O uso do verbo “arrebatar” no texto de denúncia é insuficiente para descrever o crime de roubo, mesmo o verbo podendo significar também a violência-meio desse ilícito complexo. A conclusão é da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que concedeu habeas-corpus para anular a sentença contra R.V.S., de Minas Gerais, que considerou como roubo a tentativa de arrebatamento de uma corrente do pescoço da vítima.

 

O réu foi condenado à pena de três anos de reclusão pela prática do delito tipificado no artigo 157, caput, combinado com o artigo 14, inciso II, do Código Penal. Pediu, em primeira instância, a nulidade da sentença, pois não haveria correlação entre ela e a acusação inicial. Segundo a defesa, a cargo da Defensoria Pública, o Ministério Público, inicialmente, acusou o paciente do crime de furto simples tentado, pois a denúncia não teria relatado, sequer de forma implícita, que o réu tivesse empregado violência contra a pessoa.

Para a Defensoria, a suposta violência empregada na ação teria se dirigido única e exclusivamente contra a corrente (res furtiva), e não contra a vítima, “como tentou fazer crer o ilustre representante do Ministério Público em momento posterior à denúncia sem, contudo, se utilizar o meio correto para tal, qual seja, o aditamento da peça acusatória. Ainda segundo a defesa, a alegada vermelhidão no pescoço da vítima não serve para caracterizar o crime de roubo, sendo imprescindível que o agente empregue violência ou grave ameaça contra a pessoa" , alegou a Defensoria.

A Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ/MG) deu parcial provimento à apelação, apenas para isentá-lo das custas processuais, já que foi assistido pela Defensoria Pública. “Caracterizada a violência exercida contra a vítima para viabilizar a subtração da res, resta definida a tipicidade do crime de roubo”, afirmou o TJ/MG.

No pedido de liberdade provisória e de nulidade da sentença dirigido ao STJ, a defesa insistiu que o acusado foi denunciado pela prática do crime de furto tentado, porque "arrebatou" da lesada o cordão que trazia no pescoço, após solicitar-lhe dinheiro e não ser atendido.

O habeas-corpus foi concedido. “Ocorre que ‘arrebatar’ não significa necessariamente o emprego de força contra a vítima”, considerou o relator do caso, ministro Hamilton Carvalhido. “Tal significação múltipla do termo, referindo-se à dimensão fática do delito, exclui a certeza da imputação que se faz ao réu, inibindo o exercício do direito de defesa, assegurado na Constituição Federal.”

Para o ministro Carvalhido, houve evidente nulidade da sentença e, havendo possibilidade de aplicação de pena mais grave, os autos devem ser baixados Ministério Público para aditamento da inicial. “Pelo exposto, concedo a ordem, para anular a sentença condenatória e determinar a observância do disposto no artigo 384, parágrafo único, do Código de Processo Penal, deferindo ao paciente liberdade provisória, mediante termo de compromisso, a ser firmado em Juízo, de comparecimento nas datas designadas e de não mudar de residência, sem antecedente comunicação, pena de revogação da medida”, concluiu o ministro.

Autor(a):Coordenadoria de Editoria e Imprensa STJ

 

Como citar o texto:

A simples presença do verbo arrebatar na denúncia não caracteriza crime de roubo. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 6, nº 330. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/noticias/5433/a-simples-presenca-verbo-arrebatar-denuncia-nao-caracteriza-crime-roubo. Acesso em 10 dez. 2007.

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