O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, deferiu liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3854, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), sobre o subteto para a magistratura estadual. A ação questiona o artigo 1º, da Emenda Constitucional (EC) 41/2003; o artigo 2º, da Resolução nº 13; e o parágrafo único, do artigo 1º, da Resolução nº 14, ambas as resoluções editadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 21 de março de 2006.

 

A decisão proclamada pelo Supremo defere a liminar, conforme o voto do relator, ministro Cezar Peluso, “para dar interpretação conforme ao inciso XI e ao parágrafo 12, ambos do artigo 37 da Constituição Federal, para excluir a submissão dos membros da magistratura estadual ao subteto de remuneração, e para suspender a eficácia do artigo 2º da resolução 13/2006 e parágrafo único do artigo 1º da resolução 14/2006, ambos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)”.

Esclarece o relator que "a decisão de hoje não aboliu os subtetos constitucionais de subsídios, mas apenas estendeu o mesmo teto de remuneração (a soma do valor dos subsídios mais alguma vantagem funcional reconhecida pela ordem constitucional) das ´justiças` federais à magistratura estadual". Salientou que o teto remuneratório a ser aplicado "corresponde ao valor do subsídio dos membros do STF". O ministro Cezar Peluso ressaltou que "quando haja direito de acrescer ao subsídio, já limitados, alguma vantagem lícita, esse total não pode ultrapassar o valor do subsídio dos membros do STF, cujo valor é também, nesse sentido, teto de remuneração".

O valor recebido pelos ministros do STF possui duas funções, uma é de subsídio pago aos ministros da Corte pelo desempenho de suas funções. A outra, é a de teto remuneratório, ou seja, valor máximo a ser recebido no serviço público.

"A decisão, pois, não aboliu os limites de subsídio dos membros do tribunais superiores e dos desembargadores federais e estaduais. Antes da decisão, o teto da remuneração dos juízes da União, correspondendo ao valor do subsídio do STF, era maior que o dos juízes estaduais", afirma Peluso. Os ministros entenderam que essa diferença não se justifica, uma vez que o Poder Judiciário brasileiro é um só (uno). Portanto é incabível um tratamento desigual entre os juízes federais e estaduais.

A ação

A AMB sustenta na ação que o artigo 1º da EC 41/03, ao alterar o artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal, previu o subteto para a magistratura estadual em desacordo com os “princípios constitucionais da isonomia e da proporcionalidade”, de acordo com o disposto no artigo 5º, caput e inciso LIV e o artigo 37, caput da Carta Magna. Essa diferenciação, segundo a impetrante, “viola cláusulas pétreas fundamentais concernentes à estrutura do Poder Judiciário”.

Ainda segundo os autos, a regulamentação promovida pela Resolução nº 13 do CNJ, após a edição da EC 41/03, estabeleceu que, nos órgãos do Poder Judiciário dos estados, o teto remuneratório constitucional é o valor do subsídio de desembargador do Tribunal de Justiça, que não pode exceder a 90,25% do subsídio mensal do ministro do STF. Também a Resolução 14/06 estabeleceu o mesmo limite remuneratório para magistrados e servidores dos Tribunais de Justiça estaduais.

Voto do relator

O ministro Cezar Peluso iniciou seu voto dizendo entender que “a ostensiva distinção de tratamento constante do artigo 37, inciso XI da Constituição da República, entre as situações dos membros das magistraturas federal e estadual, parece vulnerar a regra primária da isonomia”. Ele diz não encontrar razão lógica ou jurídica suficiente “para legitimar a disparidade na disciplina de restrições impostas a certo conjunto de membros de um poder, o qual é de caráter nacional e unitário”, sustentou.

Peluso lembra que o Supremo já se manifestou, ao julgar a ADI 3367, que o “pacto federativo não se desenha nem expressa em relação ao poder Judiciário de forma normativa idêntica à que atua sobre os demais poderes da República, porque a jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado, tampouco pode deixar de ser una e indivisível”. Para ele, o Judiciário tem caráter nacional. A divisão da estrutura judiciária brasileira é “só o resultado da repartição racional do trabalho da mesma natureza, entre distintos órgãos jurisdicionais”.

