Os "shopping centers" são a natural conseqüência do crescimento das cidades e da também crescente necessidade de o comércio, em economia de mercado e competitividade, unir-se ao lazer. Realidade pertinente à mercancia moderna, objetiva ofertar ao usuário horas de satisfação, assim como de compras, em que as alternativas, que lhe são apresentadas, terminam por lhe propiciar o usufruto de umas, de outras ou de ambas.

Uma das características que a Economia moderna, em nível de consumidor, tem detectado é a evolução exigencial do comprador, que surge a partir de uma educação cada vez mais abrangente em todas as camadas sociais, como também pela competitividade que impulsiona a verdadeira economia de mercado.

A figura do consumidor mais exigente, aliada às dificuldades de trânsito nas grandes cidades são dois elementos que acabam por influir, decididamente, na multiplicação dos "shopping centers", entidade desconhecida quando da elaboração do nosso Código Comercial ou mesmo não pressentida, no nascimento da legislação sobre locações comerciais.

Os "shopping centers", em verdade, surgiram como entidades de supracomércio, posto que permitem aos estabelecimentos mercantis sua melhor desenvoltura, assim como superiores resultados, de difícil obtenção sem a colaboração de suas estruturas.

O saudoso PONTES DE MIRANDA insistia em que a norma constitucional é uma norma de sobredireito. Alguns países sequer a têm, como a Inglaterra, mas a esmagadora maioria dos países, que alicerça o seu direito na Carta Suprema, aceita que a norma constitucional é uma norma colocada acima das normas ordinárias e, por essa razão, normas de sobredireito. Sem elas, as leis ordinárias não teriam vida própria e correriam o risco de gerar conflitos evidentes, em face da inexistência de um vetor maior capaz de orientá-las. Se a Inglaterra prescinde de tal ordem, sua tradição costumeira deu às normas de comportamento e sancionatórias densidade suficiente para que o respeito e a obediência componham seu direito escrito e o da "common law" esculpida pela Justiça.

Embora as comparações sejam sempre deficientes, o certo é que os "shopping centers" estão para os estabelecimentos, que o compõem, como a norma constitucional para o ordenamento jurídico ordinário, que dela depende.

Os "shopping centers" são, em verdade, um sobreestabelecimento comercial, cuja estrutura permite que os estabelecimentos comerciais, que neles se instalem, existam e nele tenham sua principal razão de ser e força.

Não há estabelecimento comercial instalado em "shopping center", que não tenham seus titulares o escolhido em função dos aspectos de agregação valorativa representada pelo acréscimo que tal instalação fatalmente provocará.

São, portanto, os "shopping centers", para todos os estabelecimentos que os compõem, uma espécie de sobreestabelecimento de onde recebem o principal fator de força mercantil, mesmo que sejam famosas as marcas ou renomadas as sociedades que se unam em suas dependências.

Quem escolhe um "shopping center", para nele instalar um estabelecimento, pretende desenvolver seu próprio comércio, mas sabe que o desenvolverá com substancial colaboração da entidade que lhe cede espaço, que lhe oferta promoção, que lhe garante um público freqüentador, pelo simples fato de ser um "shopping" e independentemente da própria força.

Quem vai a um "shopping center", na maior parte dos casos, vai em função do que oferece esse complexo comercial, com variadas alternativas de escolha, raramente se dirigindo para compra neste ou naquele estabelecimento. Mais do que isto, por saber que tais autênticas "cidades compactadas" possuem mais de um estabelecimento para cada gênero de produtos, quem procura um "shopping center", procura-o na esperança de, através de um levantamento de preços entre os diversos estabelecimentos lá colocados, escolher o produto que mais lhe agrade, pelo menor preço.

É, pois, o "shopping center" o que o usuário procura em primeiro lugar.

À evidência, para que o complexo de estabelecimentos seja atrativo, necessita o "shopping center" manter publicidade adequada e administração ágil, objetivando assegurar um público freqüentador, assim como conseguir novos usuários. Toda a estratégia de seus administradores, independentemente dos estabelecimentos existentes, é voltada para valorizar a imagem dos "shopping centers", com o que se procura, em necessárias e custosas promoções, conservar um permanente público freqüentador, seja para o lazer, seja para compras, seja para ambos.

