Carnaval tributário

É sabido que no Brasil muitas empresas não conseguem passardo segundo ano de atividades. Grande parte dos problemas enfrentados por essas empresas é de natureza tributária, pois muitos tributos não incidem sobre o lucro. Incidem sobre a receita. Essa constatação faz com que mesmo empresas não lucrativas acabem sujeitas a uma carga tributária elevada.

O maior dos problemas, no entanto, é o excesso de leis tributárias. Há no Brasil a União Federal, vinte e sete Estados e 5.561 municípios, legislando em matéria tributária. Mas não é só. Há, ainda, em todos esses entes federativos, uma grande instabilidade na legislação, que sofre constantemente mudanças radicais.

Ciente dessa situação, o grande jurista gaúcho Alfredo Augusto Becker, na década de 1980, escreveu um livro bastante inspirado e um tanto irônico, denominado "Carnaval Tributário".

Segundo o autor, a quantidade de impostos mascarados de outros nomes (contribuições, empréstimos, taxas etc) era tamanha que formava um verdadeiro bloco carnavalesco que recebia o nome de "Unidos da Vila Federal".

Neste bloco, os abre-alas eram o Presidente da República e o Ministro da Fazenda, que dançavam ao som do fêmur dos contribuintes. Estes também haviam fornecido a pele para a confecção das cuícas, as roupas para os confetes e as tripas para as serpentinas.

A fantasia que restava aos demais passistas, em virtude do excesso na carga tributária, era a tanga. Já havia o medo acerca do que usar se até mesmo esta fosse tributada.

Passados vinte carnavais, os temores se verificaram e confirmaram. Tributou-se a tanga. A carga tributária cresceu aproximadamente dez pontos percentuais. Deverá alcançar o patamar de 40% do PIB este ano, segundo os institutos de pesquisa e estatística mais renomados do País.

Ainda no ritmo do jurista Alfredo Becker, os contribuintes continuam a desfilar na "Unidos da Vila Federal" ao som de cuícas, e com confetes feitos dos restos das vestimentas e serpentinas de tripas, caindo sobre suas cabeças. Agora desfilam desnudos e, em virtude da complexidade nas normas tributárias, insistem em cantar "não entendi o enredo desse samba...".

Apenas os abre-alas, em total descompasso, entoam a melodia "é a vida, é bonita e é bonita", enquanto os demais aguardam ansiosamente a quarta-feira de cinzas.

 

 

 

Marcelo Harger

Advogado em Joinville (SC), mestre em Direito Administrativo e doutorando em Direito do Estado pela PUC/SP e membro do Conselho Estadual de Contribuintes de Santa Catarina.

www.hargeradvogados.com.br.