Conselho Nacional de Justiça Proíbe Nepotismo

O recém-criado Conselho Nacional de Justiça já demonstrou que pode contribuir para o aperfeiçoamento ético do Poder Judiciário. Afinal, foi criado para corrigir distorções existentes nesse Poder que, como toda instituição humana, carrega consigo a marca da imperfeição e das contradições que exigem o necessário saneamento ético a cada momento histórico.

Refiro-me à decisão de instituir Resolução proibindo a prática do nepotismo (nomeação de parentes para ocupar cobiçados cargos de confiança) nas diversas áreas da administração judiciária. Foi uma resposta à manifestação da AMATRA de Santa Catarina (Associação dos Magistrados Trabalhistas), que reivindicava tal proibição, especialmente em relação aos que já se encontravam ocupando tais cargos há muitos anos.

Na Justiça do Trabalho, a prática do nepotismo foi intensa e escandalosa. Em diversos tribunais regionais, os juízes – classistas ou não – foram pródigos em nomear parentes para cargos de confiança. Houve casos verdadeiramente escandalosos, de presidentes de TRT, nomearem mais de 20 parentes para ocupar tais cargos, providos sem concurso público. O único critério de escolha apenas considerava a corrente sangüinea do parentesco. Nem sogra escapou dessa condenável prática de distribuição da riqueza com o dinheiro público.

No sítio eletrônico da AMATRA, foi publicada a relação com os nomes das centenas de ocupantes desses cargos altamente remunerados e dos respetivos juízes-parentes, responsáveis pelas nomeações ofensivas aos princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade na administração pública.

Diante do descalabro na condução da administração judiciário por parte de diversos juízes de segunda instância (principalmente, de presidentes de Tribunais Regionais), o Tribunal Superior do Trabalho – TST aprovou resolução proibindo a nomeação de parentes para cargos em comissão. Mas, garantiu o direito adquirido dos já nomeados. Considerando-a ilegítima, a AMATRA catarinense questionou a ressalva do direito adquirido junto ao Conselho Nacional de Justiça, que decidiu baixar Resolução no sentido de proibir a prática do nepotismo no âmbito de todo o Poder Judiciário brasileiro.

E isto é muito bom, porque contribuirá para que administração judiciária transcorra de forma mais democrática e aberta para receber em seus quadros apenas funcionários administrativos aprovados em concursos públicos, como manda a Constituição Federal.

É preciso esclarecer que, em muito tribunais - é caso do Tribunal de Justiça de Santa Catarina - a prática do despotismo já estava proibida. Portanto, a decisão do CNJ não vai incidir sobre um campo completamente comprometido com o nepotismo. Mas ainda existem tribunais onde tal prática é comum, além dos inúmeros casos dos já nomeados que se consideram com o direito adquirido de ali permanecerem vitaliciamente, em decorrência da prerrogativa da vitaliciedade de que goza o magistrado-padrinho da nomeação.

Na esteira dessa decisão, também o Conselho Nacional do Ministério Público examina projeto de resolução para proibir a nomeação de parentes para ocupar cargos de confiança, na esfera da administração do MP. Em face de divergências entre os conselheiros, a votação está suspensa, mas tudo indica que a saneadora providência acabará por se adotada. Afinal, se o MP tem as mesmas vantagens e prerrogativas asseguradas à magistratura, deverá também observar as mesmas restrições.

Na verdade, não fossem os interesses pessoais a motivar muitos dos atos de nossos administradores, a questão do nepotismo não seria uma prática perniciosa à administração pública, nem objeto de frequentes e justificadas críticas. É que a Constituição Federal determina que a administração pública brasileira deve ser conduzida com base, entre outros, nos princípios da moralidade e da impessoalidade.

Portanto, se os administradores públicos dos três poderes desta sacrificada Nação tivessem o compromisso ético de respeitar o comando normativo consagrado em nossa Carta Magna, não teríamos milhares de esposas, companheiras, filhos, genros e até sogras, ocupando cargos de confiança pela única razão de serem parentes da autoridade que tem a caneta da nomeação em suas nepóticas mãos.

Afinal coração de pai ou de marido - e, às vezes até de genro - é sentimentalmente fraco!

 

 

 

João José Leal

Professor do Curso de Pós-Graduação em Ciência Jurídica do CPCJ/UNIVALI.
Ex-Procurador Geral de Justiça;
Promotor de Justiça aposentado.