Nas grandes cidades, inclusive, em que esse tipo de empreendimento se multiplica, é de hábito ouvir-se de pessoas vindas de outras cidades menores, que vieram fazer compras em seus "shopping centers". Conhecem os "shopping centers", mas não conhecem as suas lojas.

E é exatamente tal característica fundamental que torna o "shopping center" entidade com fundo de comércio próprio, diverso daquele que diz respeito aos demais estabelecimentos que lá se instalam. Ao destes une-se, para viabilização de uso ou de vendas, aquele "sobrefundo de comércio", que pertine ao "shopping center" e que adiciona potencialidade mercantil ao complexo de lojas nele situadas. Sem essa estrutura, os estabelecimentos comerciais não teriam a dimensão que têm, razão pela qual se deve entender que o "shopping center" adiciona seu próprio fundo de comércio ao dos estabelecimentos lá instalados para valorizá-los.

Há, pois, dois fundos de comércio que se integram na instalação de um estabelecimento comercial em um "shopping center": o do próprio "shopping center" e aquele que já possui o estabelecimento comercial ou vai por ele sendo criado.

É de se notar que toda a conformação doutrinária a respeito dos fundos de comércio, desde sua origem e evolução no Direito francês, procura estabelecê-lo como um bem imaterial, que transcende à materialidade da pessoa jurídica e de seu acervo, sendo que, não obstante o variado perfil jurídico ofertado pela jurisprudência, não há divergências quanto a ser bem imaterial, que se agrega aos demais bens da empresa.

Os ingleses chegam a confundir o fundo de comércio com o "good will" ou o "earning power", que o constituiriam, embora sejam apenas facetas parciais de uma universalidade de elementos que compõem o fundo de comércio.

No direito tributário, a sucessão se dá mesmo que a aquisição do sucedido seja apenas de seu fundo de comércio, conforme determina o artigo 133 do Código Tributário Nacional:

"Artigo 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato:

I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;

II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão".

O certo é que este conjunto de elementos, entre os quais se destacam o título do estabelecimento, a freguesia, as marcas, as expressões de propaganda, o ponto comercial, a capacidade de gerar recursos encontram-se presentes no "shopping center", que, de rigor, é aquele que maior fundo de comércio possui em comparação aos estabelecimentos que hospeda.

Com efeito, o ponto do "shopping center" é conhecido de todos os que o procuram mais do que qualquer estabelecimento nele instalado. Se se fizer uma pesquisa para que se diga o nome de metade dos estabelecimentos em cada "shopping center" para qualquer cidadão ou o nome do "shopping", que se encontra em determinado bairro, a quase totalidade das pessoas acertará o nome do "shopping" pela simples enunciação do bairro, mas será incapaz de enumerar os títulos dos estabelecimentos, pela metade, lá instalados.

Há, portanto, inequivocamente, um bem incorpóreo que possuem os empreendedores dos "shoppings", a partir do próprio título.

O mesmo se pode dizer da freguesia. A freguesia de cinemas, restaurantes, lojas comerciais é primeiramente freguesia do "shopping", - onde se encontra a variada alternativa para o que busca - e apenas depois o é deste ou daquele estabelecimento. Os demais elementos incorpóreos de um fundo de comércio dizem respeito também e, principalmente, ao "shopping center"(13).

Por essa razão é que entendo que, nesses empreendimentos, todos os estabelecimentos que lá se instalam, unem seu fundo de comércio ao "sobrefundo de comércio" representado pelos bens incorpóreos agregados pelos shoppings" a cada um deles.

Compreende-se, pois, que a unanimidade da doutrina pátria tenha estabelecido, embora com configurações distintas, perfil jurídico não clássico ao "shopping center", como se lê, principalmente, no livro "Shopping Centers - Aspectos Jurídicos" (Ed. RT, 1984, pp. 57/70).

Ora, por essa linha de raciocínio, como primeira conclusão desse perfunctório estudo é de que a empresa ou os empresários que constróem, administram os "shopping centers" são detentores de um "fundo de comércio" que, todavia, só pode existir na medida em que hospede outros estabelecimentos.

Esta é a razão pela qual prefiro denominar tal fundo de comércio de "sobrefundo", posto que tutelador dos "fundos" particulares de cada estabelecimento, mas de tal relevância que sem ele os "fundos de comércio" individualizados teriam dimensão menor ou mesmo não existiriam, dado que não teriam interesse, seus detentores, em instalar-se naquele local, sem que lá existisse um "shopping center".

