1. Noções Gerais

A aceitação da herança encontra respaldo legal nos artigos 1.581 a 1.590, do Código Civil.

Morto, portanto, o autor da herança, desde este momento seus herdeiros se tornam titulares, em condomínio, da universalidade de direitos que compunha o patrimônio do de cujus.

Para uma melhor elucidação desse instituto, vamos conhecer o texto do art. 1.572, do mesmo estatuto legal, que dispõe que “aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”, também conhecido na doutrina como "princípio saizini". 

De acordo com este artigo em momento algum o patrimônio pode ficar sem titularidade e, a manifestação que mostra a aceitação da herança é vista apenas como ato que formaliza o que a lei já dispõe, porém, a lei não impõe a ninguém a obrigação de receber aquilo que não quer, dando-se, desta forma a oportunidade para declarar se aceita ou não o que lhe é colocado à disposição.

 Em razão disso, a aceitação da herança é essencial para considerá-la definitivamente incorporada ao patrimônio do herdeiro, pois, embora a aceitação não seja necessária para transmitir a herança, é tal aceitação o ato jurídico que confirma a transmissão da herança, tornando-a definitiva e irrevogável, retroagindo seus efeitos à data da abertura da sucessão.

As obrigações impostas aos herdeiros não poderão ser superiores às forças do que irão herdar, cabendo ao beneficiado a prova de eventual excesso, nos termos do art. 1.587, do Código Civil.

2. Fases existentes entre a abertura da sucessão e a aceitação da herança

Durante o intervalo de tempo entre a abertura da sucessão e a renúncia, a herança não fica sem titular, sendo que entre o óbito do titular de direitos e a aceitação da herança, existem três momentos distintos:

            a) o da abertura da sucessão, que ocorre com a morte do autor da herança. Nesse exato momento, o acervo é transmitido todo o acervo, de forma abstrata, aos herdeiros;

            b) a delação da herança, e o momento em que se oferece o acervo aos herdeiros. Ocorre ao mesmo tempo que a abertura da sucessão; e

            c) a aquisição ou aceitação, que se apresenta como o fato jurídico do ingresso dos bens no patrimônio dos herdeiros em decorrência da manifestação de vontade destes, em virtude da qual a herança já deferida é aceita. Não podemos afirmar que o momento da aquisição se verifica com a aceitação, porque os direitos de herança não nascem com ela, mas recuam à data da morte, produzindo a aceitação efeito retro-operante, dando-se, desta forma, por encerrada a situação de pendência criada com a abertura da sucessão.

3. Formas de aceitação da herança

Vale lembrar que a aceitação da herança não precisa ser comunicada a quem quer que seja para que possa produzir seus efeitos, fazendo por si só acontecer todos os resultados previstos no ordenamento jurídico.

Na aceitação comumente não se utiliza forma expressa, servindo-se quase sempre de outros meios – tácitos e presumidos – que induzem a esse entendimento, não se permitindo o uso dessa pretensão através do meio oral, ainda que perante testemunhas.

A aceitação pode ser expressa, mas não é comum e se faz por declaração escrita através de instrumento público, particular ou termo nos autos do inventário ou tácita, quando se deduz da prática de algum ato próprio de herdeiro.

A regra é a aceitação tácita que se verifica, entre outros atos, quando: a) o herdeiro intervém no inventário habilitando-se ou manifestando-se sobre os atos processuais; b) administra, em proveito próprio e dos demais herdeiros, os bens da herança; c) promove melhoria em imóveis.

A aceitação será presumida, se algum interessado requerer ao Juiz, até 20 dias depois da abertura da sucessão, para que mande o herdeiro pronunciar-se em até 30 dias. Caso não se pronuncie, presumida será aceitação da herança.

Os atos oficiosos, que correspondem a sentimentos piedosos e desinteressados, como o funeral ou a ordenança de mandar oficiar missa a favor do defunto; os meramente conservatórios que têm por fim impedir deterioração ou perdimento da herança ou os de administração e guarda provisória que visam a cuidar do bem a fim de entregá-lo a quem deva tê-los consigo, não importam em aceitação da herança.

A cessão gratuita, pura e simples, da herança aos demais co-herdeiros não importa em aceitação da herança porque se trata de verdadeira renúncia.

