativa o Ministério Público. Em 1824, após a independência do Brasil, constaria o Ministério Público na Constituição daquele ano como também no Código de Processo Penal do Império. Do mesmo modo, acentua Antonio Augusto Mello de Camargo Ferraz: As Ordenações Manuelinas de 1521 já mencionavam o Promotor de Justiça e suas obrigações perante as casas de suplicação e nos juízos das terras. Nelas estavam presentes as influências do direito francês e canônico. Segundo estas, o Promotor deferia ser alguém: letrado e bem entendido para saber espertar e alegar as causas e razões, que para lume e clareza da justiça e para inteira conservação dela convêm.  (MACHADO, Op. cit., p.16)

Após a independência  do   Brasil,  constata-se   a  inserção   do “Parquet” na Constituição de 1824 e no Código de Processo Penal do Império, na primeira Constituição Republicana em 1891 o cargo de Procurador Geral da República seria escolhido entre os Ministros do Superior Tribunal Federal. (Revista Ministério Público Dist. Fed. Territ., Brasília, n. 9, p. 117-156, 2015)

Na Constituição de 1937 o cargo de Procurador Geral da República se tornou de livre nomeação, enfraquecendo o Ministério Público em sua forma institucional, pois esse ficaria à mercê dos interesses políticos da época, como atualmente são os Ministros. (R. Minist. Públ. Dist. Fed. Territ., Brasília, n. 9, p. 117-156, 2015)

Em 1946, CF/1946, os membros do Ministério Público ganharam a estabilidade e inamovibilidade de forma  relativa. Em 1967, ditadura militar, o Ministério Público tinha suas atribuições no capitulo do Poder Judiciário, já em 1967 o Ministério Público apareceria atrelado ao Poder Executivo, sendo o o chefe do MP de livre nomeação e exoneração do Presidente da República. (R. Minist. Públ. Dist. Fed. Territ., Brasília, n. 9, p. 117-156, 2015)

Somente em 1981, com a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei Complementar nº 40), que o Ministério Público passou a ter de fato suas prerrogativas básicas e uma organização definitiva, a Constituição de 1988 sacramentou o papel da instituição sendo esse incluso no Capitulo IV “Das Funções Essenciais à Justiça”, na Seção I, da CF/1988. (Lei complementar nº 40, 1981)

Polícia que no grego significa, “politéia” de polis (cidade), ou seja, polícia da cidade, seguindo para o latim na forma de “politia”, traz o sentindo que de organização do governo da cidade, ou de pessoa que tem como oficio a organização da guarda urbana. Disponível em: (https://dicionariodoaurelio.com/policia›. Acesso em: 04 Jun. 2017)

No Brasil as primeiras atividades policiais vide um lei foi no ano de 1760, com a figura do Intendente-Geral de Polícia da Corte e do Reino, que tinha como atribuição à manutenção da ordem pública, da segurança e paz pública e poderia utilizar os mais diversos poderes legais com uma ilimitada jurisdição, após a independência no ano de 1825, se criaria o cargo de Comissário de Polícia na Província do Rio de Janeiro. (NARO, N. et al A polícia na Corte e no Distrito Federal. Rio de Janeiro, Série Estudos Puc-RJ n.3,1981.p. 17)

 Porém o marco importante é a criação da Polícia Judiciária através da lei nº 261 de 1841, criando a figura do Delegado de Polícia e Subdelegado de Polícia, posteriormente em 1871 houve a separação da Justiça e da Polícia com a Reforma do Judiciário. (BRASIL, Lei nº 261, 1841)

Atualmente em nosso texto constitucional, CF/88,traz a polícia judiciária como a responsável a reprimir as infrações penais (crimes e contravenções) como também a de apresentar os infratores à Justiça, para a necessária punição, importante citar que estão ressalvados os crimes militares, (art. 144, §§ 1º e 4º da Constituição Federal). É exercida pelas polícias civis estaduais ou pela Polícia Federal e por outros órgãos do poder público. O inquérito policial, por sua vez, nem sempre é necessário para instruir a denúncia oferecida pelo Ministério Público.

