O notário, na condição de profissional do direito, se serve da metodologia jurídica para penetrar no direito e, também, dos princípios gerais da metodologia jurídica, tal qual, os demais profissionais do Direito, respeitando as suas peculiaridades profissionais.

O tabelião, na investigação profissional do direito objetivo, busca fundamento sólido para levantar sobre si uma construção técnica que logo será levada ao comércio jurídico, onde ficará exposta a suportar todas as provas de boa e da má-fé, e onde deve circular com tanta maior facilidade quanto seja sua invulnerabilidade.

O cliente do notário quer, de maneira principal, um direito certo, firme, porém, também um direito indisputável e isso é, por outra parte, o que a sociedade, por seu turno, lhe reclama. Também aqui seu labor é de natureza precautória, uma vez que consiste em acautelar os interesses dos particulares, contra as eventualidades catapultadas da incerteza jurídica.

O tabelião, na sua investigação profissional e jurídica dos direitos objetivos, bem como dos subjetivos, deve atentar a uma construção técnica irretocável e inabalável, que possa cumprir com seu mister de certeza e segurança jurídica.

O notário, na qualidade de operário do Direito, se serve da técnica jurídica,[1] que, face às peculariedades da função notarial, é aplicada de forma especialíssima. 

O ordenamento jurídico põe a serviço do notário um conjunto de esquemas nominados – compra e venda, doação, dação em pagamento, hipoteca, etc. – e a possibilidade de criar, dentro de certos limites, outros mais, inominados. Sua aptidão técnica lhe permitirá adaptar aqueles elementos da realidade a um ou outro de tais esquemas jurídicos. Desse modo, o tabelião obterá como resultado a figura de um direito subjetivo e a configuração de uma relação ou situação jurídica concreta, que deve conter o resultado econômico ou social pretendido pelas partes.

A averiguação notarial que põe o notário de posse dos elementos de fato e de direito em exame, leva-o naturalmente a um labor de confrontação da situação atual com a regra de direito, para extrair conseqüências favoráveis ou desfavoráveis em que fundar sua qualificação. No entanto, é possível, embora não seja imperioso, que a partir desse momento em que culmina a segunda etapa da atividade notarial, com a emissão de um parecer, comece outra, de caráter eminentemente técnico e que, na maioria das vezes, se faz imprescindível para se alcançar o fim almejado pelas partes, qual seja, a direta intervenção do tabelião na formalização da situação jurídica.

Na maioria das vezes, somente a instrumentalização do documento tem o condão de concretizar o objetivo perseguido pelas partes e submetido ao notário e, assim, se o ato será instrumentalizado, é preciso redigi-lo.  Deverá o notário, por si, ou por seus prepostos, lavrar o ato, isto é, redigi-lo observando diversos requisitos indispensáveis, pois essa redação originará a forma que culminará no documento notarial.

Nesse momento, deverá o notário, ou seu preposto, atentar para os requisitos legais impostos; deverá atentar para que no ato redigido constem todos os requisitos arrolados pela lei. Deverá obedecer, exemplificativamente, aos preceitos contidos nos parágrafos do artigo 215 do Código Civil Brasileiro; aos contidos na Lei no 7.433/85, bem como no Decreto no 93.240/86, que a regulamentou, a Lei no  6.015/73, a Consolidação Normativa Notarial e Registral do Estado a que está adstrito, ou o respectivo Código de Normas, e outros tantos mais.   

Os atos redigidos pelo notário deverão traduzir-se em instrumentos públicos, no caso instrumentos notariais. A lei orgânica do notariado e dos registradores, em seu artigo 7o, incisos I, II e III, assevera ser de competência exclusiva, privativa dos tabeliães, a lavratura das escrituras públicas e procurações públicas, testamentos públicos e atas notariais.

Todos os atos de competência dos notários poderão ser delegados aos seus prepostos. O artigo 1.632, I, do Código Civil de 1916, previa como exceção o testamento público, cuja competência era exclusiva do notário, não podendo ser atribuída a quem quer que seja, sob pena de nulidade. O Código Civil atual, no inciso I, do seu artigo 1.864 permite que seja escrito por tabelião ou por seu substituto legal, desde que seguidos todos os requisitos legais.

