Do ponto de vista primário, quanto ao exercício da função notarial, o notário tem apenas uma função, qual seja: documental ou documentadora. Entretanto, isso não é verdade, pois as escrituras ou os documentos redigidos pelos notários são reveladores de procedimentos, de boa ordem, de disposição sobre bens, cumprimento de obrigações, exposição de fatos jurídicos, dentre tantas outras funções que se torna difícil enumerá-las.

O notário faz muito mais do que autenticar atos e documentos, pois, exercendo sua função, dá forma e sanção pública nos atos em que intervém, modelando o direito e estabelecendo regras de convivência. 

O notário, como determina a lei, tem o duplo aspecto de profissional de direito, eis que tem a missão de assessorar a quem reclama sua autoridade e aconselhar os meios jurídicos mais adequados para o êxito de seus fins lícitos que se propõe alcançar e ser delegado do poder estatal que exerce a fé pública notarial.

O notário exerce uma atividade chamada administração pública dos interesses privados, diante da qual há que se reconhecer a existência de proximidade profissional entre a atividade judicial e a notarial, está quando realiza o direito.

A realização do direito é entendida de dois modos diferentes. De um lado, como aplicação de uma norma abstrata nos casos concretos e, de outro, como a própria realização ou elaboração do direito.

A função judicial é bem definida pelo critério da divisão dos poderes, nos quais um dos órgãos dita a lei (legislativo) e o outro é encarregado de aplicá-la (concretizá-la), usando, sempre que possível e não vedado pela norma, os costumes do local onde deve ser aplicado e, ainda, as outras teorias da hermenêutica jurídica, procurando sempre ditar o justo. Já na função notarial, o direito se concretiza e finaliza com o ato jurídico em sua forma instrumental, quando devidamente elaborado e autorizado (certificado) pelo notário, no exercício de sua função delegada, atuando assim, de forma preventiva na instrumentalização das vontades dos particulares, levando consigo somente uma presunção juris tantun de legitimidade e autenticidade, sem que possua o efeito de coisa julgada.

Tratadistas de direito notarial costumam atribuir aos atos jurídicos, valor e força de sentença, mas esta não deve ser entendida com o sentido de coisa julgada, pois, O documento público obriga a julgar conforme ele próprio; a coisa julgada obriga o juiz a não julgar mais o mesmo assunto. O documento público dá ensejo a ações ou pretensões e a  coisa julgada extingue o direito de ação do demandante. A escritura pública tem a promessa da lei de uma tutela jurisdicional específica; a coisa julgada elimina esta tutela na via de ação sobre as mesmas relações jurídicas.

Nessa atividade, que requer conhecimento da lei e da arte, o notário aplica a lei ao caso em que os interessados lhe submetem, procurando sempre encontrar meios lícitos para concluir a declaração de vontade pleiteada, vencendo dificuldades técnicas e práticas, devendo sempre unir as duas de conformidade com os interesses dos requerentes, prevenindo, a todo tempo, qualquer indício de futuro litígio.

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Como citar o texto:

SANDER, Tatiana..O Notário: Realizador do Direito e Aplicador das Normas Jurídicas. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 133. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-notarial-e-registral/662/o-notario-realizador-direito-aplicador-normas-juridicas. Acesso em 4 jul. 2005.

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