Com o intuito de definir Polícia Judiciária, Julio Fabbrini  Mirabete, escreve:

“A Polícia, instrumento da Administração, é uma instituição  de direito público, destinada a manter e a recobrar, junto à sociedade e na medida dos recursos de que dispõe, a paz pública ou a segurança individual. Segundo o ordenamento jurídico do País, à Polícia cabem duas funções: a administrativas (ou de segurança) e a judiciária. Com a primeira, de caráter preventivo, ela garante a ordem pública  e impede a prática que possam lesar ou pôr em perigo bens individuais ou coletivos; com a segunda, de caráter repressivo, após a prática de uma infração penal, recolhe elementos que elucidem para possa ser instaurada a competente ação penal contra os autores do fato. (...) de acordo com a Constituição Federal, às polícias  civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a  competência da  União,  as funções  de  polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”. (MIRABETE, 2004, p.73 e 74.)

Nesse sentido pode-se notar que a CF/88 trouxe uma divisão de atribuições das policias, cada uma dentro da sua peculiaridade, sendo que é missão constitucional das policias civis apurar as infrações penais, através do Inquérito Policial dirigido por Delegado de Polícia.

3.2 ESPÉCIES DE PROCEDIMENTOS INVESTIGATÓRIOS NO BRASIL

Existem diversos meios ou procedimentos de investigação, porém cada um com sua peculiaridade e de acordo com o limite legal previamente previsto, o mais comum e usual é o uso da expressão inquérito policial, que tem o Delegado de polícia como autoridade responsável, que é o termo utilizado frente a uma investigação criminal. Porém existem outras formas de investigação tais como: Inquérito Militar, Sindicâncias e o Processo Administrativo Disciplinar, Inquérito Florestal, Inquérito Civil (Ministério Público), Procedimento de Investigação Criminal-PIC (Ministério Público), Inquérito Judicial (falências), e a Comissão Parlamentar de Inquérito-CPI, são exemplos de investigação que não se confundem com o Inquérito Policial. (Nucci, 2017, p. 58)

O Inquérito Policial consiste no procedimento de diligencias que visam sustentar uma futura ação penal e que conta com provas contundentes e indícios de autoria e materialidade, sendo reduzido a termo.

A luz da Constituição Federal de 1988 o inquérito policial tem base legal no artigo 129, inciso VIII, nas funções institucionais do Ministério Público, e, implicitamente, no artigo 144, parágrafo 4º, que trata das atribuições da Polícia Civil.

Segundo Mirabete a função do inquérito policial é: “o inquérito policial visa à apuração de fato que configura infração penal e respectiva autoria, para servir de base à ação penal ou providenciar cautelares”. (MIRABETE, op. cit., p.82.)

O inquérito policial-IP possui características próprias. Inicialmente podemos dizer que a oficialidade é uma característica do IP, pois somente poderá ser instaurado por órgão oficial, que no caso é a Policia Civil., ele possui caráter inquisitorial já que não são passiveis de aplicação a ampla defesa e o contraditório ao inquérito policial, já que na fase processual essa oportunidade será concedida a parte Ré. Outras características são da indisponibilidade, sigilosidade e a forma escrita. (Avena, 2017, p. 124)

Conforme preconiza o parágrafo único do artigo 4º do Código de Processo Penal, a atividade de investigação não é exclusividade da Polícia Judiciária, podendo outros órgãos da administração pública promover de acordo com suas atribuições legais. (BRASIL, Lei nº261, 1841)

 “Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e de sua respectiva autoria.

Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função”.

