Alienação parental no genitor alienado

INTRODUÇÃO

A família passou por diversas modificações, já que a entidade familiar é considerada pela Magna Carta de 1988, o pilar de sustentação de uma sociedade, merecedora de ampla proteção estatal. Por um longo tempo, a definição do que seria família esteve atrelada aos elos sagrados do casamento, uma vez que, apenas o homem e a mulher que se união pelo matrimônio, visando à procriação, formavam uma família. Atualmente, a entidade familiar ganhou novos moldes, instituindo como família também a união estável, buscando promover a busca pela felicidade de seus integrantes, o ordenamento jurídico passa a reconhecer a importância do afeto nas relações familiares. 

Entretanto, nem sempre a família exerce integralmente seu papel, pois com os avanços legislativos referentes ao direito de família, e a independência da mulher com seu ingresso no mercado de trabalho o número de divórcios aumenta gradativamente. O que possibilita em caso de divórcios litigiosos o surgimento da Síndrome da Alienação Parental (SAP), promovendo a ofensa dos direitos das crianças ou dos adolescentes envolvidos.

Sendo a SAP uma maneira de violência contra os menores executada por seus pais ou responsáveis, na maioria dos casos, visualizadas na disputa pela guarda, ato esse que acarreta sérias consequências no desenvolvimento do menor alienado podendo durar por toda vida. Para ter um maior entendimento acerca do assunto, o presente resumo expandido apresentará uma breve análise do poder familiar, a Síndrome da Alienação Parental a fim de apontar as suas consequências, seus mecanismos de prevenção que são utilizados na busca de se combater esse fenômeno.

 

DESENVOLVIMENTO

A família passou por grandes modificações no decorrer do tempo, uma vez que no passado a entidade familiar “era formada, apenas pelo matrimônio, sendo reconhecida apenas a união entre o homem e a mulher pelo casamento com o propósito de procriação”. (BARRETO, 2012, s.p). Essa entidade familiar era submetida ao pátrio poder realizado pelo pai sobre sua prole que detinha sobre os mesmos o direito de vida e de morte (PEREIRA, 2017, p. 54). Diferente do que é vivenciado, atualmente, onde a família é orientada pelos princípios constitucionais.

A família moderna tem como base estruturante o afeto que viabiliza a formação dos mais variados tipos de família, como os decorrentes da união estável, sendo todas essas espécies de família protegidas pelo ordenamento jurídico (STOLZE, 2013, s.p). Seguindo as transformações da entidade familiar, o pátrio poder também passou por mudanças “sendo alterado para poder familiar que é realizado por ambos os genitores, uma vez que não há no atual ordenamento jurídico distinção entre o homem e a mulher” (RIBEIRO; CABRAL, 2013, s.p).

Entretanto, algumas famílias não exercem integralmente a sua missão, sendo presente em muitos núcleos familiares quando a relação termina de forma litigiosa, que desenvolve em um dos cônjuges uma serie de sentimentos como traição e vingança (DIAS, 2015, s.p), cenário onde se desenvolve a Síndrome da Alienação Parental sendo  compreendida como uma forma de violência contra os menores envolvidos “sendo exercido pelos próprios genitores ou por aquele que é responsável que possuem sua guarda” (BARUFU; ARAUJO, 2012, s.p). A Síndrome da Alienação Parental foi apresentada por Richard Gardner como sendo:

Um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação (GARDNER, 2002, apud RAFAELI, 2002, s.p).

Geralmente, a Síndrome da Alienação Parental se manifesta quando um dos genitores “por não conseguir digerir de maneira adequada o luto da separação, surgindo uma mistura de sentimentos como abandono e traição que colaboram na utilização dos filhos como meio para atingir seu ex-companheiro” (SALVADOR, 2016, s.p). Já por Alienação Parental, Richard Gardner a considerou como processo que consiste em programar uma criança para que odeie um de seus genitores sem explicação, onde a criança contribui com o processo de desmoralização do genitor (GARDNER, apud RAFAELI, 2002, s.p). A Associação de Pais e Mães enumera algumas maneiras que auxiliam na identificação da Alienação Parental (SILVA, 2012, s;p), a saber:

