O presente estudo tem por escopo investigar qual modalidade de lançamento tributário se aplica a figura jurídica do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza e com base nessa classificação analisar a controvertida questão relacionada à decadência tributária.

O Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza encontra previsão constitucional inserta no inc. III, do art. 153, CF/88, que confere competência à União Federal para sua instituição, bem como são fixados os princípios norteadores da modalidade tributária, e no § 2º, encontram-se estabelecidos os critérios: generalidade, universalidade e progressividade dessa exação.

Os arts. 43 a 45 do CTN estabelecem as normas gerais atinentes ao imposto de renda, os quais cuidam de definir os arquétipos legais. As leis federais 7.713/98 e 9.250/95, fixam regras e o Decreto 3000/99 regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do IRPF e IRPJ.

No que concerne à base econômica a "Renda" é acréscimo patrimonial produto do capital do trabalho e os "Proventos" são considerados acréscimos patrimoniais decorrentes de uma atividade que já tenha cessado. É importante ressaltar ser imanente às duas realidades (Renda e Provento) o acréscimo patrimonial e, apenas e tão somente, na sua ocorrência no mundo fenomênico que se aperfeiçoa a exação fiscal.

Portanto, o direito subjetivo afeto ao sujeito ativo pretensor do crédito tributário exsurge inapelavelmente, respeitando-se o princípio da realização da renda sempre que o contribuinte obtiver renda (renda em sentido amplo, abriga renda em sentido estrito e proventos de qualquer natureza).

Delimitado conceitualmente e de forma condensada o conceito, base legal e os principais aspectos do imposto de renda e proventos de qualquer natureza faz-se mister avançar para análise da natureza jurídica de seu lançamento tributário. Uma das grandes discussões havidas era fixar se o IR era modalidade de lançamento por declaração ou lançamento por homologação.

Cumpre observar que após o advento do Decreto-lei nº 1.967/82 que promoveu a desvinculação do prazo de pagamento e não havendo mais exame prévio do lançamento pela autoridade administrativa não remanesce mais dúvidas sobre a natureza jurídica do lançamento relativo ao imposto de renda, ou seja, trata-se de lançamento por homologação.

Como cediço essa modalidade está prevista no art. 150 da Lei 5.172/66 (CTN), in verbis:

Art. 150 - O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente homologa."

Destarte, nessas ocorrências dá-se por parte do contribuinte a antecipação do pagamento do tributo sem que o fisco promova qualquer exame prévio. Acerca da natureza jurídica do lançamento por homologação do IR já se manifestou o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

"TRIBUTÁRIO - PRESCRIÇÃO - REPETIÇÃO DE INDÉBITO - TERMO INICIAL - IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. A retenção do tributo na fonte pagadora é inconfundível com a extinção do crédito tributário. O crédito tributário não surge com o fato gerador. Ele é constituído com o lançamento (Art. 142 do CTN). Em se tratando de Imposto de Renda, o lançamento deve ocorrer após as informações do sujeito passivo, na declaração de ajuste (Lei nº 8.383/91, artigo 15) ou pela informação da fonte que promoveu a retenção; Qualquer das hipóteses leva ao exame dos artigos 147 e 150, § 4º. Não havendo homologação expressa, ela ocorreria tacitamente, decorridos 05 (cinco) anos do fato gerador e só aí há a extinção do crédito.

Recurso parcialmente provido" (Recurso Especial 250306/DF - Primeira Turma - Rel. Min. Garcia Vieira - Julgado em 06/06/2000 - DJU de 01/08/2000).

A doutrina também já firmou posição acerca da natureza do lançamento tributário relativo ao imposto de renda, in verbis:

"Sob essa ótica, por exemplo, são compatíveis com o "lançamento por homologação" por se ajustarem integralmente à hipótese prevista no artigo 150 do CNT: O Imposto sobre a Renda, o IOF, os impostos sobre o comércio exterior (II e IE), a CPMF, o ICMS, o ISS, o ITR e as contribuições especiais em geral." (in. Impostos sobre a renda e proventos de qualquer natureza / Mary Elbe Queiroz - Manole - 2004, p. 295) (g.n).

"No tocante ao Imposto sobre a Renda, NÃO SE PODE CONFUNDIR que a DATA DE APRESENTAÇÃO DA DECLARAÇÃO ANUAL para o imposto, no ano subseqüente aquele da percepção e aquisição da renda, é o momento em que ocorre o próprio fato gerador e o momento do lançamento do tributo.

A declaração é, apenas, o instrumento de que se vale o sujeito passivo para informar os fatos geradores JÁ OCORRIDOS de acordo com a periodicidade em lei" (p. 350) (g.n).

Nessa mesma linha a lição do Prof. Dr. Paulo de Barros Carvalho:

"O IPI, o ICMS, o IR (atualmente, nos três regimes, jurídica, física e fonte) são tributos cujo lançamento são feitos por homologação, tudo, reitero, consoante a classificação do Código.) (g.n) (in. Curso de direito tributário / Paulo de Barros Carvalho. - 13 ed ver e atual. - São Paulo : Saraiva. 2002 - p. 423).