Prefiro a denominação de "sobrefundo" porque é o "shopping center" o real elemento de união dos diversos estabelecimentos nele instalados, os quais dele dependem, assemelhando-se, como disse no início, ao "sobredireito" que a norma constitucional representa para o ordenamento jurídico de um país.

Tal realidade leva, por decorrência, a uma série de considerações sobre os efeitos que tal "sobrefundo comercial" exerce no concernente às relações entre os estabelecimentos comerciais com seus empreendedores, visto que tais relações microeconômicas não podem ser examinadas, à luz dos tradicionais institutos de direito privado, mormente no que diz respeito às locações comerciais.

Se a Instalação de um estabelecimento comercial em "shopping center" pressupõe a junção de dois patrimônios imateriais para fortalecimento de sua imagem e força empresarial, à evidência, toda a contratação a ser feita pelas partes deve fugir à configuração tradicional de um mero contrato de locação nos moldes da lei de luvas.

De início, a grande maioria dos contratos de locação do espaço e do "sobrefundo comercial" dos "shoppings" principia com uma caução ou reserva de área, quando da construção do empreendimento a que os juristas denominam de res sperata.

Tal forma de remuneração atual ou futura, em verdade, apenas representa parcela do pagamento do uso futuro de imóvel, ao qual se acrescentará os demais custos de manutenção da imagem e do próprio conjunto de estabelecimentos.

Em outras palavras, a vinculação contratual entre os estabelecimentos a serem instalados e a empresa empreendedora do "shopping" se faz em duas fases distintas: a de implantação e a de manutenção.

O sobrefundo surge na fase de implantação, sob a figura da res sperata ou da "caução" ou "reserva" para o futuro, mas permanece, na fase de manutenção, enquanto existir o "shopping center". Vale dizer, o "sobrefundo comercial", que está na essência da reserva de um espaço a ser ocupado pelas lojas-satélites, é elemento compositor da relação contratual entre ambos, desde o momento de sua reserva, quando ainda em construção, até o momento em que o "shopping center" desapareça ou a loja-satélite se desligue, deixando de manter estabelecimentos no complexo criado.

Não há, pois - não obstante duas fases claras na organização de um "shopping center" - como distinguir, o agregado de valorização imaterial, que representa cada uma delas, posto que tanto a res sperata significa a criação de um "sobrefundo comercial" a ser adicionado a cada estabelecimento no futuro, como a implantação e manutenção desses estabelecimentos possui as mesmas características.

Tanto é assim que na cessão de espaço de um estabelecimento, cujos titulares não mais desejem permanecer no futuro "shopping", leva-se em consideração o que este espaço representará e o ágio normalmente cobrado não diz respeito ao fundo de comércio de estabelecimento a se instalar - ainda inexistente - mas ao real fundo de comércio ou "sobrefundo" do "shopping", empreendimento que gerará as conseqüências econômicas a que se propôs.

Sob essa perspectiva, é de se compreender existir, em verdade, uma contrapartida, nos contratos entre os empreendedores e os lojistas, vinculada apenas ao "sobrefundo comercial", constituída pela cessão da res sperata do "shopping" aos estabelecimentos nele instalados, o que supera, de muito, as forças das locações exclusivas de espaço físico.

Nos contratos, portanto, entre os lojistas e os "shoppings centers" há sempre uma dupla natureza, que os faz, de um lado, idênticos ao de uma singela locação do espaço físico em contrato de locação comercial, mas que os torna, de outro lado, um contrato atípico, sem nenhuma vinculação com a lei de luvas no concernente à cessão da res sperata ou do uso do "sobrefundo comercial", representado pelos bens imateriais de que os "shoppings" são detentores permanentemente.

Em tais contratos, portanto, não há a prevalecer apenas a legislação sobre locação comercial, que, por conter certas restrições de direitos, não pode ser interpretada senão restritivamente.

O Decreto nº 24.150 de 1934, de rigor, não hospeda qualquer outra forma de locação que não dos espaços físicos, sendo, portanto, de espectro extremamente singelo e insuficiente para abranger também a "locação" de bens imateriais.