A lei da Ação Civil Pública (7.347/85) permite o procedimento administrativo investigatório chamado de Inquérito Civil, que será conduzido pelo Ministério Público, buscando apurar infrações e posteriormente o ajuizamento da ação civil publica. Importante esclarecer que não são infrações de cunho penal interesses transindividuais.  Se o Ministério Público tiver indícios ou embasamentos que o levem ao conhecimento completo que houve infração, não será necessário o Inquérito, podendo propor a ação. (BRASIL, Lei 7.347, 1985)

O inquérito judicial consiste em um instrumento processual específico da falência, que tinha por intuito angariar elementos que demonstrassem a prática de comportamento delituoso pelo falido, possibilitando ao representante do Ministério Público concluir pela ocorrência ou não de eventual crime falimentar. (Avena, 2017, p. 524)

O artigo 58, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988 diz:

“As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores”. (BRASIL, Constituição Federal, 1988)

Sabe-se que os poderes exercem sua função típica mas também exercem funções atípicas, no caso da CPI o Poder Legislativo, além de sua função de legislar, também exerce os poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, com algumas exceções, com previsão no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, por fim é importante frisar que a Comissão Parlamentar de Inquérito não julga, mas somente investiga e caso comprove alguma irregularidade, remeterá ao Ministério Público que promoverá o processo de responsabilidade civil ou criminal do político. (Avena, 2017, p. 339)

4. INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

A Constituição Federal de 1988 legitimou e consolidou o Ministério Público, instituindo no capítulo “Das Funções Essenciais à Justiça”, trazendo as atribuições, organização e garantias, tornando assim o MP independente frente aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Segundo o artigo 127, caput, da CF/88, considera-se Ministério Público:

“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

Cabe ao MP defender o regime democrático, os interesses sociais e individuais indisponíveis, zelar pelo cumprimento das leis e pela responsabilização dos infratores e proteger direitos indisponíveis do cidadão, o que engloba todos os direitos sociais e alguns individuais, sendo o fiscal da lei e da Constituição. Também na Constituição Federal, em seu artigo 127, § 1º, dispõe que “são princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”. (BRASIL, Constituição Federal, 1988)

Pode-se deduzir que as atribuições elencadas na Constituição para o ministério Público compõem um rol exemplificativo, tal fato se confirma pois a própria Constituição Federal deixou em aberto outras atribuições ao MP, desde que tenha afinidade com finalidade.

Como de costume a investigação criminal é atribuição da Polícia Judiciária, tendo o “Parquet” à função de fiscalizar, exercendo assim o controle externo.

Podemos iniciar o debate acerca da possibilidade de investigação do Ministério Público analisando dos argumentos desfavoráveis, inicialmente a Polícia Judiciária seria a responsável pela investigação e a persecução penal, tendo o MP único e exclusivamente a fiscalização, requisição e a formação de sua opinião em relação ao delito, para o oferecimento de uma futura ação penal. Tal posição tem fundamento no artigo 144, inciso IV e § 4º, da CF/88, que regem a atuação das polícias civis, e no artigo 129, incisos VII e VIII, referentes às funções institucionais do Ministério Público, mais especificamente ao controle externo da atividade policial e à requisição de diligências investigatórias e de instauração de inquérito policial. (BRASIL, artigo 144, inciso IV e § 4º, 129, incisos VII e VIII, CF/88)

O artigo 144, § 1º, inciso IV, CF/88, também é utilizado como argumento contrário legitimidade da investigação penal pelo promotor de justiça, pois caberia a Polícia Judiciária agir de forma exclusiva na investigação criminal: “A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União”. (BRASIL, artigo 144, § 1º, inciso IV, CF/88)

Talvez o ponto mais incisivo para aqueles que são contra o poder de investigação criminal do MP, que não é o que defendemos, é a falta de previsão legal para tal ação, sendo assim o “Parquet” estaria impossibilitado de promover a investigação criminal, podendo esse apenas requisitar diligencias e a instauração do inquérito policial, conforme o artigo 129, VIII, da Constituição Federal de 1988, e o artigo 26, inciso IV, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público via Lei 8.625/93. (BRASIL, art. 129, VIII, CF/88 e art. 26 inciso IV, Lei 8.625/93)

Seguindo a linha de raciocínio acerca da não possibilidade de investigação criminal do “Parquet’, cabe a esse ser o mais imparcial possível no seu convencimento de autoria e materialidade acerca de um crime, nesse sentido feriria tal sentindo o próprio promotor investigar e oferecer a denúncia, conforme diz José Carlos Fragoso:  “Trata-se de um acúmulo perigoso de atribuições, que sobre ser ilegal e inconstitucional é absolutamente inconveniente, pois dá lugar ao excesso de poder a ausos intoleráveis”. (“São ilegais os ‘procedimentos investigatórios’ realizados pelo MPF. Artigo publicado na Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: RT, vol. 10, n. 37, p. 241-251, jan-mar 2002.)

