RESUMO

 

A intervenção de terceiros é largamente utilizada no direto processual civil, tendo regramento específico no Código de Processo Civil.

No processo do trabalho sempre houve, e ainda há, controvérsia sobre a possibilidade de se adotar o referido instituto.

Após a EC 45, que alargou a competência do trabalho, abrangendo todas as demandas decorrentes da relação de trabalho, muitos dos argumentos contrários à aplicação da intervenção de terceiros na Justiça do Trabalho perderam força, porém ainda persiste controvérsia em torno da compatibilidade do instituto perante a seara Juslaboral.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Processual do Trabalho. Intervenção de Terceiros. Aplicação à Justiça do Trabalho. EC 45. Lei 9.099/95. Ritos Ordinário e Sumaríssimo.

1. INTRODUÇÃO

No direito processual brasileiro vigora o princípio da singularidade, segundo o qual somente compõem os polos da relação jurídica processual autor e réu, chamado na seara Juslaboral reclamante e reclamada. Entretanto, nos casos expressamente previstos na legislação, há possibilidade da intervenção de outras pessoas no processo.

Candido Rangel Dinamarco conceitua a intervenção de terceiros como o ingresso de um sujeito, como parte, em processo pendente entre outros.

Nesta esteira, terceiro é rigorosamente toda pessoa que não seja parte do processo e será terceiro somente até que intervenha no processo, pois ao intervir converte-se em parte.

O que justifica a existência do instituto é a proximidade entre certos terceiros e o objeto da causa de pedir, podendo-se prever, de algum modo, que o julgamento da ação projetará algum efeito indireto sobre sua esfera de direito.

Frise-se que o interesse do terceiro há de ser jurídico e não meramente econômico para autorizar o seu ingresso na lide.

A doutrina divide a intervenção de terceiros em duas subespécies: a) a espontânea ou voluntária (assistência e oposição); e b) a provocada ou coacta (denunciação da lide; chamamento ao processo; e nomeação à autoria.).

A intervenção de terceiros está prevista nos artigos 46 a 80 do Código de Processo Civil.

Sempre houve controvérsia se seria aplicável o instituto da intervenção de terceiros no processo do trabalho. A corrente contrária à sua aplicação justificava como principal óbice ao terceiro adentrar à lide o fato de que a competência da Justiça do Trabalho estava limitada às lides de entre empregado e empregador, ou seja, relação de emprego.

Com o advento da EC/45, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho, passando a conferir jurisdição no julgamento das ações decorrentes das relações de trabalho (inciso I do artigo 114 ), bem como de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (inciso IX do artigo 114), resta indene de dúvidas que a intervenção de terceiros é aplicada subsidiariamente ao processo do trabalho, nos termos do artigo 769 da CLT.

Entrementes, em razão das peculiaridades do processo do trabalho, a intervenção de terceiros não é admitida nas ações que correm perante o rito sumaríssimo. A razão desta limitação decorre da Lei 9.099/95, que instituiu os Juizados Especiais, aplicada subsidiariamente ao processo do trabalho, onde em seu artigo 10 impossibilita a intervenção de terceiros.

Já quando o processo estiver diante o rito ordinário, apesar de existir controvérsia sobre o tema, entendemos pela possibilidade da intervenção de terceiros, tomando como base legal o artigo 114, incisos I e IX, da Constituição Federal e artigo 769 da CLT.

Assim, é possível que terceiro integre relação jurídica de processo que tramita na Justiça do Trabalho, desde que o processo corra sob o rito ordinário e o terceiro esteja enquadrado em uma das figuras jurídicas previstas no CPC, a saber: assistência, nomeação à autoria, oposição, denunciação da lide ou chamamento ao processo.

2.1- Assistência

A assistência está prevista nos artigos 50 a 55 do CPC, sendo que o artigo 50 discorre sobre o conceito desta figura jurídica, in verbis:

“Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no processo para assisti-la.”

Neste diapasão, o assistente atua na lide como auxiliar da parte assistida, que é a parte principal do processo, podendo, nos casos de revelia, ser considerado o gestor de negócios do assistido.

Ademais, o ingresso do assistente não altera o processo, pois ele se limita a aderir à pretensão da parte principal.

Importante ressaltar que a disputa de interesses não abrange o assistente, pois o mérito tem o mesmo contorno com a assistência ou sem ela. Desta feita, a assistência não impede que o assistido reconheça a procedência da ação, desista da ação ou transija sobre direitos controvertidos.

Percebe-se, assim, o caráter acessório da assistência, pois terminando o processo por qualquer ato da parte principal, cessa a intervenção do assistente.