Rejeitar a transferir as ligações telefônicas aos filhos; Planejar diversos exercícios com os filhos no horário em que o outro genitor deve efetuar seu direito de visita; Identificar o novo companheiro (a) como seu novo pai ou mãe; Reter as cartas e pacotes enviados aos filhos; Depreciar e desacatar o outro genitor na frente dos filhos; Se recusar a fornecer noticias ao outro genitor referente às atividades que os filhos desenvolvem; Se referir ao outro genitor de maneira grosseira da outra companheira do ex-cônjuge; Recusar que o genitor visite os filhos; Não comunicar as atividades importantes como médico, dentista psicólogo ao outro genitor; Mudar ou ocultar nome ou sobrenome dos filhos; Responsabilizar o outro genitor pela má conduta dos filhos; Inferiorizar os presentes dados pelo outro genitor, impedindo que utilizem os objetos dado por ele (SILVA, 2012, s.p).

Em decorrência da prática da Alienação Parental a criança alienada pode desenvolver uma serie de problemas como a depressão infantil, crises de ansiedade, tendência suicida e dependência de álcool e drogas (ASSUMPÇÃO, 2011, s.p), acarretando grave comprometimento no desenvolvimento emocional e social do menor.

 

RESULTADO E DISCUSSÃO

A temática referente à alienação parental é um tema bastante discutido, tendo em vista, sua constante manifestação no ordenamento jurídico nas ações relacionadas ao direito de família, assim, “com objetivo trazer maior esclarecimento aos tribunais e na busca pela definição, suas características, e os mecanismos para combater a alienação parental que foi apresentada o projeto de n° 4. 053/2008” (STAUB, 2010, s.p), que trazia essas informações.

Após a aprovação do projeto na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, o então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva aprovou em 26 de agosto de 2010, a lei n° 12.318/2010 que trata acerca da alienação parental (BRASIL, 2010), que conceituou a Alienação Parental como sendo:

A interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este (BRASIL, 2010)

A legislação também elenca as condutas que caracterizam o ato de alienação parental por parte de um dos genitores, como dificultar o exercício da autoridade parental; dificultar o contato do menor com o outro genitor; mudar de forma repentina de endereço (BRASIL, 2010), entre outros atos dispostos no texto legal. Quando reconhecido o indicativo de alienação parental, o magistrado poderá aplicar umas das sanções previstas pelo art. 6° da lei n° 12.318/2010, a saber:

I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;  II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental (BRASIL, 2010)

Conforme exposto no artigo acima mencionado as punições variam desde uma simples advertência, nos casos onde a alienação corresponde a um grau leve até a suspensão do poder familiar, nas situações mais graves da alienação (MAIA, 2014, s.p). O legislador ao determinar as sanções a serem impostas ao genitor alienante tem finalidade de inibir a Síndrome da Alienação parental, entretanto, é necessário que os genitores, assim como os responsáveis por menores tenham ciência da gravidade da alienação parental.

Outro mecanismo muito discutido como meio eficaz no combate a alienação parental é a guarda compartilhada que é considerada como sendo uma importante ferramenta no combate a alienação parental, sendo entendida como:

A viabilidade das crianças que são filhas pais separados conviverem com seus genitores, onde estes possuem na mesma proporção a autoridade sobre os filhos em comum, vindo a tomar decisões conjuntas no que se refere ao bem estar dos menores, promovendo a eles o contato com seus pais (GAL, 2017, s.p).

O instituto da guarda compartilhada se configura por ambos os genitores exercerem a autoridade parental no que diz respeito aos filhos menores, além de exercitar o direito de convivência de forma igualitária (CORDEIRO, 2016, s.p). Razão pela qual é vista como sendo um instrumento de grande importância no combate a alienação parental, “uma vez que nenhum dos genitores pode impedir o contato com o genitor não guardião, pois ambos possuem poder sobre a prole” (SPERONI, 2015, s.p).