Kiyoshi Harada não discrepa e vaticina inapelavelmente:

"Não restam dúvidas, ao nosso sentir, de que o lançamento do imposto de renda tem natureza jurídica de lançamento por homologação" (Harada, Kiyoshi. Imposto de renda. Decadência: termo inicial e termo final. Jus Navigandi, Teresina, a7, n. 61, jan. 2003. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutirna/texto.asp?) (gn).

Fixada inquestionavelmente a natureza jurídica do lançamento tributário do Imposto de Renda Pessoa Física, como modalidade POR HOMOLOGAÇÃO, faz-se mister analisar pormenorizadamente a ocorrência da DECADÊNCIA.

É de conhecimento basilar que o prazo para homologação do lançamento relacionado ao Imposto de Renda é de 05 (cinco) anos contados da ocorrência do "fato gerador" (fjt), conforme preconiza o § 4º, do art. 150, do CTN, abaixo transcrito:

"§ 4º - Se a lei não fixar prazo para homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador, expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação."

Nessa contexto é oportuno trazer a colação a jurisprudência do STJ, acerca do prazo decadencial:

TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. TRIBUTOS SUJEITOS AO REGIME DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.

Nos tributos sujeitos ao regime do lançamento por homologação, a decadência do direito de constituir o crédito tributário se rege pelo art. 150, § 4º, do Código Tributário Nacional, isto é, o prazo para esse efeito será de 5 anos a contar da ocorrência do fato gerador; a incidência da regra supõe, evidentemente, hipótese típica de lançamento por homologação, a que pagamento do tributo não for antecipado, já não será caso de lançamento por homologação hipótese em que a constituição do crédito tributário deverá observar o disposto no art. 173, I, do CTN. Recurso Especial não conhecido. (RESP. nº 169.246/SP, AC. 2ª TURMA. DECISÃO DE 04/06/1998. RELATOR: MIN. ARI PARGENDLER. PUBL. DJ 29.06.1998, P. 153)(21).

É esse também o entendimento do Conselho de Contribuinte (Acórdão nº 101.92.642 - 1º Conselho):

DECADÊNCIA. Tratando-se de lançamento por homologação (art. 150 do CTN), o prazo para a Fazenda Pública constituir o crédito tributário decai em 5 (cinco) anos contados da data do fato gerador. A ausência de recolhimento da prestação devida não altera a natureza do lançamento, já que o que se homologa é a atividade exercida pelo sujeito passivo (Processo nº 10980.015650/97-87 0 Recurso 117700 - Sessão de 14.4.99 - DOU 30.6.00 - Relator Raul Pimentel).

A doutrina não vacila a respeito da questão:

"Segundo o § 4º, se a Fazenda Pública não proceder à expressa homologação dentro desse prazo, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito. Com isso completa-se o sistema eliminando-se qualquer possibilidade de vir um tributo a ser recebido pela Fazenda Pública, sem que o crédito tributário tenha sido constituído, pelo lançamento de ofício, ou mediante homologação, sendo esta expressa ou ficta"

"Como conseqüência, estará igualmente extinto o direito de a Fazenda Pública efetuar a lançamento de ofício pelas diferenças que, devidas, não foram pagas..." ((in. Código Tributário Nacional Comentado / Coordenador Vladimir Passos de Almeida - Zuudi Sakakiraha - Ed. Revista dos Tribunais - 2004. - p. 641).

Nessa mesma direção a posição de Eurico Marcos Diniz de Santi:

"O fato gerador dessa regra decadencial iniciará seu curso de cinco anos com a ocorrência do evento tributário, conforme dispõe expressamente a primeira parte do § 4º do Art. 150 do CTN" (g.n) (in. Decadência e Prescrição no Direito Tributário, Max Limonad, 2ª edição, 2001, p.168).

Nesse contexto, o preceito normativo inserto no § 4º, do art. 150, do CTN, trata especificamente sobre as regras de contagem de prazo decadencial (termo a quo) para os impostos lançados sobre a modalidade denominada "lançamento por homologação". Trata-se de norma específica especial e que, portanto, se sobrepõe a qualquer outra norma geral, ou seja, quando o legislador logrou tratar dessas modalidades o fez expressamente, fixando critérios objetivos aplicáveis à mesma. Assim, o termo a quo para cômputo do prazo decadencial começa a fluir a partir da ocorrência do "fato gerador", em respeito ao quanto disposto no § 4º, do art. 150, CTN.

A grande controvérsia surge em relação a parte final disposta no § 4º, do art. 150, que faz menção a ocorrência de fraude, dolo ou simulação. A jurisprudência do STJ (RE 189.421-SP) tem firmado entendimento que fixa a inteligência do art. 150, § 4º c.c inc. I, do art. 173, ou seja, o prazo começaria a fluir a partir do 1º dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ser efetuado.

Para alguns autores, dentre eles Paulo de Barros Carvalho, em relação a lacuna existente no caso de dolo, fraude ou simulação leciona que o prazo decadencial deverá seguir a regra do § 4º, art. 150 c.c inc. I, do art. 173 (CTN).

