Recentemente, fomos surpreendidos pela notícia do percentual de aprovados no último exame de ordem da OAB de São Paulo (8,52%), resultado mais que pífio se comparado com exames anteriores mas muito além das expectativas que os críticos tinham a ponderar, sendo certo que as justificativas saltaram, imediatamente, dos bolsos mágicos de diversos especialistas seja do próprio ramo sejam de outros ligados à educação ou ao sistema jurídico vigente.

O presidente da OAB Seccional de São Paulo, foi um dos primeiros a correr aos meios de comunicação para alardear que a entidade a qual representava já havia alertado os órgãos educacionais competentes de que fatos como esse viriam a ocorrer, tal como quem afere um diagnóstico terminal à um paciente moribundo que ainda pode ser capaz de estrebuchar-se no leito derradeiro de sua própria sorte.

O principal alvo são os cursos superiores de ensino cuja estrutura, métodos de ensino, corpo docente e sistema de avaliação foram guindados ao patamar de carrascos de causa dos efeitos perniciosos que vieram a causar na avaliação de futuros profissionais, chamados de operadores do direito, e na possível perspectiva de que estes jovens estudantes encontrariam-se aptos a advogar em causa de interesses de terceiros.

Pura bobagem é o que se constata ao fazer-se um exame detalhado, à luz da razão e da lógica, acerca de quem são os efetivos responsáveis por tal catástrofe ocorrida no citado exame, pois é de clareza meridiana que a responsabilidade não pode ser atribuída a apenas um único responsável, visto que a culpa bem como a responsabilidade é sistêmica e, por conseqüência, de todos aqueles, quer de forma direta quer de forma indireta, encontrem-se envolvidos na tarefa de preparar pessoas para o mundo profissional.

Ousamos aqui, primeiramente, denunciar a absoluta dissociação entre o mundo acadêmico e o universo profissional, posto que ambos não se integram quando necessário para promover a inserção do estudante nas suas futuras atividades, em especial, no tocante ao aprendizado constante e aprimorado de técnicas e relações entre as teorias apreendidas e sua efetiva aplicabilidade no mundo profissional ao qual ele virá a se integrar com todos seus anseios, expectativas e oportunidades que lhe serão criadas a partir de então.

Que nos perdoem aqueles que agitam a bandeira do estágio profissional como justificativa mais apropriada ao que foi exposto, porquanto verifica-se que inexiste qualquer vinculação entre o estágio e uma forma eficiente de integrar-se aluno e profissão, visto que na maioria das vezes, estagiários são relegados ao exercício de funções menores e sem qualquer significado prático para promover-se uma aproximação entre o jovem e aquela que será sua atividade funcional num futuro não muito distante.

Desta forma, o que temos é uma necessidade premente de integrar todos na tarefa prática de preparar estudantes para a sua vida profissional, até porque, são eles aqueles que desenharão o novo mapa das estruturas sociais, políticas, econômicas e jurídicas que poderão, com certeza, tornar a vida melhor para todos. Não podemos aceitar qualquer espécie de justificativa iníqua para que se aponte a culpa sobre uma única instituição, pessoa, ou entidade que se encontre envolvida com a educação e o preparo profissional de futuros dirigentes da nação, estadistas, médicos, professores, terapeutas, administradores, economistas, e, advogados, bem como juízes e juristas.

O que se tem na verdade, é uma responsabilidade conjunta que envolve todos que de uma forma ou de outra atuem ou prestem seus créditos ao ensino superior, ousando falar inclusive numa verdadeira responsabilidade solidária de todos com todos. E não excluímos ninguém, até mesmo os próprios alunos que são responsáveis pelo desenho de seu próprio futuro e que, por isso mesmo, tem o verdadeiro poder-dever de agir não apenas em prol de si mesmos, mas, acima de tudo, em prol de melhorias contínuas para os que virão depois e depois deles aqueles que herdarão uma perspectiva mais profícua, granjeando mais progresso e mais estabilidade social.

Este texto não tem qualquer pretensão altruísta de servir ao interesse da maioria até porque percebe-se que a maioria assim não o quer. Caso desejasse de fato qualquer mudança no atual estado geral das coisas, movimentaria-se de forma coordenada e conjunta com vistas ao atingimento de uma meta; e veja que falamos de meta e não de metas o que seria pedir demais até mesmo para quem nunca foi capaz de caminhar com os próprios pés e que pode, agora e como sempre, faze-lo de acordo com o seu livre-arbítrio, pensamento livre e desonerado que sempre foi capaz de criar, de inovar e de encontrar soluções criativas que, em momentos de crise, mostraram qual o caminho a ser seguido.

Acreditamos piamente que não existe solução pronta que esteja esperando num estojo de ouro na prateleira do conhecimento por alguém que tenha o efetivo interesse de beneficiar-se bem como aos seus semelhantes. Cabe, portanto, a todos os envolvidos, órgãos governamentais, entidades associadas, universidades, professores, educadores, profissionais e, principalmente aqueles que são os maiores interessados na concretização dessa tarefa que são os estudantes, os acadêmicos de qualquer e de todas as áreas do conhecimento que devem estar comprometidos, sem restrições ou ressalvas, com o objetivo primordial de melhoria contínua não apenas do ensino mas também, e principalmente, do aprendizado que conduz ao sucesso.

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Como citar o texto:

TROVÃO, Antônio de Jesus.De quem é a culpa?. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 119. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/exame-da-ordem-e-concursos/534/de-quem-culpa. Acesso em 23 mar. 2005.

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