Do ponto de vista favorável a investigação criminal pelo Ministério Público, opinião na qual corroboramos, podemos destacar inicialmente que não existe o monopólio da investigação criminal por parte da Polícia Judiciária (Policia Civil e Federal), desta feita não pode-se usar artigo 144, § 1º, inciso IV, pautado em exclusividade e sim na repartição do que seria atribuição da Polícia no campo Estadual ou na seara dos interesses da União. Em seguida segue o que traz o referido artigo:

“A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União”.

Acerca de conteúdo legal que possa justificar a atividade de investigação por parte do Ministério Público cabe citar o artigo 129, IX, da Constituição da República, onde dispõe que além das funções explícitas tais como as funções institucionais do Ministério Público, esse poderá ainda exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que vinculadas com a sua finalidade. Novamente se depreende que não se trata de um rol taxativo quanto as atribuições do “Parquet”, podendo ainda a legislação infraconstitucional dispor acerca dessas atribuições. Podemos assim verificar que não existe uma vedação constitucional, pelo contrário, existe uma norma constitucional permissiva de forma implícita no sentindo do Ministério Público investigar, desde que atrelado as suas funções e finalidades. (BRASIL, art. 129, IX, CF/88)

Se tratando de legislações infraconstitucionais, podemos citar alguns dispositivos legais: como a Lei Complementar nº 75/93, Estatuto do Ministério Público da União, que traz previsão legal da atividade de investigação pelo Promotor de Justiça, não restringindo essa ao âmbito do Direito Civil.

O Estatuto da Criança (Seção V do Capítulo III do Título VI) e do Adolescente e do Estatuto do Idoso (no artigo 74, V e VI) possuem a previsão legal para instauração para averiguação de ilícitos penais.

Outro ponto importante é a produção de provas durante a investigação criminal, PIC, pelo “Parquet”. Guilherme Nucci argumenta não ser favorável a investigação criminal pelo Ministério Público pois esse pode não agir com  imparcialidade e justifica tal posicionamento alegando que no durante a investigação criminal, via PIC, o “Parquet” não presta contas a ninguém, não sofrendo nenhuma fiscalização que obste a apurar uma possível ilegalidade ou vício no curso da investigação. (Nucci, 2017, p. 59)

Nesse sentindo até a própria Constituição justifica a não ilegalidade da produção de provas pelo MP pois diz em seu artigo  5º, inciso XXXV, que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Ora, nesse sentindo qualquer abuso ou ilegalidade poderão ser sustados do processo na fase processual, onde as provas produzidas têm presunção relativa e precisam superar o crivo do contraditório e da ampla defesa, mais uma vez afastando qualquer ilegalidade na investigação criminal realizada pelo “Parquet”.

A lei Complementar 75/93 em seu artigo 8º, dispõe:

“Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: I - notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; II - requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta; IV - requisitar informações e documentos a entidades privadas; V - realizar inspeções e diligências investigatórias; VI - ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio; VII - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; VIII - ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a  serviço de relevância pública; IX - requisitar o auxílio de força policial”.

Outro dispositivo infraconstitucional vem no artigo 201, caput e inciso VII, da Lei nº 8.069/90, que diz que:

“Compete ao Ministério Público: VII - instaurar sindicâncias, requisitar diligências investigatórias e determinar a instauração de inquérito policial, para apuração de ilícitos ou infrações às normas de proteção à infância e à juventude”.

Já o artigo 74, caput e inciso VI, da Lei nº 10.741/03: “Compete ao Ministério Público: VI – instaurar sindicâncias, requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, para a apuração de ilícitos ou infrações às normas de proteção ao idoso”.