O ministro ressalta ainda que a regra de escalonamento vertical dos subsídios, constante no artigo 93, V, da Constituição Federal, “ao dispor sobre a forma, a gradação e o limite para fixação dos magistrados não integrantes dos tribunais superiores, não lhes faz nem autoriza distinção entre órgãos dos níveis federal, estadual, senão que antes os reconhece a todos como categorias da estrutura judiciária nacional”.

“Embora pertencendo a ramos distintos da mesma estrutura judiciária, [magistrados federais e estaduais] desempenham iguais funções debaixo de um só estatuto de âmbito nacional, que lhes dita regras iguais, de garantias, vantagens e restrições”. No caso, essa lei única e nacional, que rege todos os membros da magistratura, é a Lei Complementar 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN), lembra o ministro.

O artigo 1º da EC 41/2003, prossegue Peluso, ao atribuir nova interpretação ao artigo 37, XI, da Constituição, afrontou o preceito fundamental da isonomia, ultrapassando o limite do poder constitucional reformador, inscritos no artigo 60, parágrafo 4º, IV, da CF.

Pelas mesmas razões, concluiu o relator, “a interpretação do artigo 37, parágrafo 12, acrescido pela emenda 47, ao permitir aos estados e ao Distrito Federal fixar como limite único de remuneração nos termos do inciso XI, do caput, o subsídio mensal dos desembargadores do respectivo tribunal de justiça limitada a 90,25% do valor dos subsídios dos ministros dessa Corte não pode alcançar os membros da magistratura”.

Por fim, Cezar Peluso disse ver manifesto no caso o periculum in mora (perigo na demora), visto já ter sido determinada, pelo CNJ, a implementação do teto remuneratório da magistratura estadual em sete tribunais estaduais. Assim, o relator votou no sentido de deferir a medida cautelar na ADI 3854, “para dar interpretação conforme [a Constituição] ao inciso XI e ao parágrafo 12, ambos do artigo 37 da Constituição Federal, para excluir a submissão dos membros da magistratura estadual ao subteto de remuneração, e para suspender a eficácia do artigo 2º da resolução 13/2006 e parágrafo único do artigo 1º da resolução 14/2006, ambos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)”.

Divergência

Ao proferir seu voto, o ministro Joaquim Barbosa abriu divergência, alegando que a norma questionada pela ADI - a Emenda Constitucional 41, foi promulgada há quatro anos. Ele lembrou que o STF já decidiu, em outros julgamentos, que o pedido cautelar, quando formulado longo tempo após a vigência da norma impugnada, perde muito da sua força, do seu poder de convencimento. “Em outras palavras, indica falta de periculum in mora”. Para ele, essa “fragilidade intrínseca, no pedido cautelar, se reforça ainda mais quando se está em presença de uma impugnação de emenda constitucional”.

Joaquim Barbosa lembrou ainda que o Brasil é um país de dimensões continentais, que contempla realidades socioeconômicas as mais diversas, “daí eu não ver razão que impeça o poder constituinte originário ou derivado de, atento a essa realidade, estabelecer gradações mínimas e nada irrazoáveis, na remuneração de certos agentes estatais”. Por estas razões, Joaquim Barbosa abriu divergência ao voto do relator, para indeferir a liminar.

Já o ministro Marco Aurélio votou para deferir a liminar na ADI, apenas para suspender a eficácia das resoluções do CNJ, afirmando não ver inconstitucionalidade na Emenda 41/2003. Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Carlos Ayres Britto, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence e Ellen Gracie acompanharam integralmente o voto do relator, ministro Cezar Peluso, para deferir a medida cautelar.

Dessa forma, por maioria, vencidos o ministro Joaquim Barbosa e parcialmente vencido o ministro Marco Aurélio, o Plenário do STF deferiu a liminar na ADI, “para dar interpretação conforme ao inciso XI e ao parágrafo 12, ambos do artigo 37 da Constituição Federal, para excluir a submissão dos membros da magistratura estadual ao subteto de remuneração, suspendendo a eficácia do artigo 2º da resolução 13/2006 e parágrafo único do artigo 1º da resolução 14/2006, ambos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)”.

 

Como citar o texto:

Plenário defere liminar para igualar o teto remuneratório no Poder Judiciário. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 5, nº 289. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/noticias/5055/plenario-defere-liminar-igualar-teto-remuneratorio-poder-judiciario. Acesso em 1 mar. 2007.

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