Após longa e dura batalha judicial, JOÃO CAPIBERIBE e sua esposa JANETE CAPIBERIBE, eleitos, respectivamente, em 2002, como Senador e Deputada Federal pelo Estado Amapá na legenda do PSB tiveram seus mandatos definitivamente cassados.

O casal era acusado de comprar votos, infringindo a Lei n. 9.840/99 e em abril do ano passado o TSE (TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL) cassou os mandatos de ambos, mas, através de liminares, eles conseguiram permanecer em seus cargos até o dia 21/09 e não há mais nenhum recurso jurídico de que possam se valer. O caso foi até o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) entretanto a mais alta Corte do país entendeu que a decisão do TSE deveria ser mantida já que não era possível, através de um Recurso Extraordinário, o reexame das provas.

O pitoresco de toda essa questão é que a principal prova contra o casal foram os depoimentos de duas mulheres que disseram que haviam recebido a quantia de.....vinte e seis reais, isso mesmo R$ 26,00 (vinte e seis reais) para votar no casal, além da apreensão de R$ 15.495,00 na casa de uma militante do PSB, além de uma relação com os nomes de eleitores. O pequeno valor envolvido e o fato de somente duas pessoas confirmarem a "compra" dos votos, além de não haver ficado provado que houve envolvimento direto dos parlamentares levou muita gente do meio jurídico e político a acreditar que eles não teriam seus mandatos cassados, porém o TSE decidiu pela cassação.

Em maio do ano passado publiquei artigo no site jurídico DIREITONET a respeito da Lei n 9.840/99 intitulando-a da "LEI QUE METE MEDO NOS POLÍTICOS".

"...a edição de hoje, 02/5/04 da FOLHA DE SÃO PAULO destaca como uma matéria de capa que a Lei n. 9.840/99 foi responsável pelo afastamento de 75 prefeitos eleitos em 2000, inclusive citando nominalmente tais políticos. Essa lei, resultado de iniciativa popular, foi levada ao Congresso Nacional pela CNBB, Conferência Nacional dos Bispos, que, como se sabe, é uma entidade da Igreja Católica de reconhecida atuação social e política.

A lei em comento representou um avanço no ordenamento jurídico nacional, deixando de lado a nossa tradição da suspensão dos efeitos das decisões judiciais passíveis de recursos e, neste aspecto, satisfaz o sentimento popular e da mídia, uma vez que esses protagonistas da política vêem suas esperanças (ou desejos, interesses) frustrados nos inúmeros processos judiciais que não cominam, de imediato, com o afastamento dos condenados.

Diz a reportagem que, agora, há uma articulação no Senado Federal para alterar substancialmente essa lei, fazendo com que seus efeitos somente sejam concretizados quando do trânsito em julgado da respectiva sentença de afastamento.

Quero chamar a atenção dos leitores para o fato de que essa pretendida alteração somente beneficiará aqueles que vivem à margem da moralidade administrativa nas eleições, comprando voto e desvirtuando a vontade popular. Ora, tal alteração somente se justificaria do ponto de vista político acaso essa lei estivesse sendo utilizado de forma precipitada pela Justiça Eleitoral, mas, seguramente, essa não é a situação de fato, tanto assim que, apesar da milhares de denúncias de imoralidades administrativa que circulam no Brasil inteiro, somente 75 prefeitos foram afastados desde 2000 até a presente data o que prova que a Justiça Eleitoral vem agindo de forma serena e não ao sabor das conveniências ou pressões políticas, nestes casos.

Mais de um milhão de eleitores assinaram o projeto que terminou por se concretizar em lei, através da chamada iniciativa popular, num dos raros e bem sucedidos movimentos dessa natureza. Essa lei sendo mantida será o instrumento mais eficaz para combater a corrupção eleitoral.

O engraçado, ou melhor, lastimável, é que o próprio Congresso sinta-se incomodado com tal lei, pois até que é discutível sua constitucionalidade - já que a regra jurídica é da suspensão dos efeitos das decisões não transitadas em julgado. O prudente seria alguns dos partidos políticos questionar a constitucionalidade da lei.