Ponto de suma importância seria a tese jurídica de que se o Ministério Público pode oferecer a denúncia, qual seria o impedimento deste de investigar, ora, a investigação criminal é menos abrangente sendo o oferecimento da ação penal um instituto que absorveria o da investigação criminal. Nesse sentindo podemos destacar a Teoria dos Poderes Implícitos na defesa da atuação do “Parquet” na perscrutação criminal. (Lenza, 2016, pg. 1011)

Também se posiciona dessa forma Mauro Fonseca Andrade:

“Em termos práticos, a Teoria dos Poderes Implícitos, também chamada de “implied powers”, nada mais seria do que a teorização do velho brocardo latino “Qui potest maius, potest et minus”, ou seja, quem pode o mais pode também o menos, criado por Ulpiano. Somando, pois, o brocardo latino “Qui potest maius, potest et minus” a essa teoria, e analisando a atual situação constitucional do Ministério Público, à conclusão óbvia chegam seus defensores: se o Ministério Público é o titular da ação penal ( o que seria o mais) também poderá ele fazer suas próprias  investigações  (  o  que  seria  o  menos),  a  fim  de  que possa melhor exercer essa titularidade e se convencer sobre o oferecimento ou não da acusação”. (ANDRADE, op. cit., p.177 e 178)

Analisando a luz do Código Processual Penal podemos concluir que existem dispositivos elencados que deixam espaço para atuação do Ministério Público em uma fase investigativa.

Art. 4º - A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Parágrafo único - A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função”.

Outro dispositivo legal que vem confirmar o posição favorável ao Ministério Público é §5º do art. 39 do CPP. Que diz:

“Art. 39, §5º - O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a Denúncia no prazo de 15 (quinze) dias”.

Analisando o artigo acima citado se depreende que se o inquérito policial, realizado pela Polícia Judiciária, é dispensável quando o Ministério Público obter elementos que fundamentem a sua opinio delicti baseado em procedimento paralelo ao IP, não podemos apoiar a tese que seria ilegal uma atuação do MP na busca de materialidade ou autoria, pois o próprio artigo justifica e possibilita que o “Parquet” tenha os meios necessários para que possa fundamentar sua opinião sobre determinado crime, e a partir daí oferecer ou não a devida denúncia. (BRASIL, §5º do art. 39 do CPP)

Trazendo outros dispositivos que justificam a investigação criminal realizada pelo Ministério Público, podemos trazer o Estatuto do Ministério Público da União, Lei Complementar 75/1993, que diz em seu artigo 8º, inciso V, pela viabilidade do Promotor de Justiça realizar procedimentos de investigação. Outra lei, 8.625/93, artigo 80, Lei Orgânica dos Ministérios Públicos Estaduais, diz que as normas que regem o Ministério Público da União poderão ser utilizadas subsidiariamente pelos Ministérios Públicos Estaduais. (BRASIL, art. 8º, inciso V, Lei Complementar 75/1993 e art. 80 da Lei 8.625/93).

Analisando o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/90, constatamos pela legitimidade de investigação criminal realizada pelo “Parquet”, na Seção V do Capítulo III do Título VI, quando da apuração de ato infracional, posteriormente os artigos 174 e 175 tornam obrigatório a apresentação do menor ao Promotor de Justiça. (BRASIL, Lei nº 8.069/90)

O Estatuto do Idoso traz no artigo 74, V e VI, a instauração de procedimento na via administrativa e da possibilidade de instaurar sindicância.

Analisando os argumentos desfavoráveis ao poder de investigação do Ministério Pública não logram êxito em suas sustentações, pois não existe uma invasão por parte do “Parquet” nas atribuições do Delegado de Polícia, esse que é um agente público de suma importância para a manutenção da lei e tem suas prerrogativas constitucionais, mas existe apenas um procedimento paralelo ao Inquérito Policial, existindo dessa forma uma soma de forças por instituições que devem combater os ilícitos penais, trazendo mais eficiência para toda sociedade, não trazendo prejuízo aos Delegados e nem um esvaziamento de suas atribuições. (Távora, 2016, p. 134)