Na seara Juslaboral é pacífico o entendimento pela aplicação da assistência no processo do trabalho, sendo, inclusive, objeto da redação da Súmula 82 do TST, ipisis liteiris:

“ASSISTÊNCIA. A intervenção assistencial, simples ou adesiva, só é admissível se demonstrado o interesse jurídico e não o meramente econômico.”

Mauro Schiavi, após ressaltar que não são muitas as hipóteses de ocorrência de assistência no processo do trabalho, cita como exemplos: 1) o sócio que ingressa como assistente para ajudar a empresa; 2) a empresa do mesmo grupo econômico que assiste outra empresa do grupo; e 3) o empregador que ingressa como assistente em ação coletiva promovida pelo sindicato em que este figura como substituto processual.

Por fim, Sérgio Pinto Martins assevera que a hipótese mais comum de assistência no processo do trabalho é a que envolve a participação do sindicato, assistindo o empregado em juízo.

2.2-Nomeação à autoria

Os artigos 62 a 69 do CPC discorrem sobre a nomeação à autoria, sendo que o artigo 62 realiza interpretação autêntica do instituto, no sentido de que “aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou possuidor”.

A oportunidade de nomear à autoria, nos termos do artigo 64 do CPC, é no prazo de resposta.

Sua aplicação no processo do trabalho é bastante restrita, mas de grande valia, eis que possibilita, vg., que a pessoa física que ocupe cargo de gerência em determinada empresa e é demandada em nome próprio pelo reclamante, possa nomear a autoria à pessoa jurídica que contratou o trabalhador, impedindo que o processo seja extinto sem julgamento do mérito e que seja ajuizada outra ação em face do verdadeiro empregador.

A doutrina coaduna do mesmo entendimento, ex vi:

“A nosso ver, a nomeação à autoria, embora de difícil ocorrência no Processo do Trabalho, não é com ele incompatível. O referido instituto pode ser compatibilizado com o Processo do Trabalho (art. 769, da CLT), inclusive para beneficiar o próprio reclamante, mesmo sem a necessidade de extinção prematura do processo em razão da ilegitimidade. Muitas vezes o autor postula verbas trabalhistas em face do reclamado que não é o empregador e este em defesa indica quem é o verdadeiro empregador. Desse modo, uma vez havendo concordância do reclamante ou até se estiver convencido o juiz, este poderá determinar o acertamento do pólo passivo, sem precisar extinguir o processo por ilegitimidade ad causam do demandado.”

Constata-se, então, que a nomeação à autoria pode dar celeridade ao processo do trabalho, pois impede a extinção prematura do processo, abrindo-se a possibilidade de que seja corrigido o polo passivo da demanda.

2.3-Oposição

A oposição pode ser aviada até a prolação da sentença por quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu. Está prevista nos artigos 56 a 61 do CPC e existem várias possibilidades em que podem ser utilizadas no processo do trabalho, evitando que seja ajuizada mais uma lide pelo opoente, que requer a coisa ou o direito da primeira demanda.

O primeiro exemplo diz respeito aos instrumentos de trabalho. Reclamante e reclamado discutem acerca da propriedade de certo maquinário, porém este bem da vida pertence a um terceiro, que poderá intervir na lide como oponente.

O segundo exemplo é sobre o direito de invenção. Empregado e empregador discutem direitos sobre invenção de determinado produto de empregado no curso do contrato de trabalho, quando terceiro se julga com direitos sobre a invenção.

O terceiro caso reside na possibilidade de discussão acerca de remuneração decorrente do labor do reclamante, quando terceiro intervêm discorrendo que faz jus a parcela remuneratória objeto da lide, vez que houve força de trabalho em conjunto com o reclamante.

O quarto caso que abre a possibilidade da utilização do instituto da oposição está no exemplo do sindicato que ajuíza ação pleiteando o recebimento de contribuição sindical e outro sindicato apresenta oposição, afirmando que a contribuição sindical lhe deve ser revertida, por ser o legítimo representante da categoria.

Destarte, a prática de oposição na Justiça do Trabalho pode auxiliar a redução das lides, bem como de sua complexidade, o que resulta em uma maior segurança jurídica para os jurisdicionados.

No entanto, é objeto de debate na doutrina a aplicação ou não da oposição no dissídio coletivo de natureza econômica.

Sérgio Pinto Martins posiciona-se pela possibilidade de oposição, discorrendo que:

“cabe oposição em dissídio coletivo, o oponente deverá fazer seu pedido, atendendo aos requisitos do art. 282. A oposição é distribuída por dependência, devendo os opostos serem citados pessoalmente ou por seus advogados para contestar a ação na audiência que for designada.”

