Apesar de tantas convicções, a noção do direito penal subjetivo continua sendo uma idéia “mal formulada”. Se é verdade que alguns doutrinadores insistem na idéia da existência de um possível direito penal subjetivo, é também verdade que há muitos outros que concordam na dificuldade e até mesmo na impossibilidade deste pensamento. Autores como Mirabete (MIRABETE, 2003) ou Bittencourt (BITTENCOURT, 2004) sinalizam a idéia de “um direito do estado de punir”, admitindo portanto, a titularidade do Estado no direito penal subjetivo. Se, é verdade que a distinção das relações entre direito privado e público faz-se obrigatória, é também verdade que ao se pensar um direito penal subjetivo, admite-se manifesta violação de conceitos básicos de IED (introdução ao estudo do direito), como assinala Aníbal Bruno (BRUNO, 2003) “a tentativa da dogmática, de estender o conceito de direito subjetivo ao domínio do direito penal e nele traduzir a natureza do poder punitivo estatal, procura estabelecer unidade sistemática na noção dos poderes jurídicos, mas o que resulta é uma turbação da pureza daquele conceito, tão nitidamente definido no direito privado”.

A definição de direito subjetivo traz a idéia de uma titularidade de um direito que é ou não exercido em função da vontade do titular do direito (sujeito ativo). Por definição, admitir-se a existência de um direito subjetivo implica, necessariamente, admitir também a existência de um dever jurídico correspondente. Desta forma, se o sujeito ativo deste direito subjetivo é o Estado, a quem caberia o posto de sujeito passivo? Alguns autores admitem a corajosa resposta de imaginar dois direitos subjetivos pertencentes ao Estado, correspondendo a momentos distintos da sua atuação: um primeiro momento antes da violação à norma (situação em que o Estado seria sujeito passivo), e outro momento, quando o Estado aplica a sanção pelo descumprimento da lei (para o qual ele seria sujeito ativo).

De qualquer sorte, percebe-se a dificuldade em se admitir um “direito penal subjetivo” e essa dificuldade dentre outras, estaria, principalmente, em se moldar o direito penal a um conceito do direto privado. Além disso, “se o poder do Estado de viabilizar as condições de vida na sociedade não pode ser comparado a um direito subjetivo, menos ainda a submissão do réu à pena, pode ser tomada como cumprimento de uma obrigação jurídica”, como bem assinala Aníbal Bruno (BRUNO, 2003), inaugurando nova polêmica no que tange o conceito de dever jurídico, pois não se espera que o réu aceite passivamente a sua pena para fazer cumprir um direito subjetivo, pelo contrário, espera-se que ele sempre a evite e negue. Por essa razão, pode-se concluir que a sanção tem um caráter punitivo, impondo uma pena.

A melhor resposta para a questão seria admitir que caberia ao Estado a “função” do direito penal subjetivo, não cabendo entretanto a sua titularidade, ou seja, seria uma tentativa de explicação onde o Estado, apesar de responsável pelas condições de existência e continuidade da organização social, deveria apenas exercer tal função, e nunca ser equiparado a titular de um direito subjetivo. A discussão porém, continuará existindo sempre que a Doutrina tentar adaptar o direito penal a um conceito tão bem definido e tipicamente do direito privado.

Fontes:

BITENCOURT, Cezar Roberto – Tratado de Direito Penal : Volume 1 – 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

BRUNO, Aníbal - Direito Penal Parte Geral: Tomo 1- Ed. Forense, 2003

MIRABETE, Júlio Fabrini - Manual de Direito Penal. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2003.

 

Como citar o texto:

VASCONCELLOS, Milton Silva de..A Dificuldade do Direito Penal Subjetivo. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 144. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/trabalhos-academicos/790/a-dificuldade-direito-penal-subjetivo. Acesso em 17 set. 2005.

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