4.1 ACESSO DO ADVOGADO A INVESTIGAÇÃO DO “PARQUET”

Sabe-se que é pacifica a posição que o advogado tem a prerrogativa de ter acesso as diligencias já realizadas, desde que já estejam juntadas ao relatório do referido inquérito policial. (Nucci, 2017, p. 66 e 67)

Questão relevante é saber se o advogado teria ou não acesso ao procedimento investigatório, denominado PIC – Procedimento de Investigação Criminal. (Nucci, 2017, p. 66 e 67)

Os estudos acerca do assunto ainda são escassos, porém Guilherme Nucci aborda tal tema. Para o referido autor, o advogado deve ter acesso aos autos da investigação que já estejam protocolados ou juntados no PIC, excluindo-se apenas as informações ou providencias investigatórias ainda em curso de execução buscando assim minimizar uma possível fiscalização sem controle por parte do Ministério Público. (Nucci, 2017, p. 66 e 67)

Por fim a segunda turma do Supremo Tribunal Federal se posicionou diante do HC 87.827/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, reafirmando posição anteriormente já adotada no seguinte sentido: “Advogado. Investigação Sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponivel ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso Amplo. Assistência Técnica ao cliente ou constituinte”. Nesse sentindo se resguardou o direito do advogado ao acesso em Procedimento de Investigação Criminal conduzido pelo “Parquet”. (Nucci, 2017, p. 66 e 67)

4.2 POSIÇÃO JURISPRUDÊNCIAL DO STF

O tema em questão trouxe vasta polemica entre as mais diversas instituições Federais e Estaduais, forçando em dado momento que o Supremo Tribunal Federal se posicionasse. Antecipando o posicionamento, o pretório excelso teve o entendimento pela procedência do Ministério Público realizar a investigação criminal.

O Supremo Tribunal Federal, em 2009, enfrentou o tema ao julgar o Habeas Corpus nº91661, no HC impetrado o réu buscavam trancar a ação penal argumentando que as investigações conduzidas pelo Ministério Público era ilegítimas e que não seria possível a investigação e posterior oferecimento da denuncia pelo promotor que investigou. A decisão do Superior Tribunal Federal foi em favor da permissividade de investigação do “Parquet”, o que gerou o informativo nº 538:

“Ministério Público e Poder Investigatório

Relativamente à possibilidade de o Ministério Público promover procedimento administrativo de cunho investigatório, asseverou-se, não obstante a inexistência de um posicionamento do Pleno do STF a esse respeito, ser perfeitamente possível que o órgão ministerial promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito. Entendeu-se que tal conduta não significaria retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais (artigos 129 e 144), de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos, mas também a formação da opinio delicti. Ressaltou-se que o art. 129, I, da CF atribui ao “Parquet” a privatividade na promoção da ação penal  pública, bem como, a seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia. Aduziu-se que é princípio basilar da hermenêutica constitucional o dos poderes implícitos, segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Destarte, se a atividade-fim — promoção da ação penal pública — foi outorgada  ao “Parquet” em foro de privatividade, é inconcebível não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que peças de informação embasem a denúncia. Considerou-se, ainda, que, no presente caso, os delitos descritos na denúncia teriam sido praticados por policiais, o que, também, justificaria a colheita dos depoimentos das vítimas pelo Ministério Público. Observou-se, outrossim, que, pelo que consta dos autos, a denúncia também fora lastreada em documentos (termos circunstanciados) e em depoimentos prestados por ocasião das audiências preliminares realizadas no juizado especial criminal de origem. Por fim, concluiu-se não haver óbice legal para que o mesmo membro do parquet que tenha tomado conhecimento de fatos em tese delituosos — ainda que por meio de oitiva de testemunhas — ofereça denúncia em relação a eles. (BRASIL, STF, 2009)

Consolidando o seu posicionamento jurisprudencial o Superior Tribunal Federal em 2015, em seu Plenário, negou provimento do RE 593.727/MG (14.05.2015), de forma a dar Repercussão Geral ao referido julgado, condicionando apenas a atividade de investigação do parquet respeitar os direitos e garantias que todos os investigados possuem.  (Avena, 2017, p. 94)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Constituição Federal de 1988 trouxe consigo uma gama de direitos individuais e coletivos como também instaurou o estado democrático de direito.