Outra ferramenta que busca amenizar as práticas de alienação parental, a mediação familiar é apontado como forma eficaz no combate desse fenômeno, onde se tem a “presença de um terceiro imparcial que exerce a função pública em processos envolvendo conflitos familiares viabilizando a possibilidade de uma solução conflitos de maneira extrajudicial” (CNJ, 2015). Entretanto, é importante ressaltar que a Lei n° 12.318/10 vetou a prática da mediação nos casos envolvendo direito de convivência dos menores, sendo considerado um direito indisponível, como pode ser analisado nas razões do veto da lei de alienação, a saber:

Art. 9o

“Art. 9o  As partes, por iniciativa própria ou sugestão do juiz, do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, poderão utilizar-se do procedimento da mediação para a solução do litígio, antes ou no curso do processo judicial. 

§ 1o  O acordo que estabelecer a mediação indicará o prazo de eventual suspensão do processo e o correspondente regime provisório para regular as questões controvertidas, o qual não vinculará eventual decisão judicial superveniente. 

§ 2o  O mediador será livremente escolhido pelas partes, mas o juízo competente, o Ministério Público e o Conselho Tutelar formarão cadastros de mediadores habilitados a examinar questões relacionadas à alienação parental. 

§ 3o  O termo que ajustar o procedimento de mediação ou o que dele resultar deverá ser submetido ao exame do Ministério Público e à homologação judicial.” 

Razões do veto

“O direito da criança e do adolescente à convivência familiar é indisponível, nos termos do art. 227 da Constituição Federal, não cabendo sua apreciação por mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos. 

Ademais, o dispositivo contraria a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, que prevê a aplicação do princípio da intervenção mínima, segundo o qual eventual medida para a proteção da criança e do adolescente deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável.”(BRASIL, 2010)

Apesar do veto existente na Lei n° 12.318/2010, a respeito da vedação da mediação nos casos de alienação Parental, vários tribunais do país passaram a empregar a mediação familiar, nas situações em que há menores envolvidos (VIANA, 2013, s.p). Procurando sempre conscientizar os genitores da importância de manter os elos entre a criança e o genitor não guardião para que ela possa crescer em um ambiente saudável buscando sempre o bem estar do menor.

 

CONCLUSÃO

Perante o exposto, percebe-se que em casos de divórcio, a guarda é judicialmente conferida visando o bem estar dos menores envolvidos no conflito, procurando sempre preservar seus direitos. Contudo, quando a Síndrome da Alienação Parental se estabelece o genitor guardião, ignora seus deveres e se converte em alienante, com o propósito de distanciar sem nenhum motivo a criança do genitor não guardião, assim como de seus familiares, uma vez que a alienação pode ser praticada por outras pessoas diferentes dos genitores.

O ato da alienação parental é visto como um meio de violência contra a criança ou adolescente que gera severas consequências psicológicas que podem durar por toda vida adulta da criança alienada, sendo penalizado pela lei n° 12.318/2010. De forma é indispensáveis todas essas medidas que foram expostas no decorrer da pesquisa seja utilizada no combate a alienação parental para que essa conduta seja extinta do nosso cotidiano.

Pois, são as crianças as mais prejudicadas com essa conduta, tendo em vista que sofre pela ausência de um dos genitores, que apesar de terem o desejo de conviver com aquele que ama é impedida pela crueldade de seu genitor guardião. Sendo também muito doloroso para o genitor alienado por ser excluído do contato com seus filhos, sendo uma ferida que nunca cicatriza, podendo ser compreendido como sendo a morte de um filho vivo.

 

REFERÊNCIAS

ASSUMPÇÃO, Vanessa Christo de. Alienação Parental e as Disputas Familiares através de falsas acusações de abuso sexual. Disponível em: < http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2011_1/vanessa_assumpcao.pdf> . Acesso em 19 mai. 2018.

BARRETO, Luciano Silva. Evolução Histórica e Legislativa da Família. Disponível em <http://www.emerj.tjrj.jus.br/serieaperfeicoamentodemagistrados/paginas/series/13/volumeI/10anosdocodigocivil_205.pdf> . Acesso em 19 mar. 2018.