Pode a aceitação da herança ainda se apresentar de forma direta ou indireta. Será direita quando provier do próprio herdeiro e indireta quando alguém a faz por ele, o que se verifica nos seguintes casos:

a) os sucessores do herdeiro podem aceitar por ele, se falecer antes de declarar se aceita ou não a sucessão;

b) o tutor e o curador poderão aceitar pelo tutelado e pelo curatelado, heranças, legados ou doações, se tiver autorização judicial para assim fazer, nos termos do art. 427, III, e art. 453, ambos do Código Civil;

c) o mandatário ou o gestor de negócios também podem aceitar, representando o herdeiro; e,

d) os credores, até o montante do crédito, podem aceitar a herança pelo devedor herdeiro. O novo Código Civil, porém, traz em seu art. 1.813, § 1º., o prazo de 30 dias seguintes ao conhecimento dos fatos, para que o credor se habilite. Concluímos que, em assim não se fazendo, precluso estará tal direito, devendo o credor, a partir daí, procurar outros recursos judiciais para ver resolvido seu crédito.

4. Prazo para aceitação ou não da herança

Aberta a sucessão, aquele que tenha interesse (o legatário, o credor e o chamado sucessivo) poderá requerer ao juiz competente para o inventário a intimação do herdeiro indeciso para manifestar-se sobre a aceitação, ou não, da herança. Este requerimento (actio interrogatoria) só pode ser feito vinte dias após a morte do autor da herança e o prazo de deliberação assinado pelo juiz, não poderá ultrapassar trinta dias.

Silente o herdeiro ao final do prazo, a lei presume que aceitou a herança. Ocorre, portanto, uma aceitação presumida.

5. Retratação da aceitação

A aceitação não pode ser retratada, pois o novo Código – Lei 10.406/2002 – em seu art. 1.812, prevê textualmente como irrevogáveis os atos de aceitação ou de renúncia da herança.

6. Aceitação da herança legítima e do legado, quando recebidos de forma simultânea

Encontrando-se o beneficiário como herdeiro legítimo e legatário de forma simultânea, poderá ele aceitar ou renunciar o que lhe é conferido nos dois institutos, ou aceitar ou renunciar o direito a que se firma cada um deles.

Aquele que recebe a título de herança e de legado, pode renunciar aquela e aceitar este, ou vice-versa; se, recebe na qualidade de herdeiro legítimo  e de herdeiro testamentário, pode aceitar a herança legítima e renunciar à herança testamentária, ou vice-versa.

Nestas hipóteses não se trata propriamente de aceitar ou renunciar à posição de sucessor, mas ao título sucessório que legitima a aquisição hereditária.

A lei fala em primeira e segunda heranças. A primeira herança é aquela que fora deferida ao falecido herdeiro sem que sobre ela houvesse deliberado. A segunda herança é aquela decorrente da morte do próprio herdeiro silente. Assim, se os sucessores do herdeiro falecido renunciarem à herança decorrente daquele falecimento, não poderão deliberar sobre aquela herança que lhe fora deferida antes de morrer; ao contrário, se aceitarem aquela segunda herança, poderão aceitar ou renunciar à primeira.

7. Aceitação e renúncia da herança mediante condição ou termo

A herança é a universalidade de direitos do falecido transmitida aos herdeiros como um único e indivisível direito. Decorre deste princípio que a herança não admite aceitação ou renúncia parcial. Assim, não pode o herdeiro aceitar apenas os imóveis ou, rejeitando-os, pretender tão-só os depósitos bancários.

A aceitação condicional ou a termo também não se admite. A intenção do legislador é garantir a continuidade das relações jurídicas de conteúdo econômico do falecido, de sorte que o herdeiro assume a posição de autor da herança em suas relações jurídicas ou a repudia. A condição e o termo impedem a continuidade natural daquelas relações. O herdeiro não pode, portanto, aceitar a herança por certo tempo ou a partir de determinado dia, nem sob condição de receber, apenas as quotas das sociedades que forem, após a apuração de haveres, reconhecidas como lucrativas.

A aceitação parcial, condicional ou a termo é nula.

8. Conclusão

A aceitação da herança e a manifestação livre de vontade de receber o herdeiro a herança que lhe é deferida.

A aceitação da herança deve ser pura e simples, não podendo estar vinculada a condição ou termo, uma vez que, adquirida a herança pelo herdeiro ou pelo monte, não mais pode ela ser perdida, o que, ao contrário, traria uma insegurança nas relações jurídicas.

Referências Bibliográficas

FRANÇA, Adiel da Silva. Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2004.

FIUZA, César. Direito Civil. 7. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 23. ed. São Paulo: Saraiva. 1989.

.

 

Como citar o texto:

SANDER, Tatiana.Considerações sobre a aceitação da herança. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 134. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-empresarial/681/consideracoes-aceitacao-heranca. Acesso em 14 jul. 2005.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.