O Brasil tem o condão de ter uma cultural muito peculiar. Numa sociedade contemporânea, marcada pela especialização cada vez maior do profissional, o Brasil prima por uma inversão completa no que tange os valores educacionais.

 

 

Enquanto o mundo globalizado se preocupa em contratar profissionais que saibam cada vez mais sobre um determinado assunto, e assim, ter segmentos empresariais altamente desenvolvidos e capacitados, a realidade nacional caminha na contramão.

 

 

A obtenção de emprego nas trincheiras empresárias tupiniquins prima pela contratação de pessoas cada vez menos especializadas.

 

 

Os motivos são variados: salários mais baixos, menor concorrência para um superior menos qualificado etc.

 

 

No entanto, seria este o melhor caminho? A crise qualitativa chegou também às universidades. Quando o MEC estipulou que o requisito necessário para ser professor era a existência de, ao menos, um mestrado era sabido que o profissional do magistério se tratava de pessoa que se dedicou a um estudo minimamente mais aprofundado.

 

 

O mestrado representa um salto qualitativo na formação de um professor. Não é possível mensurar a densidade que o curso exige numa comparação com uma especialização ou com uma pós-graduação Latu sensu.

 

 

Mesmo paralelo deve ser traçado entre o mestrado e o doutorado. O nível de profundidade do segundo é muito maior. Primeiro por se tratar de um assunto específico dentro da área escolhida. Segundo por ter a obrigatoriedade de ineditismo.

 

 

Tal conseqüência requer uma dedicação por parte do candidato muito elevada. E aqueles que detêm a qualificação de doutores são pessoas altamente respeitadas no mundo acadêmico e são habilitadas para receberem convite das grandes universidades.

 

 

O doutorado representa um marco na carreira de um professor, o reconhecimento de todo um investimento, seja financeiro, ou temporal, com notada renuncia da convivência continua com amigos e familiares.

 

 

E em outros locais como nos Estados Unidos e Europa um doutor é disputado pelos grandes centros. E no Brasil?

 

 

Bem, o cenário nacional prima por uma deprimente inversão de valores educacionais, porque a contratação de um doutor pelas universidades se trata de um fato cada dia mais raro.

 

 

Seria uma posição inovadora? Na verdade não, a realidade nacional é que pessoas com elevada qualificação fizeram jus a um salário quantitativo maior. Para uma instituição o fato é que o salário de um doutor pode viabilizar a contratação de dois mestres, ou de três especialistas.

 

 

Então é preferível abrir mão desse notado conhecimento em detrimento de pessoas menos gabaritadas.

 

 

A mesma faceta aflora o cotidiano empresarial. É muito mais preferível contratar profissionais mais “baratos” e, consequentemente, menos gabaritados do que primar por uma mão-de-obra realmente especializada.

 

 

Um chefe com uma formação inferior prefere ter um subordinado com qualificação menor para não representar uma possível concorrência.

 

 

Na verdade, a existência de pessoas altamente capacitadas em determinadas áreas deveriam produzir o efeito inverso. Afinal, uma empresa deveria buscar justamente pessoas gabaritadas para propiciar uma melhoria de rendimento.

 

 

Assim é feito ao longo da sociedade contemporânea. As empresas investem muito em seus próprios funcionários. Pagam como complemento de salário cursos como MBA, LLM, MASTER, PHD etc. e por quê?

 

 

A resposta é uníssona: retorno garantido para o próprio ente coletivo. Quando se investe num funcionário o retorno será percebido num período médio de tempo, mas a experiência e o conhecimento adquiridos representam novos conhecimentos à empresa.

 

 

Formar o próprio profissional, e propiciar um incremento em sua qualificação é mais econômico do que ter de buscar no mercado uma pessoa com as mesmas qualificações.

 

 

Porém o dinheiro gasto não seria melhor empregado num profissional que já tivesse essa experiência? Está é a grande diferença da realidade nacional para a estrangeira: plano de carreira.

 

 

No Brasil quando uma empresa passa por um período de dificuldade os primeiros funcionários passiveis de cortes são os mais antigos, por representarem os maiores gastos.

 

 

Mentalidade que não conduz a um crescimento. O profissional experiente deve estar sempre atualizado, com formação atualizada, mas jamais se pode prescindir de sua experiência por um jovem com a mesma capacitação profissional que irá ganhar metade de seu salário.

 

 

Esta é a realidade tupiniquim. Uma pessoa com quarenta anos é considerada velha para o mercado de trabalho. As chances de um emprego menor são diminutas.

 

 

E a realidade dos doutores de hoje? A resposta é o acompanhamento da contramão brasileira. Pois, não é raro um professor, numa entrevista de emprego, omitir ser doutor para garantir sua contratação, mesmo com um salário inferior.

 

 

Não é interessante ser tão qualificado neste país. Ser muito bom na sua área pode acarretar um prêmio inimaginável: o desemprego.

 

Como citar o texto:

GONÇALVES, Antônio Baptista.A inversão dos valores educacionais. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 236. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/etica-e-filosofia/1792/a-inversao-valores-educacionais. Acesso em 7 ago. 2007.

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