A inconstitucionalidade e a ilegalidade da taxa de desperdício nas relações de consumo

Percebe-se, atualmente, a criação de uma espécie de taxa desfavorável ao consumidor, cujo objetivo é penalizá-lo por um suposto desperdício no momento em que aprecia e consome o produto do fornecedor. Trata-se da "cláusula ou taxa de desperdício".

A pré-falada cláusula pré-contratual faz parte do cotidiano dos consumidores de pizzarias, restaurantes, barzinhos e demais estabelecimentos que oferecem, em especial, alimentação aos clientes. Alavanca-se, sobretudo, na idéia de malbarateamento, isto é, do ato de esbanjar daquele que usufrui do produto servido.

O fato é que, embora conste do contrato de consumo como uma cláusula penal, sancionadora, com a aplicação de multa àquele que a ofender, não pode prevalecer sob o aspecto jurídico.

A Constituição Federal da República estatuiu a proteção do consumidor como uma garantia fundamental (art. 5º, inciso XXXII) e um princípio da atividade econômica (art. 170, inciso V), cuja efetivação está outorgada à lei.

Muito bem. Nessa esteira, a lei protetiva das relações de consumo instrumentaliza-se pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), cujo objetivo é acalentar a parte mais fraca nos acordos realizados entre fornecedores e pessoas que de seus produtos e serviços desfrutam .

Ao entrar em um restaurante, por exemplo, logo ao sentar-se e solicitar a refeição, o cliente já está aderindo ao contrato previamente estipulado pelo fornecedor e que em seu conteúdo, dentre outras cláusulas, há a da cobrança da "taxa de desperdício", no caso de o consumidor vir a esbanjar o alimento que lhe é proporcionado.

Independentemente se a cobrança aludida é exposta na entrada do estabelecimento, em alguma parede, ou em letras miúdas no cardápio, é inconstitucional e ilegal.

Primeiramente, é necessário passar pelo conceito de desperdício. O que significa a "expressão"? Bem, o vocábulo é por demais genérico e de cunho subjetivo. Isso quer dizer que cada pessoa possui o seu conceito próprio de desperdício; há uma variação de seu conceito de acordo com a idade, sexo, localidade em que reside o consumidor, costumes, enfim; de uma gama de fatores que ficam totalmente ao arbítrio do fornecedor, de forma isolada, sem conversar com o cliente. Aquele é quem irá proferir a "sentença final": se um pãozinho deixado no prato ou um pouco de arroz será ou não esbanjar e, conseqüentemente, realizar a cobrança da multa.

Não bastasse a fixação unilateral do comerciante à clientela da extensão do malbarateamento da comida servida, ainda de quebra, confere a si mesmo a consciência do valor a ser pago pelo que "ficou no prato". Ora, dessa forma poderia estabelecer que um pedaço de carne deixado é desperdiçar e poderia infligir uma taxa módica de R$ 30,00(Trinta reais), por exemplo, para o infrator, o que significaria, dependendo do local, o preço de uma nova refeição.

Esse comportamento é que a Carga Magna e o Código de Consumidor vieram inibir. Como garantia individual e fundamental de todo cidadão, a Lei 8.078/90 estabeleceu a nulidade de todas as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem excessiva e incompatíveis com a boa-fé e a equidade, além das que estejam em desacordo com a proteção ao consumidor (artigo 51, incisos IV e XV).

Não há nada mais injusto e desproporcional que a oneração do consumidor com uma taxa que é totalmente criada e dosada nos moldes do próprio fornecedor para apenas obter lucros a mais ao estarem as vendas não muito acirradas e, assim, tirar proveito dos consumidores com a arrecadação "extra" da pré-falada taxação.

Diante do exposto, de nenhuma valia é a referida cláusula pelos motivos já expostos. Caso o consumidor seja multado indevidamente, não deverá pagar a presente taxa, somente o preço do produto consumido.

No âmbito civil, poderá o consumidor pedir a devolução da multa, se já a pagou, utilizando-se do juizado especial cível, bem como, exigir verbas indenizatórias pelos danos morais se a situação lhe trouxe algum constrangimento ou vexame.

Elaborado em 14/10/2004

.

 

 

 

Paulo Aurélio Perez Minikowski

Acadêmico do 5º ano de Direito da Universidade Estadual de Londrina - UEL, ex-estagiário da 7º Vara Cível da Comarca de Londrina, Paraná; da Promotoria do Patrimônio Público da Comarca de Londrina, Paraná , da 1ª Vara de Execuções Fiscais de Londrina, Paraná e atual estagiário do Escritório de Aplicação Jurídica da Universidade Estadual de Londrina -UEL.