Muito se fala e vem se falando sobre a corrupção de um modo geral. Nesta época e por conta dos escândalos recentes, a preocupação concentra-se nos candidatos e nos assuntos das eleições e do campo eleitoral.

Tentou-se até acabar com o “caixa 2” ou com o dinheiro não contabilizado, como dizem os seus responsáveis. Mais se tentou diminuir a gravidade dos fatos, dizendo-se que todo mundo faz as mesmas coisas, pretendendo-se assim, tornar aquelas práticas, até comuns.

Mas não é bem assim.

Nós da sociedade organizada temos que ficar cada vez mais atentos a esses fatos, a essas práticas, para que, no momento próprio, e um deles se avizinha com as eleições, possamos alijar e expurgar por completo da vida pública esses maus representantes, esses maus brasileiros.

No campo do Direito Eleitoral, a recente chamada minireforma buscou diminuir a corrupção eleitoral, a compra de votos, proibindo algumas práticas antigas como a distribuição de camisetas, batons, réguas, canetas, chaveiros, e outros brindes de pequeno valor. Há possibilidade de punições severas para aqueles que forem flagrados descumprindo as proibições, como a perseguição de seus diplomas e/ou mandatos, através de ações próprias, por eventual abuso do poder econômico, oferecimento de vantagem em troca de votos, dentre outras possibilidades.

Mas nesse ponto temos que fazer uma reflexão.

Assim como em qualquer caso de corrupção, há a pessoa que oferece ou proporciona a vantagem ilícita, mas também há a pessoa que recebe e goza os benefícios daquela vantagem ilícita oferecida e então aceita.

São as duas faces da mesma moeda. Não há uma face sem a outra. Não há o corruptor se não houver o corrompido. Não há o traficante de drogas se não houver quem as consuma.

E aqui a pessoa que recebe as benesses, ainda que necessitada, dá um terrível mau exemplo. Acaba agindo, mesmo sem pensar, como o consumidor da droga que estimula o tráfico. O eleitor que assim age acaba estimulando a corrupção eleitoral, contribuindo para eleger aquele que, ao não respeitá-lo antes da eleição – porque o agride e o ofende comprando-lhe o voto –, com toda a certeza irá respeitá-lo menos ainda depois de assumir a função pública.

Surgem neste contexto os escândalos nacionais, a exemplo dos recentes, como valériodutos, sanguessugas, etc.

Mas há na própria lei uma solução.

Processar e condenar estas pessoas que recebem os presentes as benesses e os favores, também. Não só processar e condenar quem oferece ou dá a vantagem indevida, mas também quem as aceita, recebe e usufrui.

Alguns Tribunais Eleitorais do Brasil vem agindo assim. Buscam punir, quando possível e com base em provas, as duas faces, os dois lados da mesma moeda. O corruptor e o corrompido, na tentativa de desestimular essas práticas.

É o caso do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso, onde estivemos recentemente, em que alguns de seus membros revelaram o entendimento de punir os dois lados da corrupção. Mas não é o caso do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, por exemplo, onde a jurisprudência revela uma preocupação com o corruptor, entendendo o corrompido como um hiposuficiente, um necessitado, um coitado que precisa daquela ajuda até para a sua subsistência.

São duas posições completamente opostas, ambas escudadas na boa interpretação da norma. Uma mais radical e uma mais tolerante com alguém que precisa, por exemplo, de uns tijolos para construir uma moradia melhor para seus filhos.

É essa a dúvida que deixamos para reflexão do leitor: para o aperfeiçoamento da democracia e amadurecimento da sociedade como um todo e nestas questões eleitorais de oferecimento de vantagens e benesses, qual a posição mais acertada?

 

Como citar o texto:

ROLLO, Alberto; ROLLO, Alberto Luis..Quem recebe as benesses também pratica corrupção: as duas faces da mesma moeda. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 189. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-eleitoral/1426/quem-recebe-as-benesses-tambem-pratica-corrupcao-as-duas-faces-mesma-moeda. Acesso em 31 jul. 2006.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.