Com essa Lei ocorreram duas inovações importantíssimas, a primeira é no sentido de que o candidato que de qualquer forma ou usando de qualquer artifício estiver comprando votos, além de receber a pena já prevista no código, com a tramitação do processo penal tradicional, terá mediante um procedimento sumário, seu registro cassado e ainda pagará uma multa. A outra, inibe o uso da máquina administrativa em favor da própria candidatura o que vai suceder com prefeitos candidatos à reeleição principalmente, pelo fato de poderem concorrer, sem ter que deixar o cargo.."..

Decorrido mais de um ano e ante o processo do casal Capiberibe afirmo que mantenho minhas esperanças na Lei 9.840/99, mas tenho que considerar que, com tantos recursos jurídicos disponíveis, o processo pode se arrastar por anos a fio.

Veja-se a ementa do TSE, no julgamento do Recurso Ordinário:

 

RESPE Nº 21264 RESPE - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL 2749/2003 14/04/2003 MACAPÁ - AP PROCESSO JUD250 TRE-AP - AP Judiciária Ministro Relator CARLOS VELLOSO Decisão e Inteiro Teor Julgamento em 02/09/2004 do E.Dcl. - 52642004 O Tribunal, por unanimidade, rejeitou os Embargos de Declaração, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello, Francisco Peçanha Martins, Humberto Gomes de Barros, Luiz Carlos Madeira e Caputo Bastos.

Julgamento em 02/09/2004 do E.Dcl. - 50432004 O Tribunal, por unanimidade, rejeitou os Embargos de Declaração, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello, Francisco Peçanha Martins, Humberto Gomes de Barros, Luiz Carlos Madeira e Caputo Bastos.

Julgamento em 27/04/2004 O Recurso, por unanimidade, foi conhecido como Ordinário, rejeitadas as preliminares e registrada a divergência do Ministro Francisco Peçanha Martins, relativamente à primeira delas, ou seja, ao impedimento da Juíza Stella Ramos, que S. Exª acolhia para afastar a preclusão. No mérito, por maioria, o Tribunal deu provimento ao Recurso Ordinário para impor sanção de cassação dos registros e dos diplomas expedidos, impondo multa de 15.000 (quinze mil) UFIR"s para cada um dos recorridos. Vencidos os Ministros Fernando Neves e Celso de Mello. Falaram: pelo recorrente, o Dr. Osvaldo Degrazia; pelos recorridos, o Dr. José Antônio Almeida; pelo assistente, PSB, o Dr. Paulo Saraiva da Costa Leite. Usou da palavra, pelo Ministério Público Eleitoral, o Dr. Roberto Gurgel. Votaram com o Relator os Ministros Francisco Peçanha Martins, José Delgado e Luiz Carlos Madeira.

Julgamento em 15/04/2004 Deu-se por impedido o Ministro Presidente, Sepúlveda Pertence. Face ao disposto no parágrafo único, do artigo 6º, do Regimento Interno do TSE, decidiu o Tribunal, por unanimidade, sob a presidência da Ministra Ellen Gracie, adiar o julgamento do feito para o dia 27 de abril, devendo ser convocado Ministro Substituto do STF, ocasião em que serão renovados o relatório e as sustentações orais. As partes e seus advogados, presentes nesta assentada, deram-se por intimados desta decisão. Votaram os Ministros Relator, Francisco Peçanha Martins, José Delgado, Fernando Neves e Luiz Carlos Madeira.

Julgamento em 01/04/2004 O Tribunal, por unanimidade, conheceu o Recurso como Ordinário e, também por unanimidade, rejeitou as preliminares. No mérito, após os votos dos Ministros Relator, Francisco Peçanha Martins e José Delgado, dando provimento ao Recurso, pediu vista o Ministro Fernando Neves. Aguardam o Ministro Luiz Carlos Madeira e a Ministra Ellen Gracie. Falaram: pelos recorrentes o Dr. Osvaldo Degrazia e pelos recorridos o Dr. Antônio Tavares Vieira Netto. Usou da palavra, pela Procuradoria Geral Eleitoral, o Dr. Roberto Gurgel.