Os contratos entre os "shoppings" e os lojistas não é um contrato de locação de imóvel, mas um contrato mais abrangente, em que o imóvel é menos relevante que o complexo de elementos imateriais que tornam aquele ponto atraente e propício ao comércio.

Desta forma, parece-me que, nos contratos mencionados, há de se considerar sua dupla estrutura, em que a locação do espaço físico é menos relevante que a cessão do "sobrefundo de comércio", que deve ser implantado e preservado para que todos os estabelecimentos nele instalados, dele se beneficiem.

Esta é a razão pela qual, na pactuação sobre a utilização das lojas-satélites e de locação de espaço material a cessão de "sobrefundo comercial", o mais das vezes, a prestação pecuniária vincula-se à "performance" do estabelecimento instalado, ou seja, ao faturamento, recebendo os empreendedores a locação do "sobrefundo" de acordo com o reflexo que a manutenção das estruturas dos "shopping centers" exerce sobre tais unidades empresariais.

A existência de dois tipos de obrigações no contrato entre um estabelecimento comercial e o "shopping center", um de natureza locacional do espaço físico, que é o menor, e outro de cessão do fundo de comércio, que é o maior, pois, a verdadeira razão de ser do empreendedor, leva-me a entender que nas ações renovatórias os dois elementos não podem ser desconsiderados.

De início, não há porque submeter o regime jurídico da cessão do sobrefundo comercial, que é livremente determinado pelo princípio da autonomia da vontade, ao regime jurídico restrito e de menor densidade da locação espacial, este podendo se submeter, se desvinculado, às normas próprias da legislação de locações comerciais e, portanto, sujeito às restrições pertinentes.

Parece-me que, em se admitindo as ações renovatórias para a locação do espaço físico, distinto é o regime de cessão do "sobrefundo comercial", que poderá permanecer independente daquela ação e dos valores lá estipulados, nos termos pré-acordados, já que, como atrás afirmei, em Direito, as leis restritivas são sempre interpretadas restritivamente, não podendo o exegeta utilizar-se da integração analógica, da interpretação extensiva ou da reserva relativa da lei formal para oferecer sua inteligência a respeito.

Admitindo, todavia, que as partes livremente convencionem submeter-se ao regime das locações comerciais, impondo tal disciplina jurídica para as duas relações mencionadas, nem por isto, nas ações renovatórias, poder-se-á desconsiderar a fixação de remuneração pela utilização do "fundo de comércio" do "shopping center" ou, na minha opinião, do "sobrefundo mercantil".

Mister se faz, nessas hipóteses, que o Juiz determine o valor da locação do espaço físico e da cessão de fundo de comércio, cuja retribuição é mais uma remuneração assemelhada à de "royalties" por uso de marcas ou patentes, sem as restrições de natureza fiscal ou cambial impostas a estas.

Outorgue-se à cessão do "sobrefundo comercial" o nomem juris que se quiser, nem por isto, seja cessão temporal, locação ou arrendamento, ganhará tal pactuação coloridos de locação de espaço físico, razão pela qual deve merecer tratamento diverso.

Nem se diga, que nas renovatórias vinculadas a contratos em que não tenha havido a distinção entre a locação do espaço físico e cessão do "sobrefundo de comércio", não haveria necessidade de ofertar um preço pela remuneração do sobrefundo de comércio, já esgotado no primeiro contrato.

O argumento carece de procedência na medida em que a res sperata nasce, em verdade, na 1ª fase de constituição de um "sobrefundo de comércio" correspondente à sua implantação, mas tal "sobrefundo", que se valoriza na medida em que cresce a dimensão e a importância dos "shopping centers", continua na fase de manutenção, de rigor, a mais importante, posto que a imagem do "shopping center", se não preservada, frustrará a expectativa geral de seus empreendedores e dos lojistas que lá se instalam.

A manutenção e a melhoria da imagem deve ser preocupação contínua dos empreendedores, a bem do empreendimento e dos estabelecimentos lá instalados, que se beneficiam da utilização desse trabalho em seus negócios.

Parece-me, pois, impossível a separação das duas facetas, nos contratos, devendo, nas ações renovatórias em que a locação do espaço físico e cessão do fundo de comércio se confundirem, permanecer a obrigação do locatório de remunerar um e outro, cabendo ao Juiz sua justa determinação com critérios pertinentes à lei de luvas para os espaços físicos, mas com critérios idênticos aos dos demais contratos para a cessão do "sobrefundo de comércio", visto que esta parte acordada não está sujeita a qualquer restrição.