BARUFI, Melissa Telles; ARAÚJO, Sandra Maria Bacca (coord.). Alienação Parental: Vidas em preto e Branco. Porto Alegre: Escola Superior de Advocacia OAB/RS. 2012. Disponível em: <<https://www.mpma.mp.br/arquivos/CAOPIJ/docs/2._Cartilha_Alienacao_Parental_OAB-RS.pdf> . Acesso em 19 mai. 2018.

BRASIL. Lei n° 12.318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei n° 8.069 de 13 de julho de 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12318.htm>. Acesso em 19 mai. 2018.

CORDEIRO, Marília Nadir de Albuquerque. Da guarda compartilhada - aspectos doutrinários e jurisprudenciais. In: Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 21 abr. 2016. Disponível em: . Acesso em: 19 mai. 2018.

CNJ. O que é mediação? Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao-portal-da-conciliacao/perguntas-frequentes/85618-o-que-e-mediacao>. Acesso em 19 mai. 2018.

DIAS, Maria Berenice. Síndrome da Alienação Parental, o que é isso? Disponível em <http://www.apase.org.br/94013-berenice.htm>. Acesso em 19 mai. 2018.

GAL, Maria Eugenia Von. A Guarda Compartilhada como Forma de Evitar a Alienação Parental. In: Jus Brasil: portal eletrônico de informações, 2017. Disponível em: <https://movongal.jusbrasil.com.br/artigos/427133417/a-guarda-compartilhada-como-forma-de-evitar-a-alienacao-parental>. Acesso em 19 mai. 2018.

GARDNER, Richard. Síndrome da Alienação Parental. RAFAELI, Rita (trad.). Disponível em:< http://www.apase.org.br/94001-sindrome.htm >. Acesso em: 22 mai. 2018.

MAIA, Ronald. Alienação Parental. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28253/alienacao-parental>. Acesso em 19 mai. 2018.

RIBEIRO, Luciana Gonçalves; CABRAL, Maria Laura Vargas. O poder familiar e o conceito moderno de família à luz do ECA. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 22, n. 5087, 5 jun. 2017. Disponível em: . Acesso em: 19 mai. 2018.

SALVADOR, Luciana. Luto de uma separação. Disponível em https://www.psicologalucianasalvador.com/single-post/2016/05/13/O-Luto-de-Uma-Separa%C3%A7%C3%A3o-1 Acesso em 19 mai. 2018.

SPERONI, Emanuelle Loise Kolling. A guarda compartilhada como possível solução para alienação parental. Disponível em: <https://repositorio.unisc.br/jspui/bitstream/11624/855/1/Emanuelle%20Loise%20Kolling%20Speroni.pdf> Acesso em 19 mai. 2018.

STAUB, Maria Derotilde Sá. A Síndrome da Alienação Parental e o Projeto de Lei n° 4.053 como meio para evitá-la. Disponível em: <http://repositorio.unesc.net/bitstream/1/925/1/Maria%20Derotilde%20S%C3%A1%20Staub.pdf>. Acesso em 19 mai. 2018.

STOLZE, Pablo. Material de apoio Direito de família. Disponível em: <http://pablostolze.com.br/2013.2.LFG.Familia_01.pdf>. Acesso em 18 mai. 2018.

VIANA, Kátia Maria. Alienação Parental: Instituto da Mediação como possibilidade de resolução de conflitos. In: Conteúdo Jurídico, Brasília-DF, 2013. Disponível em: . Acesso em 19 mai. 2018.

Data da conclusão/última revisão: 20/6/2018

 

 

 

Jessyca Boechat Soares e Tauã Lima Verdan Rangel

Jessyca Boechat Soares: Graduanda do Curso de Direito da Faculdade Metropolitana São Carlos (FAMESC) – Unidade de Bom Jesus do Itabapoana, 10° Período;

Tauã Lima Verdan Rangel: Professor Orientador. Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da UFF – Linha de Pesquisa: Conflitos Socioambientais, Rurais e Urbanos. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especialista em Práticas Processuais Civil, Penal e Trabalhista pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Pesquisador e Autor de diversos artigos e ensaios na área do Direito, e Professor Orientador  da Faculdade Metropolitana São Carlos (FAMESC) – Unidade de Bom Jesus do Itabapoana.