As assinaturas dos interessados no ato notarial somente podem ser colhidos na presença do Notário ou do funcionário a que foi atribuído a responsabilidade da lavratura. Não se admite a coleta de assinatura por quem não o lavrou e/ou certificou o fato constante na escritura.

A redação dos instrumentos públicos deve ser feita no idioma nacional, não se admitindo que seja redigido em qualquer outro idioma.

Os atos notariais devem ser lavrados em livros próprios utilizados na serventia e, atualmente, a grande maioria dos Códigos de Normas e Consolidações Normativas Notariais e Registrais dos Estados, permite que os atos sejam lavrados em livros de folhas soltas, conforme modelo próprio, em papel de segurança, seguindo os demais requisitos aprovados e autorizados pela Corregedoria-Geral da Justiça do respectivo Estado, ou por processo químico adequado, para posteriormente ser encadernado. Também podem ser lavrados em livros de papel pautado ou impressos, previamente encadernados, com claros necessariamente preenchidos à mão, preenchidos por meio datilográfico ou de reprodução mecanizada admitidos no sistema jurídico vigente, sendo que, em todas as formas de lavratura dos atos notariais, não se permite espaços em branco.

Os notários e/ou seus prepostos, antes da lavratura de quaisquer atos notariais, deverão verificar, entre outras coisas:

a)    se os comparecentes estão munidos dos documentos de identificação, especialmente as cédulas de identidade civil e/ou outro documento de identificação  previsto no ordenamento jurídico. Caso não possam ser identificados documentalmente, mas sejam conhecidos do Tabelião, - exclusivamente deste -, o mesmo poderá certificar tal fato, atestando a identidade da parte. Não estando munidos de documentos e não sendo conhecidos do Tabelião, poderão duas testemunhas atestar a identificação civil das partes, conforme prevê o Art. 215, § 5.º, do Código Civil brasileiro.

b)    Verificar, quando se tratar de negócio jurídico em que haja transmissão de direitos de qualquer natureza, se os comparecentes estão munidos dos Documentos de Identificação de Contribuinte da Secretaria da Receita Federal (CPF), devendo constar do ato instrumentalizado;

c)     Verificar, quando se tratar de pessoa jurídica, os documentos comprobatórios de sua existência, assim como os da representação, verificando, inclusive, se eles se encontram registrados na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e, se possuem Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) e, se este está dentro do prazo legal de validade;

d)    verificar, quando as partes se fazem presentes por meio de instrumento de mandato, se ele confere poderes específicos (especiais e expressos), se a forma é pública ou particular, e a correspondência dos demais dados constantes do instrumento. Quando se tratar de instrumento de mandato antigo, solicitar certidão atualizada, para verificar se houve ou não revogação;

e)    verificar, quando se tratar de transmissão de bens imóveis ou de direitos a eles relativos, a titularidade, as certidões de propriedade com negativa de............... ônus  e ações reais e pessoais reipersecutórias, atualizadas nos últimos 30 (trinta) dias e, se houve recolhimento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (tanto na transmissão inter vivos, como também na causa mortis);

f)      verificar, quando se tratar de pessoa, jurídica ou física, empregadora, a apresentação de Certidão Negativa de Débito para com a Previdência Social (CND), administradas pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que possui validade por 60 (sessenta) dias. Atentar para o fato de que, se o imóvel transmitido não faz e nunca fez parte do ativo permanente, e se a atividade da pessoa jurídica transmitente envolve exclusivamente a compra e venda de imóveis, locação, desmembramento ou loteamento de terrenos, incorporação imobiliária ou construção de imóveis destinados à venda, caso em que estará dispensada da apresentação de tal certidão;

g)    verificar, no caso de pessoa jurídica, a apresentação da Certidão Negativa de Débito (CND), relativamente a contribuições sociais administradas pela Secretaria da Fazenda. Atentar se o imóvel transmitido faz ou não parte do ativo permanente da pessoa jurídica transmitente e se sua atividade é o comércio de compra e venda de imóveis e outros (ver item anterior), neste caso, estará dispensada da apresentação de tal certidão (item anterior);

h)    verificar, quando se tratar de espólio, massa falida, herança jacente ou vacante ou de sub-rogação de gravame, de concordatária, incapazes e outros, que para dispor ou adquirir imóveis ou direitos  a eles relativos, dependam de autorização judicial, se estão munidos dos respectivos alvarás judiciais, com a respectiva autorização;