De outro lado, Mauro Schiavi aponta pela impossibilidade da figura da oposição em dissídio coletivo de natureza econômica, sob o argumento de que:

“no estágio atual da competência da Justiça do Trabalho, não cabe mais a oposição em dissídio coletivo, pois se houver controvérsias sobre a representação da categoria, deve o sindicato oponente postular ação declaratória junto à Justiça do Trabalho, no primeiro grau de jurisdição, e pretender a suspensão do dissídio coletivo enquanto tramitar a ação declaratória, por meio de medida cautelar, podendo o relator do dissídio coletivo, se entender cabível, suspender o processo até a decisão da ação declaratória, nos termos do art. 265 do CPC.”

Neste diapasão, a repartição de competências entre a Vara do Trabalho e o TRT realmente impede que seja deferido o pedido de oposição em dissídio coletivo de natureza econômica, razão pela qual entendemos ser impossível o seu deferimento.

2.4-Denunciação da lide

A denunciação da lide vem prevista nos artigos 70 a 76 do CPC e assegura, basicamente, o direto de regresso do demandado em caso de eventual condenação.

O momento de sua oferta é na inicial, se o denunciante for o reclamante, e na defesa, caso o denunciante seja o reclamado.

A doutrina aborda que apesar de o caput do artigo 70 do CPC asseverar a obrigatoriedade da denunciação da lide nas hipóteses dos incisos II e II , se o réu não ofertar o requerimento da denunciação da lide, este não perderá o direito de regresso, mediante ação autônoma posterior. Acrescenta, ainda, que entendimento contrário violaria o acesso à justiça, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.

No âmbito do processo do trabalho o instituto possui amplitude bastante reduzida quando comparado com o processo civil, não sendo aplicável os incisos I e II do artigo 70 da CLT, por se tratar de tema estranho à relação de trabalho.

Impende ressaltar que o TST ao cancelar a OJ 227 da SBDI-1, manifestou-se pela possibilidade de denunciação à lide no âmbito da Justiça do Trabalho.

Nesta esteira, há possibilidade de denunciação da lide nas ações reparatórias de danos morais e patrimoniais, quando o empregador possui contrato de seguro para arcar com estes gastos, momento em que poderá denunciar a lide à seguradora.

Ou então, caso a empresa tenha algum prejuízo decorrente de fato do príncipe, cujo o obreiro pleiteie o ressarcimento, cabe à empresa denunciar à lide ao Poder Publico.

2.5-Chamamento ao processo

No chamamento ao processo o co-responsável pela dívida invoca, no processo, a presença dos demais responsáveis ao pagamento que pode surgir em eventual condenação.

Possui previsão legal nos artigos 77 a 80 do CPC.

O cabimento do chamamento ao processo na seara Juslaboral é deveras interessante para o reclamante, que possuirá mais pessoas responsáveis ao pagamento de eventual condenação, sendo totalmente compatível com o processo do trabalho.

Mauro Schiavi aponta que pode ocorrer o chamamento ao processo do sócio, quando a empresa está insolvente; ou da empresa do mesmo grupo econômico; do subempreiteiro, quando a demanda é proposta em face do empreiteiro principal; da empresa tomadora de serviços, quando se postula o vínculo de emprego em face de cooperativa; ou, ainda, da empresa prestadora, quando se postulam verbas trabalhistas em face da tomadora de serviços nos casos de terceirização.

Wagner Giglio traz em sua obra outra interessante oportunidade de chamamento ao processo, quando o empregador é uma sociedade de fato ou um condomínio irregular, quando todos os sócios ou condôminos poderão ser chamados à lide.

CONCLUSÃO

A intervenção de terceiros, mormente após a Emenda Constitucional n.º 45, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho, desde que respeitadas as limitações em face de sua menor abrangência em comparação com o direito processual civil, onde é pleno, é totalmente compatível com os procedimentos da seara Juslaboral, vez que diminui o número de lides e resulta em maior efetividade da jurisdição, sem abrir mão da segurança jurídica.

Neste diapasão, como a Lei 9.099/95, aplicada subsidiariamente ao processo do trabalho, nos termos do artigo 769 da CLT, impede a aplicação do instituto da intervenção de terceiro no rito sumaríssimo, resta a possibilidade de utilizar os benefícios desta figura jurídica no rito ordinário da Justiça do Trabalho.

Referências

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BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Vade Mecum/Obra Coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes - 5 ed. atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2008.

BRASIL. Código de Processo Civil. Vade Mecum/Obra Coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes - 5 ed. atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2008.

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DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro.Curso de Direito Processual do Trabalho. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2009.

GIGLIO, Wagner D. Direito Processual do Trabalho. 15 ed. São Paulo: LTr, 2005.

 

Data de elaboração: novembro/2009

 

Como citar o texto:

GONCALVES, Leonardo Ramos..Intervenção de Terceiros no Processo do Trabalho. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 14, nº 752. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-trabalho/2139/intervencao-terceiros-processo-trabalho. Acesso em 8 fev. 2011.

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