Fidelidade partidária e os buracos negros da decisão do TSE
Por Alberto Rollo
A decisão do TSE que dá aos partidos o direito de reaver mandatos de parlamentares que saíram dessas legendas para outras, procurando, à toda evidência, o abrigo do governo e o usufruto de suas benesses tem um conteúdo moral altamente elogiável. Como disse o Ministro Marco Aurélio, presidente da Corte Eleitoral Superior, é um verdadeiro pontapé para iniciar a Reforma Política e Eleitoral.
A decisão do TSE espanca mudanças imotivadas, cujos motivos (veja-se o paradoxo ) é a fisiologia e o usufruto de benesses. Já aqui os Ministros deixaram claro que isso não atinge decisões que venham a bordo de mudança de ideário partidário, ou sejam fruto de perseguição política. O que preserva a mente e a consciência dos parlamentares.
Essa decisão, por simetria, vale para as Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores. Sempre haverá parlamentares que poderão alegar perseguição política com a nomeação de desafetos para dirigirem diretórios partidários de regiões onde têm influência e captam seus votos.
Mas, nesse primeiro momento de surpresa com a decisão da Corte Eleitoral, e de estupefação com o alcance dos efeitos dessa decisão, surgem alguns “buracos negros” que terão que ser resolvidos com o andar da carruagem.
Como fica essa decisão frente ao art. 55 da Constituição Federal que estabelece, numerus clausus, os casos de perda de mandato, acrescentando-se, ao citado artigo, uma nova hipótese, fruto de construção judicial? É, mais uma vez aqui, o Judiciário legislando, saturado que está da atuação legislativa dos parlamentares ( ou a falta de ) . Se a Carta Magna dispõe expressa e taxativamente quais os casos em que o mandato é retirado do parlamentar, não há como interpretar-se o que não existe. E a perda de mandato por mudança de partido é uma previsão inexistente na Constituição Federal.
Ficou dito, durante os debates, que, os candidatos só se elegem graças aos votos dados aos partidos e a classificação dos eleitos com as sobras fruto da aplicação do quociente eleitoral. Mas, candidatos como Paulo Maluf e Celso Russomano que se elegem independentemente das sobras, somente com os votos conquistados por eles, podem eles mudar de legenda ?
E os candidatos eleitos por coligação, podem eles deixar o partido pelo qual participaram da coligação e ir para outro, que fez parte dessa mesma coligação ? É o caso de Zequinha Sarney que, na legislatura anterior, saiu de um partido e foi para o outro dentro da mesma coligação.
E, sem aprofundar muito o tema, terá, o Presidente da Casa Legislativa onde aparecer o problema de cassação do mandato por mudança de partido, que dar ao parlamentar o direito ao contraditório e a ampla defesa, como da Constituição Federal, mesmo para procedimentos de caráter administrativo? Quais serão as regras de procedimento a serem aplicadas?
Terminamos como começamos. Elogiando o profundo conteúdo moral dessa decisão. Mas, neste momento, perfilando nosso entendimento ao lado do voto vencido do Ministro Marcelo Ribeiro, com lastro em duas decisões majoritárias do STF, outros eram os tempos, uma das quais sob nosso patrocínio, no caso do deputado Aristides Cunha de Mogi das Cruzes.
Fidelidade partidária sem perda de mandato por razões de consciência é algo desejável, a ser atingido através de processo legislativo. Cada roca com seu fuso.
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Sobre o autor:
Por Alberto Rollo: advogado especialista em Direito Eleitoral e presidente do IDIPEA (Instituto de Direito Político Eleitoral e Administrativo).
Redação
Código da publicação: 9324
Como citar o texto:
Fidelidade partidária e os buracos negros da decisão do TSE. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 5, nº 293. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/fique-por-dentro/9324/fidelidade-partidaria-os-buracos-negros-decisao-tse. Acesso em 29 mar. 2007.
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