Parece-me ainda que o ideal seria, todavia, os "shopping centers" prepararem modelo contratual, dissociando a locação física da cessão do "sobrefundo de comércio".

A locação física deveria seguir os parâmetros normais das locações de espaços semelhantes, prevalecendo a livre contratação inicial, com os pesos e contrapesos relacionados com a duração do contrato.

A cessão do "sobrefundo de comércio" deveria ser acordada ou por instrumento a parte ou por negociação contida no contrato de locação, especificando-se a razão de ser do critério adotado.

Tal critério poderia levar em consideração a mesma variação que se utiliza para remuneração de "royalties", ou seja, uma variação de 1 a 5% sobre o faturamento ou outra que livremente as partes acordarem pela relevância de uso do "sobrefundo de comércio" pertinente aos "shoppings".

Embora a cessão do fundo de comércio, de forma permanente, não seja idêntica, mas apenas semelhante à cessão de uma marca ou de uma patente, posto que tais cessões, por "royalties" remuneradas, representam apenas cessão de parte de um "fundo de comércio", que, no caso dos "shopping centers" é cedido por inteiro, há de se considerar que o critério de remuneração tradicional das cessões de marcas, patentes e inventos relacionados ao volume do faturamento das mercadorias, é o melhor e o mais justo para se avaliar a dimensão da influência do "sobrefundo comercial" sobre os estabelecimentos instalados em suas dependências.

Desta forma, na conformação dos contratos referentes aos "shoppings", dever-se-ia considerar, como critério ideal, uma remuneração fixa por locação do espaço físico e uma remuneração variável de acordo com o faturamento vinculado à cessão do sobrefundo de comércio.

Para os empreendimentos dos "shoppings" o tratamento tributário seria indiferente, em nível de imposto sobre a renda, na medida em que a receita seria operacional e sujeita à tributação, sendo que em face da notória inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 56, de 1987, aprovada apenas por acordo de lideranças no Senado e não por maioria absoluta, poderiam discutir a inexistência de lei a exigir o ISS, em face de a matriz legal do Decreto-lei nº 406, de 1968 estar desconsiderada pelas administrações municipais e as leis ordinárias, lastreadas na Lei nº 56, de 1987, serem de notória inconstitucionalidade.

Finalmente, mister se faz relembrar que a cessão do "sobrefundo de comércio" assemelhando-se à remuneração de "royalties", mas não sendo remuneração de "royalties", em verdade, não se submete às limitações da Portaria nº 456, de 1958 - de contestável legalidade para efeitos de dedução - por parte dos estabelecimentos locatários, visto que o acordo se faz por livre negociação entre as partes e sem restrições na legislação de espécie.

Acrescente-se que a remuneração do "sobrefundo de comércio" na fase de implantação para os estabelecimentos empreendedores deve ser considerada receita operacional, visto que já é antecipação de remuneração para uso futuro, gerando idêntico direito deducional nos estabelecimentos com expectativa de direito de uso.

Poder-se-á, todavia, adotar a técnica do diferimento, nos termos do Parecer Normativo nº 11, de 1976, cuja ementa é a seguinte:

"IMPOSTO SOBRE A RENDA E PROVENTOS - APURAÇÃO ANUAL DOS RESULTADOS.

As receitas de arrendamento de bens imóveis contratados a preço certo e a longo prazo, realizadas em período inferior ao do contrato, podem ser diferidas para os exercícios de sua competência, assim considerados aqueles que estejam perfeitamente identificados.

A receita que depende de evento futuro, de resultado incerto, deverá ser apropriada no exercício em que se tornar juridicamente disponível".

Nova realidade, com reflexos no direito econômico, tributário, comercial e civil, merece reflexão crescente por parte dos doutrinadores, magistrados e advogados, para que as soluções jurídicas já apresentadas, possam receber definitivo tratamento legislativo futuro.

 

Como citar o texto:

MARTINS, Ives Gandra da Silva..A Natureza Jurídica das Locações Comerciais dos "Shopping Centers". Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-empresarial/113/a-natureza-juridica-locacoes-comerciais-shopping-centers. Acesso em 14 set. 2000.

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