i)      verificar, quando se tratar de transmissão de imóveis ou de direitos a eles relativos, se o transmitente está munido das certidões negativas de débitos municipais, comprovação de pagamento de laudêmio  e certidão de autorização de transferência passada pela Secretaria do Patrimônio da União, se for o caso. Poderá, entretanto, o adquirente dispensar tal certidão, devendo nesse caso, assumir a responsabilidade pelo pagamento de eventuais débitos existentes, com exceção da Certidão passada pelo SPU, que não poderá ser dispensada, porque é necessário para o registro de qualquer escritura que envolva imóvel foreiro;

j)      verificar sempre, nos atos em que tenham por objeto imóveis rurais, Certificado de Cadastro do Imposto Territorial Rural (CCIR) lançado ou o relativo ao exercício imediatamente anterior, se o prazo para pagamento daquele não esteja vencido, verificar se está acompanhado da respectiva prova de quitação do Imposto Territorial Rural (ITR), relativamente ao último exercício, e certidão de lançamento do feito pelo órgão respectivo e, Certidão Negativa de Impostos ou, então, comprovante de pagamento dos 5 (cinco) últimos exercícios;

k)    quando se tratar de escritura de imóvel rural, a qual vislumbre desmembramento, verificar se a área desmembrada ou a remanescente, são iguais ou superiores à fração mínima de parcelamento (módulo) que se encontra citada no Certificado de Cadastro de Imóveis Rurais;

l)      verificar sempre, quando se tratar de adquirente pessoa física estrangeira  ou pessoa jurídica estrangeira, e se o imóvel for rural, se se enquadra dentro dos limites admitidos para aquisição, ou se está munido da respectiva autorização, expedida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária; e, 

m) em se tratando de desmembramento que terá como finalidade a unificação em outro imóvel rural, verificar se o remanescente não ficará com área inferior à fração mínima de parcelamento.

Cabe ressaltar, que os requisitos acima, que devem observar os notários ao lavrar os instrumentos públicos, são apenas exemplificativos e não se esgotam, pois, existem muitos outros elencados na legislação pátria que devem ser observados, tais como as restrições quanto a liberdade de dispor os bens, respeito à legítima, capacidade das partes, entre outros.

O cumprimento dos requisitos legais para a lavratura dos atos notariais são obrigatórios aos notários. É nesse momento que o tabelião afirma sob sua fé os fatos que presencia e os documentos que confere, dotando-os de autenticidade e, exercendo assim, a fé pública extrajudicial.

Essa é a fase mais solene do documento notarial, é nela que o documento se transforma em público e nasce para a vida do direito com os efeitos singulares que a lei lhe concede.

Os documentos emanados das serventias notariais, ou seja, autorizados por um notário, deverão ficar registrados na própria serventia de onde surgiram, em livros próprios, visando a sua guarda e conservação, observando as disposições contidas nos Códigos de Normas e Consolidações Normativas Notariais e Registrais de cada Estado e no Artigo 30 da Lei Orgânica Notarial, pois, a responsabilidade pela ordem, guarda e conservação do arquivo, em lugar adequado e seguro é de responsabilidade no notário titular da serventia.

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_________. Lei dos Notários e dos Registradores Comentada (Lei 8.935/94). 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. Atualizado de acordo com o Novo Código Civil (lei n. 10.406, de 10.1.2002). 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

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NERY JÚNIOR, Nelson.; NERY, Rosa Maria Andrade da. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor: atualizado até 10.03.1999. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

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VASCONCELOS, Julenildo Nunes; CRUZ, Antônio Augusto Rodrigues. Direito Notarial: Teoria e Prática. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.

[1] Segundo, Paulo Dourado de Gusmão (Op. cit. p. 27), a técnica jurídica é o “conjunto de procedimentos e artifícios aptos não só a construir, com clareza e precisão, normas jurídicas, como também capazes de facilitar a interpretação, aplicação e o aperfeiçoamento das mesmas”.

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Como citar o texto:

SANDER, Tatiana..Procedimentos dos Notários para a Lavratura de Atos Notariais. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 132. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-notarial-e-registral/659/procedimentos-notarios-lavratura-atos-notariais. Acesso em 30 jun. 2005.

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