O Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei da Biossegurança (PL 2401/03), indo agora para a sanção ou veto presidencial. O texto legal em questão estabelece as regras de segurança e políticas de fiscalização para as atividades científicas relacionadas aos chamados Organismos Geneticamente Modificados (OMG), ai incluídas questões polêmicas, como as voltadas à pesquisa das células-tronco humanas e dos transgênicos.

O texto legal afastou destaques importantes apresentados no Senado, dentre eles o que buscava proibir a permissão de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa e terapia.

Assim, uma vez sancionada a Lei, estará autorizada a pesquisa com embriões humanos produzidos por fertilização in vitro, desde que estes embriões sejam considerados inviáveis ou congelados há pelo menos três anos. Para isso, entretanto, a Lei prevê o consentimento expresso dos genitores e aprovação anterior dos projetos em comitês de ética reconhecidos e regulamentados legalmente.

O texto legal deverá ser ainda regulamentado, mas já prevê penas que variam de 1 a 3 anos de detenção e multa para o uso de embrião humano em desacordo com os seus enunciados, e a reclusão de 2 a 5 anos para a realização de clonagem humana que é proibida. O texto proíbe, a engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião humano. Também fica proibida a liberação de OGM no meio ambiente sem que haja prévia aprovação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio - órgão federal a ser criado com vinculação ao Ministério da Ciência e Tecnologia) ou licenciamento ambiental, se for considerada atividade potencialmente causadora de degradação ambiental.

A lei cria, ainda o Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), composto por onze ministros de Estado e vinculado à Presidência da República, que ficará responsável pelas políticas públicas dos órgãos com poder fiscalizador e regulador sobre a matéria, como poderes de decisão sobre os usos comerciais dos OGM.

A nova lei da Biossegurança contextualiza o Brasil no debate mundial que envolve o assunto, que está inserido dentro da chamada revolução científica e tecnológica. Em que pese os rigorosos mecanismos de segurança criados para pesquisas biogenéticas, a polêmica parece ser inevitável. Sobretudo com relação às pesquisas que envolvem a células-tronco de embriões humanos “descartados” pelos pais, no que diz respeito a enunciados de ordem ética e religiosas.

Bill Gates profetizou em 1997 em seu livro “a empresa na velocidade do pensamento” que a ciência evoluiria no mundo na década seguinte, mais do que havia evoluído nos cinqüenta anos anteriores. A chegada da chamada “medicina regenerativa” trazida pela evolução técnica e científica e pela nova Lei, parece não querer ter fim. O homem busca equiparar-se à Deus.

O pano de fundo de toda a polêmica não pode deixar de esconder um acentuado interesse de ordem econômica, levando a uma profunda reflexão de natureza ética. A resistência é de ordem moral ou religiosa ? Com certeza sim, mas não é só isso. A vida e a dignidade da pessoa humana são valores que devem ser preservados acima de quaisquer outros. Uma sociedade que não observar este enunciado não tem futuro sob o prisma sócio-antropológico. A lei civil brasileira aceita a preservação da vida desde o momento da concepção

Este também é o enunciado do pacto de San Juan da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário. Assim, o embrião é vida e como vida precisa ser visto e respeitado, de forma plena e indiscriminada.

É certo que o Estado é laico. Mas a sociedade não o é. E nesta condição a sociedade precisa ser ouvida e respeitada, inclusive no que diz respeito as suas convicções de ordem moral e religiosas. A questão moral também está inserida no contexto das nossas leis. Tanto é assim, que todos os atos praticados por agentes públicos, indistinta e incondicionalmente, devem observar critérios de moralidade.

Uma moral, portanto, não se distingue da outra.

De qualquer ângulo que se observe a questão, (não há como e não se quer) impedir o avanço da ciência. O que se quer impedir é que em nome deste avanço (e do interesse econômico e das vaidades científicas nele embutidas) se atire no lixo outras conquistas alcançadas pela raça humana às duras penas ao longo do seu processo evolutivo. Dentre elas, uma que embora ainda não seja exercitada de forma integral e plena em todo o planeta, que é fundamental : a preservação incondicional da vida e da dignidade da pessoa humana.

 

Como citar o texto:

NEMETZ, Luiz Carlos..A Lei da Biossegurança. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 152. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-e-biogenetica/886/a-lei-biosseguranca. Acesso em 13 nov. 2005.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.