Ousa-se divergir dessa conclusão, porquanto, não se vislumbra arcabouço científico ideal, conforme segue: i) o legislador fixou topologicamente as regras próprias para as hipóteses do lançamento por homologação (ato do particular); ii) as regras do art. 173, I, II, do CTN, restringem-se especificamente aos lançamentos de ofício e por declaração; iii) repulsa ao direito tributário a interpretação extensiva; iv) o direito subjetivo ao crédito não pode se eternizar no tempo, a fim de possibilitar que esse direito durma o sono dos esquecidos e em face do contribuinte figure tal qual a espada de Damocles; v) o Estado tributante deve exercitar o princípio da eficiência (art. 37, caput, EC 19), o qual preserva ainda o interesse público, razão pela qual o prazo de 5 anos se apresenta apto e contempla o desejo constante do processo legiferante, o qual inseriu o preceito normativo disposto no § 4º, do art. 150, CTN no sistema jurídico.

Ainda que a posição aqui defendida permita colocar no mesmo patamar o contribuinte que simplesmente não tenha praticado o "ato do lançamento" daquele que tenha agido em fraude, dolo ou simulação, o que pode representar ab initio uma contradição ou um despropósito, vez que o contribuinte faltoso não sofreria qualquer gravame, mesmo neste caso teria o sujeito ativo prazo suficiente para promover os atos necessários para a constituição de seu crédito tributário e nesse momento ajoujado ao lançamento levaria a efeito a imposição de multa moratória agravada pelo ilícito praticado, ou seja, promoveria o descrimem nessa etapa.

Portanto, não se entrevê espaço para a interpretação ampliativa nitidamente fiscalista que autorize a administração fazendária ultrapassar os lindes traçados pelo legislador para os caso de lançamento por homologação (art. 150, § 4º, CTN) e aplicar analogicamente ou em cumulação o inc. I, do art. 173, do CTN, que, ressalte-se, restringem-se aos casos de lançamento de ofício e por declaração. Urge destacar que a aplicação do inc. I, art. 173, CTN, não prestigia a interpretação sistemática, ainda que possa ter esse colorido, sua opacidade se revela quando se vislumbra o quão forçado é sua aplicabilidade para o caso concreto.

Observe-se, seguindo Maximiliano, que onde o legislador não excepcionou não é lícito ao intérprete fazê-lo.

Destarte, dentre essas duas situações indesejáveis: i) ampliar demasiadamente o prazo decadêncial; ii) não existir previsão a impor situação mais gravosa ao contribuinte que tenha agido em fraude, dolo ou simulação, a segunda hipótese se afigura mais aceitável, pois continua o Fisco a contar com o prazo legal plausível de 5 (cinco) anos para a homologação, podendo fixar multa agravada, mormente nos tempos atuais em que a fazenda enxerga maldade em tudo, perpetrando no meio social uma postura voraz arrecadatória sem precedente consistente na hiperdilação do prazo para todos os casos.

Urge ressaltar que, ainda que se considere como equívoco a expressão "lançamento por homologação", porquanto, nítido ato praticado pelo particular, o certo é que num dado momento factual ocorreu certo evento concreto. É justamente a partir desse evento que se deve iniciar a contagem. Se o contribuinte praticou algum ato ou se ficou inerte, pouco irá importar e refletir para o aspecto relacionado a contagem do prazo. É esse momento marcado no tempo e concretamente ocorrido que deve servir de marco inicial, razão pela qual não se perquire sobre qualquer iniciativa do sujeito passivo.

Destaque-se que o fato de existir ou não pagamento relacionado ao signo presuntivo de riqueza não se atrela o lançamento. Deve-se considerar sempre a ocorrência factual. Explica-se: se o contribuinte percebeu renda e não declarou e resolveu correr o risco junto ao Fisco Federal e optou pela postura ilícita terá contra si, para os próximos 05 (cinco) anos a possibilidade de ser lançado o crédito tributário correspondente, sendo certo e exato que o prazo para que a administração fazendária constitua seu crédito por meio de lançamento, começará a fluir a partir da ocorrência do "fato gerador".

Assim, à posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça em relação à contagem do prazo com base no quanto disposto no art. 173 do CTN se ressente de plausibilidade, porquanto, a regra aplicável aos tributos cujo lançamento se opera por meio de ato do particular deve seguir o preceito normativo especial traçado no § 4º, do art. 150, do CTN.

Destarte, o Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza é modalidade de lançamento por homologação e em decorrência dessa característica deve seguir os lindes traçados no § 4º, do art. 150, da Lei 5.172/66, para fins de cômputo do prazo decadencial. Adite-se por termo que outro aspecto importante diz respeito a antinomia entre o art. 150 e 142, do CTN, cuja discussão deverá ser travada em outra oportunidade mas que certamente produzirá efeitos concretos em relação a tudo aqui aduzido.

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Como citar o texto:

RODRIGUES, Gesiel de Souza..Impostos de renda: Modalidade de lançamento tributário e decadência: inaplicabilidade do art. 173, CTN. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 104. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-tributario/412/impostos-renda-modalidade-lancamento-tributario-decadencia-inaplicabilidade-art-173-ctn. Acesso em 29 nov. 2004.

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