Resumo RECURSO ESPECIAL, IMPROCEDÊNCIA, REPRESENTAÇÃO, ART. 41-A, LEI 9.504/97, CANDIDATO, DEPUTADO FEDERAL, SENADOR, GOVERNADOR, UTILIZAÇÃO, IMÓVEL, COMITÊ ELEITORAL, DISTRIBUIÇÃO, DINHEIRO, MATERIAL, CAMPANHA, CAPTAÇÃO, VOTO, BOCA DE URNA, ENTENDIMENTO, AUSÊNCIA, PROVA.

Ementa SESSÃO DE 27/04/2004(wcv) ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO: PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA PELO ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97, ACRESCENTADO PELO ART. 1º DA LEI Nº 9.840, DE 28.9.99: COMPRA DE VOTOS. I - Recurso interposto anteriormente à publicação do acórdão recorrido: tempestividade. Precedentes do TSE. II - Tratando-se de matéria que possibilita a perda de mandato eletivo federal, o recurso para o TSE é ordinário: CF, art. 121, § 4º, IV. Conhecimento de recurso especial como ordinário. III - Impedimento e suspeição de juízes do TRE: não-acolhimento. IV - Prática de conduta vedada pelo art. 41-A da Lei nº 9.504/97, acrescentado pelo art. 1º da Lei nº 9.840/99: compra de votos. Há, nos autos, depoimentos de eleitoras, prestados em juízo, que atestam a compra de votos. V - Para a configuração do ilícito inscrito no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, acrescentado pela Lei nº 9.840/99, não é necessária a aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral. Ademais, para que ocorra a violação da norma do art. 41-A, não se torna necessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo próprio candidato. É suficiente que, sendo evidente o benefício, do ato haja participado de qualquer forma o candidato ou com ele consentido: Ag nº 4.360/PB, Min. Luiz Carlos Madeira; REspe nº 21.248/SC, Min. Fernando Neves; REspe nº 19.566/MG, Min. Sálvio de Figueiredo. VI - Recurso especial conhecido como ordinário e provido.

Partes RECORRENTE: DIRETÓRIO REGIONAL DO PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB ADVOGADO(s): OSVALDO FLÁVIO DEGRAZIA, e outros RECORRIDO: JOÃO ALBERTO RODRIGUES CAPIBERIBE ADVOGADO(s): ANTÔNIO TAVARES VIEIRA NETTO, e outros ASSISTENTE: DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO - PSB ADVOGADO(s): PAULO COSTA LEITE, e outros

A decisão do TSE foi reformista no sentido que desconsiderou a potencialidade do ato, ou seja, mesmo que tenha sido provado que apenas duas eleitoras tenham sido "compradas" e que essa quantidade de votos não seria suficiente para inverter o resultado das eleições, deveria ser cassado o mandato. Outro ponto importante é que o TSE considerou que, para se configurar o delito previsto no art. 41-A, da Lei n. 9.504/97, acrescentado pela Lei n. 9.840/99 não é necessário que se prove a participação direta do candidato, bastando o fato do mesmo ser beneficiado como o ato ilícito.

Esse posicionamento do TSE, se mantido, em todas as instâncias da Justiça Eleitoral representará um grande avanço para a lisura das eleições no País.

Não falta, basta pesquisar na Internet e nos jornais do Amapá, quem, a exemplo do próprio casal Capiberibe, que veja na decisão da Justiça Eleitoral apenas perseguição política, sob os mais diversos fundamentos, o que é natural em vista dos interesses contrariados e da emoção que envolve um processo dessa natureza, porém o desfecho desse caso deve servir de referência aos que militam na Justiça e na Política, servindo, a todos, como bússola, seja para orientar as decisões dos que usam as togas, seja para coibir práticas de corrupção eleitoral por aqueles que buscam os votos.

(Elaborado em Recife, 23 de setembro de 2005)

 

Como citar o texto:

ANGELIM, Augusto N. Sampaio.Combate à corrupção eleitoral e a Lei 9.840/99: o caso de João e Janete Capiberibe (PSB/AP). Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 145. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-eleitoral/808/combate-corrupcao-eleitoral-lei-9-84099-caso-joao-janete-capiberibe-psbap-. Acesso em 24 set. 2005.

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