Quanto ao Ministério Público esse teve na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei Complementar nº 40) em 1981 uma grande transformação, e posteriormente visando garantir e fiscalizar o estado democrático de direito, a Constituição Federal de 1988 deu ao Ministério Público previsão de atribuições mais especificas e organizou sua estrutura de forma a servir toda sociedade da forma mais efetiva possível.

Predominante nos países afora o do Ministério Público atua coordenando e executando o Inquérito Policial, juntamente com a Policia porém o Ministério Público exerce o papel de chefiar o procedimento investigatório.

São os legitimados via Constituição Federal como órgãos da segurança pública: Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, as Polícias Civis, as Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros Militares.  O inquérito policial ficou a cargo das Policias Judiciarias, na busca pela elucidação e da investigação de autoria e materialidade, sendo um suporte para o oferecimento de uma futura ação penal. 

A Constituição Federal de 1988 trouxe consigo uma organização institucional ao Ministério Público, no capítulo “Das Funções essenciais à Justiça”, sendo a legislação mais importante ao longo do tempo para o Ministério Público no Brasil, já nos artigos 127 e 129, trazem os princípios e as funções orgânicas do “Parquet”.

Grande controvérsia surgiu em relação ao poder do Ministério Público atuar efetivamente na investigação criminal, sem invadir as atribuições da Policia Civil, as opiniões pela atuação investigativa ou não do “Parquet” surgem pela interpretação de princípios, leis e pela atribuições concedidas pela Constituição Federal de 1988

Sabe-se que existe no Brasil outros meios de investigação que a legislação infraconstitucional tornou acessível a outros agentes públicos, não cabendo falar do Inquérito Policial por ser monopólio do Delegado de Policia, esses outros instrumentos podem ser: Inquérito Judicial, Comissão Parlamentar de Inquérito e Inquérito Civil.

Ainda, na legislação infraconstitucional, há previsão de investigação criminal realizada pelo “Parquet” no Estatuto do Ministério Público da União e na Lei Orgânica dos Ministérios Públicos Estaduais, por fim, existe também dispositivos legais sobre a matéria nos Estatutos da Criança e do Adolescente e do Idoso.

Respondendo o problema proposto no referido artigo, pode-se notar que a investigação criminal por parte do Ministério Público é válida, desde que esse não invada as atribuições do Delegado de Polícia, ou seja não usurpará função de nenhum outro agente público que por lei execute seus afazeres. Logo já é sedimentado que Promotor de Justiça realize a investigação criminal paralela ao Inquérito Policial, já que o IP é dispensável quanto ao oferecimento da futura ação penal oferecida pelo MP. Polemicas se instalaram acerca do tema, tanto na doutrina quanto nas ações levadas ao judiciário, na busca pela ilegalidade da investigação realizada pelo Parquet.

Os Tribunais Superiores se posicionaram a favor da investigação do Ministério Público, sendo que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, em decisões recentes votaram pela legitimidade do Ministério Público, praticar atos de investigações criminais sem ferir nenhum preceito constitucional. Para tal fundamento o argumento mais forte foi a Teoria dos Poderes Implícitos, que se o Promotor de Justiça poderá oferecer a denuncia o que é a fase mais abrangente, ele poderia também investigar o fato, fato esse que antecede a fase processual, produzindo provas com valor probatório relativo e que serão colocadas ao crivo do contraditório e da ampla defesa na fase processual. Desta feita, é pacífica a possibilidade de investigação do Ministério Público.

Por fim, o presente trabalho esclareceu e demonstrou que é legal o Procedimento de Investigação Criminal-PIC, realizado pelo Ministério Público, respondendo assim as questões controvérsias acerca do tema.

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Data da conclusão/última revisão: 2017-06-09

 

Como citar o texto:

ASSIS, Luís Felipe Feijo Carvalho de..A atuação do Ministério Público na investigação criminal. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 27, nº 1445. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/3656/a-atuacao-ministerio-publico-investigacao-criminal. Acesso em 10 jun. 2017.

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